Annabeth

—Ei, quietos pestinhas! – Minha mãe fez questão de calar os filhos mais novos assim que a insígnia do jornal oficial apareceu na televisão.

O mesmo não foi necessário para mim, pois eu já me encontrava em total silencio, vidrada na televisão enquanto sentava sobre meus próprios pés. Não importava a casta da família, todos em Illéa tinham um lugar para assistir o jornal oficial. Muitas famílias das castas mais baixas como a 6, 7 e 8 se juntavam para assistir em alguma lugar em comum, quando não tinham como bancar uma televisão. Entretanto, todas as sextas a noite o país parava pra saber as notícias mais importantes sobre as guerras que ainda ocorriam no exterior, os ataques rebeldes dentro do país e as novidades envolvendo a família real.

Faziam exatos 10 dias que eu havia entregado a ficha de inscrição para a Seleção, e desde então algo parecia me deixar cada vez mais nervosa sobre o momento em que nos encontrávamos: Em poucos minutos, as selecionadas seriam anunciadas pela primeira vez.

Eram 7 dias de prazo para todas as garotas entregarem suas fichas – o que eu julgava desnecessário, levando em conta o número de meninas que encontrei na fila ainda no primeiro dia - E assim que chegassem todas as fichas, o Rei Zeus faria o sorteio e seu resultado seria apresentado no jornal oficial.

Minhas mãos suadas foram apertadas discretamente pelas do meu pai, assim como as várias vezes durante a semana que ele fazia algo para me manter calma. Enquanto isso, minha mãe tinha surtado em todos os minutos possíveis dos dias anteriores, já que segundo ela eu havia estragado todas as minhas chances, “a realeza jamais aceitaria que uma garota mal arrumada seguisse na competição” era o que ela vivia repetindo.

Em algum dos segundos passados após a execução do hino, o Rei havia começado a passar as principais notícias sobre a guerra na Nova Ásia. Nada do que ele falava com a voz autoritária parecia grandes novidades, provavelmente porque meus olhos só conseguissem focar no garoto loiro, de pele incrivelmente clara e olhos azuis, parado atrás do rei.

O príncipe Jason era uma cópia perfeita do pai. Assim como ele, o garoto tinha uma estrutura ideal para uma figura tão imponente. Apesar de nunca aparecer sem um terno perfeitamente alinhado, era possível notar que o garoto tinha um corpo bem definido. Seus olhos eram tão azuis que pareciam eletrizados e a postura dos dois era sempre ereta, séria e condizente ao seu posto. Havia um único detalhe que diferenciava o garoto do pai: uma pequena cicatriz que repuxava o canto superior do lábio, e só o deixava ainda mais atraente.

Me senti tola, quantas outras garotas não estariam suspirando por ele, exatamente igual a mim, nesse momento?

Assim que Apolo, o apresentador do jornal, chamou a atenção para si foi que meus irmãos finalmente se aquietaram por completo. Não havia uma pessoa em todo o país que não adorasse Apolo Solace; ele era simpático, extrovertido e engraçado na medida certa, sabia como cativar seu público.

— Então, Alteza... – Apolo se aproximou do príncipe, que o recebeu com o maior dos sorrisos. Me peguei pensado se aquilo não cansava, sorrir o tempo todo. – Como está o coração em saber que você conhecerá a sua futura esposa entre as garotas que lhe serão apresentadas agora?

— Sinceramente? Acho que desmaiado, Apolo. – a expressão do Príncipe era divertida. - Ou batendo tão rápido que não o sinto.

Um riso breve tomou conta de todos que apareciam no jornal e dos telespectadores ao meu lado.

— Você sequer deu uma espiada no rosto das garotas? Algo para nos adiantar? – O apresentador sorriu de lado olhando para o príncipe.

— Apesar de estar morrendo de curiosidade, acho que é bom começar a seleção respeitando todas as suas regras. – Jason respondeu.

— É sua melhor escolha, garoto! – O Rei se pronunciou.

É claro, regras. Haviam várias delas na seleção, era assustadora a ideia de precisar submeter alguma relação a todas aquelas proibições ou deveres. Alguns minutos de leitura de um livro em que constavam algumas delas já haviam me deixado exausta.

— Majestade, gostaria de deixar algum conselho para as nossas queridas selecionadas? – o apresentador se dirigiu a rainha dessa vez.

 -Bem, Apolo, desejo a maior das sortes a todas as garotas. Muitas de vocês estão nervosas nesse momento, eu também estava. – A mulher sorriu levemente e cordial. – Aproveitem a noite enquanto podem, a vida de 35 de vocês vai mudar completamente em alguns minutos. Assim, meu maior conselho é que continuem a serem vocês mesmas.

—Ótimo conselho como sempre, Majestade. –Apolo sorriu. – Bem Alteza, que tal acabarmos com todo esse mistério de uma vez por todas? – perguntou olhando para o Príncipe.

— Sequer temos outra escolha? Dê-me minhas opções, Illéa. – Jason falou para a câmera dessa vez. Por alguns segundos, a insígnia do jornal brilhou na tela, cortando para Apolo dessa vez onde o rei dava as notícias.  O apresentador sorria enquanto segurava algumas fichas em mãos.

— Senhoras e Senhores, unam-se as minhas felicitações para as seguintes filhas de Illéa. – A seleção começava naquele momento, enquanto Apolo lia um por um o nome das garotas, província onde morava e casta, e suas fotos apareciam na tela.

Algumas garotas chamavam mais atenção que outras, porém todas eram incrivelmente bonitas. Drew Tanaka, uma garota da Dois, parecia ter se preparado toda a vida para aquela foto, seus cabelos eram escuros e incrivelmente lisos, o sorriso era quase ofuscante de tão branco e o olhar com certeza deixaria alguns homens apaixonados. Silena Beauregard, por outro lado, tinha uma beleza muito mais natural, seus olhos verdes eram de dar inveja.

Me sentia cada vez menos esperançosa. Até as garotas claramente despreparadas para a foto pareciam perfeitas para a coroa. Abri um sorriso enorme ao ver uma garota da Cinco, com cabelos ruivos e cheios, sorrindo tão sinceramente para a câmera que mostrava claramente não se importar com o pingo de tinta que tingia a gola da sua camiseta.  

— Gostei dessa – Virei-me para comentar com os outros, porém, no segundo seguinte meu coração deu um salto.

— Annabeth Chase, Carolina, Três. – Apolo recitava na televisão enquanto minha foto chamava a atenção. Meu sorriso era genuíno, meus cabelos moldavam completamente meu rosto e a maquiagem que ainda restava nele deixava tudo natural. Aquela imagem não poderia ser minha, eu não era tão bonita.

Meus irmãos voltaram a cantarolar em um volume alto, minha mãe me abraçava e eu continuava parada encarando a tela, perplexa, sem sequer prestar atenção nas candidatas seguintes.

— Você está na seleção, corujinha! – Ela comemorava alto perto do meu ouvido. –Minha filha vai ser a nova princesa! 

Então o telefone tocou e finalmente ela me largou. Recebíamos um telefonema de felicitação atrás do outro, como se toda a atenção da província houvesse se virado a minha casa - e havia.

Enquanto isso, tudo em que conseguia pensar era onde havia me metido. Eu não queria toda aquela atenção. Eu não queria que, como a rainha disse, minha vida mudasse completamente.