Futuro ausente de um presente vazio escrita por kami


Capítulo 3
A queda




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— Sai, você não precisa ser gentil comigo. – disse com delicadeza, mas se levantou de onde estava e saiu andando – Boa noite. – disse alto quando já estava quase fora do campo de visão do moreno.

— Tenten – ele chamou e ela virou para o olhar – Eu sei que você não vai estar aqui quando acordarmos e sei que não vai para a casa de seus pais.. você mente muito mal – ele justificou quando mais uma vez ela o olhou com cara de espanto – Não deveria, afinal te conheço pouco, mas ainda assim me importo com você, então, vá onde deve ir e faça o que deve fazer, mas leve isso – ele arremessou um pergaminho para ela e ela pegou.

A kunoichi não precisou nem perder tempo analisando o que recebera, aqueles pergaminhos codificados eram parte do treinamento dos ninjas de elite como ela. Aquele se ativado, certamente levaria Sai até ela em qualquer lugar

— Use sem receio, não vou te encher de perguntas.

Ela simplesmente virou-se novamente e foi até o acampamento, aceitou aquele pergaminho por pura cordialidade e até já havia se esquecido dele quando chegou no canto em que tinha deixado sua mochila. Agradeceu por todos estarem dormindo e sem nem perceber guardou o presente de Sai antes de colocar a mochila nas costas.

Olhou para Gai-sensei e Lee e seus lábios desenharam no vento um adeus inaudível. Olhou também para Naruto e Kakashi e ainda mais uma vez para lugar de onde tinha vindo. Sai realmente era um cara muito estranho.

Saiu dali em passos lentos e leves, para não acordar ninguém e nem ser vista por Sai, agora sim seguiria viajem rumo a lugar nenhum. Como já esperava, no meio do caminho, ouvindo apenas o barulho sincronizado de seus passos e sua respiração, muitas outras recordações invadiram a mente a da morena.

O dia em que os pais a mandaram para ser uma kunoichi em Konoha, a primeira vez que voltara para casa depois disso, as noites em que sentira falta do lar, e suas preferidas, às vezes em que os pais apareciam de surpresa em seu apartamento. As confissões entre mãe e filha, os segredos milenares das armas passados de pai para kunoichi.

Todas vinham banhadas da deliciosa lembrança do conforto que era o seu quarto em sua casa, e logo em seguida, soterradas pela dor do dia em que encontrara a aldeia em chamas, a casa de sua infância destruída, os corpos no chão. Conhecidos, parentes ou corpos anônimos ao chão, do mais novo ao mais velho ancião, apenas a moldura de um quadro lúgubre que tinha ao centro do mesmo seus pais mortos e enterrados sem honras e sem glória, velados apenas por ela e mais ninguém.

A lembrança ainda vívida de como voltara para Konoha, ah, como precisava de um ombro amigo, de um afago caloroso e da presença amável de Neji. Como precisava e ansiava voltar para o conforto dos braços de Neji, para suas missões bem sucedidas.

E era neste ponto que as lembranças misturavam-se em um complexo furacão de emoções que a levara até ali. Frágil de uma maneira que a kunoichi não gostava de reconhecer, descobriu que também não tinha mais Neji. Ah, nunca o tivera.

Os cabelos soltos dançavam ao vento enquanto as pontas chicoteavam em suas costas, sempre gostara do cabelo longo. Seus mestres sempre diziam que a vaidade seria a morte de uma kunoichi se cabelos longas demais a cegassem em campo de batalha, Tenten fazia questão de manter seus cabelos tão longos que os mesmo batiam em sua cintura. Sempre bem amarrados em coquinhos, dizia que a vaidade era o calor a mais no chakra de uma kunoichi que sabe dominar as técnicas que usa.

Sim, era muito vaidosa, e ainda assim uma ninja de elite. Não que isto tinha alguma relevância para onde iria, não tinha mais ninguém para quem voltar, mais ninguém para superar ou impressionar.

Parou com a mão estendida no tronco de uma árvore, a respiração era tão pesada e sem ritmo que seus pulmões doíam ao pulsarem dentro de seu peito, e o ar aspirado pelo nariz e pela boca descia-lhe seco e com tanta urgência que lhe ressecava as paredes da garganta. Fechou os olhos ao se sentir tonta. Havia saído de casa há dois dias atrás para jantar com Neji e não havia comido nada ainda.

O corpo fraco permitiu-se escorregar pelo troco da árvore. Precisava comer, mas não tinha mais forças para levantar dali, lembrou-se por acaso que sempre tinha barrinhas cereais na mochila e pílulas de comida, preferiu uma pílula e vinte minutos depois estava em pé novamente.

Aquela era uma floresta abundante em árvores frutíferas, seria mais prudente pegar algo da mesma para comer naquele momento e deixar as barrinhas para o incerto futuro. A mão roçou livre em torno de uma maça cintilante e a agarrou sem delongas, não se lembrava de comer com tanta necessidade na vida, entretanto, o cheiro adocicado proveniente das macieiras não lhe fez assim tão bem.

— Tenten levante, não é só porque está em casa que vai encarar essa visita como férias. – a voz da mãe ecoou em algum lugar distante em suas memórias.

— Eu já vou okaa-san – respondeu a menina de suas lembranças cobrindo a cabeça com o travesseiro.

Sua mãe não entendia que ela havia corrido mais que as pernas suportavam para chegar ali antes do que costumava. A viajem de dois dias fora feita em quase um, ela merecia um descanso extra, afinal tinha apenas anos anos e recém havia tentado o exame chunin. Na ocasião havia ficado zangada por seus pais não estarem lá, mas quando fora tão facilmente derrotada pela Suna, agradeceu o fato.

— Vamos Tenten, o seu otou-san quer ver como está seu ataque com “as gêmeas”. – a morena apenas bufou sob o travesseiro. – E eu fiz sua torta preferida.

...travesseiro aquele que voou longe ao ouvir a segunda parte do chamado. Só naquele momento havia percebido o tamanho de sua fome, e a saudade da comida da mãe.

— Onde está a torta de maça? – perguntou invadindo a modesta cozinha da casa.

— Primeiro, vamos ver “as gêmeas” – anunciou o pai, tinha tanto orgulho de sua mestre das armas.

— Otou-san.. onegai, não tem como eu fazer qualquer coisa bem feita com estômago vazio e sabendo que tem uma torta de maça inteirinha aqui. – justificou vendo o mais velho sorrir enquanto fazia sinais de negação com a cabeça, sua menina guerreira não mesmo jeito.

A memória do momento feliz em família se desfez com a mesma velocidade em que se apresentou à seus olhos. Um grito em plenos pulmões invadiu a mata e causou algum alvoroço entre a fauna sensível. A morena havia tornado a chorar descontroladamente.

— Chega de memórias!! – gritou agarrando-se firmemente com as duas mãos em sua cabeça. – Por que é tão impossível esquecer o que passou e seguir em frente? – perguntou ao vazio ao seu redor

Queria tanto ser capaz de conseguir colocar uma grande e pesada pedra em cima de tudo. Sem rumo e sem perspectiva alguma, Tenten se viu correndo mais uma vez para lugar nenhum. Talvez compreendendo que corria não de um lugar específico, mas do tempo.

A morena das armas desejava apenas correr do passado do qual ela não conseguia se desapegar, correndo de algo do qual ela poderia cruzar o limite dos oceanos, mas não poderia simplesmente apagar de suas memórias.  Correu, simplesmente fechou os olhos para estancar as lágrimas e correu; era apenas aquilo que podia fazer.

Não via pra onde ia, não lhe interessava para onde corria. Não estava preocupada em bater nos obstáculos, se tropeçaria, se cairia ou despencaria. Nada mais importava, estava sozinha e ninguém no mundo teria o poder necessário para lhe dar aquilo que poderia lhe ajudar.

Sem pais, sem fé, sem Neji e possivelmente sem Hinata, uma vez que não teria coragem de olhar novamente para a amiga sem confessar que já tivera Neji... que ainda amava Neji.

Não sabia onde estava e nem como chegara até ali. Seus olhos estavam evitando o mundo que estava deixando para trás e quando finalmente os abriu, o mundo ao seu redor se resumia a uma mancha verde, formada pela copa das árvores.

Aquele ponto de observação deveria ser um lindo destino em um dia quente de verão. Mas hoje não.

As mãos se prenderam no suporte de metal, seu corpo parecia tão leve quando deixou o mesmo para atrás de si. Estava além da barra de proteção do limite do parapeito do mirante alto que dava vista para aquele bosque.

Não sabia como chegara até ali, como fora parar do lado de lá e o que exatamente queria com isso. Estava tudo tão certo e de uma hora para outra tudo tão confuso, tão errado e sombrio.

Ao longe ele olhava a bela morena que chorava desesperadamente se segurando na barra de metal do mirante. A chuva que começara cair se misturava com as lágrimas dela de uma forma tão bela que o comoveu.

Os cabelos molhados se grudavam pela lateral de sua face, os olhos vermelhos indicavam que ela já havia chorado muito, chorado demais, as mãos que se seguravam firmes na barra de metal já há alguns minutos indicavam que alguma parte de sua consciência não queria se soltar dali. Havia desespero naquela alma tão jovem, mas o inconsciente, possivelmente de uma mente muito forte, estava esperando ser salva enquanto olhava desesperadamente o vale la embaixo.

Ele sabia como era ver o mundo ao seu redor distorcido por lágrimas, tinha seus motivos. O que levaria uma kunoichi tão nova e bela até aquele nível de desespero?

— É um belo vale, não é mesmo? – quando viu seus pés ja tinham o levado até ela.

Sem se importar com a chuva, se escorou no parapeito ao lado da mesma, mas atrás da barra de proteção. Então pode olhar diretamente para ela e constatar que ela era ainda mais bonita de perto, mas isso não fazia diferença; uma ninja da folha.

— Veio até aqui fazer sua boa ação diária? – disse sem olhar para o lado.

— Se me conhecesse um pouco mais saberia que não sou do tipo que faz boas ações.

— Então por que veio até a...qui – ela finalmente olhou para o lado, encarando de cheio os olhos do homem, tão profundos, tão tristes, tão cheios de...solidão.

Pareciam-lhe estranhamente familiares. Estendeu sua observação para além dos negros orbes tão vazios, para observar-lhe a face como um todo, podia perceber que o moreno fazia o mesmo com relação a si.

— Sasuke? – perguntou sem nenhuma convicção de que estava de fato na frente do famoso amigo de Naruto, por mais parecido que aquele homem fosse com ele.

Ele estranhamente sorriu. Não era algo comum, mas a comparação o surpreendeu.

— Ele está tão parecido assim comigo hm? Por que não nos apresentamos em primeiro lugar? – disse entendendo sua mão na direção da dela em uma espécie de cumprimento estrangeiro – Uchiha Itachi.

— O Uchiha assassino. – concluiu – Acha que vou pegar em sua mão pra você me puxar aí pra trás? – disse olhando para a mão clara sem dar muita atenção para a revelação da identidade do homem atrás de si.

Não tinha medo dele. Porque temeria a morte quando já estava pendurada na beira de um precipício. Mas para sua surpresa, ele riu mais uma vez.

— Algumas raras vezes, um cumprimento de mãos é apenas um cumprimento de mãos. Mas tudo bem, vou saber se suas mãos são macias quando buscar seu corpo lá embaixo – disse direcionando os olhos para o mar verde, ainda com mão esticada.

— Mitsashi Tenten – disse pegando na mão pálida, tão cálida quanto as suas devido ao treinamento ninja e molhada pela chuva, que a apertou e depois soltou sem tentar puxá-la.

— Conheço o seu clan, mestres de armas.

— Ouvi histórias do seu também, mas o final é meio sombrio uma vez que, misteriosamente todos os membros morreram – disse irônica, sabia que estava mexendo com fogo, mas não ligava mais para o que aconceria com sua vida.

Estranhamente, estava gostando da pequena troca de palavras. Sem que ela percebesse, o Uchiha estava dando a ela exatamente o que ela precisava: Palavras livres de julgamento.

— É, ele morreram, todos os que estavam no complexo no momento é claro. Parece que sua arma mais afiada é a língua, afinal.

— Estou à altura de um retalhador – disse estreitando os olhos.

— Muita ousadia até para quem quer morrer. – disse em um tom de aviso próximo ao ouvido dela. – Ter uma língua ferina não salvaria você, mestre das armas, se caísse na minha brincadeira de retalhação.

— Por que veio até aqui afinal? Não liga pra minha vida, se quer me conhece.

— Eu estou do lado de cá do ferro de proteção, quem não liga pra sua vida é você. Mas eu fiquei curioso em saber por que uma bela kunoichi, de um ótimo clan resolve se jogar de um mirante tão longe de casa.

— Porque pra você faria mais sentido se eu "matasse" meus problemas não é mesmo. – irônica – Do que importa meus motivos? Que importância teria isso pra você? É um assassino, não da valor à vida dos outros...

— Não dou. Mas olhe bem ao seu redor.

Então Tenten parou de admirar os olhos penetrantes que fascinaram sua atenção como se fosse um metal atraído por um forte imã. Não estava mais pendurada na barra de proteção. Surpresa, olhou tudo ao seu redor novamente e em seguida para o Uchiha em busca de uma explicação

— Eu não preciso convencer você, posso obrigar você a fazer o que eu quiser apenas com os olhos. É claro que também eu não precisaria ter saído nessa chuva fria apenas para dizer para uma garota triste que desistir é a maior fraqueza de todas. Mas no fim das contas só você pode dizer o quanto vale a sua vida. – virou de costas e começou a andar em passos lentos na chuva que ficava cada vez mais grossa.

Como podia ser tão irritante? A vontade de cutucá-lo à largas farpas crescia cada vez mais dentro de si. As lágrimas já haviam parado de cair há muito mais tempo do que ela podia se lembrar, as lembranças do passado que ela perdera também não insistiam em lhe provocar, aparecendo toda hora em sua mente, como memórias rodando em um filme sem fim.

— Então você se sente apto a intervir no direito de uma pessoa de viver, tirando a vida dela, mas é contra o direito que uma pessoa tem de tirar a própria vida?

— Quantas missões já concluiu Tenten – perguntou ignorando a pergunta capciosa.

— Trezentas e cinquenta e oito missões em virtude do Hokage, eu acho – respondeu o seguindo automaticamente.

— E em todos esses anos com todas essas missões nunca tirou uma vida?

— Sim várias...

— Assassina! – ele virou para dizer olhando profundamente em seus olhos.

— Não há comparação. As vidas que eu tirei eram de criminosos.

— Pela versão da história que cabia a você. A mesma coisa pode ser aplicada a mim.

— Sua mãe era uma criminosa? – ela foi seca e direta como somente quem acabara de perder a pessoa que mais amava no mundo poderia agir diante de alguém que matou sua própria mãe.

— Nenhum dos seus criminosos tinha filhos ou potencialidade para isso? – sempre uma pergunta para evitar uma resposta.

— Pare de querer fazer parecer a mesma coisa.

— É a mesma coisa.

— Então você me tirou da beira daquele penhasco pra me convencer de que é um bom ninja?

— Não! Eu tirei você de lá porque... esquece, nem eu sei mais porque tirei você de lá. Gostava mais de você quando estava chorando.

Caminharam então em silêncio por um longo tempo, uma vila desconhecida por si pareceu ganhar forma pouco a pouco e estranhou a tranquilidade com que ele andava por ali. Itachi não era um procurado Rank S? Neste momento ela reparou como ele gostava de fechar os olhos cada vez que o vento soprava e batia em suas peles, e o ato singelo revelou a si que não apenas com tranquilidade, o Uchiha sabia onde ir naquele lugar mesmo de olhos fechados.

A falta de expressão no rosto de Itachi era desagradavelmente semelhante à de Neji, mas diferente do Hyuuga, os olhos de Itachi expressavam alguma coisa... culpa talvez tristeza. Além de toda frieza, tédio e solidão.

O silêncio prevaleceu até que o estômago vazio da Konoha resmungou alto. Tenten levou a mão ao local constrangida, lembrou que tudo que comera fora aquela maça depois da pílula que serviu apenas para dar-lhe forças para levantar.

— Aposto que você não come há muito tempo. Vamos, aquela ali serve. – disse indo em direção a uma barraquinha aleatória.

— Eu estou bem posso aguentar mais...

— Uhum – concordou sem desviar o caminho em direção à barraquinha – Desculpe não vou confiar nas palavras cortadas por sua língua afiada, ainda não faz uma hora que tirei você da beira de um penhasco.

— Mas lá nem deve ter comida, é uma barraca de doces. – obeservou.

— Uhum – disse acelerando o passo – anda logo, a chuva ainda vai voltar a ficar forte.


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