Recomeçar escrita por bia


Capítulo 4
Domingueira




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Narrado por – Renata  

   “Eu vou te esperar
aonde quer que eu vá
aonde que...”

   - Alo? – merda, quem ligava aquele horário?

   - Oi loirinha, onde você andou esse tempo todo? Ta sumida.    

   - Nossa, precisava ligar a esse horário?

   - São onze horas da manhã – Nossa, onze horas.

   - O que foi Tiago?

   - Vem pra quadra e chama a pandinha, o Cheetos está aqui comigo.

   Porque ele queria a pandinha? Que saco, ele não desencanou dessa garota? E porque ele tinha que escolher minha melhor amiga?

   Tudo bem que ela é super bonita e meio oferecida.

   - Ta bom, já estou indo.

   Desliguei o celular e logo disquei pra pandinha.

   - Oi amor! – disse ela atendendo.

   - Oi, tudo bom?

   - Claro e você?

   - Estou bem. Escute, vamos para a quadra? O Tiago e o garoto novo estão lá – eu disse, pegando minha toalha do armário.

   - Soube que esse garoto é um gato e muito legal.

   - Ele é bonito mesmo, ontem eu sai com ele.

   - Hum – disse ela, não admitindo que eu estivesse com ele e ela não.

   - Vamos então?

   - Claro, passa aqui daqui uns dez minutos.

   - Tudo bem, beijo.

   Desliguei o celular. Entrei no banho. Porque ela sempre queria ser mais que eu? Ela nunca foi assim.

   Acho que é porque no passado ela nunca vinha em primeiro lugar, era zoada e meio esquisita. Marcela foi crescendo e se tornou bonita e gostosa. Deve ser por isso. Bem, não é muita gentileza da parte dela. 

   Desliguei o chuveiro e me troquei. Agora eu só tenho que perguntar para minha mãe se meu castigo acabou.

   Desci para o café da manhã, mas ele já tinha acabado. Fui até a cozinha, estava Gabriel conversando com mamãe.

   - Bom dia – disse ela, ríspida.

   - Oi, mãe eu vou para a quadra tá?

   - Você está de castigo. Ontem foi a mesma coisa. Eu te chamei e você não me respondeu. Você estava no quarto por acaso?

   - Sim mãe, eu devia estar dormindo ou sei lá. Eu fiquei o final de semana inteiro no quarto. Deixa-me sair pelo menos no domingo!

   - Não.

   - Tudo bem mãe, acho que você está pegando um pouco pesado demais com essa pirralha – disse Gabriel, chacoalhando meu cabelo com os dedos.

   - Ela não me respeita, ela não sai.

   - Que saco mãe, porque você faz isso comigo? Dentro do condomínio ninguém entra ou sai. Se você quer estragar sua vida, se trancando dentro de casa com medo, o problema é seu. Eu vou aproveitar – Sai porta a fora, andando até a casa da pandinha.

   - Re! Re! Espera – olhei para trás.

   - Oi Gá. Esculpe por esse clima logo de manhã.

   - Tudo bem, a gente se acostuma com o tempo. Se você quiser eu converso com a mãe, ver se ela entende seu lado.

   - Não precisa, só vai gastar seu tempo – começamos a andar, eu estava indo à casa da minha amiga, ele só estava me seguindo.

   - Sabe, ela precisa entender que aquilo já passou, e na sua festa de quinze anos? Ela só vai deixar os convidados entrarem depois de passar pelo raio-x? – Rimos juntos – Está ansiosa?

   - Não, eu já fiz quinze anos mesmo, a festa está um pouco atrasada.

   - Bem, saiba que eu vou dançar valsa com você.

   - Essa eu quero ver.

   - Vou voltar pra casa, ela também me botou de castigo – rimos, afinal, sabíamos que os castigos da mãe são tão fracos que se você sair de casa (como nós fazemos) ela nem vai perceber.

   Continuei andando. O tempo está louco, ontem estava muito calor e hoje está um frio. Encolho-me mais no meu moletom. Toquei a campainha. A senhora Antonia é uma mulher muito bonita.

   - Mãe eu estou na quadra. Tchau.

   Saímos andando até a quadra. Ela vestia um short e uma blusa de alcinha – com o sutiã aparecendo.

   - Não está muito frio para essa roupa?

   O vento corta meus dedos do pé – estou de chinelo – e ao meu lado eu posso ver os pelos do corpo de minha amiga se arrepiar.

   - Não, eu estou com calor. Olha só meu short, ele não deixa minha bunda maior? – perguntou ela sorrindo, virando aquele traseiro grande por natureza para a minha cara.

   - Porque faz isso Marcela?

   - Fala sério Renata, o garoto novo é muito gato, eu o vi pela sacada.

   - Mas precisa se vestir desse jeito para ele gostar de você?

   - Para ele gostar ‘daquele’ jeito precisa – disse ela rindo.

   Aff, ela já roubou Tiago de mim, agora quer roubar Igor também?

   - Eu to afim do garoto novo, Igor o nome dele – eu disse, corando.

   - Sério? Então fique tranqüila que eu não vou fazer nada – eu sabia que ela entenderia.

   Chegamos à quadra, eles estavam no quiosque, ali perto. Tiago sentado em cima da mesa e Igor no banco. Chegamos mais perto.

   - Oi pandinha – disse Tiago, analisando-a de cima a baixo.

   - Oi Loirinha – disse Igor, piscando para mim. Eu sabia que ele queria que eu fizesse o domingo dele surpreendente, assim como foi a sexta e o sábado. Mas a verdade é que eu não quero decepcioná-lo. Eu iria levá-lo para a domingueira que tem no centro, mas e se ele não gosta de festa?

   - Oi Igor, essa é a pandinha, minha amiga.

   - Oi – ela foi até ele e lhe deu um beijo na bochecha.

   Não, eu não estou a fim dele, só falei para ela não roubar minha amizade com ele. E ele também não gosta de mim, só tem olhos para uma tal de Marina.

   Sentei-me no banco e não tinha mais lugares.

   - Onde eu vou sentar? – perguntou a garota, fazendo biquinho.

   - Senta no meu colinho – disse Tiago, batendo naquela coxa dele.

   Eu queimei de ciúmes. Não acredito, que saco. Porque ele não pode gostar de mim como eu gosto dele? Eu sempre fui uma boa amiga, é talvez esse fosse o problema, ele me manipula muito fácil.

   - Nem vem garoto, prefiro o colo do Cheetos.

   O QUE? Eu pedi para ela não fazer nada, porque ela está fazendo isso?

   - Não! Pode sentar aqui – disse, me levantando. Ela me olhou com uma cara feia e sentou no banco. Eu encostei-me à parede.

   - Pode se sentar aqui – disse Igor, abrindo as pernas.

   Bom, a gente já era grandes amigos, aquilo não significava nada. Afinal eu só tenho olhos para Tiago.

   Sentei-me entre as pernas de Igor, ele pôs as mãos em minhas coxas. Peguei sua mão e discretamente a tirei dali. 

   - Gente, vocês vão à domingueira hoje? – perguntou Pandinha, eu até já imagino como ela vai.

   - O que é? Tipo uma balada? – perguntou Igor, senti seu hálito em minha nuca.

   - Sim, é muito legal. E o lugar é pequeno ainda, então é todo mundo grudado.

   - Adoro balada – disse – Você vai loirinha?

   - Acho que sim, você vai Tiago?

   - Claro, vai estar cheio de gostosas.

   - Eu vou bem gostosa – disse Pandinha, piscando para ele e abrindo as pernas.

   - Ei, eu vou até minha casa pegar um negócio, você vem comigo loirinha? – perguntou Igor, saindo do banco por trás.

   Eu não quero deixar os dois sozinhos, eu sei que eles já ficaram, mas poxa, eu mereço uma chance.

   - Vai lá, eu te espero aqui – disse, ele abaixou a cabeça e deu um falso sorriso, começou a andar.

   Que saco você Renata, é por isso que ninguém gosta de você, Sai correndo atrás de meu amigo.

   - Espere Igor, eu vou com você.

   - Na verdade eu só queria sair de perto deles, parecia que estávamos segurando vela, mas como você gosta dele, então...

   - Eu não gosto dele! – disse, meio alto.

   - Gosta sim, eu já percebi.

   - Está tão na cara? – perguntei.

   - Quando você quase a fuzila com os olhos e ainda fica secando o Tiago, então fica muito na cara – ele disse.

   Nossa, eu faço tudo isso e nem noto.

   - Mas essa Pandinha é meio puta viu.

   - Meio? – perguntei debochando – Ela sempre quer roubar tudo que é meu.

   - Igual ela quis me roubar – disse ele, piscando.

   - Você não é meu – eu disse, rindo.

   - Então, você vai à domingueira? – ele mudou de assunto.

   - Claro, eu sempre vou, adoro balada.

   - Eu também, mas escuta, não é meio vazio? Tipo, a cidade é um ovo...

   - Você vai se surpreender quando vir tudo aquilo, é um lugar cheio de jovens, de domingo nós tomamos conta da cidade.

   Ele ergueu uma sobrancelha. Igor abriu a porta de casa e me convidou para entrar.

   - O que vai fazer? – perguntei.

   - Sei lá, vamos pro meu quarto ou sei lá. Minha mãe já voltou e está no super mercado. Já sei, posso instalar o XBOX, você gosta?

   - X... O que? – perguntei confusa, ele deu uma pequena risada e tirou de dentro de uma caixa de mudança um aparelho todo embrulhado no papel bolha.

   - É um vídeo game, você sabe jogar?

   - Claro, no vídeo game sou foda! – disse, meio sarcástica, mas que eu jogo bem eu jogo.

   - Vamos ver loirinha.

   Ele me passou um controle e ficou com o outro, começamos a jogar, eu sou boa, mas não tanto para ganhar dele.

   Foi quando a porta da casa abriu e a mãe dele entrou, meu Deus que vergonha. Eu nem conheço ela e já estou em sua casa, sentada no sofá, jogando vídeo game.

   - Igor? Está aqui? – perguntou ela, indo para a cozinha.

   Ele nem tirou os olhos da tela, eu estava mais preocupada com o que ela iria achar.

   - É! – gritou ele, concentrado demais no jogo – Ganhei! E você perdeu loirinha! – disse, pulando no sofá e comemorando.

   - Loirinha? Quem está ai?

   Igor se levantou e me puxou até a cozinha.

   - Mãe, essa é a Renata – ele me apresentou, corei na hora – Renata, essa é a minha mãe Vivien.

   - Olá – eu disse, a cumprimentando.

   - Olá Renata, é tão bom ver que meu filhote já fez amizades – abri um sorriso.

   - É, ta bom mãe – disse ele, indo pegar um salgadinho da sacola de compras.

   - A gente já vai almoçar Igor – avisou.

   - Mãe, meu estomago é de aço.

   - Que homenzinho! – dei uma pequena risada, agora eu sei de onde ele tirou o adultinha.

   - Acho que vou para a casa almoçar – disse.

   - Não quer almoçar aqui Renata? Minha comida é maravilhosa!

   - Não obrigada Vivien, mas acho que minha mãe está me procurando também, quem sabe da próxima vez?

   - Seria um prazer. Filho vá acompanhar sua amiga até a porta.

   Ele me acompanhou até a porta, abriu.

   - Bom, então a gente vai à domingueira hoje né? Vou ver se minha mãe deixa. Que horas começa?

   - Das seis da tarde até a meia noite.

   - Nossa, amanhã para acordar vai ser uma beleza.

   - Pois é, mas é muito legal. As seis você vai lá em casa pra gente ir ok?

   - Tudo bem então, até lá – disse ele, me dando um beijo na bochecha.

   Sai andando. Quando estava mais longe da casa dele, olhei para trás. Igor ainda está parado na porta, olhando para mim sorrindo.

   - Ótimo rebolado! – ele gritou, abrindo mais ainda o sorriso.

   - Tonto!

   - Até as seis! – ele gritou, entrando em casa.

   Sai correndo até chegar, abri a porta.

   - Bem na hora do almoço – disse Gabriel, sentado à mesa, esperando o almoço.

   - Ufá!

   - Oi Renata, lembrou que tem família?

   - Nossa mãe, logo de manhã estragando o clima?

   - Sente-se.

   Sentei-me a mesa.

   - Lavou a mão?

   - Você me mandou sentar.

   - Vá lavar sua mão.

   Levantei resmungando e lavei minha mão.

   - Pronto, está feliz?

   - Para de retrucar.

   - Cadê o pai? – perguntou Gabriel.

   - Não vem almoçar hoje.

   - O loco fi, como assim mano? – demos risada, sabemos que fazer essa linguagem de “favela” deixa mamãe muito irritada.

   - Que prazer você tem de me irritar em Gabriel?

   - O loco mãe, que nada fi, eu to de boa aqui, nós samo tudo humilde, tudu esse mundo é nosso – ri mais alto ainda, ele também riu.

   - Querem saber? Conseguiram!  - ela se levantou.

   - Não mãe! Desculpe, sente aqui com a gente – ela voltou a sentar – Porque nós semo tudo humilde – rimos juntos.

   - Para com isso, que coisa horrível, você ainda acha graça Renata? Essa coisa de favela!

   - Olha o preconceito em branquinha, vo manda tudu meus mano bate nu seis.  

   - Se você não parar com isso vai ficar de castigo.

   Eu chorava de tanto rir.

   - Tudo bem, parei.

   Voltamos a comer em paz.

   - Mãe, hoje eu vou à domingueira tá?

   - É, eu também! – disse meu irmão.

   - Na domingueira? Junto com aqueles emos que vivem bebendo e fumando? Nem pensar!

   - Você nunca deixa, que saco! – gritou Gabriel.

   - É, pelo menos hoje, eu nunca vou!

   - Não!

   Baixei a cabeça.

   - Eu vou ligar pro pai!

   Gabriel foi até o telefone.

   - Que menino desobediente – resmungou ela.

   - Pai, hoje eu e a Renata podemos ir à domingueira?... Domingueira pai, balada... Ela mandou falar com você... Ta bom, obrigado viu pai, bom trabalho!

   - Você tem que incomodar seu pai no trabalho né? Impressionante.

   - Ele deixou então nós vamos.

   - Olha, quer saber? Faz o que vocês quiserem, mas depois não vem dizendo que eu não avisei!

   - Ta bom, ta bom.

   Terminei de almoçar, pedi licença e subi para meu quarto. Olhei o relógio, já são uma e meia. O celular em cima da minha cama estava vibrando.

   Igor diz: Minha mãe deixou, até as seis loirinha.

   Renata diz: Beleza, a minha também.

   Fui ao computador. Entrei no MSN.

   Tiaguinho diz:

UHASUHASUAHSUAHSUAHSUHAS, ooi loirinha!

   Renata diz:

Oi pipoquinha

   Tiaguinho diz:

Hoje me ajuda com a pandinha na domingueira? Vou pedir para ficar com ela.

   Ótimo, ele quer ficar com ela, e do jeito que essa garota é, vai aceitar. Bem, parece que eu nunca vou ter Tiago para mim.

   Renata diz:

Acho que ela prefere ficar com alguém mais atraente, UAHUAHSAUHSAUSHAUHSAUHSAUSH

   Tiaguinho diz:

Se eu sou tão feio então porque você me ama tanto?

   Renata diz:

É Tiago, eu te amo tanto mesmo!

   Tiaguinho diz:

Eu sei que você me ama, eu percebi.

   Ótimo, mais problemas.

   Renata diz:

Vou sair, tchau, beeijos!

   Sai do MSN, não quero falar com ele agora, nem nunca mais. Não acredito, que vergonha. Ele sabia esse tempo todo, ria de mim pelas costas e eu achava que ainda tinha chance. Quero morrer.

   Deitei na cama, afundei minha cabeça no travesseiro. Eu sou uma fracassada mesmo, vou morrer sozinha, porque todo mundo que eu amo não me ama.

   Comecei a ficar sem ar, me virei e fiquei olhando o teto. Eu queria estar no espaço, flutuando com as estrelas e quem sabe encontrar um extraterrestre? Ri comigo mesma, peguei meus livros e fiz meu dever.

   Certo, que tédio! Olhei no relógio, ainda são duas e meia da tarde, se eu começasse a me arrumar terminaria as quatro.

   Peguei meu celular.

   Renata diz: O que esta fazendo?

   Igor diz: Jogando XBOX com a minha mãe :)

   Eu queria ter uma mãe que jogasse XBOX comigo, ou que pelo menos conversasse, não que fica me botando de castigo.

   Sai do meu quarto e fui até a cozinha, onde minha mãe está.

   - Oi mãe, posso ajudar? – ela mexia alguma coisa que estava na panela.

   - O que deu em você hein?

   - Não posso mais te ajudar?

   - Pode – ela se deu por vencida e acreditou que eu não quero nada em troca da ajuda. Na verdade eu só quero passar mais tempo com ela – Estou fazendo brigadeiro, me deu vontade. Já está quase pronto, quando esfriar nós vamos enrolá-lo.

   - Tudo bem, então, como andam as coisas? – perguntei, sentando-me no banco da cozinha.

   - O que deu em você Renata?

   - Eu só quero passar mais tempo com você. Quer jogar buraco?

   - Vá pegar o baralho enquanto eu termino aqui – disse ela, sorrindo.

   Foi ela que me ensinou jogar buraco e ninguém ganha dela. Quando voltei já estava tudo terminado. Separei as cartas, embaralhei, e começarmos a jogar.

   Ficamos assim por um bom tempo, ela ganhando todas e eu... Bem, sou ruim nisso.

***

   - Obrigada Reca por me ajudar, agora vá se arrumar.

   - Me arrumar? – perguntei confusa.

   - Você não vai naquele negócio de domingueira?

   - Verdade, brigada mãe, to indo.

   Fui para meu quarto correndo, olhei o relógio, já eram cinco horas da tarde. Tomei um banho, fui até meu guarda roupa. Coloquei uma calça verde clara e uma blusa branca de manga comprida. Passei uma maquiagem verde e branca, um tênis Nike bem colorido e arrumei minha franja.

   Eu adoro me vestir assim, muitos chamam de emo, eu chamo de confortável. Coloquei o dinheiro no bolso e fiquei na sala. Nem foi preciso esperar muito, logo a campainha tocou.

   Abri a porta, estava aparado ali Igor, incrivelmente bonito. Uma calça bem apertada jeans, blusa de manga comprida vermelha e nas mãos um casaco branco. No pé um tênis igual ao meu.

   - Oi eminha – disse ele, rindo.

   - Oi eminho – disse, fazendo um biquinho.

   - Você está linda – senti meu rosto corar.

   - Obrigada, vamos? Temos um longo caminho. É no centro.

   - A gente não vai com o Tiago e com a pandinha? – perguntou ele, me seguindo.

   Eu não queria que eles fossem juntos, eu sempre fico meio de lado quando aquela garota está junto.

   - Eles não vão a pé.

   - Hum...

   Saímos do condomínio e começamos a andar, às vezes ele tentava puxar assunto, mas o silencio parecia mais forte. Quando fomos nos aproximando do centro da cidade começamos a ver os jovens que estavam ali.

   Tinha por todas as partes, praça, posto de gasolina, lanchonetes e na rua. Tinha de todas as raças, emos, punk, rappers e aqueles indefinidos.

   - Aqui é a domingueira? – perguntou ele, meio confuso.

   - Não, a domingueira é o nome de uma balada, mas nas ruas ficam aqueles que acham que a domingueira não é tão boa e satisfatória.

   - E está muito longe?

   - Na verdade chegamos.

   Paramos na frente da domingueira, parecia uma casa, mas não tinha janelas, e só uma porta. Dava para ouvir as musicas.

   - Nós podemos entrar?

   - Porque não poderíamos? – perguntei, indo em direção a porta.

   - Censura.

   - É quatorze anos. Mas eles vendem bebidas para todos. Como eu disse, de domingo a cidade é nossa. Na verdade eles não estão nem ai, só querem ganhar o salário deles mo final do mês.

   - Beleza, estou precisando me divertir.

   Entramos no lugar, passamos pela portaria. Pagamos. Quando o segurança abriu a porta veio uma pressão de musica e gente. O lugar parecia menor do que da ultima vez que vim, na verdade, eu adoro isso.

   - Caraca, isso aqui ta bombando! – disse Igor.

   - Vamos – puxei-o.

   Fomos para o meio da pista, começou a tocar um psy muito bom. Está tão apertado que é um esfrega esfrega. Logo chegou um cara encostando-se a mim, ele chegou bem perto e sussurrou no meu ouvido.

   - Aposto um beijo que você me quer.

   Empurrei o para longe. Eu queria ter Tiago, não esse cara. Se bem que ele é bem bonito. Tentei procurar aquele pipoca, mas tinha muita gente.

   - Vou pegar um smirnoff pra gente – disse Igor no meu ouvido, a musica é tão alta que parece um sussurro.

   Ele saiu de perto, mas logo voltou com uma garrafa na mão, deu um gole e me passou. Na hora eu gelei, eu nunca bebi álcool. E se minha mãe perceber? Se bem que eu não preciso ficar bêbada, um gole não mata ninguém.

   Peguei a garrafa e dei um gole, queimou minha garganta, mas é muito bom.

   Voltei a dançar, a musica invadia meu ouvido e tomava conta do meu corpo. Senti uma mão em minhas costas, as luzes me deixavam tonta e mais a vontade ainda. Essa pessoa me puxou para perto, vi que era Igor. Ele nos grudou e chegou bem perto.

   - Quer ficar comigo?

   Arregalei meus olhos, ainda com a cabeça encostada em seu ombro, não olhando diretamente para ele, pensei no que diria. Eu queria ficar com ele, mas eu queria Tiago, eu quero Tiago! Não quero ficar com Igor e nunca mais ser sua amiga.

   - Igor...

   - Tudo bem – ele disse, sorrindo.

   - Não sério...

   - Tudo bem, eu entendo – disse ele, e voltou a dançar, dando sempre um falso sorriso.  

   Eu voltei a dançar, meio triste, mas estava me divertindo. Quando eu virei para trás não vi mais Igor. Comecei a andar, procurando o. Foi quando eu vi Tiago, fui a sua direção. Ele me cumprimentou com um beijo na bochecha.

   - Onde está pandinha?

   - Ela está com Igor, ele pediu para ficar com ela – disse ele, reprimindo uma raiva.

   Não acredito, ele pediu para ficar com ela? Então como eu não aceitei, ele foi pedir para ficar com aquela... Vaca? Que moleque idiota. Eu fui até os puffs que tinha nos cantos e em um deles estavam os dois se beijando. Não acredito!

   Gritei de raiva, mas não era possível ouvir. Fui até aquele ‘lindo casal’ e puxei Igor.

   - Ow... Ow... Ow! – disse ele, resmungando.

   - Porque você está beijando ela? – perguntei brava.

   - Porque eu quero – disse ele, como se estivesse dizendo o óbvio.

   - Você pediu para ficar com ela?

   - Sim!

   - Foi porque eu não aceitei? – perguntei, fazendo uma cara de dó, eu percebi que ele ficou bravo.

   - Eu não sou o tipo de pessoa que guarda rancor, você não aceitou? Tudo bem. Agora, se você acha que só porque eu estou a fim de você, eu vou ficar no seu pé, aumentando seu ego, então sinto decepcioná-la. Desde que eu cheguei você só tem pensado no Tiago e só tem olhos para ele, mas tem certeza que é isso que você quer? Correr atrás de alguém que não está nem ai para você? Isso te faz feliz Re? Acho que não! Às vezes temos que amar quem nos ama.

   Ele saiu de perto e eu fiquei parada. Preciso sair daqui. Fui para fora e sentei no chão da rua. Ao meu redor tinha muitos jovens, uns bêbados, outros sem rumo.

   Do meu lado sentou o mesmo menino que pediu para ficar comigo na balada. Chaguei mais perto dele e sussurrei em seu ouvido:

   - Aposto um beijo que você me quer.

   Ele sorriu e meu beijou, sem amor, só por prazer. Nesse momento eu não me importava se eu beijava bem ou não, só quero tirar todos da minha cabeça.

   Eu sou uma tonta e Igor tem toda a razão. Não acredito no que tenho feito constantemente. Sempre correndo atrás de alguém que não se importa comigo, isso não me faz feliz.

   Agora eu percebi o que perdi: A amizade de Igor, a amizade de pandinha e minha dignidade, por estar beijando um qualquer.

   Que saco!


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