Longo Caminho Para Casa escrita por ShelbyMinerva
Notas iniciais do capítulo
Mais um capítulo!
Levantei cedo naquele dia. Estava nevando.
Eu adorava a neve. Me sentia livre quando estava lá. Como se, ninguém fosse me achar se eu me vestisse de branco, deitasse na neve e ficasse lá, quietinha. Mas sempre havia uma parte de meu corpo que não se misturava com a neve. Os hematomas sempre estavam lá.
Naquele dia, vesti meu vestido de inverno azul e minhas botas velhas. Fiz uma trança em meus cabelos loiros e sai do quarto.
— Bom dia Shelby - disse Alma, quando eu sai do quarto.
— Bom dia, Alma - eu disse.
— Lembra daquela noite em que brincamos?
— Lembro. Foi semana passada.
— Hoje podemos brincar de novo? Podemos?
— Claro.
— Então vá buscar sua boneca enquanto eu peço para a mamãe se podemos ir lá fora.
— Te espero lá.
Peguei minha boneca e corri para fora.
Brincamos boa parte da manhã. Depois fiz as tarefas de casa.
Porém, no final do inverno, enquanto lavava a louça da janta, quebrei um prato.
— SHELBY! - gritou Luisa.
— Me desculpe - pedi.
Ela me acertou com a colher. E então eu agarrei Gabbie e declarei:
— Vou dar uma volta.
Sai de casa e bati a porta. Já sabia que iria apanhar depois, mas não me importava mais. Esses anos de dor me fizeram a aprender a não ter medo. E eu sabia de uma coisa, que ninguém nunca ia precisar me dizer: eu era uma sobrevivente.
Fui para a floresta. E então ouvi uivos. Parei. O medo tomou conta de mim. Lobos na região não era apenas uma lenda contada por Nina, a senhora que mora perto da minha casa?
— Tem alguém aí? - perguntei.
E então eles me atacaram. Eram quatro ou cinco. Um me derrubou no chão. O outro me atacou primeiro, seguido pelos outros.
Eu gritei por socorro. Mas ninguém veio. Eu gritei de dor. Gritei de medo. Chamei meu pai. Chamei até mesmo Luisa.
— PAPAI! - eu gritava e me debatia.
Eu só queria morrer. Doía muito mais do que as surras da Luisa, doía muito mais do que o estupro. Só não doía mais do que a morte de meu pai.
Então alguém apareceu. Era um homem alto que já devia ter mais de quarenta anos. Ele falou como se conhecesse os lobos:
— Lauro! Gabriel! Lia! Deixem essa garota em paz!
E os lobos o obedeceram.
Ele se abaixou ao meu lado e tocou meu pescoço.
— Não me machuque - pedi, com um fiapo de voz.
— Tudo bem, pequena, fique calma, eu estou aqui. Onde estão seus pais?
— Papai... Morto... Mamãe... Não...
— Sua mãe morreu?
— Não... Bater...
— Ela te bate?
— Sim... Salve... Me...
— Você mora na casa aqui perto?
— Sim...
Então, com muito cuidado, ele me pegou no colo.
— Gabbie - murmurei.
Ele não escutou e seguiu em frente, deixando minha companheira na neve.
Ao chegarmos em minha casa, eu estava quase inconsciente, mas ouvi Luisa e o homem bonzinho conversarem:
— ... Ela mereceu - era a voz de Luisa.
— A senhora maltrata sua filha? - perguntou ele.
— Ela merece.
— Nenhuma criança merece. Não, não posso deixar ela aqui.
— Pois a leve. Eu nunca a quis e não é agora que vou querer ela.
Ele começou a se afastar da casa. Ouvi os gritos de Alma:
— SHELBY! SHELBY!
Mas eu nunca mais vi aquela casa.
Ele me levou para o carro dele e me colocou deitada no banco de trás.
— Segure isso na sua barriga - pediu ele, colocando um pano na minha barriga - para estancar o sangramento. Vamos para um local mais quente, onde eu irei cuidar de você.
Ele foi para o banco do motorista e ligou o carro e o ar quente. Por um momento eu esqueci da dor. Mas então doeu novamente.
— Doí... - murmurei.
— Eu sei que doí - disse ele, enquanto dirigia - eu passei pela mesma coisa. Assim que você ficar bem, eu lhe contarei tudo, garota.
— Sangue...
— Está escorrendo mais sangue?
— Corpo todo...
— Sim, eu sei que há ferimentos no seu corpo todo, mas o pior é aí. Sabe, menina, eu tenho observado você a dias. Na verdade, desde que cheguei aqui para visitar um amigo. Eu vi o que sua mãe e seu...
— Padrasto.
— Faziam com você. Mas afinal, já me cansei de te chamar de garota. Mas me diga, você tem nome?
— Tenho.
— Eu também. Me chamo Beck. Pronto, agora você sabe meu nome. Mas eu não sei o seu. Como é?
— Shelby.
— Que nome bonito. Pronto, agora já nos conhecemos.
A neve ficou para trás.
— Iremos parar em um hotel-fazenda - explicou ele - e depois iremos para Mercy Falls.
Eu já não tinha mais forças para responder. E o mundo começou a girar e depois disso, não vi mais nada.
Quando acordei, estava deitada em uma macia, coberta por vários cobertores. Não doía mais tanto. Beck estava colocando um pano frio em minha testa.
— Oi - disse ele.
— Oi - murmurei - onde estamos?
— Fique tranquila. Estamos no hotel fazenda. Shelby, eu preciso que você seja muito forte. O que eu vou te contar pode ser difícil de acreditar, mas é real.
Então ele me contou sobre os lobos. Da matilha, de como nos transformamos todo o inverno, de como vivem. E contou que fora a cidade que eu morava para checar como andavam os bandos de lá, já que tinha voltado a forma humana mais cedo. E por isso me encontrou.
E eu pensei que graças aos lobos, poderia deixar meu passado para trás.
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