Ser um aluno da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts era um sonho para a maioria das crianças bruxas do Reino Unido. O desejo de entrar em uma das quatro casas, de fazer amizades, descobrir coisas ocultas no castelo e aprender cada vez mais sobre o mundo bruxo era, sem pensar duas vezes, o que eu mais ouvia meus primos falarem quando éramos crianças. 

 Só que eu não tinha a mínima vontade de saber como era. Eu só queria sair de casa e não ter que lidar com Fleur e Victoire, poder fazer o que eu queria na hora que queria e, acima de tudo, não ter que conviver com Bill.

Eu ainda estava tentando me acostumar a ideia de não ter mais meus amigos comigo este ano, mas infelizmente sabia que não tinha escolha e não tinha mais forças para continuar brigando. 

Quando eu acordei, Louis já estava pronto e tomando café da manhã, claramente animado e conversando com mamãe. Seu malão estava no final da escada, com sua coruja presa em uma gaiola em cima. Victoire e Bill não estavam na cozinha, já que ainda era muito cedo para irmos para a estação. Louis tagarelava sobre como estava com saudade dos amigos da Lufa-Lufa e como ia levar presentes da França para a sua melhor amiga. Eu ri, sentando na cadeira do meio e dando bom dia para eles. 

— Bom dia, mon chéri

— Eai, Nick - cumprimentou meu irmão. - Animada?

Dei um riso abafado, me controlando para não soltar nenhum comentário irônico logo cedo. Eu gosto muito de Louis e não quero estragar mais uma relação com a minha família. 

— Vamos ver no que vai dar, não é? - tentei parecer o mais amigável que consegui, pegando algumas torradas na mesa e colocando no prato. 

— Quem sabe você não vai para a Lufa-Lufa, e ai posso te apresentar alguns amigos, a Alice e o salão comunal! - ele parecia mais animado com a situação do que eu, já que ninguém da família Weasley pertencia a sua amada casa. 

Com exceção de Louis, Albus e Roxanne, todos os outros membros da família tinham ido para a Grifinória. Albus era da Sonserina e Roxanne era da Corvinal.  

— Mas ela é só sua amiga mesmo, querido? - Fleur perguntou, colocando uma xícara de café em minha frente - Você parece gostar muito dela…

— Ah mãe, não começa de novo! - ele fechou a cara, emburrado, mas ainda de bom humor. - Você sabe que a Alice é quase uma irmã para mim. 

— Talvez Dominique consiga te ajudar com essa amiga, se você quiser…

Louis pensou em responder, mas vi que seus olhos brilharam com a possibilidade de ter algo a mais com a garota. 

— Eu? - dei um longo gole no café, assustada de ter sido colocada na conversa. - Claro, Lou! Quem é essa Alice, é da Lufa-Lufa? 

— Como assim quem é Alice, Nick? Alice Longbottom, passou as últimas férias com a gente aqui no chalé e…

— Ela não estava aqui nas últimas férias. - a voz do meu pai surgiu no ambiente, arruinando o momento de descontração. Ele passou por trás de mim, sentando-se ao lado de Fleur. Já estava vestido para ir trabalhar, no banco Gringotes e manteve-se em silêncio enquanto tomava café. 

Terminei minha refeição, pedindo licença ao me levantar e indo em direção ao meu quarto que já estava praticamente vazio, já que eu ia levar tudo o que podia para me lembrar de como era. Terminei de colocar as coisas no malão, colocando o uniforme preto (que ainda não tinha as cores de nenhuma casa) por cima, para facilitar na hora de me trocar no trem.

Semana passada Louis me explicou tudo sobre Hogwarts. Que para ir para lá íamos pegar um trem, que eu só vi uma vez quando levamos Victoire para a estação,  já que as aulas na França começam antes. 

Ele disse que a viagem demora entre três e quatro horas e que as cabines não são separadas por casa, então ele sempre ia junto com nossos primos e depois encontrava os amigos. Me explicou sobre os testrálios, as carruagens e que demora mais ou menos 15 minutos da estação até o castelo. Ele acha que vou precisar ir com Hagrid, já que nunca fui para Hogwarts antes, mas eu me recuso a ir no meio dos primeiranistas. 

Eu pensei muito no que Vic me disse no outro dia, e apesar de tudo, não sei se quero entrar na Sonserina. Quando comparo as casas de Beauxbatons com as de Hogwarts, a Sonserina parece com Noble, a casa dos metidos. Mas ainda era uma opção melhor do que cair na Grifinória… De qualquer modo eu teria aulas com meus primos, já que as aulas são compartilhadas com outras casas. 

Não estou preparada para ver nenhum deles. Claro que eu sei como eles estão e sua aparência, já que Victoire tem milhares de fotos no seu quarto, mas acho que nenhum deles me vê há anos, nem mesmo em Redes Sociais trouxas, porque por mais que Vic esteja viciada nessas coisas, eu nunca usei nenhuma. 

Terminei me arrumar, colocando uma roupa simples: uma calça jeans de cintura alta e uma blusa preta. Calcei um par de tênis pretos e soltei meu cabelo, que estava comprido demais, deixando ele cobrir boa parte do meu rosto. Não passei nada de maquiagem, apesar de não me sentir muito bem com as sardinhas a mostra no rosto. Eu sabia que estava simples e bonita, pois ser uma veela fez com que eu me desenvolvesse muito bem enquanto crescia, mas não quero me destacar, não quero aparecer, como fiz na antiga escola. 

Só quero terminar esse ano o mais rápido possível e da forma mais normal que puder. 

Quando eu desci as escadas novamente, levitando meu malão atrás de mim, todos já estavam prontos e me esperando. Com o malão em uma mão, peguei a mão de Fleur com a outra enquanto ela aparatava comigo. Logo em seguida, Louis surgiu com Bill e Vic, que já era maior de idade, veio sozinha.

Quando passamos pela entrada secreta que dava na estação 9 ¾, voltei a ter 10 anos. Lembrei da primeira e única vez que estive ali, vendo minha irmã entrar no famoso Expresso de Hogwarts pela primeira vez. O ambiente ainda era o mesmo, várias famílias se abraçando e se despedindo como se nunca mais fossem se ver, amigos se encontrando e crianças ansiosas para mais um ano na escola de magia e bruxaria. 

Louis me ajudou a colocar o malão na parte de carga do trem, rapidamente se despedindo de todos enquanto ia procurar seus amigos. Minha mãe sorria, vendo Louis e uma garota baixinha se abraçarem como se fosse a primeira vez. 

— Deixa eu adivinhar, Alice? 

— A melhor amiga dele… - Vic riu, encarando o casal. - Ah, esse amor jovem é tão fofo mas tão infantil. Eu lembro quando eu não admitia para ninguém que gostava de Teddy.

Vic tentava puxar assunto para matar o silêncio constrangedor que havia se instalado. Fleur e Bill estavam de mãos dadas, esperando a hora da despedida e Vic acenava para algumas garotas da Grifinória que provavelmente conheciam ela dos anos anteriores. 

— James Sirius, venha se despedir da sua mãe antes de ir embora! - ouvi a voz de tia Ginny gritar para longe, enquanto ela vinha se aproximando. Senti um frio na espinha ao pensar que James estava com ela. - Ah, esses Potters, não podem ver o Expresso de Hogwarts que já ficam animados! Bill, Fleur, que bom encontrá-los aqui! 

Ela se aproximou, sozinha. Os cabelos ruivos esvoaçando enquanto cumprimentava um a um. Reparei que atrás dela estava tio Harry, conversando seriamente com uma garota que eu tinha certeza que era Lily, sua filha mais nova, mas James e Albus não estavam lá.  

— Eu não quero saber de você arrumando confusão com Hugo de novo, ouviu Lilian? - ele dizia, em tom baixo e protetor. - Já disse que não acho uma boa ideia esse namoro de vocês e que isso vai acabar afetando sua notas!  

— Meu deus pai! Já passamos por isso, chega de implicância com o Hugo! Ele é filho do seu melhor amigo, você conhece ele como ninguém! 

— E é exatamente por isso que me preocupo! 

— Oh, olhe como Dominique está crescida! Como vai querida? - Tia Gina me abraçou, me olhando dos pés a cabeça depois e sorrindo. Hoje eu estava mais alta do que ela, o que era estranho já que da última vez que a vi eu tinha menos de 11 anos.  

Não tive tempo de responder, já que logo em seguida meus outros tios chegaram. Tio Rony trazia Hugo, o que acarretou uma pequena discussão com seu melhor amigo. Angelina e Percy estavam apenas com Molly, que era fácil de reconhecer por ser a mais nova da família e tia Hermione não parecia estar lá. 

— Hermione teve que ficar resolvendo algumas questões do ministério. - explicou Rony Weasley, abraçando a irmã e cumprimentando os outros na roda, incluindo eu e Victoire. 

Eles conversaram por alguns minutos, enquanto Victoire me explicava algumas coisas sobre Hogwarts mais uma vez. Quando o apito do trem soou, vi meus tios se afastarem em busca dos próprios filhos. Louis já havia se despedido dos meus pais, então sobrou para mim fazer a cerimônia sozinha. 

Victoire me abraçou, me desejando boa sorte e dizendo que eu deveria pensar nisso de forma positiva. Fleur me segurou por alguns segundos, sussurrando no meu ouvido para tomar cuidado com a floresta e com os garotos que se aproximassem de mim. 

Vi de canto de olho Albus e Hugo aparecerem, se despedindo dos pais. Rose, James, Lucy e Roxanne não estavam mais lá. Já estava pronta para sair andando, depois de dar um “tchau” coletivo para meus tios, quando senti a mão de Bill puxar levemente meu braço. Quando me virei, meu pai estava muito próximo a mim e parecia ter dificuldade em falar as palavras que vieram em seguida: 

— Eu espero que você entenda que eu sempre vou fazer tudo que posso para o seu bem, Dominique. 

Ele estava claramente desconfortável, passando a mão nos cabelos curtos e ruivos nervosamente e evitando me olhar nos olhos enquanto falava. Nós não conversamos sozinhos há muitos anos, e principalmente não sem brigar.  Acho que ele não esperava que eu respondesse, já que logo em seguida continuou. 

— Eu sei que você acha que eu implico com você e que não te deixo fazer nada, mas na sua idade eu também odiava meus pais e queria ficar o mais longe possível deles. Hoje em dia eu me arrependo de não ter dado valor para a família antes do seu tio Fred morrer. - ele se interrompeu, como se tentasse não falar do passado - espero que você consiga ser feliz em Hogwarts, assim como foi em Beauxbatons. Tente não ter uma impressão errada da escola só porque eu falei tanto dela quando você era criança e tudo que eu falo parece ruim para você. 

Eu ia interromper, mas ele continuou a falar, sem me dar chance de resposta. 

— O expresso já vai sair e você não pode perder. - ele pegou minha mão, finalmente me olhando diretamente. Seus dedos encostaram na ponta do bracelete e ele calmamente o empurrou para cima, prendendo a minha mão entre a dele - Apesar de tudo, você e seus irmãos são a melhor coisa que eu já tive na minha vida. E eu quero que você seja feliz. 

Eu não sabia o que responder. Nossa relação sempre foi problemática, mas apesar de todas as desavenças e brigas, eu não o odiava, como ele pensava. 

Ele segurou minha mão por mais alguns segundos, mas o alarme soou pela última vez. Fleur se aproximou, me apressando para entrar no veículo. Será que ela ouviu tudo o que ele disse? 

Antes de entrar no trem, virei para trás, juntando todas as minhas forças para ignorar o nó na minha garganta que me fazia querer chorar pelas palavras que Bill me disse, olhando para o casal que estava abraçado olhando o trem partir e disse: 

— Vou escrever para vocês. - nos seis anos que estive em Beauxbatons nunca escrevi para nenhum deles a menos que fosse algo muito importante. - Para todos vocês.