Exílio do Amor escrita por Funny Hathaway


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Olá, gente!

Espero que gostem deste capítulo! Reescrevi e revisei com muito carinho



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Londres, Inglaterra

16 de Março de 1872

Elizabeth abaixou sua caneta tinteiro e suspirou pesadamente. Aquele manuscrito francês que seu pai havia lhe repassado para traduzir estava dando um trabalho excepcional. Mas já deveria ter previsto, se o senhor Green, o outro tradutor que trabalhava na editora, havia desistido era porque havia alguma coisa de muito difícil de decifrar.

Clark logo descobriu que havia mais de uma dificuldade naquela obra. O vocabulário era muito antiquado e as descrições dos lugares e personagens eram minuciosas ao extremo. Só havia passado uma hora e Elizabeth já estava exausta de traduzir parágrafo por parágrafo. Mas o sucesso do livro era gigantesco demais na França para a editora simplesmente ignorar aquela tradução, por mais difícil que fosse.

E Elizabeth deveria admitir para si mesma que não estava se concentrando tanto quanto deveria. A perspectiva do baile de hoje à noite a fazia ficar agitada.Conforme as temporadas foram passando, ela cansou mais e mais de frequentar aquele tipo de evento. Só causava dores de cabeça.

Mães orgulhosas comentando como sua filha de 19 anos já havia se casado e estava com p primeiro filho a caminho, algum tipo de indireta sutil para Elizabeth, que com 25 anos, nem noiva estava; ou pior, algum cavalheiro a abordava, achando que ela estava completamente desesperada por um marido àquela altura da vida e aceitaria qualquer um. Sempre havia algum pequeno acontecimento extremamente irritante.  

Ou pior de tudo, quando algum nobre da mais longa linhagem a olhava de cara feia, empinava o nariz e saía andando. Não importava quanto tempo a família Clark frequentava o círculo da aristocracia inglesa, sempre alguém parecia não se esquecer que as origens dos Clark eram totalmente burguesas.

Sim, seu pai, Phillip Clark nasceu sem um centavo no bolso, sem nenhuma garantia de uma cama confortável ou de um prato quente para aquecer o estômago em tempos de inverno. Quando criança, Phillip vendia jornais na rua. Não era a situação ideal, mas ajudou a pagar as contas de casa e lhe trouxe algum contato com aquele mundo de papel e tinta. Graças a sua ambição e força de vontade, ele começou a trabalhar no mesmo jornal como um simples repórter de rua, subindo, pouco a pouco, na hierarquia daquele pequeno jornal de bairro até conseguir abrir seu próprio jornal “The Globe” e uma editora. Mais tarde acabaria expandindo ainda mais seus negócios.

The Globe fez um sucesso muito grande. O jornalismo investigativo era extremamente instigante, causando muita curiosidade no público leitor. Enfim, sem muitos detalhes, mas Phillip Clark conseguiu juntar uma grande quantia, e conseguiu comprar um pequeno título de barão, e ele junto com a sua família começou a frequentar o círculo social aristocrata. No entanto, para os olhos da alta sociedade, os Clark eram somente uma família burguesa, de pouco valor.

Elizabeth sempre sentia esse estigma pesando nas suas costas, como se estivesse gravado na sua pele “Nascida em um berço pobre”. Nem todos os nobres pensavam desta maneira, mas bastava um para colocá-la neste patamar inferior. Por conta disso, seu interesse em bailes não era dos maiores.

Seu pai apareceu na pequena salinha dela com um sorriso no rosto. A perspectiva de fazer alguns contatos novos para suas empresas animava o senhor Phillip Clark.

—Vamos para casa, querida. Assim, você e sua irmã tem tempo de sobra para se arrumarem- Elizabeth gemeu levemente contrariada e seu pai lhe lançou um olhar de pena.

                                                               ***

—Pela última vez, Ethan. Eu já lhe disse que não vou ao maldito baile de Madame Williams- Duque exclamou virando-se para seu sócio que o seguia por todo o Royale.

Já fazia dias que Ethan comentava deste dito baile de Madame Williams e Duque insistentemente dizia que não iria. Mas seu amigo conseguia ser irritantemente insistente e hoje era o dia do baile e seu sócio entrou na sua sala e não o deixava em paz, desde então.

—Você sabe que é um evento importante na temporada londrina. E mais, Madame Williams é uma de nossas clientes mais antigas. Além de ser nossa amiga- Ethan listava os motivos para ir ao baile, contando um por um nos dedos. Duque era um homem muito paciente, mas seu amigo conseguia tirá-lo do sério.

—O senhor sabe muito bem como eu me sinto em relação à aristocracia- ele lançou um olhar de alerta para seu amigo. Já havia explicado toda a sua situação para seus sócios. Eles pareciam compreender sua dor, pelo menos era o que Dereck achava até o dia de hoje com aquela constante insistência de seu amigo.

—Até quando você vai deixar o que os outros pensam de você definir os lugares que você frequenta, como você vive a sua vida? Já está na hora de deixar isso de lado, Dereck- Ethan usou o nome verdadeiro de Duque, o que mostrava sua seriedade. Duque sabia que o amigo se preocupava com seu bem estar, mas conviver com nobres ingleses não era um opção.

—Não define como eu vivo. Eu só particularmente não gosto de conviver neste universo pela maneira como as pessoas me olham, como se eu fosse algum tipo de aberração. Não me agrada nada me sentir parte de um circo- Duque havia regressado ao seu escritório e checando a correspondência deixada em cima de sua mesa, porém não conseguia se concentrar no que estava escrito nos envelopes.

—Madame Williams disse que faz questão da nossa presença no baile. Eu e James já confirmamos presença, só falta você, meu amigo- Ele sentia que essa era a última carta que Ethan jogava, seus argumentos já haviam se esgotado.

—Então vão os dois. Alguém precisa ficar aqui no clube para ter certeza que a noite correrá bem.

Ethan não disse mais nada e saiu de escritório, frustrado. Duque andou até seu armário e pegou um copo e uma garrafa de gim. Toda aquela história do baile lhe fazia lembrar de seu passado, e de como tudo aquilo doía, como uma ferida que nunca cicatrizava completamente.

Duque era filho bastardo de um dos duques mais poderosos de toda Grã-Bretanha. As extensões das terras, e a quantia de dinheiro ganha por ano eram exorbitantes. Mas dinheiro nunca resolver os conflitos do coração e seu pai acabou se apaixonando pela governanta da casa. O romance foi intenso, a necessidade de manter tudo em segredo fazia os dois apaixonados se quererem ainda mais.

Fruto deste amor clandestino, nasceu Dereck. A mãe morreu no parto, ninguém sabe se a causa foi alguma complicação no parto ou a tristeza profunda da moça de saber que nunca poderia assumir seu filho perante todos junto ao homem que amava. Qualquer que seja o motivo, aquele pequeno bebê foi deixado sozinho no mundo.

Não completamente sozinho, porque afinal o duque de Woodburn o adotou e o criou como filho, o que ele realmente era. Seu pai fazia pose de que estava fazendo uma boa ação adotando órfão, quando na verdade só estava cumprindo com sua responsabilidade de pai. Neste meio tempo, a duquesa engravidou e deu à luz um menino, para a infelicidade de Dereck.

No fundo, a duquesa sempre suspeitou que Dereck era filho de seu marido, por isso, todo o seu desprezo era reservado para aquele pequeno menino inocente. O meio irmão de Dereck, Adam, adotou o ressentimento da mãe e fazia questão de tratar mal o pobre garoto. Desmerecia a aparência, os modos e a inteligência de seu meio irmão. A infância de Dereck não foi das melhores, digamos assim.

Quando ele chegou na idade de começar a frequentar eventos sociais, a recepção da alta sociedade também não foi das melhores. A aristocracia, com seu lado fofoqueiro e malicioso, também suspeitava da infidelidade do duque. No entanto, as más línguas caíram em cima do filho inocente, e não da pessoa que havia desrespeitado os laços de seu matrimônio. Todos olhavam torto para Dereck, pouquíssimas damas dirigiam alguma palavra a ele, e muitos ainda ridicularizavam sua suposta ilegitimidade. Chamavam Dereck pelas costas de O Quase Duque. Depois de um tempo o apelido acabou encurtando para Duque, somente.

Duque não suportou por muito tempo aquele pequeno inferno. Deixou de frequentar o círculo social das temporadas, saiu da casa de seu pai e mergulhou de cabeça no submundo londrino, também frequentado por nobres. Mas naquele universo, sua legitimidade era um mero detalhe, mulheres se jogavam aos seus braços, querendo fazê-lo de sua mais nova aquisição, um amante.

Já havia se passado muito tempo desde aquela primeira temporada, mas as cicatrizes ainda estavam abertas. Duque mal falava com seu pai, ele podia ter acolhido aquela criança sem mãe na sua casa, mas era a única coisa que havia feito, oferecido um teto para Duque, porque a mansão Woodburn nunca foi um lar para ele. Seu pai nunca defendeu aquele doce menino dos olhares feios e das ofensas sussurradas sobre ele. O erro havia sido do duque, mas quem pagou foi Dereck, e ele não conseguia perdoar aquele tipo de atitude.

Só de pensar em pisar novamente em um salão de baile já causava arrepios em sua espinha. As lembranças de um jovem desajeitado e louco por aprovação voltavam logo a memória. Virou o conteúdo que restava no seu copo, uma tentativa de guardar novamente aquelas memórias no fundo da sua mente.

                                                           ***

Elizabeth se encolheu de dor quando June, sem querer, cutucou seu couro cabeludo com um grampo. Sua irmã sempre fazia seus penteados, era um hábito que as duas criaram, mesmo que houvesse uma camareira para auxiliar Elizabeth, ela sempre preferia que June, com suas habilidades mirabolantes, pensassem em algum penteado.

Esse pequeno ritual das duas surgiu desde que June tinha seus 7 anos e adorava fazer penteados em suas bonecas, e era muito talentosa, um penteado mais deslumbrante que o outro. Em algum dia, June viu Elizabeth desarmar seu penteado todo complicado e suas madeixas caindo em cachos nas costas e ficou completamente encantada. Pediu insistentemente para sua irmã até ela permitir que começasse a fazer o penteados em seu cabelo.

No começo, as coisas não davam exatamente certo e June acaba fazendo alguns belos nós nos cachos de Elizabeth. Mas a irmã mais velha nunca reclamava de ter que gastar um bom tempo desembaraçando seu cabelo. Depois de um tempo, a caçula pegou o jeito e criou-se o costume.

Naquele dia em especial, June havia se superado. Feito uma trança grande que serpenteava pela cabeça de Elizabeth e a ponta da trança ela enrolou, numa espécie de coque meio solto, complicadíssimo de se fazer. Dois cachos estavam soltos, cada um de um lado do seu rosto. June sempre gostava de fazer algum penteado que ressalta o cabelo cacheado de sua irmã, era quase uma obrigação.

Enquanto a caçula retocava os últimos detalhes do penteado, Elizabeth sentia sua irmã um pouco agitada, por isso quando June olhou a irmã nos olhos no espelho, ela já estava preparada para lidar com alguma inquietação da Clark mais nova.

—Você acha que eu arranjo um bom pretendente nesta temporada?- ela perguntou para Elizabeth com uma incerteza mostrando no olhar, algo muito raro para June. Se havia alguma coisa que June sempre tivera segurança era de que encontraria um amor para a vida toda.

—Por que a pergunta, querida?- Elizabeth franziu o cenho, preocupada.

—Não sei. Já se passaram duas temporadas e eu não encontrei algum cavalheiro que me faça sentir todos aqueles sentimentos dos romances que nós duas tanto gostamos de ler- June compartilhou um olhar de entendimento com Elizabeth. As duas sempre amaram os romances mais melosos possíveis, aqueles até previsíveis- Talvez seja melhor eu arranjar algum pretendente bonito e rico, me casar e resolver logo com essa questão. Não tenho mais tanta fé assim no verdadeiro amor- a última expressão foi dita revirando os olhos.

June realmente já havia passado por duas temporadas e rejeitado diversos pretendentes, mas Elizabeth sempre pensou que algum haveria de tirar o fôlego de sua irmã. Elizabeth podia muito bem não acreditar no amor para ela mesma, mas tinha total fé na paixão da sua irmã. Ela era uma das pessoas mais cuidadosas e apaixonantes que já tinha visto, se June não encontrasse seu “príncipe encantado”, ninguém mais teria a menor chance de encontrar.

—Escute-me com muita atenção, minha querida irmã. Eu tenho certeza que você encontrará um cavalheiro que a fará feliz, mas será no momento que tiver que ser. Não adianta tentar apressar algo, não terá serventia alguma. Se as pessoas tiveram que se acostumar com a ideia de eu preferir trabalhar do que procurar por um marido, a ideia de você esperar um tempinho a mais por um casamento por amor será fichinha - June soltou um pequeno riso com aquela fala da irmã- Não perca fé, minha querida. Quem sabe não pode ser hoje o grande dia? Eu sei que chegará.

Elizabeth levantou da cadeira de sua penteadeira e abraçou sua irmã caçula com força. Sentiu seu coração levemente aquecido com aquele enlaço. Escutou a porta de seu aposento se abrir e o pai das meninas entrar e encostar no batente da porta. Havia uma tristeza na sua postura, mas seu olhar demonstrava só orgulho. E foi então que Elizabeth se lembrou, daqui dois dias seria o aniversário de morte de sua mãe, Mary Clark. Sempre quando o calendário se aproxima desta data, Phillip ficava alguns dias um pouco abatido e tristonho. Ninguém da casa questionava, todos sabiam.

—Minhas queridas, sua mãe estaria tão orgulhosa de ver vocês duas assim. Duas moças crescidas e uma cuidando da outra. Enche meu coração cheio de orgulho- o tom de voz de Phillip denotava alegria.

Se havia uma coisa que Elizabeth mais adorava em seu pai era o seu cuidado com as pessoas à sua volta. Ele sempre fazia questão de observar cada pequeno detalhe, de deixar claro o quanto apreciava ter seus filhos e amigos à sua volta. A perda de sua esposa não o havia feito amargo, como acontecia com alguns maridos, mas havia feito Phillip crescer e perceber quantas pessoas ainda estavam na vida dele.

As duas moças caminharam até o pai e deram um abraço afetuoso. Não precisam dizer nada, elas sabiam que sua mãe fazia falta e nada poderia preencher aquele vazio. Permaneceram assim por alguns instantes, deixando as ações falarem mais alto.

—Desculpe interromper o momento- O irmão mais velho, Thomas surgiu a porta- Mas já está na hora de irmos para o baile.

June disparou na frente, louca para entrar na carruagem primeiro. Elizabeth deu risada da reação da irmã, enlaçou o braço no do irmão e seguiu na mesma direção, escada abaixo, pronta para mais um baile.


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Notas finais do capítulo

Obrigada pela atenção

Até a próxima

Beijos



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