O Enterro do Lince escrita por Nathália Paixão


Capítulo 2
Abaixo do Solo


Notas iniciais do capítulo

Olá novamente, meus leitores.
Estou postando aqui na mesma sequência que postarei no outro site (Spirit).
Quem estiver acompanhando realmente tem um coração forte! (kkk)
Aproveitando que ainda estou de férias irei enviar de 3 em 3 dias os capítulos, sim?
Eles serão postados sempre na parte da tarde.

Agora um adendo importante com base no conteúdo a seguir.

Presumo que após uma pesquisa sobre a data de aniversário do Aslan pude confirmar que ele nasceu no ano de 1968, fiquei um pouco na dúvida se o mesmo havia morrido com 17 anos ou se já tinha passado um ano. Com base nos acontecimentos que giram em torno de Banana Fish, tanto mangá quanto anime, creio que o mesmo faleceu com 18 anos, então coloquei 1986 na lápide ao invés de 1985. Se alguém tiver relatos mais específicos em torno desta informação adoraria saber, sim?

Desejo uma ótima leitura!



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Em memória de Aslan Jade Callenreese.
1968 - 1986 
“Um herói nunca morre, ele prevalece com vida na história de um povo.” ¹
“Os covardes morrem várias vezes antes da sua morte,
mas o homem corajoso experimenta a morte apenas uma vez.” ²


━ E ao lar o fugitivo retorna novamente.

Nebuloso. Nuvens carregadas pareciam se formar ao longo do horizonte. O cemitério localizado em Cape Cop imitava até cenário de um filme de calamidade, fazendo jus a situação que uma hora ou outra iria acontecer um dia. Não que a nova lápide que situava-se presente naquele momento não fosse parte de um final nefasto. Muito pelo contrário. Era um desfecho que muitos sabiam que algum dia poderia acontecer, mas que era inacreditável de se crer que realmente calhou tão cedo e de forma tão súbita.

O vento soprava medianamente levando consigo as folhas que soltavam das árvores e tirava do chão aquelas já secas. Ele fazia balançar as madeixas grisalhas do adulto barbudo que encarava a lápide muito bem posicionada ao lado de outra no topo do morro daquele lugar. Uma vista privilegiada e que, com toda certeza, agradaria aos mortos devido ter sido um dos mesmos a escolhê-lo.

━ Você realmente não tem jeito. Não sente vergonha? ━ Disse frustrado.

Jim Callenreese, pai de Aslan, estava inconformado. Ele observava o túmulo de seu filho mais novo com um olhar difícil de decifrar, assemelhando-se a uma expressão de desgosto.

━ Então, como é a morte, Ash?

As palavras saiam de seus lábios como lâminas. Lâminas estas que cortavam de forma ilusória toda a cavidade bucal do homem que as pronunciava sem pudor algum. O sentimento que sentia ao ver o próprio velório do filho mais velho para agora presenciar o do filho mais novo era algo perturbador e indecifrável. Já não bastou ter uma vida medíocre onde as mães daqueles haviam o deixado para assim eles o deixarem de igual modo, logo em seguida? Morrendo gradativamente um após o outro. Definitivamente, esta não era a vida que ele havia pedido para ter, entretanto que precisava aceitar, afinal ele mesmo cometeu muitos erros e precisa encarar o destino que já estava escrito em suas veias e pele.

━ Isso com certeza foi algo que chocou todos nós. ━ Disse uma voz masculina que aproximava-se por trás. ━ Com toda licença, senhor Jim. ━ Pronunciou Max, subindo os pequenos degraus de escada que findavam-se à frente dos memoriais, caminhando em direção ao mais velho.

━ Tsc, patético. ━ Resmungou Jim para si.

Max Lobo era um jornalista de cabelos castanhos-claros e olhos verdes, o mesmo era conhecido próximo de Griffin, ex-parceiro de guerra e filho mais velho de Jim, e Ash quando os mesmos antes estavam vivos. Havia à um tempo conhecido o pai deles quando trouxe o garoto loiro para Cape Cod onde ele visitou sua ex-casa após alguns anos. Havia decorado o caminho que Ash lhe falou. Naquela época eles foram atrás de informações sobre o assassino de Griffin, Abraham Dawson, e logo em seguida atacados por funcionários de Golzine e Jim feriu-se, mas foi socorrido logo em seguida.

O jornalista, agora respeitado devido ter ajudado a desmascarar o governo de Golzine, ficou ao lado do mais velho lendo o manuscrito prefixo no memorial com um pesar enorme em seus olhos. Não era fácil de acreditar naquilo. Como assim? Como Ash havia morrido? Não fazia sentido. Ou não, fazia sim. Afinal, o garoto ainda tinha inimigos, não tão grandes quanto Dino, mas ainda assim não eram pessoas de boa índole. Ele ainda era alvo. Como tinham simplesmente deixado tal situação acontecer? Quão ingênuos eram em não procurar por Ash e simplesmente deixá-lo vagando por aí? Aquilo parecia um pesadelo. Um pesadelo que se tornou realidade.

Angústia. Dor. Tristeza. Aflição. Culpa.

Eram sentimentos que percorriam pelo corpo de Max. O mesmo portou-se bem no velório, porém agora não conseguia mais fingir ser forte. Lágrimas salgadas persistiam em cair de seus olhos iniciando-se em uma fina linha que escorria por suas olheiras devido noites mal dormidas desde o dia que soubera que o menino faleceu. Elas tocavam as bochechas e findavam-se na base do queixo molhando a grama em seus calçados. Era doloroso demais ver alguém que considerava como filho morrer antes dele e de forma tão sorrateira.

Um silêncio mórbido percorreu onde aos poucos fora cortado por soluços que viam da direção de Max. Aquilo era cruel demais. Não podia acreditar. Não queria. Pelo menos tinha convicção de que o rapaz estava agora num lugar melhor. Um lugar que não sofreria mais, onde não ousariam encostar um dedo nele para o violarem, muito menos portaria armas para se defender. Morreu em paz e nisso tinha total certeza. Pelo menos isso era algo que o homem pudera usar como justificativa para tentar ficar mais tranquilo.

━ Só posso ser um “velho, idiota” mesmo, Ash. Prometi que não ia chorar. ━ Disse Max.

━ Fique calmo, você não está errado. Eu que fui um pai horrível para ele, você não tem culpa. ━ Disse Jim, tentando consolar o outro. ━ Ei, você é um dos conhecidos dele que vieram da última vez, não? Procurando as coisas de Griffin. Me recordo.

━ Sim. Sou ex-parceiro de Griffin da guerra também.

━ Você disse isso da última vez.

Era estranho. O silêncio que se propagou após a singela conversa começava a reinar. O som das ondas da praia faziam uma natural melodia constante ocasionando um simplório relaxamento para ambos.

━ Ele foi esfaqueado, né? ━ Perguntou Jim, cortando o silêncio.

━ Sim. ━ Max levava seu braço até os olhos enxugando-os com a manga da blusa tentando se recompor para ter uma conversa decente com o pai biológico do falecido.

━ Deve ter sido uma dor terrível. O médico falou se perfurou algum ponto vital?

━ Não. Parece que a faca não acertou nenhum ponto. Um conhecido nosso comentou que os médicos falaram que a causa foi hemorragia, apenas.

Já fazia um tempo desde que o jornalista recebeu o relato do chinês Sing Soo-Ling depois do mesmo ter saído do aeroporto antes de todos após se despedir de Eiji Okumura que retornara para o Japão. O gangster dissera que precisaria ir antes para resolver assuntos pendentes com seus companheiros, sabendo que ele era o líder atual da gangue de Chinatown. Qual foi a surpresa ao atender uma ligação do mesmo alterado dizendo que Ash Lynx havia morrido. Aquilo foi um choque. Não era algo que Max acreditou logo de primeira, demorou segundos para cair a ficha do que estava ouvindo do outro lado do telefone e precisou confirmar pessoalmente.

Qual foi o espanto ao ver que dessa vez era verídico.

O corpo de Ash ficou alguns dias no necrotério após a confirmação de onde o mesmo seria enterrado. Nada melhor que retornar para o lar que nasceu, assim como o irmão. Foi pedido do próprio Ash deixar o pai cuidar do enterro de Griffin e agora o seu.

━ Entendo. ━ Jim proferiu, seco.

━ Foi minha culpa. Não podia ter deixado ele sozinho. Ele até tinha mandado uma mensagem antes pra mim. Eu podia ter rastreado.

━ Já falei que não foi. Ele quis assim.

Sim, Ash quis. Claro que a facada não foi algo que ele premeditaria. Não! Ele sempre foi muito desconfiado e cauteloso, com certeza notaria alguém próximo com instinto assassino. O que pode ter acontecido?

━ Guarda baixa? ━ Disse Max, incrédulo.

━ Talvez.

━ Ash nunca ficou de guarda baixa. Deve ter acontecido algo. ━ Max levou a mão até o queixo, pensativo.

━ Acho que foi por causa da carta que Eiji pediu para eu dar pro Ash.

Sing falou parado logo abaixo dos degraus analisando os homens pelas costas com suas costumeiras mãos dentro dos bolsos da jaqueta.

━ Ah, Jim! Esse é Sing, amigo de Ash. Ele me pediu para trazê-lo aqui.

━ Não era amigo dele! Apenas o respeitava. ━ Falou, constrangido. ━ Muito.

━ E o que tinha escrito na carta? ━ Perguntou Jim, observando o menor por sobre os ombros.

━ Óbvio que não sei! Eiji me pediu para entregar ao Ash e não que eu lê-se o que estava nela. ━ Disse, subindo os degraus impaciente. ━ Mas com certeza foi algo que o fez ceder, mesmo que só por alguns segundos. O que mais me deixa puto é que foi Lao quem o matou. Se alguém tem que se sentir culpado esse sou eu! Não você, seu velhote.

O chinês estava inconformado. Pretendia ir embora antes do aeroporto exatamente para ver o loiro mais uma vez e dizer como foi a despedida, mesmo tendo convicção de que Ash não merecia saber devido ser cabeça dura em não ter ido ver a ida da única pessoa que ele amava. Sempre desconfiou do relação dos dois. Eles não eram somente próximos como amigos ou irmãos. O vínculo deles era muito mais intenso visivelmente e não só Sing havia notado isso. Era algo mais forte até mesmo para amantes.

Quando finalmente havia retornado para o local em que sabia que Ash estaria graças ao Eiji viu um aglomerado de pessoas em um ponto ao lado da biblioteca e arregalou os olhos ao notar Lao sendo levado por uma ambulância. Sabia que ele estava ali por causa de Ash. Mas como sabia? Ele havia o seguido? Desconfiava e comprovou isso ao adentrar a biblioteca procurando por ele. Sing perguntou para uma das funcionárias se havia acontecido algo e ela informou que um jovem loiro tinha sido levado para o hospital e que parecia que tinha levado uma facada bem profunda.

Foi surreal e assustador ver Ash na sala de emergência com vários médicos tentando o ressuscitar. Não podia aceitar. A culpa era sua. Sabia que Lao não concordava com os princípios que havia decidido sobre Ash, mas tudo já havia se resolvido. Por quê? Lao ainda não sabia. Não havia ainda contado para ele. Ele nutria ainda um ódio por Ash tão grande assim? Que desgosto sentia de si próprio.

━ Eu sou um péssimo chefe. Eu não mereço esse posto. É tudo culpa minha! Ash morreu por minha causa. Eu o matei!

O menor chorava em meio a soluços. Tinha muitas responsabilidades para se tomar e decisões sendo apenas um menino de 14 anos. Não havia pedido para ser líder. Se pelo menos Shorter estivesse ainda vivo nada disso teria acontecido.

Pelo menos é o que ele pensava.

━ Pare de se culpar, Sing. Quem matou ele foi o Lao, não você. ━ Falou Max, tentando amparar o mais novo.

━ Cala a boca e me solta! Uma parcela da culpa é minha sim, afinal, Lao é meu meio irmão. ━ Disse, tirando as mãos do outro de si.

━ Mas Sing...

━ Pare de tentar me levantar! Eu já entrei a muito tempo nesse inferno!

━ Acredito que a culpa seja de todos nós. Cada um tem sua parte. ━ Falou Jim, surpreendo os dois.

Ele andou sério um pouco mais para frente, encarando os túmulos de seus filhos.

━ Mas creio que Ash não concorde com isso. Sabe, pode não parecer para vocês, mas ele era uma criança muito alegre e inocente quando Griffin ainda estava entre nós. Nunca pedi a Deus que meus filhos tivessem tido uma vida tão terrível como essa, mas acho que mereci, não é mesmo, Aslan? Afinal, quem sofre no fim somos nós que ficamos pra trás, vivos.

━ Senhor Callenreese... ━ Disse Max, preocupado.

━ Não precisa ter pena de mim. Eu não mereço. Tentei protegê-lo da minha maneira falha quando o pedi pra ficar na casa da tia, não imaginei que ele fugiria pra após alguns anos descobrir que estava sendo cuidado por um mafioso. Eu errei em não ter ficado de olho nele. Garoto! ━ Exclamou, chamando por Sing, sem olhá-lo.

━ O que foi? ━ Respondeu irritado.

━ Alguém disse mais alguma coisa? ━ Acho que não... Espera! Lembrando bem acho que a funcionária disse que não havia notado que ele estava ferido, porque Ash estava com um rosto sereno e... Sorrindo.

━ Então ele...

━ É óbvio. Aceitou a morte. Tsc, bem a sua cara, filho vulgar. ━ Jim disse, cortando Max.

━ Espera! Quem você acha que é pra falar assim com Ash seu velhote gordo e babaca?

━ Calma, Sing!

Max segurava o menino pelos ombros que se debatia a fim de bater no outro que falara mal do loiro, mas ele parou após ver as lágrimas que escorriam sem pudor dos olhos do idiota. Aquilo era injusto! O sentimento de perda era angustiante demais. Não aguentava mais ficar ali naquele momento, detestava aquilo. Detestava não ter feito nada. Não podia ainda encarar a lápide do Ash, não tinha coragem. O chinês se soltou das mãos alheias com força e correu na direção do portão do cemitério, distanciando-se completamente do local. O jornalista observava aquilo com tristeza. Sabia que era demais para uma criança como ele toda aquela situação.

━ Max, não é?

━ Sim.

━ Uma vez você me perguntou se eu não amava meu filho.

━ Acho que me lembro vagamente disso sim.

━ Um pai mesmo que ruim como eu tem sentimentos. Não fui o melhor, mas sim, eu amava ele e não vou deixar de amá-lo. Você pode não acreditar se não quiser.

━ Eu acredito. ━ Disse Max, surpreendendo o outro que ficou quieto por alguns segundos.

━ Obrigado.

Algumas gotas de chuva começavam a cair sobre ambos. As nuvens que antes estavam longe vieram trazer consigo a água que marcaria aquele momento tão sôfrego e ao mesmo tempo sincero. Max encontrava-se já dentro do carro junto a Sing no carona, havia preferido não contar ainda para Jessica, sua ex-esposa e agora noiva pela segunda vez com ele, o que aconteceu. Seria muito problemático por hora. Ele se concentrava na direção, rumo a Nova Iorque.

━ Ai ai, vai ser problemático contar pro Eiji. ━ Suspirou, Max. Ainda com um estado emocionou horrível.

━ Deixa que eu conto.

━ Acho melhor não, rapaz.

━ Eu conto. Já tomei a decisão. Não se meta! Tenho que fazer pelo menos isso pelo Ash. ━ Disse, cruzando os braços e olhando para fora do carro. ━ Shorter faria o mesmo.

O mais velho apenas deixou um longo suspiro pesado novamente sair. O menino podia ser uma criança, mas era corajoso. Corajoso e, talvez, forte o suficiente para conseguir aguentar o peso da dor que carregava e que iria carregar mais ainda após dar a notícia para o japonês.

━ Tudo bem. ━ Disse por vencido.


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Notas finais do capítulo

E chegamos a mais um fim de capítulo! ♥

O que acharam? O pai de Aslan não era um homem perfeito. Tinha seus defeitos, mas espero que eu tenha conseguido retratar um pouco o peso que ele sempre vai carregar durante vivo.

— Como será que Sing vai contar para Eiji sobre a morte de Ash?
— Como será que Eiji irá reagir?

As respostas estarão no último capítulo de O Enterro do Lince! ♥

(¹) A primeira frase da lápide fui eu que fiz, porém acredito ser um termo que bastantes animações sejam japonesas ou não utilizem principalmente em enredos históricos em que seus personagens contém aspectos heroicos.
(²) William Shakespeare. Quis colocar, pois para mim combinou bastante com o Aslan, além de eu achar que ele gostaria desse escritor maravilhoso.



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