O Voador escrita por Gabriel Gorski


Capítulo 20
Perdendo o Controle




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Ian tentou atacá-lo mais uma vez. Sua espada zunia a cada golpe impreciso que dava, equivocando-se, mas se aproximando. Ecco forçou a mente, enquanto se afastava, próximo às paredes. Precisava ganhar tempo.

— Ian. – Disse, em meio à respiração ofegante. – Você quer ser conhecido, certo?

— Não podes me enganar com estas frivolidades. – Riu, bradando mais uma vez ao avançar com sua espada. Ecco sentiu o vento cortado próximo ao rosto.

— Espere! – Gritou, se afastando novamente. – Como você pode ser grandioso se não há uma única testemunha?

Ian parou, arquejando com calma. Ecco continuou se afastando taciturnamente. Seu senso de ambiente lhe deu certeza de que o chão não deixaria de existir no centro do recinto, e aproveitou o momento para ir até ali.

Era bizarro – e peculiar – e estar num calabouço feito para um finghar e não o encontrar ali, bem no meio de tudo, nem nos cantos, nem acima, nem qualquer lugar. Ecco olhou para cima, o único lugar onde conseguia enxergar algo.

— Pedes para ser minha testemunha? O que você ganha nisto?

— A chance de continuar vivo. – Lhe pareceu uma boa resposta para dar.

— E por que eu deveria crer que não vais fugir assim que puder?

— Mas eu posso contar às pessoas sobre isto em qualquer lugar.

Ian deu um passo e então outro, antes de brandir a espada.

— Não. Tu morrerás.

O som do aço caindo no chão assustou a ambos.

— O que foi isso? – Perguntou Ian, alarmado.

— Deixando a espada cair em batalha, Ian? – Zombou Ecco.

— Eu vou acabar com você, desgraçado! – Gritou Ian, investindo novamente contra o vazio. – Apareça!

Por um momento, Ecco achou ter visto algo à sua direita, uma luz que corta a penumbra como um remo corta a água. Ao virar, viu uma espada de médio vinco flutuando à sua frente. Ian também viu, e ambos permaneceram quietos, observando o que aconteceria.

— Isso é você? – Perguntou Ian.

Ecco soube que não era uma armadilha quando ouviu aquela pergunta.

— Não, mas agora é minha.

Os dois dimanaram para apanhar a espada. Ecco, porém, estava muito mais próximo e deu um salto para puxá-la pela empunhadura.

A visão de Ecco modificou-se brutalmente ao tocar a espada, como se as formas físicas que via se alongassem, deformando-se. Ecco estava mais impressionado por enxergar formas, porém. Via o chão abaixo de si, escuro como o carvão, refletindo uma tênue e fraca luz de tons esverdeados. As paredes tinham tochas penduradas e grilhões abertos, aguardando pacientemente pelos pulsos daqueles que nunca foram condenados. Ian estava parado ao seu lado, segurando a espada com duas mãos, olhando ao redor freneticamente, golpeando o nada várias e várias vezes.

— Eu estou aqui! – Disse Ecco.

Ian correu na direção dele, desferindo um belo golpe no ombro de Ecco, que recuou. Cortou então parte do outro braço, fazendo com que Ecco guinasse novamente. Ao atacar outra vez, porém, as lâminas se chocaram.

— Como assim?! – Indagou, cético, sem entender como ele conseguia erguer uma espada tendo ambos os braços feridos.

Ecco não tentou responder. Atacaram-se, no escuro, seguindo os movimentos que aprenderam, em cima, em baixo, recuar e avançar. Ecco porém, para surpreender o adversário, avançou desengonçadamente por baixo, desferindo um golpe na panturrilha dele, que caiu de joelhos, urrando de dor, xingando inúmeras palavras desconhecidas.

Em um súbito contra-ataque, entretanto, Ian arremessou uma bola de fogo contra Ecco, acertando o seu cabelo. O fogo não se apagou, mas, pelo contrário, se alastrou no ar como se criasse vida, abandonando o corpo para se transformar num monstro parrudo com muito mais de quinze côvados de altura e seis braços, grandes como toras de sequoias. Ao cair no chão – em pé –, um forte estrondo ecoou entre as paredes.

Como se isto não fosse suficiente, as chamas absorveram toda a escuridão, envolvendo-as de tal forma que uma camada se formou, como se fosse pele. Para ser mais fidedigno ao que Ecco presenciou, em algum momento, a criatura simplesmente era carne e não chamas. Seu maxilar quadrado e seus olhos totalmente vermelhos encaixavam-se num formato absurdamente severo.

Ecco ainda tentou correr, mas Ian o empurrou, derrubando-o antes que escapasse pela porta. A espada que trouxera por ali ficara.

— Ecco. – Disse a criatura. – Obrigado por me libertar.

— Ochantgar... – Disse Ecco, extasiado e completamente fascinado. – Não o libertei, foi ele quem acendeu a chama.

— Sim. Mas ele sabia que, se fizesse isso, me desprenderia da maldição que me impuseram. Você o fez acender uma chama.

— Foi o que me pediu para fazer. – Respondeu, encabulado.

Ochantgar deu uma risada mais natural do que aquela de antes, quando ainda era escuridão. Ao refletir nisso, Ecco reparou que não conseguia entender como ele era uma escuridão, ou como a risada dele poderia parecer comum se ele era um finghar, ou ainda como ele estava vivo. Ousou fazer uma pergunta.

— O que aconteceu quando...

— Quando a espada apareceu? – Ochantgar o interrompeu. – Como enxergou? Como pode erguer as espadas? Por que não foi queimado?

— Sim, tudo isso. – Tinha sido Ochantgar, Ecco sabia.

— Antes, precisamos sair daqui. – Falou.

Finghars tinham uma habilidade interessante: Eram capazes de alterar o próprio tamanho. Qual a melhor forma de sair dali? Quebrando as paredes, com certeza. Ochantgar, ao sair da torre onde estivera confinado por mais de mil e duzentos anos, respirou fundo e, sorrindo, disse.

— Jamais estive tão feliz por ser livre.

Ecco admirava a espada ezraellyana em suas mãos. Seria sua, como um troféu de batalha. Subiu os escombros que o finghar fizera e saiu da torre.

— Espere. – Pediu Ecco e logo foi ao encontro dos livros que escondera.

Num dos cantos da sala, Ian se escondia, assombrado. Ao ver Ecco entrar, chorou por piedade. Ecco, contudo, pegou os livros com dificuldade e se retirou sem dizer uma palavra sequer.

Ao retornar, encontrou o finghar em um tamanho consideravelmente menor, ainda mais alto que Ecco, porém.

— Vamos. – Falou.

— Me dê os livros. – Disse, pegando pequenas quantidades em cada mão. O finghar pegou também a espada ezraellyana.

— Eu posso carregar. – Tentou argumentar, mas o finghar, num mísero instante, sumiu. – Ei, cadê você?

— Aqui! – Gritou com sua voz alterada, ainda grave. Ochantgar estava do lado de fora da prisão.


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