Kepler-452 escrita por Doutor


Capítulo 3
Tédio do espaço.




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Mary estava com os olhos vermelhos e inchados, pois havia chorado muito hà poucos minutos atrás. O local aonde estava era frio... muito frio. Era uma sala circular, bem iluminada e com paredes e piso brancos. No centro estava Vincent, que mexia em algo muito parecido com um computador e usava uma coisa estranha na cabeça.

Ela se levantou daquele piso frio e caminhou até o garoto.

—Eu nã-não consigo en-entender...- ela soluçava, enquanto falava com uma voz chorosa. -Você é um... alienígena?

—Sim. - respondeu Vincent, ainda focado no que fazia.

—Mas como? - perguntou Mary. Vin olhou para a garota,  confuso, estranhando que ela não soubesse uma resposta que, para ele, era óbvia. 

—Bom, eu nasci em um planeta que não é a Terra. - respondeu. Quando escutou a palavra "Terra", Mary se lembrou do que estava acontecendo com seu planeta e começou a chorar mais ainda.

Foi algo constrangedor, pois Vincent não sabia o que fazer. Ele olhou para os lados enquanto a garota chorava, e então deu um tapinha nas costas da garota. 

—Vai passar! Calma... - disse ele, ainda sem saber o que fazer. 

Após mais alguns minutos chorando,  a garota se acalmou e sentou em uma cadeira ao lado de Vincent. Ainda soluçando,  a garota se manteve em silêncio por algum tempo. 

—Então... Por que aquilo começou a acontecer com a Terra? - disse ela, quebrando o silêncio do local.

—Bom, quando você apertou o transmissor hiperespacial de autorização, você avisou aos habitantes de Norzoon que seu planeta já podia ser colonizado. - respondeu ele. 

—O que? Quê diabos é Norzoon?

—Meu planeta natal. Vocês nomearam ele como Kepler-452b. 

—Ah... - Mary não fazia idéia de que planeta era esse, mas não podia ficar sem falar nada e demonstrar sua ignorância. Os únicos planetas de que ela se lembrava eram os planetas do sistema solar.

—Quando você ativou o transmissor, você autorizou a colonização da Terra. Então eu tive que pegar minha nave e aqui estamos.

—E... pra onde vamos? 

—Pra Norzoon.

—Mas e a Terra? - gritou a garota,  entrando em desespero.

—Ah, ela será colonizada. Os humanos serão escravizados ou mortos.- respondeu, ainda sem expressão. - Sorte a sua que eu pude salvar você. 

—Mas... Por que o seu povo está fazendo isso? Por que você...- Mary parou para refletir. -Você... Você é o culpado. Foi pra Terra só para ver se podia ser colonizada.

—Aí você se engana. Eu sou apenas um pesquisador... Todo habitante de Norzoon é obrigado a levar um transmissor hiperespacial quando vai para outro planeta. A lei nos manda fazer isso. Aí,  quando o cidadão de Norzoon percebe que o planeta é seguro para se colonizar, ele pode optar por transmitir essa informação. - disse ele. - É uma lei para garantir a expansão da espécie pela galáxia. 

—Então... a culpa é minha? - disse ela. Lágrimas começaram a escorrer de seus olhos e ela voltou a chorar.

—Bom, tecnicamente... sim. Eu só te salvei porque era a primeira humana que estava na minha frente. - respondeu ele, enquanto a garota continuava chorando. -Agora, se prepare. - Vincent apertou um botão e Mary teve uma sensação estranha. 

Mary sentiu, em uma fração de segundo, todo o seu corpo sendo comprimido até toda sua massa estar em um volume infinitesimal, que desapareceu. Em uma fração de segundo depois,  esse volume infinitesimal reapareceu e seu corpo foi expandido, até assumir o volume original. Foi a sensação mais estranha que a garota já sentiu,  deixando-a enjoada e tonta.

—Que merda...- ela disse, mas não continuou, pois sentiu que vomitaria.

—Nós fizemos um salto hiperespacial... É normal se sentir enjoado após isso. É melhor se sentar. 

A garota,  tonta, tentou encontrar o banco ao lado do banco de Vincent e se sentou.

—O que é... um salto hiperespacial?

—É um salto no hiperespaço. Viajamos uns vinte anos-luz em menos de um segundo.

—O que? Vinte? Estamos vinte anos-luz distantes da Terra?

—É... Vamos comer algo. Isso vai ajudar após um salto desses. - Vincent se levantou.

***

Vincent comia algo rosa, parecido com uma amoeba. Mary também estava com uma, mas tinha receio de comer. Ela apenas cutucava a comida.

—Vincent...

—Oi?

—Qual é o seu nome? Claro que não é Vincent van Gogh.

—Não. Meu nome é Karvatorofopianassamos Demezar. - respondeu.

—Kar... O que? - perguntou a garota.

—Karvatorofopianassamos Demezar. - respondeu novamente.

—Ok... Vou continuar com Vincent. - afirmou Mary.

—Como quiser. 

—Bom, Vincent... Por que escolheu o nome de um pintor famoso?

—Foi um mal entendido. - Vincent terminou de comer e começou a explicar.  -No idioma do meu planeta, as palavras "famoso" e "comum" não tem diferença.  São a mesma coisa... Não vai comer? - Vincent apontou para a "amoeba" na mão da garota. Mary deu um sorriso sem graça e tentou dar uma mordida naquilo. Para sua surpresa, aquilo era melhor do que imaginava.

—Nossa... Isso é bom! - disse ela, mastigando. - Pode continuar.

—Ah! É mesmo! Enfim, até aqui tudo bem. Mas o problema é que, no meu idioma, as palavras "pintor" e "nome" são homônimos perfeitos.  Duas palavras com escrita e pronúncias idênticas, mas significados diferentes.

—E... Como isso é possível? - perguntou Mary.

—Sendo...- respondeu Vin, achando estranho que que garota não soubesse uma resposta tão óbvia.  - Simplesmente é. Uma galáxia com tantos idiomas... Não é de se espantar que, em um deles, "pintor" e "nome" sejam homônimos perfeitos.- Vincent nunca havia entendido o porquê de coincidências surpreenderem tanto os humanos.  A resposta mais plausível era de que, como os humanos não são capazes nem de sair de seu próprio sistema planetário, eles só convivem com sua pouca população de sete bilhões de pessoas. Mas em um universo tão grande, com tantos seres vivos, planetas, espécies e idiomas, as coisas improváveis eram vistas mais frequentemente. 

Já Mary achava coincidências como essa bastante fascinantes, pelo mesmo motivo. 

—Legal! Continue! - disse ela, comendo o último pedaço da comida rosa.

—Para meu azar, quando fui pesquisar os nomes comuns da humanidade, eu pesquisei os pintores famosos da humanidade.

—O que é isso que acabei de comer? É delicioso! - Vincent ficou confuso após essas falas de Mary. Outra coisa que ele não entendia é como as fêmeas humanas tinham a capacidade de falar tanto e sobre tantos assuntos diferentes ao mesmo tempo. A única explicação que ele havia pensado era que as fêmeas fortaleciam suas relações sociais falando sobre as relações sociais dos outros ou sobre qualquer outra coisa idiota. Enquanto os machos apenas falavam sobre coisas idiotas.

—Bom, é um kenor. Um doce feito de uma fruta do meu planeta. - respondeu.

—Seu planeta... Como ele é? - perguntou Mary. Vincent se fascinou com mais uma demonstração da capacidade de abordar múltiplos assuntos que as fêmeas humanas tinham. Mas se questionava se Mary achava que ele era uma fêmea ou se as fêmeas também faziam isso para fortalecer relações sociais com os machos.

—Bom... Ele órbita a estrela Nor. Vocês nomearam ela de Kepler-452. Ela fica a mil e quatrocentos...

—Tá bom... Não quero saber essas coisas. Quero saber como era a sua infância no seu planeta? 

—Bom. Era comum. Mas quando eu completei trinta anos, eu tive que...

—Espere! - interrompeu Mary. -Trinta anos? - perguntou.  A surpresa da garota veio do fato de que Vincent aparentava ter apenas uns vinte anos. Ela, por exemplo, tinha apenas vinte anos.

—Sim. Nossa infância vai até os trinta e cinco, quarenta anos.

—E... quantos anos você tem.

—Noventa e dois. - respondeu.

—Anos? - perguntou,  perplexa.

—Sim. Anos terráqueos. - Mary se aproximou e tocou a pele de Vincent, como se procurasse por rugas. -E você tá na Terra há quantos anos?

—Uns cinco. - repentinamente, um relógio estranho que estava no pulso de Vincent começou a brilhar. -Ótimo! Estamos preparados para mais um salto. 

—Espera... O que? - mas Vincent nem esperou Mary protestar. Ele pressionou um botão no relógio e, novamente, Mary sentiu a sensação de ser comprimida.


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Notas finais do capítulo

Qualquer erro, me avisem.



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