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Sakura Haruno

19 de Março de 2018 | Terça-Feira

~*~

Quando todos saíram de sua sala fui a única a ficar. As minhas pernas não regiam e quando as senti tão bambas deixei que se abatessem comigo sobre a cama onde estava Itachi.

Estava morto

Tinha morrido nas minhas próprias mãos.

Não havia o que mais fazer, as máquinas estavam desligadas e o próprio Itachi já não estava ali comigo, nunca mais estaria.

Retirei a touca verde e as luvas e aproximei-me dele e num gesto tão delicado sussurrei contendo as lágrimas:

— Como pudeste ir embora sem sequer t-te despedir? N-Não é justo Itachi! – Fechei os olhos doridos das lágrimas que teimavam em cair, mas que ainda assim as soube conter o tempo suficiente para que aquele momento acabasse da forma mais brusca que se podia imaginar.

— O que estás a fazer com Itachi?! – Após ouvir a porta ser forçosamente aberta, soou uma voz carregada de irritação e dor. Naquele momento, afastei-me bruscamente e a culpa se sobrepôs sobre os meus ombros, mas ainda assim lutei pela melhor postura que poderia ter, ou melhor, que era obrigada a ter, pois, acima de tudo, naquele momento estava ali como médica, unicamente como profissional de saúde.

— N-Não sei como entrou, mas o senhor não pode estar aqui. – A minha voz começou baixa, mas ganhou a autoridade que precisava naquele momento, mesmo que isso não parecesse ser suficiente para abala-lo nem um pouco.

— Foste tu?! Fos-

O seu tom elevou-se para mim de forma acusatória e se não tivéssemos sido interrompidos as coisas certamente teriam corrido muito mal. Pior do que já tinham corrido.

— Sakura! Preciso de ti na receção! – Shizune vinha acompanhada de um casal, que ela rapidamente identificou para mim – Os senhores vieram despedir-se, vamos dar-lhes um tempo a sós.

Saí de lá juntamente com Shizune, sem pronunciar mais qualquer tipo de palavra, estava lá a família dele e eu apenas saía com o olhar fixo no chão envergonhada e compreendendo aquela dor mais do que eles poderiam sequer imaginar.

Com tudo aquilo que se tinha passado saí do hospital mais tarde do que o meu turno indicava e dados os acontecimentos, Shizune indicou-me que seria melhor não fazer o próximo turno, mas que ainda fosse ao hospital mais logo explicar o que se tinha passado. Ao ter ouvido aquilo, soube que teria uma grande conversa pela frente, tanto com ela, como com Tsunade, quando regressasse ao hospital.

~*~

— O quê?! Não pode ser Sakura… – Afinal teria duas grandes conversas pela frente e uma delas estava prestes a começar.

— É a verdade Ino… – Por cada vez que repetia cada acontecimento, menos Ino acreditava nas minhas palavras e mais me custava continuar. Tinha contado o que tinha sido o meu “ocupado fim-de-semana”, em como tinha ficado encarregue pelo hospital e ainda tinha tido tempo para uma saída romântica secreta e ela estava incrédula com aquela informação e o pior veio depois quando lhe contei que o meu acompanhante de quinta-feira, tinha virado meu paciente na terça e eu tinha falhado na operação justamente dele.

— Agora compreendo o estado em que chegaste aqui… andavas enrolada com um paciente, como suspeitava, mas acabar assim… É doloso demais – Não tive tempo para reagir à sua acusação de que andava enrolada com um paciente, pois quando dei por ela já me abraçava e acariciava os meus cabelos.

Não disse mais nada, ficámos assim um tempo, naquele momento só conseguia repousar no seu ombro, completamente calada.

— Então e depois voltaste a ver a família dele? – Questionou enquanto desfazíamos o abraço.

— Não e foi o melhor, depois da forma como, suponho, o irmão dele entrou naquela sala, seria o desastre – Recordava o olhar acusatório que me tinha dado naquela sala e por mais duro que fosse para mim, ele estava certo, ele estava no seu direito, no direito de estar a sofrer, furioso, e de me culpar.

— Ele não tinha que entrar lá daquela maneira também, ora! – Ela tentava defender-me acima de tudo e não pude deixar de sorrir um pouco.

— Provavelmente está a processar-me neste momento – Ria forçosamente de mim própria.

— Sakura…! – Repreendia-me preocupada – Mas o que aconteceu mesmo? Como ele…? – Ela não precisou de terminar para que percebesse a sua pergunta e pude ver o quão receosa estava de faze-la.

— A meio da operação à coluna ele começou a não conseguir respirar, nada indicava aquela reação e quando tentava agir ele… – Mais uma vez não foi preciso completar.

— Oh Sakura… Mas isso não significa que a culpa tenha sido tua – E lá estava Ino, sempre a proteger-me.

— Foi! Foi minha! – Disse nervosa elevando o tom de voz – Fui eu que fiz a cirurgia! Fui eu que não soube agir! Fui eu que coloquei a preocupação à frente da racionalização daquela situação! Fui egoísta ao ponto de decidir sozinha que faria EU a operação, mesmo sabendo que era errado! Sou eu a culpada por Itachi nunca mais voltar! – Saiu tudo aquilo que precisava de dizer e mesmo que depois de dizer aquilo tudo me sentisse um pouco melhor, tudo o que veio de seguida foram lágrimas incontroláveis e os braços reconfortantes de Ino.

20 de Março de 2018 | Quarta-Feira

~*~

Estava a caminho do hospital e o receio de voltar lá era notório, Tsunade e Shizune estavam à minha espera e mesmo que tivesse tido a noite inteira para me preparar para aquela conversa, tinha a certeza que não estava preparada.

O caminho nunca tivera sido tão curto e quando afastei todos os pensamentos que me apoquentavam, respirei fundo, fechei os olhos, respirei fundo de novo e dei batidas leves na porta do gabinete de Tsunade.

— Entre!

— Boa noite, Tsunade! – Cumprimentei-a e ficámos as duas fitando olhos uma da outra, sentia que aquele silencio fosse destruir-me, mas não arranjava palavras que o derrotassem, ou talvez me faltasse a coragem e, ali, só senti desamparo.

— Senta-te, será uma longa conversa – Tsunade suspirou pesadamente e eu suspirei também, sabia que por mais duro que seria ela estaria lá para me ouvir, tudo do princípio ao fim.

Tal como esteve, calma e compreensiva, em silêncio até que eu terminasse tudo aquilo que tinha para lhe contar, sem pressões.

— Percebo que os meus atos foram totalmente egoístas e trouxeram consequências graves e compreendo caso seja necessário sofrer das mesmas! – Finalizei, no final de tudo, seja qual fosse a relação com ela, a posição que estava a representar era de médica.

— Sakura… –  Ela começou meio hesitante – Na verdade, a causa do enfarte foi a operação a que tinha sido sujeito anteriormente – Não pude esconder o espanto naquela afirmação e sem qualquer palavra da minha parte, ela prosseguiu – Embolia pulmonar… O coágulo sanguíneo formou-se após a operação ao fêmur e infelizmente dado o seu tamanho a obstrução nos pulmões foi fatal e rápida – Ouvi e no momento relembrei os súbitos momentos em que o perdi nas minhas próprias mãos e fechei os olhos mais uma vez, fosse na tentativa de evitar chorar ou enfrentar a culpa.

— Entendo… – Foi a única coisa que proferi.

— Sakura! – Puxou de volta o foco da minha atenção – A situação não é fácil, mas afogares-te na culpa não vai trazer ninguém de volta – Sabia que tinha razão, mas não interiorizava – Foi errada forma como agiste pela – hesitou em busca de um termo adequado – envolvência com o paciente que tinhas, mas acredito que tenhas agido como uma profissional à altura, o coágulo poderia ter chegado aos pulmões mesmo antes da operação ou, ainda, muito depois. Não havia como prever. Foi um mal silencioso que não conseguimos detetar e que colapsou no pior dos cenários – Naquele momento, senti que me consolava e vi a pena com que me olhava.

— Eu cometi o erro Tsunade – Comecei ainda com voz baixa. Era a verdade – Não estava nas minhas mãos decidir operar, sabia a complexidade da operação! Entrei lá já em pânico! – Sabia que poderia ser honesta, eu precisava de ser honesta, porque ao menos à Tsunade eu devia isso – O médico responsável do caso do paciente chegou ao hospital, ainda estávamos no bloco operatório! E eu tinha tomado o lugar dele! E quando o vi ir embora, perder o resto de vida que lhe pertencia! – Naquele momento, as lágrimas saíram sem que tivesse qualquer força para as impedir – Quando era necessário assumir o MEU erro, para aqueles que aguardavam por Itachi preocupados, fiquei lá, naquela sala, à espera que o tempo voltasse para trás. Não consegui encarar ninguém, como tinha obrigação de fazer…

— Sakura, foi um erro, talvez inevitável para o resultado final, mas tal como disseste, estás a sofrer com as consequências, sejam estas no coração ou na tua própria cabeça – Ouvi atenta enquanto enxugava as lágrimas – Não corrigir os erros que cometemos é o mesmo que estar a cometer novos, por isso, lembra-te, essa dor só vai desaparecer quando a enfrentares, não existem erros imperdoáveis…

Não disse mais nada e Tsunade compreendeu que não era preciso, que mesmo não percebendo totalmente o que me queria dizer com aquilo, iria deixar-me a pensar o suficiente para encontrar o caminho certo no meio daquele pesadelo onde me tinha perdido.

Levantai-me e despedi-me dela agradecendo por tudo o que ela sempre era para mim e, ainda assim, conseguia surpreender-me:

— Tira os dois dias até sábado para resolver este assunto no teu próprio tempo! – Acrescentou imperativa.

— Nã-

— É uma ordem! Tens horas a mais neste hospital! – Mesmo quando tentei dizer que não seria necessário, ela decidiu interromper-me rapidamente e eu simplesmente pude assentir. Não negava a pausa por sentir que era a minha obrigação estar no hospital, mas sim porque no fundo sabia do medo de ter tempo a mais, para pensar demais, para sofrer mais do que se estivesse ocupada no hospital, embora também soubesse que Tsunade tomava a decisão acertada por mim, pois no estado em que estava a minha cabeça, a minha produtividade seria lastimável e recusava-me a ser irresponsável com a vida de mais alguém!

~*~