E os namoradinhos? escrita por Hunter Pri Rosen


Capítulo 7
O fim do acordo


Notas iniciais do capítulo

Hello!

Cheguei com o penúltimo capítulo e a trilha sonora é totalmente Roberto Carlos, socorro!

Boa leitura ♥



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Um namoradinho falso. É isso que Daniel é. Não posso me esquecer do nosso acordo. Estamos confundindo as coisas, nos deixando levar por esse beijo proibido no banheiro, tal como fizemos quando ele chegou aqui em casa e me surpreendeu ao som de Roberto Carlos.

Isso não pode estar certo, estamos brincando com fogo, é perigoso para nós dois. Preciso afastá-lo agora mesmo antes que a coisa vá longe demais.

Mas como afastá-lo se tudo que consigo é suspirar e inclinar mais o pescoço enquanto sua boca distribui uma trilha quente de beijos em minha pele?

Por um momento, imagino exatamente onde a trilha vai parar. Porém, antes que Daniel alcance meus lábios ansiosos de novo, ele mesmo se afasta. Com um nítido esforço e despertando um vazio em mim, mas se afasta.

— O que... estamos fazendo... Marina? — questiona, com a respiração ofegante.

Desnorteada, ajeito o cabelo e o vestido que ele amassou com as mãos um tanto afoitas.

— Isso deve ser... uma atração momentânea — digo sem fôlego, não me importando se é verdade ou mentira. — Nada de mais.

— Ah, com certeza é uma atração. — Ele ri de um jeito óbvio. — Agora nada de mais?

— A gente precisa parar e manter o foco no plano — disparo, convencida por aquela insegurança e pela onda de temor que despertam em mim de novo.

Daniel me encara um tanto surpreso. Ou seria decepcionado?

— Claro, se é o que você quer. Vamos seguir o combinado.

Como assim? Não é o que ele quer também? É impressão minha ou Daniel ficou triste? É impressão minha ou também estou? Será que estraguei tudo? E o que seria esse tudo? O que está acontecendo com a gente?

— E rezar para essa noite acabar logo — Daniel acrescenta, olhando para o espelho com certa amargura enquanto arruma a camisa que, há poucos segundos, puxei para perto de mim com tanto empenho e tanta certeza do que queria.

Droga... Ainda quero.

Sentindo um estranho vazio, mas sem conseguir lutar contra os meus temores idiotas, abro a porta e saio logo depois dele.

Caminhamos num silêncio sepulcral pelo corredor até que sinto sua mão roçando a minha de leve. Surpresa, olho para baixo enquanto Daniel a segura por fim. Com uma força gentil e cheia de calor, levando-me a apertá-la de volta.

Pergunto-me se o gesto faz parte da nossa farsa, já que estamos bem perto da sala agora, se Daniel fez sem perceber ou por que quis. A expressão impassível no seu rosto de perfil não me dá qualquer dica.

— Caramba! Vocês demoraram, hein? — Rodrigo comenta assim que nos vê chegando.

Daniel ri meio culpado e se desculpa com todos já à mesa:

— Foi mal, estamos aqui agora. Que a ceia comece!

Amanda e Beatriz soltam uns risinhos nervosos e patéticos. O restante da família olha para nós dois com certa ternura e admiração. Enquanto sentamos lado a lado, ouço algum deles comentar como fazemos um casal bonito.

Daniel beija minha mão antes de soltá-la com delicadeza. Olha para mim de um jeito indecifrável, mas sinto que para as pessoas ao redor pode parecer um olhar apaixonado porque, embaixo do mistério, há um calor inegável nas íris castanhas travadas em mim. Um calor que não consigo não corresponder. Sorrio inevitavelmente.

Se ele está atuando ou não, sou incapaz de dizer. Mas, com certo pânico, chego à conclusão de que eu pelo menos não estou fingindo.

A pele da minha mão, que foi beijada por Daniel, ainda pinica quando começamos a nos servir.

— Como vocês se conheceram? — tia Verônica pergunta, olhando para nós dois daquele jeito enternecedor e também curioso.

— Naquele Starbucks perto do MASP. — A lembrança me causa nostalgia, embora tenha acontecido há poucos dias. — O André é um amigo em comum e nos apresentou.

— Que clichê e sem graça... — Amanda resmunga baixinho, revirando o arroz à grega.

Daniel endireita a postura de imediato e contrapõe de uma maneira educada e afiada ao mesmo tempo:

— Clichê com certeza, mas de sem graça não teve nada. Você já olhou bem para a sua prima? Se sim, deve imaginar como me senti quando coloquei os olhos nela pela primeira vez. Foi... mágico e muito especial. Eu só conseguia pensar em como tinha tirado a sorte grande.

Claro, porque viu em mim a solução perfeita para sair do Serasa e SPC.

— Com todo o respeito, Dona Lúcia, Seu Alberto, a filha de vocês é uma tremenda gata.

Meus pais riem. Talvez mais a minha mãe do que meu pai, ele fica um pouco enciumado com o comentário surpreendentemente espontâneo de Daniel. Embora ele esteja atuando, meu coração se engana e dispara.

— E quando ela ficou toda nervosinha porque a chamei de Mariana... — Ele ergue as mãos em rendição quando todos arregalam os olhos. — Em minha defesa, foi o nome que escreveram no café dela e o André não tinha nos apresentado ainda. Bom, naquela hora, eu pensei... Nossa, ela fica ainda mais linda assim.

Meu coração acelera mais um pouco, é inevitável e muito bom. Na televisão, o rei canta Proposta. Paro com a colher a meio caminho da boca, esqueci como se mastiga. Só consigo olhar para o rapaz do meu lado e mergulhar em suas mentiras, ao mesmo tempo em que torço para que seja tudo verdade.

Será que Daniel se sentiu atraído por mim desde o começo? Não, sem chance. Sua única preocupação era aquele maldito boleto. Ele até me chamou de linha de crédito!

— Aposto que ela também te achou um gato. — Beatriz suspira e apoia as mãos no rosto, olhando demais para Daniel. — Só uma cega não veria algo tão óbvio.

Algo queima no meu peito. Por baixo da mesa, chuto a canela da assanhada. Minha prima se encolhe e me lança um olhar ferido e confuso. Enquanto isso, Daniel ri alheio ao meu rompante agressivo e responde:

— Na verdade, ela estava esperando um galã de cinema e ficou meio decepcionada quando me viu. Até soltou um comentário sobre isso e eu ouvi sem querer. Foi uma saia justa e tanto, mas eu levei na boa e quebrei o climão com meu bom humor.

Olhares recriminadores me fuzilam enquanto Daniel ri do próprio relato.

— Marina! — meus pais ralham em uníssono.

— Mas você é bem bonito — Amanda deixa escapar, e ganha um chute certeiro também. — Ai... Tudo bem, você não é um galã, mas também não é de se jogar fora.

Mais um chute. Mais forte. Essa sirigaita só pode estar de brincadeira!

Daniel dá de ombros e bebe um pouco de guaraná.

— Sei lá, acho que sua prima me achou comum demais.

Foi exatamente o que achei naquele dia. Cega demais e focada demais na neura pelo namoradinho de mentira. Mas hoje percebo que...

— Caras comuns podem se revelar bem bonitos quando conhecemos mais de perto. Foi assim com você. — Engulo em seco, sentindo a tensão do rapaz ao meu lado se misturar com o meu súbito nervosismo. Sei lá de onde tiro coragem para encarar o seu rosto. — Hoje eu te acho lindo porque... Bom, você é mesmo.

Aquela chama perigosa que vi em Daniel, pouco antes dos dois beijos arrebatadores, volta a crepitar em seus olhos. Ele olha para a minha boca e algo estremece dentro de mim. Será que está pensando em me beijar daquele jeito de novo na frente de todos? Porque eu não ligaria...

Caramba, estou muito confusa! Eu não disse para mantermos o foco no plano? Por que diabos não estou conseguindo seguir meu próprio conselho?

A chama se esvai e dá lugar àquela tristeza que também vi quando o lembrei do nosso plano no banheiro. O maldito plano que Daniel deve resgatar agora e deduzir que eu estou encenando.

Minha vontade é gritar que nunca falei tão sério na vida! Mas antes que eu faça isso, ele torna a pegar minha mão e torna a beijá-la. É nítido que luta para camuflar a decepção quando me encara de novo.

— Sorte a minha que te conquistei, princesa.

Minhas tias e minha mãe suspiram. Meu pai e seus irmãos dão risada. Amanda e Beatriz devem estar olhando para mim com inveja e para Daniel de um jeito inconveniente. Rodrigo finge uma ânsia de vômito.

Penso em pegar a primeira coisa que eu ver na mesa e jogar nele, porém não consigo desviar do olhar de Daniel. Não consigo porque minha mão formiga em resposta ao toque sutil dos seus lábios. Não consigo porque quero que ele entenda que não falei nenhuma mentira.

Ele é mesmo um pão, perfeito do seu jeito comum, lindo de um jeito intrínseco dele, um rapaz divertido e contagiante. E que beija melhor do que todos os galãs de cinema juntos, aposto. De alguma forma, Daniel me conquistou sem que eu percebesse. Mas percebo isso agora, como percebi enquanto o beijava. Como tenho sido idiota e indecisa!

Movida por um impulso, surpreendo-o ao unir nossos lábios de novo. Desta vez, lembro de respeitar as pessoas em volta e me afasto em seguida. Fico deliciada com a onda de calor que, mesmo com um beijo simples, agita cada célula do meu corpo, faz minhas mãos suarem e meu coração dançar uma música muito louca.

Visivelmente confuso — mas nada indiferente ao efeito do meu gesto — Daniel demora a voltar a atenção ao prato.

Não sei o que mais acontece durante a ceia, não presto muito atenção porque simplesmente não consigo. Mas sei que ele rouba todas as atenções e tira a nossa farsa de letra.

De vez em quando, segura a minha mão sobre a mesa e chega a tocar meu rosto algumas vezes em demonstrações naturais de carinho. Surpreendentemente naturais, o que me deixa mais perdida.

Já não sei mais o que é verdade ou mentira na nossa história. Já não sei mais se todas as vezes que conversamos e ficamos perto um do outro era só para construir o romance falso ou se o romance de verdade acontecia enquanto eu me enganava. Não sei se Daniel sente o mesmo que eu e também se enganou enquanto encenava o papel de namoradinho. Não sei o que esperar ou fazer depois dessa noite.

Só sei que Roberto Carlos está cantando Detalhes quando digo a mim mesma que talvez seja melhor seguir com o plano até o final, deixar Daniel sair da minha vida e esquecer as coisas intensas que senti quando nos beijamos.

Nunca tive sorte com relacionamentos, por isso nunca foram para a frente. Vou acabar estragando tudo se decidir alimentar essa maluquice.

Prefiro que Daniel lembre de mim como a sua linha de crédito mesmo. Prefiro que ria dessa história do que decepcioná-lo como já decepcionei e fui decepcionada. Namoro de verdade e Marina Gonçalves não combinam. Mas vou aproveitar como passo o restante do namoro falso.

À meia-noite, depois que todos desejam Feliz Natal, se abraçam e apertam as mãos, enquanto os fogos de artifício iluminam a varanda, avisto Daniel olhando para o céu e vou até ele.

Mal paro ao seu lado e percebo seu corpo retesando. É quase como se ele tivesse sentido minha presença e ficado em alerta. Será que imaginei isso ou exerço mesmo esse efeito nele?

Coloco minha long neck no parapeito, bem perto das suas mãos. Arrisco e repouso a mão sobre uma dele. Está tão quente.

Daniel finalmente olha para mim. Sorri timidamente e se aproxima devagar.

Estou pronta para mais um beijo, afinal era o combinado, mas ele apenas me abraça. Não que seja um simples abraço. Ele parece conter muitas palavras implícitas e me desperta um sentimento de calor reconfortante. Parece tão certo estar nos braços de Daniel assim.

— Você é linda. Por dentro e por fora — diz baixinho e de repente. — Se está solteira, é porque os caras que conheceu até hoje tinham sérios problemas e não te mereciam. Mas você não precisa de nenhum deles para se sentir completa. Já é maravilhosa por si só. Esquece essa pergunta dos namoradinhos, princesa. Você é muito mais que isso.

Fecho os olhos e deixo o perfume de Daniel me inebriar mais uma vez. Não só o perfume, mas o seu cheiro natural que é mil vezes melhor. Aperto-o com mais força e sua resposta é fazer o mesmo.

Tenho vontade de dizer que, na verdade, preciso de um desses caras que conheci sim. Preciso muito.

— Feliz Natal, príncipe — é o que sai, no entanto, num sussurro patético.

Uma risada baixa e rouca o sacode um pouco. Daniel me afasta o suficiente para envolver meu rosto. Pego-me esperando, ansiosa, desejando o beijo. Mas ele não vem. Não onde eu queria pelo menos.

— Feliz Natal, Mariana.

Minha testa ainda está formigando quando ele pisca e se afasta. Passa pela sala, despedindo-se de todo mundo às pressas. Acho que inventa alguma desculpa antes de cruzar a porta, deixando um baque surdo para trás. Na TV, o rei está cantando Falando sério quando meu namoradinho de mentira vai embora.

É o fim do nosso acordo mirabolante. É o fim de tudo. Deu tudo certo. Ainda assim, algo me parece muito errado. Acho que é esse vazio esquisito que fica em seu lugar.


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Notas finais do capítulo

Lembram que quando se conheceram, o Daniel chamou a Marina de Mariana? Pois é, parece que tudo voltou a ser como era antes :-/

Inté o derradeiro capítulo final!