E os namoradinhos? escrita por Hunter Pri Rosen


Capítulo 5
Acordo é acordo, certo?


Notas iniciais do capítulo

Obrigada pelos comentários, gente ♥ Vou responder já já!

Hohoho! Boa leitura e Feliz Natal!



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E chegou o grande dia! O dia que eu mais temia antes ter a brilhante ideia do namoradinho falso. Dia 24 de dezembro, véspera de mais um Natal. O dia em que Daniel vai me livrar da pergunta inconveniente que venho aturando nos últimos anos.

Eu deveria estar mais tranquila, já que encontrei um cara legal que topou fazer o papel e acertamos os detalhes para que tudo siga nos conformes. Entretanto, tão logo abro os olhos de manhã, a ansiedade me revira por dentro. Para minha surpresa, não só ela.

Confusa, sento-me na cama e olho para o celular sobre o criado-mudo. A inexplicável saudade me faz pegá-lo e procurar pelo contato de Daniel no WhatsApp.

Desisto de ligar quando vejo que são apenas seis horas da matina. Ficamos conversando até tarde ontem e provavelmente ele ainda deve estar dormindo. Eu deveria estar fazendo a mesmíssima coisa, aliás.

Levo um susto quando o celular começa a vibrar e tocar Shake it off, a foto do meu namoradinho aparecendo no centro da tela. Fico surpresa ao reconhecer que não é qualquer uma, mas o nosso registro no Ibirapuera. Justamente aquela última foto que tiramos e que nos pareceu tão espontânea e divertida. Especial de alguma forma.

— Quem incomoda? — brinco ao atender, fingindo um bocejo.

— Desculpe... Te acordei?

O tolinho acreditou! A inocência somada ao constrangimento em sua voz me fazem rir.

— Não, às seis da manhã, véspera de Natal, eu costumo pensar sobre teorias da conspiração.

Um breve silêncio seguido por uma risada abafada. Daniel entendeu que estou pagando na mesma moeda algo que ele fez da primeira vez que liguei para ele, numa manhã muito parecida com esta.

Touché, princesa.

Eu não deveria sentir uma palpitação por ouvir o apelido falso, deveria? Mesmo assim, sinto.

— Dormiu bem? — pergunto, a fim de acalmar o comportamento esquisito do meu coração.

— Na verdade, não, acordei toda hora pensando em você. — Boquiaberta, ouço Daniel se apressar para corrigir logo depois: — Digo, no plano! Em você em consequência do plano, entendeu? Só isso.

É impressão minha ou ele parece subitamente nervoso? É impressão minha ou eu gostei mais da sentença inicial?

Zonza, limito-me a anuir:

— Claro. Eu também fiquei pensando nisso. Acordei toda hora...

Demonstrando a mesma pressa, Daniel acrescenta:

— E foi de pensar no plano que eu me dei conta de um furo nele. Uma coisa que passou batido, Marina...

Fico tensa de imediato. Simplesmente não pode ser! Nós pensamos em cada detalhe, acertamos tudo, combinamos a história muito bem, espalhamos nosso “amor” pelas redes sociais para não levantar suspeitas, está tudo dentro do esperado, tudo caminhando para a encenação perfeita.

Daniel não parece estar brincando, no entanto, então será que nos enganamos? O que foi que esquecemos?

Estou prestes a perguntar isso e pedir que desembuche de uma vez, mas ele se adianta:

— Eu vou direto ao ponto, mas é meio constrangedor, então se prepara e não me leve a mal. — Ouço quando ele respira fundo do outro lado e isso me deixa ainda mais apreensiva. — Demonstrações de carinho, princesa. Como vamos nos comportar na frente da sua família?

Demoro mais do que seria o normal para entender o que Daniel quis dizer com isso. Quando assimilo a mensagem, sinto aquela palpitação imprópria de novo junto com uma epifania. Ele tem razão! Esquecemos de um detalhe! O plano tem mesmo um furo. Um furo e tanto, essa não!

De nada adianta apresentá-lo como meu namoradinho, temos que parecer um casal natural. Se não mostrarmos qualquer contato físico na frente da parentada chata, tenho certeza que vão desconfiar. Talvez não desconfiem da farsa em si, mas desconfiem que não estamos tão apaixonados um pelo o outro.

Tentando pensar claramente, me levanto da cama e caminho em círculos. Começo a roer o cantinho de uma unha. Só paro para romper o pesado silêncio da ligação:

— Não é porque somos namorados... de mentirinha, claro, que precisamos nos agarrar na frente das pessoas sem nenhum pudor. Aliás, eu odeio quando os casais fazem isso, é constrangedor e deselegante. Por que não procuram um quarto logo?

— Eu não estou falando de dar uns amassos explícitos, mas você não acha estranho que a gente mal se encoste durante a ceia inteirinha?

Sim, acho muito estranho e com certeza levantaria suspeitas. Passaríamos a imagem de um casal frio? Em crise? Que não se ama de verdade?

Não quero que minha família acredite apenas que estou namorando, mas que saibam que eu estou muito feliz com Daniel. Ao pensar sobre isso, me dou conta que tenho sido mesmo muito feliz nos últimos dias...

— Marina, eu não quero tirar proveito da situação, nem que você entre em pânico, mas nós precisamos combinar isso direito. Eu preciso que você me diga exatamente o que posso ou não fazer essa noite.

Há algo implícito nas palavras de Daniel. Algo que me faz despencar sentada na cama com o coração mais disparado do que nunca.

— Eu não quero que a sua família descubra a verdade e isso arruíne tudo...

As batidas urgentes no meu peito perdem força quando lembro do que está em jogo para Daniel. Do que ele fez questão de deixar claro desde o começo e agora pelo visto. O calor no meu corpo dá lugar a um gelo glacial.

— Não se preocupe, você vai receber o pagamento no final de qualquer jeito — esclareço entredentes. — Acordo é acordo. Eu mantenho a minha parte, mesmo que a sua dê errado.

Daniel soa estranhamente ofendido e um tanto surpreso quando retruca:

— Você acha que é com isso que eu tô preocupado? Com o dinheiro?

O gelo glacial dá lugar a uma raiva primitiva. Não sei por que fico tão chateada com algo que não é novidade. Minha relação com Daniel é uma relação de negócios, de troca de favores com uma remuneração no final.

— Não foi por isso que você aceitou me ajudar? Pelo dinheiro?

Ele fica em silêncio e, por um instante, penso até que a ligação pode ter caído ou sido encerrada. Então, ouço sua respiração de novo e acho que ele vai explodir a qualquer momento. Mas Daniel soa calmo — ou seria triste? — quando se pronuncia de novo:

— No começo, sim. Eu não vou mentir, a grana será bem-vinda e foi o que me fez topar te ajudar no início. Mas não é só por ela que eu tô fazendo esse papel ridículo.

A raiva dá lugar à uma curiosidade irresistível. Ajeito-me melhor e pergunto com a voz mais mansa:

— Então é por quê?

— Me incomoda o que vão pensar de você se isso der errado.

A curiosidade inflama dentro de mim. Meu coração volta a bater depressa. Daniel está preocupado com o que vão pensar de mim? Que eu vire motivo de piada por todos os Natais seguintes?

— Por quê?

Ele demora um pouco para responder e, quando responde, soa muito enigmático e ainda ofendido:

— Se você precisa mesmo perguntar, é sinal de que não importa. Deixa pra lá, eu devo ter imaginado que... Esquece. Vamos manter o foco no plano?

O lógico seria manter o foco no plano, mas uma parte de mim se recusa a fazer isso agora. Essa parte só quer voltar ao tópico anterior e descobrir se há algo acontecendo nas entrelinhas.

— O que não importa? O que você imaginou? Como assim? O que você está tentan...

No entanto, Daniel demonstra que não concorda com essa parte de mim, já que me interrompe um tanto seco:

— Eu vou ser prático e direto. Posso te abraçar na frente da sua família?

— Pode.

Será que respondi rápido demais? Nem pestanejei? A respiração dele ficou fora de ritmo ou foi um chiado na linha?

— E segurar sua mão? — pergunta, com um tom de voz mais suave. — Fazer carinho nela, enroscar seus dedos com os meus, esse tipo de coisa?

— Sem problemas.

Eu vou adorar. Perceber isso faz aquela palpitação despertar de novo e meu estômago afunda numa onda de calor.

— Eu posso... Eu devo... Você permite que eu...

Por que Daniel está gaguejando? Não combina com ele. Definitivamente, está bem sem graça e não sabe como fazer a tal pergunta. Não demora muito para que eu deduza do que se trata e o ajude com isso:

— Que você me beije? Sim. — Minhas mãos estão suando e meu rosto queima como se eu estivesse embaixo do Sol ao meio-dia. Apresso-me em fingir que não estou tensa e emendo em tom explicativo: — Namorados de verdade se beijam, né? Precisamos convencer todo mundo que somos isso, então sim.

Daniel solta a respiração. Por que ele estava prendendo-a?

— Não se preocupe, não será um beijo ousado do tipo desentupidor de pia. Será respeitoso.

E por que parece triste de novo quando diz isso?

— Respeitoso tipo... técnico e frio?

E por que diabos pergunto uma coisa dessas? Por acaso estou a fim de um beijo real e quente?

— Marina.

Um arrepio desconcertante eriça minha pele quando ouço meu nome na voz de Daniel. Porque há algo no seu tom que não parece uma bronca, mas um apelo. Se não fosse loucura, eu chutaria que ele está implorando para eu não provocá-lo assim. Acho que ele está certo, é melhor não brincar com fogo.

— Respeitoso está ótimo.

Ficamos em silêncio por alguns instantes. Consigo até ouvir vozes no andar de baixo. Meus dois tios chegaram com suas esposas ontem no fim da tarde, trazendo três primos mais velhos que eu a tiracolo. Por sorte, consegui mantê-los longe do meu quarto. Uma parte está amontoada pela sala, outra num quarto vago e espaçoso perto dela. Pelo visto, acabaram de acordar.

— Ok, serão dois beijos, tudo bem? — Daniel retoma, trazendo o meu foco de volta. — Um quando eu chegar e apenas se a sua família estiver na sala, outro na despedida. Suficiente?

— E um a meia-noite — sugiro, sem perceber. — De Feliz Natal, ué...

Quero me convencer de que só propus isso porque seria estranho desejarmos Feliz Natal um para o outro com um simples abraço, mas a verdade é que... a ideia de beijar Daniel três vezes ao invés de duas me parece tentadora. Definitivamente, não sei mais o que está rolando aqui.

— Três então — ele assente com a voz um tanto sufocada. Para minha surpresa, alfineta logo depois: — Negócio fechado? Relaxa que eu não vou cobrar nada mais por isso. Acordo é acordo, certo?

— Daniel! — ralho, indignada.

— Te vejo à noite, princesa. Preciso desligar agora — avisa de um jeito mais polido.

E antes que eu diga qualquer coisa para mantê-lo na linha, meu namoradinho de mentira desliga.

Sozinha na penumbra parcial do quarto, com o celular em mãos, olhando para a foto do seu contato, relembrando o momento exato do registro e como eu me senti naturalmente feliz e bem naquela hora, um pensamento martela na minha cabeça. Um desejo ou uma possibilidade, não sei ao certo.

Eis a possibilidade: Daniel como meu namorado de verdade.

Quando o conheci, apenas há alguns dias, essa ideia nem passaria pela minha cabeça ou, se surgisse, me arrancaria uma boa gargalhada. Mas hoje...

Definitivamente, não sei mais o que está rolando comigo. Ou com ele. Está rolando alguma coisa entre nós além do plano? Foi isso que Daniel insinuou antes e depois alegou que foi imaginação? Foi imaginação? Imaginamos juntos então? Que diabos!

Antes que eu enlouqueça de tantas perguntas, largo o celular sobre a cama e vou me arrastando até o banheiro. Um banho quentinho será ótimo para varrer essa maluquice toda da minha cabeça. Porque é exatamente isso: Maluquice.


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Notas finais do capítulo

Maluquice = aí tem coisa.