E os namoradinhos? escrita por Hunter Pri Rosen


Capítulo 4
Parece até um casal de verdade




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Quem diria? O tal Daniel está saindo melhor do que a encomenda. Nosso piquenique no Ibira acaba se mostrando bem divertido, a manhã está sendo bem agradável e é muito legal conhecer melhor o meu namoradinho fajuto. Talvez, quando a farsa acabar, nós possamos ser amigos. No momento, tudo o que sei é que seria uma pena perder o contato com ele. É um cara bacana no fim das contas e o seu senso de humor afiado tem certo charme.

Enquanto o dito cujo atualiza o status de relacionamento no Facebook sob meu pedido, me dou conta que estou olhando demais para ele. Em minha defesa, a luz do Sol realçou o tom castanho do seu cabelo e achei... meio bonito.

Afasto esse pensamento e pego meu celular na bolsa. Abro a rede social e checo as notificações. Para todos os efeitos, somos um casal, então para que todos se convençam disso é melhor expor para Deus e o mundo antes do Natal.

— Muito bem. — Finjo um suspiro ao ver o status atual. — Daniel Rodrigues está em um relacionamento sério com Marina Gonçalves. Você é um cara de muita sorte, sabia?

— E você é muito doida. — Ele ri, sacudindo um pouco os ombros. — Que tal uma foto?

Antes que eu assimile a proposta, Daniel se aproxima de mim, encosta o corpo no meu — me causando um calor engraçado e... bom? — e abre a câmera do smartphone junto com um largo sorriso.

Faço um esforço para retomar o foco e encarno o papel, aninhando a cabeça no seu ombro e sorrindo do jeito mais apaixonado que imagino que as pessoas sorriem nessas horas.

Daniel ainda propõe mais duas fotos depois. Uma com nós dois fazendo um coraçãozinho com as mãos. Outra das nossas mãos entrelaçadas junto à toalha quadriculada do piquenique. Sinto aquele calor impróprio de novo quando minha pele encosta na dele.

Enquanto ele posta tudo imediatamente e faz as marcações em todas as redes sociais possíveis, me pego olhando para o seu rosto de perfil. Não tinha reparado quando o conheci naquele Starbucks, mas até que Daniel é bem bonitinho. Não no sentido de feio arrumadinho, longe disso. Tem algo nele que o torna bonito e só agora notei. Uma beleza natural e acolhedora.

— O que está olhando?

Ah, não... Ele me pegou no flagra! Será que eu olhei demais? Por que diabos fiquei olhando? Será que babei? Não! Minha boca está bem seca...

Estranhamente nervosa, disfarço como posso:

— Nada! Digo... É que eu quero tirar uma foto também.

Daniel estreita o olhar e um leve sorriso brinca em seu rosto.

— Tudo bem. E o que eu tenho que fazer?

Penso rápido.

— Encosta a testa na minha.

Eu podia ter pensado melhor, mas agora não posso voltar atrás na sugestão. Posso?

— O quê...

— Encosta a testa na minha, príncipe — reforço, sorrindo para ele do jeito mais descompromissado que consigo, tentando convencê-lo de que não tem nada demais nisso, tentando convencer a mim mesma. — Vem logo, eu não mordo.

Daniel hesita e, por um momento, acho que ele também está exalando algum nervosismo misterioso. Seja impressão minha ou não, ele assente com um meneio de cabeça depois e se aproxima. Com cuidado, faz exatamente o que eu pedi.

Não sei dizer o que sinto quando a pele quentinha roça a minha testa e se apoia nela suavemente, só sei que me arrependo da sugestão porque isso exige um contato visual contínuo. E constrangedor. Ainda assim, muito bom. Os olhos de Daniel são castanhos, mas têm uma borda meio esverdeada...

— Vai tirar a foto ou não? — Daniel sorri, visivelmente confuso com a demora.

A foto! Esqueci da foto! Acho que estou meio confusa também. Ou com Alzheimer. Engulo em seco e tateio a toalha em busca do celular. Esbarro em alguma coisa enquanto procuro. Dedos macios como o rosto junto ao meu.

Teria sido bem mais fácil me afastar por um instante para pegar o aparelho e acionar a câmera com calma, porém além de confusa e com Alzheimer, estou agindo com incoerência ao que parece. É Daniel quem acaba resolvendo a situação, segurando o celular junto comigo, posicionando-o numa boa altura e voltando a unir nossos rostos logo depois.

— Pronto, princesa. Quando você quiser.

O comentário me arranca uma risada fácil, dissipando a tensão esquisita em mim e contagiando meu namoradinho de mentira que sorri em resposta. Em algum segundo desse momento em que nos encaramos aos risos, aperto a tela e ouço o clique da foto sendo registrada com sucesso. Então olhamos para ela ao mesmo tempo e tenho que dizer...

— A gente parece um casal de verdade.

Minhas bochechas pinicam. Ardem. Queimam. Daniel não diz nada pelos longos segundos que se estendem. Só escuto as garças do parque fazendo um escarcéu no lago à frente. Quando finalmente crio coragem para olhar para Daniel de novo, meu coração palpita diante do olhar indecifrável que encontro.

— Parecemos mesmo.

Uma mecha do meu cabelo se move em meio a brisa que corta o curto espaço nos separando. Daniel a coloca atrás da minha orelha e demora para afastar a mão. O indicador desliza suavemente pelo meu rosto até o queixo, me causando um arrepio gostoso.

— Sabe de uma coisa? Não é sacrifício nenhum fingir que sou seu namorado. Eu faria esse papel até de graça.

Arqueio as sobrancelhas e recuo um pouco, buscando uma distância segura. Não sei por que a proximidade me pareceu meio... perigosa.

— Sério?

Ele balança a cabeça e faz uma careta culpada.

— Não, desculpe, eu preciso mesmo da grana.

— Idiota. — Dou um cutucão em suas costelas, arrancando-lhe um gemido de protesto enquanto não resisto a mais uma risada espontânea.

Levanto-me do gramado enquanto digo a mim mesma que não fiquei chateada com o comentário. Daniel é minha farsa, está prestando um serviço porque precisa dar um jeito na vida financeira. Por isso e apenas por isso topou me ajudar. Não tem nada de diferente acontecendo aqui. Só estávamos brincando e nos conhecendo melhor pela farsa. Tudo por ela.

Portanto, é melhor varrer minha imaginação para debaixo do tapete, parar de sentir certas coisas e manter o foco.

— Eu preciso voltar pra casa.

Daniel se coloca de pé um segundo depois.

— Eu te levo. De ônibus. Nesse caso, te faço companhia é melhor.

— Não precisa...

Por algum motivo que prefiro não desvendar, não me parece uma boa ideia passarmos mais tempo juntos. Só quero encerrar esse encontro... Digo, esse piquenique que, definitivamente, não foi um encontro, mas sim uma reunião de negócios.

Infelizmente, Daniel não demonstra concordar comigo sobre pararmos por aqui e insiste:

— Eu faço questão. Além disso, tenho que decorar o caminho. A ceia de Natal será lá, certo?

Em pleno século 21, com tantos aplicativos, Google Maps e facilidades para se locomover, o argumento me soa meio fraco. Daniel é um rapaz inteligente e tenho certeza que não teria dificuldade em chegar na minha casa, se eu lhe passasse o endereço no dia 24 mesmo. Entretanto, ele parece tão resoluto em me acompanhar e eu não quero ser grossa insistindo em dispensá-lo, então... talvez não tenha problema passarmos mais um tempinho juntos.

— Ok, sem problemas.

Ele brinca, fazendo uma reverência, e ajeita a toalha dentro da mochila.

Coloco o lixo numa sacolinha e jogo na primeira lixeira que vejo enquanto caminhamos rumo à saída do parque em um silêncio um tanto desconfortável.

Por sorte, Daniel puxa assunto um pouco depois, me fazendo mais perguntas pessoais para não cometer nenhum deslize na frente da minha família e a tensão entre nós se dissipa. Enquanto permito que ele me acompanhe até em casa, tudo o que faço é enchê-lo de perguntas também, rir de algumas respostas, disparar comentários afiados e aproveitar a sua companhia.

Admito, é uma ótima companhia. Em nada lembra o garoto meio idiota que me conheceu naquele Starbucks e foi atirando um boleto no meu colo sem cerimônia.

Não querendo me sentir a última Coca-Cola no deserto, mas Daniel também parece apreciar bastante a minha companhia. Pego-o olhando para mim várias vezes no percurso. Olhando com atenção, com um interesse natural mas que beira um distraído fascínio. Em alguns momentos, com um calor enternecedor.

Bom, como Daniel mesmo disse no parque, acho que não está sendo um sacrifício para ele fingir que é meu namorado. Falando por mim, estou gostando bastante do workshop para o meu papel ao seu lado. Posso não ter dado sorte com o sexo oposto, com namorados de verdade, mas posso afirmar que encontrei o namoradinho de mentira perfeito e que vou me empenhar bastante para ficar à sua altura.

Juntos, ganharemos esse Oscar para o Brasil!

Não nego que nos dias seguintes, antes da fatídica ceia natalina, marcamos de nos encontrar mais algumas vezes. E, quando não nos vemos, nos falamos pelo WhasApp até de madrugada sobre tudo e qualquer coisa.

Queria dizer que é só pela farsa, porém não sei se rir — até a barriga doer — dos comentários das nossas fotos e à atualização do nosso status de relacionamento se enquadra nisso. Tampouco se comentar as séries em tempo real e compartilhar memes um com o outro estão inclusos no workshop do falso namoro.

Só sei que gosto de conversar com Daniel. Cada vez mais. De rir com ele. E de como ele me olha muito sério às vezes. Sempre acabo ficando arrepiada e quente ao mesmo tempo. É um calor que me estremece. E um frio que arde.

Eu sei, não faz o menor sentido.


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