E os namoradinhos? escrita por Hunter Pri Rosen


Capítulo 3
Apelidos carinhosos


Notas iniciais do capítulo

Oieee!

Terceiro capítulo chegando!

Desculpem se eu tô atualizando muito rápido hahahahahh Mas é que o prazo termina dia 31/12 e não quero postar tudo num dia só.

A propósito, a fic ia ter de 5 a 6 capítulos, mas pelas minhas contas terá 7. No momento, estou escrevendo o 6 hihihihihih

Boa leitura ♥



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A uma semana do Natal, a ansiedade começa a me perturbar sem dó ou piedade. Junto com ela, o receio de que algo dê muito errado, que o plano vá por água abaixo e que, de alguma forma, minha família descubra que meu namoradinho perfeito é, na verdade, um namoradinho de mentira.

Aliás, a que ponto cheguei, meu Deus! Pagando para um desconhecido interpretar esse papel na frente de todos! É muito humilhante!

Bom, sejamos realistas. Como a alternativa é muito pior, está diretamente ligada a temível pergunta que quero evitar ao menos esse ano e agora é tarde demais para voltar atrás e desmentir a história de que estou perdidamente apaixonada pelo cara perfeito, afasto esse momento de fraqueza para debaixo do tapete e inspiro profundamente.

Inquieta, viro-me pela cama em busca de uma posição confortável. Não consigo encontrá-la de jeito nenhum, tampouco o sono que me faria relaxar ao menos um pouco.

Os primeiros raios de sol já desenham sombras engraçadas pelo quarto, quando desisto de vez e tenho uma ideia brilhante. Sem pensar duas vezes, procuro meu celular apalpando o criado-mudo. No fim, foi bom Daniel ter me adicionado no WhatsApp quando nos conhecemos.

Ele atende alguns toques depois, a voz enrouquecida pelo sono:

— Quem incomoda?

Oops! Esqueci do horário, está um pouco cedo para fazer ligações. Mas agora que já liguei mesmo...

— Oi. Te acordei?

Ele suspira pesadamente do outro lado, demora para responder e, quando finalmente faz isso, exala ironia:

— Claro que não, imagina. Às seis da manhã, de um domingo, eu costumo pensar sobre teorias da conspiração.

Rio um pouco sem jeito, amassando a ponta do lençol entre os dedos.

— Nossa... Parece que alguém acorda de mau humor.

— Quando me acordam antes da hora, sim.

Minhas bochechas queimam e me sinto uma tremenda idiota. Uma idiota inconveniente e mal-educada. Onde eu estava com a cabeça quando decidi ligar assim? De repente e tão cedo para alguém que mal conheço?

— Desculpe, nos falamos outra hora — lamento apressada, prestes a desligar e procurar um buraco para me esconder.

O celular já está longe do meu ouvido quando a voz de Daniel se eleva repentinamente:

— Espera! Não desliga! Eu tô brincando!

Trago o aparelho de volta.

— Ok, estou bem aqui.

O silêncio do outro lado da linha me faz questionar se Daniel ainda está também ou se voltou a dormir. Demora longos instantes até que ele solta a respiração e dá sinal de vida de novo:

— Foi mal, Marina.

Seria essa a primeira vez que Daniel disse meu nome corretamente? Sim. E, sei lá por que, gosto de ouvir como soa na sua voz.

— Eu não quis ser grosseiro. Acordando cedo ou não, eu sou uma peste insuportável. Só fico socializável depois de uma caneca bem cheia de café.

A confissão honesta me faz sorrir, muito embora ele não possa me ver agora.

— O que manda? — pergunta depois de uma pausa, fazendo um claro esforço para não soar rude. Antes que eu abra a boca para responder, no entanto, ele se precipita: — Ah, não... Não me diga que mudou de ideia sobre o nosso acordo? Eu tô precisando muito daquela grana, Marina...

— Jesus! Você só pensa no dinheiro? — Apesar do tom de bronca, não consigo conter uma risada. O desespero de um devedor pode ser muito engraçado, quem diria.

— Claro! Isso não é segredo, você sabe que eu estou enrascado financeiramente. Eu fiz questão de abrir minha situação quando negociamos o trato. E mesmo assim você não se sensibilizou o suficiente, lembra?

— E lá vamos nós... — Respiro profundamente e conto até dez. — Relaxa, garoto. Eu não desisti de nada. Os 75%, tudo que eu posso te dar, estão garantidos.

Daniel expira com tangível alívio.

— Ufa, ainda bem. Folgo em saber que você é uma garota de palavra. Então... o que te fez ligar pra mim a essa hora?

De repente, me vejo meio sem graça em expor a tal ideia. Penso em desconversar, inventar uma desculpa para encerrar a ligação e pensar melhor. Mas, ao olhar para o calendário em cima da cômoda, alguns passos à frente da cama, volto a temer a proximidade do Natal e me convenço que não tenho escolha. A princípio, eu até pensei que só apresentar o Daniel durante a ceia seria o bastante, mas fui muito inocente. É óbvio que precisamos construir uma base sólida para a farsa. E só tem um jeito de fazer isso.

— Sentiu saudade? — ele me traz de volta à realidade com a brincadeira.

Decido ir direto ao ponto e seja lá o que Deus quiser:

— Eu estava pensando que seria uma boa ideia... estreitar os nossos laços. No sentido profissional do acordo, é claro.  — Amasso o lençol com mais ansiedade. — Nós precisamos convencer como casal, entende? Só que tudo o que eu sei é que você está devendo os rins na praça. Ah! E que é de Exatas. E tudo o que você sabe sobre mim é que eu sou de Humanas e...

— E está com medo de ser taxada de encalhada por mais um Natal, desesperada para não fazer feio na frente da família e ter a autoestima arrastada na sarjeta.

Por que Daniel tem que ser tão direto?

— Algo assim — murmuro a contragosto. — Taxada de encalhada, não que eu esteja encalhada de verdade.

— Claro, entendi.

O tom de deboche não me passa despercebido, mas procuro manter a classe e o profissionalismo, afinal estamos tratando de negócios cujo resultado será ótimo para ambos.

— Acontece que para não levantar suspeitas sobre a farsa, a gente precisa se conhecer melhor. E também combinar a nossa história de amor direitinho, para não ter erro nem furos, sabe? Como nos conhecemos, como nos apaixonamos, os apelidos carinhosos que usamos um com o outro...

— Apelidos carinhosos? — Daniel me interrompe, exalando divertimento. Acho até que está prestes a gargalhar. — Você não acha que isso é um pouco demais?

— Nada constrangedor, não se preocupe — faço questão de esclarecer. — É que usar os nossos nomes o tempo todo pode soar artificial.

— Okay... — Ele fica em silêncio por alguns segundos, acho que ponderando a ideia. No fim, deve perceber que tenho razão pois diz animado: — Já sei! Posso te chamar de raio de sol?

Fecho os olhos por um momento.

Raio de sol é péssimo.

Linda?

— Muito genérico.

Tosinha?

— Que isso?

— Acho que é diminutivo de gostosi...

Meu rosto arde e me apresso em cortar a sentença antes que seja tarde demais:

— Nem pensar!

Daniel ri do meu embaraço.

— Que tal mozão?

— Deprimente.

Princesa?

Abro a boca para dispensar mais uma sugestão, mas hesito ao me dar conta de que...

— Eu gosto de princesa.

— Também gosto, combina com você.

Sinto que Daniel disse isso sem perceber. E, pode ser impressão minha, mas ouço algo parecido com um engasgo logo depois. Será que ele ficou sem graça com o próprio comentário?

— Ai que fofo, príncipe!

— Ei, quem disse que você pode me chamar disso aí? — questiona, recuperando-se do estranho constrangimento e ficando meio na defensiva.

— Você está mais para um ogro mercenário, é verdade — provoco. — Mas se eu sou a princesa, nada mais lógico que você seja o meu príncipe. Portanto, príncipe será — determino, sem lhe dar qualquer brecha para oposição.

Aceitando o apelido, Daniel limita-se a resmungar baixinho:

— Que seja. Pelo visto é você quem manda nessa relação de mentirinha.

— Pelo visto você aprende rápido.

— Estou começando a odiar esse plano.

— Eu também não estou feliz, mas tempos desesperados...

— Exigem medidas desesperadas — ele completa meu raciocínio, e eu imagino que tenha lembrado do dinheiro mais que bem-vindo que cairá na sua conta corrente depois do Natal. — Onde quer me encontrar?

Pega de surpresa, a única coisa que sai da minha garganta é um sufocado:

— Quê?

Como se a resposta fosse óbvia, Daniel explica com muita praticidade:

— Se vamos combinar a nossa história de amor, não é legal definir tudo por telefone. Soa muito artificial, você não acha? Além disso, podemos levar horas debatendo os detalhes. Quer caminhar no Ibira?

O convite vem tão rápido e direto que não me dou ao luxo de pensar sobre ele, simplesmente me ouço respondendo no susto:

— Quero.

— Daqui a duas horas? Em frente a Oca?

É impressão minha ou Daniel ficou subitamente animado? Nem sinal do mau humor de antes. Que esquisito...

Quer saber? Não importa. Com certeza, ele só está prezando pelo papel convincente como namoradinho fajuto que deverá desempenhar. Deve ter medo que eu não cumpra com o pagamento no final se algo der errado, se minha família desconfiar, se não estivermos bem alinhados no discurso apaixonado durante a ceia de Natal, essas coisas que também estão me deixando apreensiva.

— Te encontro lá, príncipe.

— Mal posso esperar, princesa.

Ele desliga e eu percebo que estou sorrindo de um jeito meio bobo. No fim das contas, até que esse garoto é bem divertido. Vou sentir falta dele quando a farsa acabar.

***

Depois de um banho rápido, coloco um vestido leve e confortável, condizente com o verão dos infernos que assola o Brasil nessa época do ano. Por sorte, em comparação com os últimos dias, hoje o clima está um pouco mais ameno e a máxima não deve passar de 26 graus. Mesmo assim, espero pegar um ônibus com ar condicionado até o parque ou chegarei lá suando feito uma porca.

Pé ante pé, desço a escada e dou uma olhada na sala. Nem sinal dos meus pais, eles costumam ir à missa aos domingos pela manhã. Dona Lúcia e Seu Alberto são professores há mais de vinte anos e trabalham na mesma escola, na Aclimação. Ela leciona Língua Portuguesa; ele, História.

Não é à toa que a área de Humanas me seduziu logo de cara e escolhi cursar Letras. A diferença é que não quero me tornar professora, mas trabalhar com revisão e traduções em uma boa editora. Ano que vem, começo mais um semestre e, até agora, estou amando tudo que aprendi.

Depois de uma rápida passada na cozinha, só para engolir o café da manhã, escovo os dentes rapidinho e corro para o ponto de ônibus.

Graças a Deus, o ônibus tinha ar condicionado. Mesmo sendo um domingo de férias, o trânsito estava um pouco complicado porque muita gente ainda está fazendo as compras de Natal, mas consigo chegar no Ibira só dez minutinhos atrasada.

Logo avisto Daniel, embaixo de uma árvore perto da Oca, distraído enquanto mexe no celular, uma mochila nas costas e os fones encaixados nos ouvidos. À medida em que venço nossa distância com alguns passos, me dou conta de algo que me deixa estranhamente nervosa. Não sei como abordá-lo.

Pode parecer bobo, talvez seja mesmo, mas o que devo fazer quando parar na frente dele? Um aperto de mão é muito formal. Acenar e evitar contato físico me parece muito antipático. O natural seria dar um beijinho rápido no seu rosto, mas, sei lá por que cargas d’água, fico bem sem graça ao pensar nisso. Talvez porque não somos amigos de verdade, talvez porque ele é meu namoradinho de mentira, talvez porque estou sendo idiota mesmo.

Quando estou a um passo de alcançá-lo, Daniel finalmente percebe minha presença. Não sei se foi impressão minha, mas acho que ele me mediu da cabeça aos pés por um rápido instante. Depois, abre um sorriso largo, arranca os fones e me alcança com os braços.

— Princesa! — Ele me envolve num abraço caloroso demais para o meu gosto, e eu me pego concentrada no seu perfume. É bom, aliás. Depois, dá um beijo no meu rosto e por fim me solta. — Tudo bem? Por que suas bochechas estão coradas?

— Deve ser o calor — respondo depressa, desamassando o vestido e tentando entender por que fiquei vermelha. Claro, eu não estava esperando tanta empolgação. É impossível prever esse garoto...

— Engraçado, hoje até que está mais fresquinho. Será que chove? — Ele olha para o céu, analisando o tempo. Depois, torna a se concentrar em mim. — Ah, desculpa pelo abraço. Foi demais? É que eu fiquei tão feliz de te ver.

— Ficou?

E por que eu estou feliz por ter ouvido isso? Foi só um comentário aleatório e sem importância. Certo?

— Não é só por ter lembrado da grana, juro. — Ele ri, erguendo as mãos em rendição, e eu reviro os olhos desapontada, mas não surpresa. — É que eu estava cansado de esperar.

Trinco os dentes.

— Eu só atrasei dez minutos.

— Nunca são dez minutos para um homem.

Respiro fundo, sorrio forçado para ele e decido recomeçar com toda a calma e praticidade do mundo:

— Ok, então não vamos perder mais tempo, príncipe. Aonde você quer ir pra gente conversar?

Daniel me surpreende mais uma vez, passando um braço em volta dos meus ombros e me levando a caminhar ao seu lado.

— Eu sei que falei em andar pelo parque, mas antes a gente podia comer algo. Eu trouxe umas coisas de casa, já que por aqui é tudo tão caro e eu...

— Está na pindaíba, tô sabendo.

— Exato. Que tal um piquenique?

— Eu já tomei café, obrigada.

Daniel dá de ombros.

— Tudo bem, sobra mais pra mim.

Uma risada me escapa e não resisto em cutucá-lo:

— Você não tem nada de príncipe, sabia?

Ele olha para mim com um canto da boca levemente arqueado. Por um momento, acho que vai pagar na mesma moeda. Ao invés disso, hesita e me encara por algum tempo antes de dizer:

— Foi mal. Prometo que não vou fazer feio na frente da sua família. Vou valer cada centavo. Serei um gentleman! Muito educado! E o melhor namoradinho falso que você já teve na vida.

A promessa final me faz rir — e também reacende aquele calor esquisito no meu rosto.

Disfarço, olhando para baixo, observando nossos pares de All Star andando em sincronia pela grama. Como não sei o que falar — e isso me deixa um pouco assustada porque geralmente eu sempre sei — decido que é hora de colocar em prática o que nos trouxe até aqui. Preciso saber tudo sobre Daniel ou, pelo menos, uma boa parte.

— Qual curso você faz?

— Sistemas de informação, indo para o último ano. E você?

— Letras, indo para o terceiro ano. Trabalho numa gráfica por enquanto e graças a Deus estou de férias.

— No momento, desempregado, ferrado e à procura de uma boa oportunidade na minha área. Signo?

— Gêmeos.

— Que bom, acho que combina com Escorpião.

— Escorpião é o pior signo do zodíaco — acuso, aos risos.

— Em alguns pontos, talvez. Mas nós somos excelentes amantes. Uma pena que esse namoro é de mentirinha ou você poderia saber do que estou falando.

Daniel me lança um sorriso travesso. Respondo com um cutucão em suas costelas, disposta a não permitir que ele me deixe sem graça de novo, e corrijo:

Ainda bem que esse namoro é de mentirinha.

Ele dá de ombros e faz mais perguntas. Também faço as minhas. Rimos de algumas respostas até chegarmos ao lago. Daniel tem uma irmã mais velha e os pais se divorciaram há cinco anos. Durante as férias, ele reveza a estadia na casa de cada um. Durante as aulas, fica numa república na USP. Para passar o tempo, gosta de games, filmes, séries, livros e HQs. Fico feliz que nossos gostos sejam parecidos, só não sei por que, já que não importa muito.

A uma distância da margem, ele estende uma toalha que tirou da mochila e ajeita as guloseimas que trouxe de casa sobre ela. Sei que eu disse que não estava com fome, mas acabo afanando um bolinho Ana Maria porque amo demais o de baunilha. Também bebo goles generosos de Coca-Cola.

Sentada de frente para Daniel, lembro a mim mesma que estamos aqui única e exclusivamente pelo bem da farsa, embora não nego que estou me divertindo bastante com o rumo da conversa. Também digo a mim mesma que estou no controle da situação e que muito em breve não precisarei falar com ele ou vê-lo mais. Depois do Natal, nosso acordo chegará ao fim e voltaremos a ser dois estranhos um para o outro.

O engraçado é que esse último pensamento não me causa alívio. Ao contrário, me desperta certa... Seria tristeza?


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Notas finais do capítulo

Ibira = abreviação do paulistano para Parque do Ibirapuera kkkkkkkkk