Do amor ao oceano escrita por Miss Koroleva


Capítulo 6
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"Caminhava a passos lentos,quase flutuando sob a ponte que cruzava o oceano. O céu, parcialmente obscuro pela noite,carregado de estrelas iluminando seu caminho,pareciam preenchê-la de fulgor. Muito acima de onde estava,duas baleias,feitas de poeira estelar, saltavam pelos céus,como numa brincadeira divertida. Quando caíram sob algo que ela não podia ver, um brilho dourado voou para cima de si e,tão rápido quando pôde imaginar, foi dissipado pelo vento, dançando em formas alegóricas e vivazes.

Sentia seu corpo vibrar com a energia,seus pés descalços movimentarem-se seguindo um ritmo impulsivo,mas delicado. Olhou para baixo, podendo ver suas mãos pulsarem uma luz branca,emanando algo que ela desconhecia. Percebeu a quentura agradável se alastrar,então,por toda sua extensão,sentia como se pudesse conectar,por livre desejo,a todo o ambiente. Podia ouvir cada coração bater,cada movimento que a água fazia,ajustar seu próprio ritmo ao revolto e inexplorado,dando-lhe uma calmaria impensável.

Pelo mar,pequenas ondas se faziam presentes,sussurrando baixo e docemente seu nome. Elas também sentiam sua presença,podia notar. Mas ouvira,pouco depois, seu nome ser chamado em um ruído estridente,assustado e grotesco,prendendo sua atenção e instigando-lhe certa intromissão. Percorreria a ponte,ansiando testemunhar algo que não imaginava ser,mas sentia intensamente. E a sensação começou a lhe transmitir as piores sensações que desejaria ter: Caos,desordem,medo,ódio,desespero,tragédia... Parou,então,olhando sem fim para o caminho. Agora se assemelhava uma passagem diretamente para o inferno: O que quer que fosse lhe aguardando no terminal,era completamente descontrolado em força e forma,que apenas crescia como uma aberração invisível,mas quase tátil. Diferente de sua própria energia,esta parecia engolir o mundo ao seu redor, verídicamente avassaladora.

Não era hora de se aproximar daquilo.

Então,com um sexto sentido mais aguçado, captou uma dinâmica diferente e,quando vislumbrou o grande navio se aproximando por trás,atendeu ao chamado suave das ondas e saltou, pois sua passagem acabara por destruir a ponte,que desmoronava forçosamente em um efeito dominó.

Mergulhara rápido,sentido a água quente novamente. Seria seu corpo ou o próprio oceano quem lhe pregava uma peça? Até tentou voltar á superfície,mas estava impedida de passar,como se tudo acima de sua cabeça estivesse congelado.

Pouco a pouco descia,cada vez mais perdida, movendo-se pela água em busca de qualquer pista. Estava vazio, como um enorme deserto de água salgada, tão morto e solitário quanto um cemitério esquecido.

Em algum ponto da trajetória,uma pequena esfera brilhante brotou á sua frente e,logo que se aproximou desta,ela desapareceu, tornando a ficar visível mais abaixo. Seguiu-a ao fundo,em meio a piscos randômicos e um caminho complicado permeando as rochas,quando enfim encontrou algum sinal de que não estava tão sozinha quanto pensava. Ao fundo, numa vasta caverna, diversas esferas emanavam luz,mas com um brilho muito inferior a da que tinha trazido a jovem. Conforme se aproximava, notava diversas ramificações unindo-as, como frutos no galho de uma árvore. Algumas movimentavam-se independentes na água,rodeando-a quando ela parou ao centro,sob uma pedra ricamente desenhada que ornava o solo arenoso. Ao tocar com os dedos de seu pé nela,viu a mesma iluminar-se, estendendo-se por meio de linhas tortas ao resto do local,semelhante a raízes. Conduzindo a mesma luz que vira na superfície,elas desabrocharam em diversos ramos,formações vistosas e magníficas.

Sentiu seus olhos contraírem e,quando os abriu,outra esfera se situava á sua frente. Era maior do que todas as outras,cinzenta e fria,como se dormisse.

Tocou-lhe de leve,causando um efeito cintilante,que logo se apagou. Resolveu,então,tomá-la nos braços: A reação foi imediata, proporcionando uma irradiação forte e incessante. Em questão de segundos,ultrapassou os limites físicos e adentrou seu peito,causando uma explosão luminosa efêmera.

De repente,o silêncio e a escuridão reinavam.

Tinha a sensação de que alguém estava esmagando seus órgãos,tamanha a dor que sentia.

Quando esta cessou,começou a sentir a cabeça latejando com o despertar."

O som do despertador finalmente tinha acordado Marinette,que levantou quase inteira suada. Seu corpo doía e a cabeça parecia ter sido batida contra um sino,pois algo reverberara e se contorcia dentro de seu crânio.

Outro sonho absurdo…

Optou por descer e tomar um analgésico,antes que piorasse. Enquanto colocava um pequeno croissant no seu prato,notou que já passava do meio-dia. Como tinha dormido tanto?

Retornou para o seu quarto após comer,indo direto para o banheiro,ligando as torneiras da banheira e entrando em seguida. Sentia seu corpo inteiro pegar fogo e,temendo uma febre,submergiu na água gelada,num choque térmico imediato,que a fez espasmar uma das pernas contra a cerâmica quando afundou a própria cabeça,num movimento rápido. Após o banho rápido,já se sentindo um pouco melhor,saiu tremendo,apenas enrolada em sua toalha,em direção ao guarda roupa para se trocar e sair. Precisava passar em outro lugar antes de ir visitar Adrien novamente.

Vestiu um casaco leve logo que acessou a rua,enfiando o celular num dos bolsos. Havia centenas de mensagens não lidas que ela queria que permanecessem assim,estava sem ânimo para ler qualquer uma no momento.

Somente parou quando chegou próximo a uma grande casa litorânea,que ocupava o terreno final da rua e era a única da região que tinha acesso direto ao mar por um pequeno ancoradouro na parte inferior. Destrancou a porta,entrando um pouco hesitante pela sala. Tudo já estava pronto para sua mudança,inteiramente decorado e com boa parte de suas coisas já guardadas em seu quarto e,com certeza,viria em definitivo nos próximos dias. Passeou verificando todos os cômodos úteis da residência,situados no andar térreo,até chegar ao terceiro quarto,cuja situação era peculiar em relação aos demais. Sua porta branca de maçaneta dourada destoava dos demais,sempre permanecendo fechado,pois evitava entrar com frequência. Cogitou adentrar o cômodo,quase abrindo a porta,mas desistiu na última ação. Aquele ambiente não precisava se misturar aos demais.

Quando terminou a inspeção,poucas horas depois,desceu ao subsolo para guardar algumas coisas e acabou por se deparar com a varanda que ligava á entrada do ancoradouro na área externa,dividida apenas por uma porta de correr em vidro e alumínio,onde se era possível ter uma vista privilegiada de toda a baía e seu vasto mar.

O mar…

Alocou a mão na altura dos olhos e do horizonte,fazendo uma rápida medição. Faltava pouco para o horário que fora combinado. Precisava ir. Deu uma última olhada prazerosa no céu claro e subiu pela escada,saindo pouco depois da residência. Provável que morar ali não fosse tão ruim quanto ela pensava.

Prosseguiu devagar pelas ruas,observando as construções do entorno,a movimentação dos carros,os risos das crianças que atravessavam a rua em busca de um sorvete… Focar no que sua cabeça queria não seria boa ideia no momento.

Talvez precisasse conversar com alguém sobre os sonhos recorrentes. Ainda mais depois que o primeiro se concretizou de maneira aterradora. Mesmo após aquele dia corrido, Marinette não conseguia tirar nenhuma das cenas de sua cabeça. Alguma coisa aconteceu de verdade para que ela acordasse naquele estado?

Era uma pergunta difícil demais para que soubesse a resposta.

Ao chegar no cais,a passos lentos,notou que Adrien já estava á sua espera,com o cotovelo esquerdo apoiado no estrado,enquanto desenhava algo com as gotículas de água,entediado. Levantou rápido a cabeça quando notou a sombra á sua frente. - Mari!

Ela acenou com a mão,chegando mais próxima. - Ficou me esperando muito tempo?

— Um pouco... Pensei que fosse chegar antes de mim,igual ontem!

Sentou-se,segurando os joelhos. - Oh,desculpa! Sinceramente,não gosto de me atrasar… Mas estava resolvendo alguns assuntos…

O loiro apoiou os braços,deixando o tronco quase na altura dela - Não tem problema ! E que tipo de assuntos você foi tratar ?

— Bem,é sobre a minha casa... Talvez eu me mude essa semana, definitivamente… A reforma coincidiu com a data do meu último embarque de serviço do ano,então não há motivo para eu procastinar mais!

Ele pareceu espantado. - Espera! Você vai se mudar? Então... Quer dizer que você vai embora?… - Seu rosto mudou de expressão em questão de segundos.

— Não,claro que não! Eu só vou sair da casa dos meus pais. Ir morar sozinha,sabe? - Conforme foi compreendendo a situação,seu rosto se alegrou novamente. - Além do mais,tudo que eu conheço está aqui,não faria sentido eu me afastar!

— Obrigado por esclarecer… Eu não queria que fosse para longe. Você foi uma das melhores coisas que me aconteceu nos últimos dias…

Ela sorriu de canto,se lembrando dos últimos pensamentos que teve antes de chegar. - Eu fico encantada de ouvir isso!… - Sua voz murchou,em desânimo.

— Você não me parece muito feliz… Aconteceu alguma coisa,My Lady? - Ela remexeu a boca,ainda pensando sobre o que ia falar. Talvez fosse melhor não contar nada,por enquanto. - Se estiver com algum problema,eu posso tentar ajudar…

— Não,Adrien,eu só… Pensei numa coisa… - Voltou a sorrir. - A propósito,a minha nova casa é bem perto daqui. Você pode ir conhecer algum dia,se quiser! - Adrien gargalhou,como se tivesse ouvido a melhor piada do mundo. - Tá rindo do quê?

— Marinette,só pra te lembrar,eu não tenho pernas! Não tem a menor chance de eu entrar!

— E você acha que eu não sei disso ? - Foi a vez da mestiça rir. - Tem uma plataforma pra estacionar barcos pequenos bem no meu quintal! Você não conseguiria entrar,mas pelo menos pode ver alguma coisa!

— Ah,então assim as coisas mudam de figura, M'lady! A gente até poderia ficar conversando por mais tempo! - Ele riu, brincalhão. - Acho que ficar mais por perto de você me faça ter menos pesadelos.

O assunto chamou a atenção dela. - Você tem tido pesadelos,por acaso?

— Hã.. Ocasionalmente…

— E pode me contar algum ?

— Olha, não sei… - Disse mais baixo,receoso. - Não quero que você me ache maluco ou algo do tipo…

Ela sorriu,terna. - Eu já estou falando com um peixe,não tem nada de mais doido que isso. Você confia em mim?

— Confio... - Eles se olharam por longos instantes. - Tudo bem então,contarei… Mas lembre do que eu te disse!

— Vou lembrar!

Sorriu. - Eu... Acho que já conhecia você antes de nos encontrarmos… Pouco antes de nos vermos pela primeira vez, eu tive um sonho onde estava nadando pouco abaixo da superfície,como se estivesse num momento de completa paz… E,num rompante,ouvi o barulho de algo entrando na água. Quando me aproximei,vi algo afundando. - Marinette sentiu o choque da história colidir com sua consciência. Ele devia saber exatamente o que ela estava passando. - E tinha ali,ao seu redor, uma energia que eu nunca tinha sentido antes… Eu não podia te deixar afogar... Quando cheguei mais perto, notei que você era humana. - Marinette tentou disfarçar o nervosismo,mordendo discretamente o lábio inferior. - No dia seguinte,você me salvou. E quando eu vi o seu rosto novamente, algo me dizia que eu precisava saber quem era você.

As muitas coincidências a assustaram,mas manteve firme sua convicção. - Isso é estranho… Mas pode ter servido para te alertar de algo,talvez? E é normal ter curiosidade, então entendo sua ação …

— Sim… - Ele demonstrava certa disposição em deixar o assunto morrer. - Mas,de qualquer forma,me conte o seu também. Duvido que seja mais estranho!

Ela tocou o nariz dele com leveza. - Em outro dia,quem sabe! Mas tenho uma história bem mais legal pra te contar agora,quer ouvir?

Ele sorriu. - É claro,M'Lady!

A conversa dos dois se estendeu por várias horas,animadamente,dissipando o clima de tensão que havia se formado,em meio a histórias engraçadas e opiniões sobre a discussão. Porém, apenas o tempo iria dizer quando era o momento certo de conversarem sobre aquele assunto…

Distante dali, em uma gigantesca mansão ao centro da cidade,um homem corria apressado. Subindo em largos passos pela escadaria de mármore,carregando um tablet nas mãos,esbaforido pelo cansaço que começava a tomar conta de seu corpo. Ao chegar no terceiro andar da residência,diminuiu a velocidade,tornando-se quase imperceptível,enquanto passava a mão na extensão do fraque repetidamente,caminhando pelo extenso corredor até a sala final. Dois guardas,á postos na porta,cederam espaço para sua passagem com pequenos passos ao lado. Empurrou as pesadas portas,adentrando o quarto, que estaria totalmente escuro,não fosse por dois castiçais nas paredes do quarto e uma enorme lareira ao centro,onde uma cadeira repousava com as costas viradas para a entrada. Uma mão pequena e delicada segurava uma taça de vinho,apoiando sob um dos braços.

— Senhoria,os especialistas conseguiram novas informações. É algo de seu de seu agrado. - A voz masculina ecoou solitária.

Alguns instantes de silêncio cortante perduraram,o fazendo quase deixar o tablet na mesa próxima á mulher e sair dali. Quando começou a se mover,a voz atordoou suas intenções.

— Conte o que ouviu,Charles. - Deixou o cálice quase vazio em cima de uma pequena mesa de vidro ao lado,cruzando uma das pernas. - Estive aguardando muito tempo por isso...

A porta fora fechada pelos seguranças,dando privacidade para que o delicado assunto fosse relatado em total sigilo. O medo reinava sob o ar do ambiente,quase num espectro sombrio,contaminando a integridade e o bom senso de quaisquer pessoa adjunta.

O grande caos começava a mostrar as garras.


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Notas finais do capítulo

Talvez eu tenha deixado alguém confuso.
Se o fiz,não se desespere,há tempo para tudo. Inclusive para compreender o que está por trás das entrelinhas.
As peças desse quebra cabeça estão,enfim,dando as caras. Como será que tudo irá se encaixar?
Aguardo por todos na próxima segunda,dia 10! Tenham um ótimo fim de semana ♥️



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