Memento Mori escrita por EsterNW


Capítulo 13
11.0 - Remember me


Notas iniciais do capítulo

Hallo hallo, meu povo!
Bem, lembram-se das notas do capítulo 8.5, quando eu disse que teríamos mais capítulos introspectivos? Então, voltamos mais uma vez com um cap menos aventura e mais voltado "para dentro".
Como da outra vez, esse capítulo é com uma Clara já conhecida por nós, a Clara vitoriana, lá de The Snowmen. Por falar nele, temos cenas e falas que vieram direto do episódio e outras criadas por mim, para "preencher" quebras de tempo entre uma cena e outra do episódio.
Esse também é um dos maiores capítulos da fic, porém, tenho a ligeira impressão que está um pouco prolixo e enfadonho, mas espero que seja só o meu perfeccionismo falando xD Por isso, peço que vocês deixem um comentário quando terminarem de ler, precisa ser coisa longa, não, só pra eu saber o que vocês acharam :D
Agora chega de falatório e vamos ao que interessa :D Boa leitura ;)



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“Eu sonho com uma escada para os céus,

Meu anjo está vindo dos Céus para me buscar

Eu o alcanço, mas então você desaparece,

Toda vez que você me chamar

Saiba que estou apenas um passo atrás.”

— Stairway to the Skies, Within Temptation

 

Londres, Inglaterra, dezembro de 1892.

O Doutor despejou o conteúdo do bule para dentro da xícara, deixando o objeto abandonado sobre o balcão da cozinha da Tardis. Era inevitável adquirir alguns hábitos humanos, como esse de beber uma xícara de chá quentinha enquanto lia um bom livro dentro do aconchegante do lar, estando o lado de fora totalmente enregelante. Sua Tardis poderia não ser uma casa tradicional, porém, era sua morada a mais tempo do que qualquer um poderia contar.

Diferente de épocas passadas, a nave estava estacionada no mesmo lugar há... Quanto tempo mesmo? Ele até mesmo perdera as contas, com dias, semanas e meses embaralhando-se em sua percepção. Que diferença isso fazia? Estava aposentado, sem mais aventuras, sem mais companheiros agitando e avivando sua Tardis, apenas ele e sua solidão.

O Doutor bebericou do conteúdo, percebendo que errara na quantidade de açúcar novamente, não estando doce como gostaria. Sem vontade de retornar para a cozinha, apenas largou a xícara sobre a parte do console ao lado da cadeira em que se sentara. Colocando os óculos que sempre deixava abandonado na sala principal, abriu o livro que lia anteriormente: Grandes Esperanças, de Charles Dickens, exemplar dado a ele pelo próprio escritor em pessoa. Talvez algum dia devesse visitá-lo novamente... Não, sem mais aventuras, prometera para si mesmo. Esses dias eram passado. Agora, tudo o que lhe restava era aproveitar sua reclusão solitária em seus séculos restantes.

Procurou com os olhos o último parágrafo que lera algumas horas antes, deparando-se com Pip, o protagonista, a pensar em como sua vida seria melhor se tudo tivesse sido diferente, ambicionando e criando mil e uma expectativas. Era o ponto de virada do livro, onde o título da obra começava a fazer sentido com o enredo.

O Doutor sorriu de canto, perdido em seus pensamentos, lendo o mesmo parágrafo várias vezes sem sequer enxergar realmente. Será que ele também era como os humanos, criando enormes esperanças, mesmo sabendo que no final sua queda seria grande? Afinal, quando mais alto se isolasse em...

O soar do telefone da Tardis interrompeu sua linha de pensamento e sua leitura, que, na verdade, fora deixada de lado minutos antes, mesmo que ainda permanecesse com o livro aberto.

O Doutor hesitou, titubeando se deveria atender ou não. Talvez fosse um pedido de ajuda de algum lugar no universo. Estava em dúvida se deveria perder tempo em mais uma recusa ou não. O aparelho continuava a soar, como se a própria Tardis insistisse para que a ligação fosse atendida.

O senhor do tempo retirou o aparelho do gancho.

— Sim? — atendeu sem sequer perguntar pelo interlocutor, reconhecendo a voz de Vastra do outro lado da linha. — O que? Eu estou tentando ler — devolveu de forma rabugenta, antes mesmo que a silurian explicasse o porquê de sua ligação em plena véspera de Natal.

Srta. Clara e a sua preocupação com a neve. Eu lhe dei o teste da única palavra.

O Doutor folheava o livro de maneira aborrecida, querendo pular as páginas com os pensamentos do protagonista e ir logo para o ponto onde as coisas começavam a mudar.

— É sempre inútil — devolveu da mesma forma entediada que possuía em seus movimentos, parando de passar as páginas a esmo. — O que ela disse? — Apesar de tudo, questionou para Vastra. Nunca conseguia conter sua curiosidade, por mais que ela fosse inútil na situação em que decidira se colocar.

A linha emudeceu por alguns instantes. O Doutor ficava cada vez mais impaciente, querendo finalizar logo a ligação e se concentrar no livro que mal lia direito.

— Então? Então? — insistiu, exigindo por uma resposta rápida de Vastra.

A voz de sua interlocutora finalmente deu sinal de vida do outro lado, porém, os sinais vitais do senhor do tempo pareceram parar e retornar ao ouvir a fatídica palavra pond. Com o silêncio retornando durante a ligação, ele tentou disfarçar suas emoções, não conseguindo conter, contudo, um abrir involuntário dos lábios e um arregalar de seus olhos verdes, enquanto suas memórias corriam pela mente.

E assim elas continuaram, até chegarem ao fatídico dia em Nova York, o mesmo dia... O Doutor retirou os óculos que usava, observando o brilho das lentes conforme a movimentava com seus dedos quase trêmulos. Ele observava o brilho dos óculos que outrora pertenceram a Amy Pond.

Strax já sugeriu por onde começar a investigar. — A voz de Vastra afirmava do outro lado, discorrendo sobre as medidas já tomadas pela Paternoster Gang antes mesmo que o Doutor tomasse ciência dos fatos. Com ou sem ele, o trio ajudaria à governanta que conhecera mais cedo.

— Cinco minutos.

O que? — Vastra devolveu, estranhando a interrupção repentina.

— Estarei aí embaixo em cinco minutos.

Sem esperar por uma resposta, o senhor do tempo deu a ligação por encerrada, devolvendo o telefone para o gancho. Ao lado do objeto, depositou o livro e, logo acima, sobre o console, os óculos que pertenceram a Amy.

Passou as mãos pelo cabelo, exasperado, sentindo os fios voltarem ao lugar tão logo apoiara as mãos sobre o console principal da Tardis, curvando-se sobre os controles.

Por que dissera que estaria lá embaixo em cinco minutos? Ele prometera, jurara que nunca mais viveria como antes. Por quê... O Doutor ergueu os olhos, enxergando seu reflexo distorcido através da coluna principal do console. Quando se tornara tão amargo assim? Bem, nem precisava responder...

Uma única aventura, apenas dessa vez e então nunca mais. Nunca mais mesmo.

Era o que repetia para si enquanto vestia seu casaco e, inconscientemente, colocava a gravata borboleta, com seus dedos ágeis dando um laço perfeito em questão de segundos. Velhos hábitos nunca morriam.

Velhos hábitos nunca morriam, foi o que pensou quando cruzou a soleira da porta da Tardis e pôs-se a descer do alto de sua nuvem de isolação.

...

O Doutor e Clara subiam a escada em direção à nuvem onde a Tardis se encontrava parada, com a adrenalina subindo enquanto a altura aumentava e o senhor do tempo mantinha a conversa fluindo. A governanta ainda se perguntava por que ele insistia num bate papo quando eles podiam morrer a qualquer segundo. A verdade é que ele estava curioso sobre aquela mulher misteriosa e queria usar o pouco tempo que tinham para sanar o máximo de suas dúvidas que conseguisse.

Por que essa impressão no fundo de sua mente, que lhe dizia que isso já acontecera antes? Bem, não exatamente isso, com uma mulher de gelo ao seu encalço, mas essa sensação de dejá-vu, como se não fosse a primeira vez que conversasse com Clara? Como se não fosse a primeira vez que a conhecesse?

As perguntas ininterruptas de sua companheira de sua subida não deixavam que suas dúvidas fossem o principal pensamento em sua mente, tendo que dividi-las entre responder suas perguntas e não morrer, é claro.

— Você realmente vive aqui em cima numa caixa, numa nuvem? — Sua sucessão de questionamentos parecia não ter fim, aumentando ainda mais ao terem atingido o final da escada e finalmente pisado sobre o vapor congelado da nuvem em que o Doutor se isolava.

Isso porque Clara vira apenas o lado de fora de sua Tardis...

— Sim. Há bastante tempo — respondeu a mais uma das tantas perguntas que recebia em disparada, finalmente parados sobre o vapor, enquanto a mulher de gelo lutava para subir, ainda na escada.

Clara encarava o Doutor de perfil, com um olhar curioso e um sorriso divertido, pois, para ela, aquele era o melhor natal de sua vida, finalmente saindo do tédio de sua rotina como governanta e garçonete nas horas vagas. Não que ela não gostasse dos Latimer, muito pelo contrário, ela amava aquelas crianças e tinha certa afeição pelo capitão Latimer, seu patrão. Mas Clara não evitava esconder seu desejo de aventura, à mostra principalmente nas histórias mais mirabolantes que inventava para Francesca e Digby.

— Caramba, você deve ter um mau humor e tanto — ela alfinetou, com as respostas fluindo como água por entre aquela dupla que mal se conhecia direito. Ao menos naquela vida.

— Eu não sou mal humorado — o Doutor soltou com certo mau humor. Certo, ele estava realmente mal humorado e irritadiço nos últimos tempos, mas nunca que admitiria isso em voz alta! Muito menos para Clara, que parecia desafiá-lo toda vez que rebatia uma de suas falas.

— Você vive numa caixa!

— Se é uma caixa, então você é uma governanta.

Com isso, deu-lhe as costas, ligeiramente ofendido por terem chamado sua Tardis de caixa. Humanos... Com certeza ela teria a mesma reação quando abrisse as portas. E realmente o fez, enquanto Clara continuava a transcorrer sobre como todos os homens eram os mesmos.

Adentrando seu interior, acendeu a sala de console com apenas um bater de mãos sobre os botões. Involuntariamente, um sorriso tomou conta de seus lábios, antes mesmo que se virasse de frente para a porta, onde Clara se encontrava parada, com sua face tomada por surpresa.

Humanos... Ele nunca se cansaria deles. Muito menos de suas famosas reações quando viam a dimensão de sua Tardis pela primeira vez. Orgulhosamente, ele apresentava-a para Clara, ainda maravilhada com o que seus olhos viam. Aquela frase, ela ia dizer aquela frase! Ele nunca se cansaria de ouvi-la!

O Doutor riu, pela primeira vez em sabe-se lá quanto tempo, enquanto esperava Clara percorrer todo o exterior da caixa azul. Mesmo que não ousasse admitir em voz alta, sentia falta disso. As reações surpresas, os olhares maravilhados, as aventuras, os amigos que fazia... Perdido em sua própria solidão e miséria, esquecera-se do sentimento de alegria que tomava conta de seu peito todas as vezes em que essa mesma cena se repetia.

— É menor do lado de fora — Clara deu o veredito de seu raciocínio quando terminou de visualizar as dimensões do exterior da cabine.

Okay, essa era nova... Realmente, tinha algo de diferente naquela mulher. Diferente o suficiente para trazê-lo de volta das sombras em que se afundara.

Apesar da frase incomum, Clara continuava a bombardeá-lo de perguntas, que com certeza aumentariam ainda mais com as inúmeras possibilidades que se abriam junto das portas da Tardis, pela qual ela acabara de passar. A governanta corria e ria docemente enquanto observava as cores metálicas e brilhantes da sala de controle. Fazendo aquilo que melhor sabia, o Doutor mexia em alguns botões, apenas para tentar se exibir.

— Tem uma cozinha?

Mais uma vez, Clara lhe surpreendia com suas perguntas.

— Não sei por que perguntei, eu só... Gosto de fazer suflês.

O Doutor parou de mexer em botões e alavancas aleatórias, encarando a governanta de canto de olho. Suflês? Por que a obsessão com... Suflês? E, um momento, como ele tinha certeza que ela tinha uma obsessão com suflês? Podia ser apenas um desejo aleatório... Porém, nada era aleatório na sua vida. Muito menos aquela mulher que surgira de repente durante seu isolamento.

O Doutor saiu de trás dos controles, seguindo Clara até perto da porta da Tardis. Ela ainda encarava todo o cenário deslumbrada.

— Por que você me mostrou isso?

— Você me seguiu, lembra? Eu não te convidei.

Querendo deixar sua mente trabalhar sem mostrar suas dúvidas, ele voltou a ficar de costas e deixar seus dedos correrem de modo aleatório pelos controles novamente.

Clara acabava com o mistério que ele escondeu em seus atos minutos atrás, quando deixou que ela alcançasse a escada até sua nuvem. Ele voltou-se para ela, querendo olhar mais uma vez para aquela mulher que o Universo colocou em seu caminho. Ela não ia deixá-lo em paz enquanto não revelasse a verdade. E ele não deixaria passar a oportunidade. Seus corações lhe diziam para não deixar que ela fosse embora. E assim ele faria.

— Eu nunca sei o porquê. Eu só sei quem.

Da escuridão de seu bolso, o Doutor retirou uma chave brilhante, colocando-a na palma de Clara. Dando a ela a chave para conhecer o universo. A chave que jurou guardar para sempre junto de sua solidão, ele entregava na mão de uma mulher que mal acabara de conhecer. Realmente, como bem dissera, ele nunca sabia o porquê os escolhia. Apenas sabia quem. E tudo lhe gritava que Clara era a pessoa certa a escolher.

Clara parecia não acreditar na oportunidade que lhe era entregue em mãos, não sendo capaz de esconder suas emoções através de seus olhos escuros expressivos. Mesmo que tentasse, não conseguia conter as lágrimas que começavam a formar em seus olhos castanhos. Ela sequer sabia por que estava começando a chorar. Parecia que mil e uma emoções passavam por si naquele momento. Mil e uma emoções, mil e uma vidas que esperaram por aquele momento. Mil e um desejos que finalmente se cumpriam. Mil e uma vezes em que desejou que ele a notasse.

— Lembre-se disso. Agora. De tudo. Porque esse é o dia. Esse é o dia...

Ela ainda observava o senhor do tempo, que novamente lhe dava as costas, sequer conseguindo ficar parado muito tempo em um só lugar devido sua agitação.

Esse era o dia em que aqueles dois finalmente se encontravam. Não em um mero esbarrão por aí, do qual não se lembrariam nunca mais. Esse era o dia em que tudo mudava.

— Esse é o dia em que tudo começa! — O Doutor puxou uma das alavancas, dessa vez efetivamente colocando a Tardis para começar a funcionar, não apenas como uma exibição para olhos deslumbrados.

Clara sorriu genuinamente encantada pelo que o Universo colocava à sua frente. Às suas costas, porém, a Morte a espreitava. Diferente do Doutor, a Morte sempre a via. E nessa vida não seria diferente.

A governanta de gelo a puxou abruptamente, tirando-a de seu torpor maravilhado e derrubando a chave para seus desejos de aventura de suas mãos. Ela a tirava com força de dentro da Tardis, com o Doutor percebendo tarde demais o que acontecia. Mesmo que ele a visse pela primeira vez, era tarde demais para parar a Morte de chegar até a Garota Impossível.

Mesmo que ele corresse e chamasse pelo seu nome, Clara caía rumo à sua morte mais uma vez, despencando com um estrondo ao atingir o solo, anunciando a todos o seu fim.

Recusando-se a aceitar que a Morte a levasse mais uma vez, o Doutor desceu com sua Tardis, materializando-a ao redor do corpo imóvel de Clara. Ainda em negação, o senhor do tempo procurou a todo custo por um pulso, um sinal que fosse que o coração da Garota Impossível ainda batia. Mas não havia nada.

Tocando a face que começava a gelar, fosse pelos resquícios de gelo em volta do corpo ou pela vida que escapava, o Doutor analisou rapidamente as feições serenas no rosto de Clara, que parecia não fazer nada mais do que dormir, como se nada a perturbasse do lado de fora.

Decidido a não ceder dessa vez, o Doutor segurou o corpo pequenino da governanta em seus braços, tirando-a do contato com o frio do chão metálico. Talvez prevendo os seus atos, a Tardis escancarou suas portas, permitindo que o senhor do tempo atravessasse-as.

Dessa vez, ele não deixaria a Garota Impossível para trás.

...

O corpo de Clara permanecia deitado sobre a mesa da sala de jantar dos Latimer. Tudo o que lhe restava naquela vida eram meros minutos antes da escuridão. Ao menos dessa vez, a Morte não lhe fora tão cruel, arrebatando-a de uma vez. Ou não, considerando que ela era obrigada a presenciar o sofrimento das pessoas queridas que deixava para trás. Era sempre assim, em todas as suas vidas. Clara morria por um bem maior, deixando para trás tudo o que viveu, todos os que a amavam.

Quantas vezes aquele rosto passou por cenas semelhantes? Quantas pessoas enlutaram-se por uma jovem de nome Clara Oswald? Em todas as vezes, tudo o que ficava para trás eram meras lembranças que se perdiam na teia do tempo e na imensidão que é o universo.

Os Latimer choravam lágrimas quentes e salgadas, enquanto do lado de fora chovia, com as nuvens chorando gotas salgadas sobre a terra. As mesmas gotas responsáveis por salvar o Doutor e toda Londres da entidade que se nomeava como Grande Inteligência.

O ambiente que era preenchido apenas pelo som da chuva batendo contra a janela, foi tomado pelo ruído da Tardis a materializar-se. Dessa vez, o Doutor não deixaria a Garota Impossível morrer sozinha.

A porta se abriu, mostrando ao Doutor e à Vastra a cena solene que tomava conta da sala de jantar, em uma despedida improvisada de última hora.

— Sinto muito, não havia nada para ser feito. Ela tem minutos apenas — Strax sentenciou com gravidade para o Doutor, ecoando o que todos naquela sala já tinham consciência. Apenas os aparelhos tecnológicos do sontaran foram capazes de atrasar um pouco a ceifa da Morte sobre aquela vida. Eles não podiam adiar o inadiável.

O Doutor se aproximou da mesa que servia como leito improvisado para Clara, querendo ver seu rosto uma última vez. Ele não deixava de sentir uma culpa a lhe incomodar, sabendo que nada disso teria acontecido se Clara não tivesse se envolvido com ele. No final de tudo, o desfecho era sempre o mesmo, regado a lágrimas e corações partidos.

— Nós salvamos o mundo, Clara. Você e eu — ele contou, tendo abaixado-se até ficar da altura do móvel. Queria ao menos dar um pouco de conforto para a governanta, para que soubesse que sua vida não lhe era tomada em vão.

A verdade era que a Morte nunca a levava em vão.

— Você vai voltar... Para a sua nuvem? — Clara questionou com um fiapo de voz que ainda lhe restava. A mulher permanecia imóvel, tendo seus olhos semiabertos fixados no senhor do tempo ao seu lado.

Talvez como uma dúvida se sua missão naquela vida era cumprida, Clara externou aquela pergunta. O Doutor não precisava ser salvo apenas da Grande Inteligência. Isolado em sua nuvem, enlutado e mergulhado em dor e sofrimento, ele precisava de alguém que o trouxesse de volta para a luz da vida. Clara o salvava de mais de uma maneira, mesmo sem se dar conta disso.

— Sem nuvens agora.

— Por que não? — Clara soltou entre suas últimas respirações, cada vez mais difíceis e espaçadas, enquanto seus pulmões também começavam a parar junto do restante de seu sistema.

— Choveu — O Doutor respondeu enquanto aqueles olhos castanhos se fechavam, para nunca mais se abrirem naquela vida.

O senhor do tempo tentou segurar suas emoções de lhe escaparem, enquanto a família Latimer ainda chorava pela perda logo ao lado e o trio de Paternoster resguardava um silêncio respeitoso. A chuva era o único som entre os soluços que inundavam a sala de jantar. A nuvem de isolação do Doutor se desfazia lá em cima, escorrendo através de toda aquela água.

O Doutor abaixou o rosto, sabendo que não restava mais nada a ser feito. Ele não queria ver as últimas batidas daquele coração.

Corra, garoto esperto. E lembre-se de mim.

Ao badalar da meia-noite, anunciando o início do dia de Natal, Clara deu seu último suspiro. O Doutor ergueu o rosto, finalmente ouvindo aquela frase, aquelas palavras que estavam gravadas por todo o universo. Onde quer que houvesse um dos ecos de Clara, aquelas mesmas palavras estavam marcadas ao encontrar-se com a Morte. Contudo, nunca eram ouvidas. Ao menos, nunca por quem a Garota Impossível queria que a ouvisse.

O Doutor encarou aquele rosto que era tomado pela palidez da morte. Aquela sensação, mais forte do que qualquer dejá-vu que já tenha sentido junto daquele rosto, tomou conta de sua mente. A mesma voz, a mesma face, as mesmas feições, o mesmo nome... Pela primeira vez em mil e uma, o Doutor se lembrou. Pela primeira vez, Clara não precisaria correr atrás do Doutor. Pela primeira vez em mil e uma, a morte de Clara Oswald era presenciada pelos olhos do Doutor.

Pela primeira vez em mil e uma, Clara Oswin Oswald não seria esquecida.








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Notas finais do capítulo

Stairway to the Skies, Within Temptation: https://youtu.be/85fX-iz9F08

Aquele momento que seria mind blowing, se vocês já não soubesse o que vem a seguir -q
E então, gostaram? Espero que sim ♥
Agora, como vocês já devem ter percebido, os Doutores (pelo menos os oficiais), já quase todos apareceram por aqui, então é sinal que... Sim, a fic está acabando D: Vou deixar tudo o que tenho pra falar só na semana que vem e um recado pra vocês: o último capítulo da fic sai na próxima quarta, mas teremos um epílogo (ou cena pós crédito de filme da Marvel, como gosto de chamar), que vai ser postado na quinta feira 31, no dia seguinte ao último capítulo.
Até lá, povo o/