Carpe Diem escrita por Tahii


Capítulo 3
Ato falho


Notas iniciais do capítulo

E AÍ, GENTE, tudo certo?

Espero que sim, hoje está sendo um dia maravilhoso e mais uma prova de que milagres acontecem, eis a nossa atualização. Quero agradecer a todos que começaram a acompanhar, e a Ana Clara pelo comentário ♥

Boa leitura ♥



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— HORA DE ACORDAR, ROSIE! SEU PRÍNCIPE ENCANTADO JÁ ESTÁ QUASE VINDO E VOCÊ NEM TOMOU BANHO AINDA.

Abri meus olhos com pesar, sentindo que o fim estava próximo. O meu fim.

Olhei para o lado, sem me mexer, e vi Roxanne enrolada em uma toalha azul na frente do espelho. Ela sorria e cantarolava uma música qualquer, com certeza feliz pelo o que viria. Peguei o travesseiro e coloquei em cima do meu rosto, completamente desmotivada.

— Estou falando sério, Rosita. — insistiu penteando os cabelos secos. — Sem contar que a vovó Molly não vai gostar de saber que a neta favorita dela não está se importando com as visitas.

— A Lily é a neta favorita dela, ou a Lucy, sei lá.

— Se não levantar daí em cinco segundos, vou ser obrigada a convocar Dominique para te tirar daí. Ela está toda babona em cima do James, vai ficar uma fera se eu tirá-la de lá.

— Por que você é tão chata? — reclamei grunhindo. Era triste ter que deixar o meu paraíso único para me sujeitar a uma amostra grátis de inferno.

— Papai sempre diz que as pessoas que mais nos amam sempre saem de chatas.

Preferi não argumentar dizendo que eu não considerava meus pais chatos — embora não entendesse a atitude estúpida de concordar com o jantar —, apenas saí do quarto para pegar algo para comer e ir logo tomar banho antes que a terceira guerra bruxa acontecesse. Alvo e seu amigo idiota, Scorpius, jogavam videogame na sala, e o resto da casa estava em completo silêncio. Após pegar uma banana, percebi que a mesa já estava arrumada e que o relógio marcava cinco e quinze da tarde.

Tomar banho não foi tão difícil quanto eu achei que seria. O problema veio quando me deparei com as roupas que eu havia deixado no guarda roupa junto com as das minhas primas. Eram roupas consideravelmente legais, e eu precisava de algo normal. Algo em mim sabia que ser excêntrica seria um problema, assim como ser brega. Lysander Scamander gostava de mim, estranhamente, de qualquer jeito. E entre dois extremos que poderiam aumentar a chances da paixãozinha dele por mim se potencializar, escolhi o meio caminho: uma saia jeans e uma blusa preta, que já deixaria claro o meu sentimento de luto pelas minhas horas de paz. Meu cabelo decidi deixar solto, e sequer passei um batom, queria que todos refletissem sobre a minha cara amassada por, provavelmente, um conjunto de hipogrifos nervosos. Eu estava razoavelmente ok no meu traje, o que me deixou menos preocupada. Seria impossível ouvir algum elogio.

Fui interrompida da minha autoadmiração quando a porta se abriu. Dominique entrou com um vestido curto azul e um olhar espantado.

— Você está tão… Sem graça.

— Ah, obrigada. Atingi meu objetivo. — sorri falsamente animada, embora dissesse a verdade. Ela se sentou na cama, me encarando um pouco desconfiada. — É sério. A última coisa que preciso na vida é escutar elogios do Lysander.

— Ele te acha linda de qualquer jeito, Rose. O amor é cego.

— Obrigada por me lembrar. — se fosse em outras épocas, talvez, me sentiria mal pela grosseria, mas não era o caso. — Que horas que eles vão chegar mesmo?

— Por volta das sete, o tio Jorge disse. Faltam alguns minutos ainda. — assenti terminando de deixar meu cabelo desgrenhado. — Aquela hora que o James entrou, você estava falando algo, mas não terminou.

— Era sobre o Lysander?

— Acho que sim. Você disse que depois que beijou ele você deu um jeito de voltar para o dormitório e aí…

— E aí senti um chão duro na minha bunda. — lembrei-me imediatamente. Um sorriso de arrependimento nasceu no meu rosto já devastado pela derrota de contrariar os próprios ideais. — Digamos que eu tive alguns imprevistos no meio do caminho que me levaram, de fato, a ficar um pouco passada no resto da festa.

— Por que estou com medo do que você vai falar?

— Porque talvez seja pior do que beijar o Lysander. — e não era algo que eu gostaria de colocar em um outdoor e gritar para o mundo que eu fiz. Preferiria conviver com a sina de apenas ter ficado com o Lysander. — Eu meio que fiquei, como eu posso dizer? Não é flertando, nem me agarrando... Mas algo muito próximo disso e com o único intuito de repelir o Lysander e também, hum, de superar algumas coisas no meio de tudo o que aconteceu. — foi o jeito mais sutil que achei de dizer, embora minhas orelhas queimassem com a mentira.

— Hm, flertando com quem?

— Com o-

— ADIVINHA QUEM CHEGOU! — a porta se abriu em um supetão, revelando uma Roxanne animada demais. — Adoro a pontualidade deles. Você acredita que falta um minuto para as sete e, voilá! Os Scamander estão lá embaixo e a vovó mandou chamar vocês.

Merda.

Senti meu coração disparar somente em ver o sorriso maníaco de Roxanne. Dominique fez um sinal para irmos logo, antes que algo pior acontecesse, e eu prontamente me coloquei ao seu lado. A cada degrau descido, eu fechava mais meus olhos na vã esperança de acordar do pesadelo que iria começar. Mas não. Por sorte eu não caí da escada, o que foi ótimo; por azar quando pisei em chão firme a família Scamander estava cumprimentando meus pais.

Eu nunca tive nada contra os Scamander. Meus pais estimavam muito Luna, por toda a época de Hogwarts e os acontecimentos da guerra. Ela e Rolf sempre estiveram presentes nos aniversários, em algumas festas de família e sempre que podiam se reuniam. Luna e Rolf eram, inclusive, os padrinhos de Hugo. Porém, nada exclui o fato de que eu fui a sorteada do mundo mágico para ser alvo de zoações envolvendo um dos filhos deles.

Lorcan Scamander era normal até, conversava com todo mundo, era admirado e beirava ao que consideravam “ser descolado”. Batedor do time da corvinal, crush de Roxanne até os dias atuais e simpático, muito simpático. Seu irmão, por outro lado, era da lufa-lufa, uma negação com quadribol e tudo que envolvida um pouco de habilidade social. Não se importava em ser diferente — e realmente não há nada demais em ser singular —, mas ele era diferente demais. Mamãe dizia que ele lembrava muito Luna, e eu entendi o porquê depois de alguns anos quando comecei a participar efetivamente de conversas adultas. Nada contra. Ele sempre foi uma pessoa maravilhosa, assim como seus pais, mas… Ele poderia ser maravilhoso bem longe de mim, e sem uma paixão esquisita.

— Rosie! — sorri assim que ouvi Luna falar meu nome lá da porta de entrada. Dominique me deu, literalmente, um empurrãozinho para que eu pudesse andar até ela. — Como você cresceu! Daqui uns dias ultrapassa o Roniquito.

— Talvez. — eu conseguia ouvir os risos de Roxanne mesmo um pouco de longe. Apenas sorri amarelo ao abraçá-la. Ela vestia uma calça vermelha, uma blusa cheia de círculos coloridos, uns cinco colares em formatos estranhos e tinha brincos de argolas prateados, a coisa mais normal que observei. — É um prazer revê-la, tia Luna.

— Não posso dizer que é um prazer revê-la, Rosie, Lysander falou tanto de você durante essas férias de verão que te vejo praticamente todos os dias. — sorri sem jeito. Muito sem jeito. Tão sem jeito que olhei para a minha mãe pedindo arrego.

— Por que não vai cumprimentar Lorcan e Lysander, querida? — minha querida mãe sugeriu, não aliviando em nada a situação. Apenas assenti e murmurei um “com licença”.

Inspirada de uma coragem que eu não sabia exatamente de onde veio, fui até os gêmeos que conversavam com Alvo. Ele não resistiu ao sorriso estúpido ao ver a minha cara de semi morta que, provavelmente, o mataria depois que as visitas fossem embora.

— Olha a sumida aí! Estávamos falando de você, Rose, e sobre a festa de amanhã. — sorriu pomposo, cruzando os braços.

— Você não parece estar na vibe de festas. — observou Lorcan, sensato como sempre, me cumprimentando com um beijo no rosto. Ao seu lado, Lysander me olhava com olhos arregalados, como se eu fosse um programa de televisão levemente interessante.

— Estou um pouco cansada.

— Mas está linda como sempre. — por muito pouco eu não tive o desprazer de ouví-lo. Por educação que a minha mãe deu, o cumprimentei do mesmo modo que fiz com seu irmão, tendo a total certeza de que Alvo me encarava sonhadoramente. Claro, a minha infelicidade era o objetivo dele e da gangue do mal. — Por que não respondeu minhas cartas? — senti minhas bochechas arderem, embora estivesse mais ou menos acostumada com o seu jeito direto de resolver as coisas. Ele mal piscava.

— Lorcan, acho melhor deixar os dois se entenderem. Sabe como é esse lance de ficante, hum? Que tal um suco de abóbora? — até a risada de de Lorcan era constrangida pela minha situação. Ao ficar “sozinha”, no canto da sala com ele, repensei na possibilidade de ter impedido meu primo de se afastar.

— Somos ficantes? — sua voz era esperançosa e esquisita.

— Não tive tempo de responder suas cartas. — retruquei com um excesso de sinceridade. Demoraria muito para recuperar os pedaços rasgados, queimados, rabiscados e jogados privada, pia e ralo abaixo apenas para responder. — E acho que devemos conversar sobre o que aconteceu naquela festa, mas talvez aqui não seja o lugar ideal.

— Pra mim está bom. Gosto da cor das paredes.

— Certo. — pigarreei olhando para o meu lado esquerdo. Roxanne fazia um coração com as mãos, assistindo lindamente a cena patética. — Eu estava um pouco alterada naquela festa, voc-

— Muito, na verdade. Nunca vi alguém ficar tão vermelho, nem ouvi tantas risadas altas e desafinadas. Mas eu te entendo, sentiria o mesmo caso a minha namorada me traísse na frente de, praticamente, Hogwarts inteira. É deprimente, não te julgo. — ele, basicamente, se embolou com a velocidade da fala. Pelo o que eu o conhecia, estava ansioso.

— Então, e… O que aconteceu entre nós foi-

— Maravilhoso. O melhor beijo da minha vida. O único, pra ser sincero. Mas eu não me importo. Você é incrível, Rouxinol, tenho certeza de que é a mulher da minha vida. — suspirei olhando aqueles olhos azuis com uma certa tristeza. Por mais que eu não gostasse dele como colóquio amoroso, não era justo ser grossa ou fazê-lo de palhaço. Ele merecia algo melhor, alguém melhor do que eu.

— Por que não conversamos lá fora?

— Até em cima do telhado se você quiser.

Acompanhei ele até o lado externo da Toca, andamos alguns metros longe até que eu considerasse o perímetro seguro. Ao fechar a porta, olhei bem séria para Roxanne. Eu odiava o modo como ela levava as coisas na brincadeira, de forma inconsequente. Ele era uma pessoa com um coração cheio de sentimentos, assim como ela. Talvez o problema das pessoas fosse acreditar que apenas ele mesmo não merece ser machucado, talvez foi isso o que Brian Wood pensou ao beijar a baranga da Spinnet. Tio Jorge disserta sobre a importância do “carpe diem” quando fala sobre sentimentos, mas não há garantia de que todos saibam viver isso intensamente sem confundir com egoísmo.

Viver um momento como se fosse único ou viver como se você fosse o único?

— Lys, olha, eu estava muito abalada naquela festa, entende? Até hoje me sinto humilhada com o que houve com o Wood. E naquela noite, bom, foi uma tentativa de esquecer e… Você é um bom amigo, você sabe disso, e depois de algumas doses tudo se mistura na cabeça. Não quero perder a nossa amizade.

— Sou seu amigo para sempre, Rose, pode ter certeza. Mas podemos ter algo a mais. Até mesmo porque você sabe que eu gosto de você, muito. — é, eu e o mundo inteiro já sabíamos. — Podemos tentar.

— Ahn, não podemos. — engoli a seco. Ele pareceu não entender, e ao mesmo tempo seus olhos pareciam distantes enquanto me encarava.

— Podemos.

— Não podemos.

— Podemos. Já faz tempo que você e o Wood terminaram.

— É verdade, mas…

— A não ser que você tenha sentimentos amorosos por outra pessoa, podemos tentar. Como eu disse, eu acho você maravilhosa e sonho com os seus beijos todos os dias. — ele levou a mão aos lábios, suspirando em seguida. Dei um riso nervoso.

— Esse é o problema, Lys.

— Eu ter gostado do seu beijo?

— Não.

— Eu te achar maravilhosa?

— Ahn, não, Lys, é que-

— Não estou te entendendo. — meu coração parecia que iria sair pelo meu nariz a qualquer instante.

— Eu gosto de outra pessoa.

— Quem? — perguntou na lata, fazendo com que sua voz perdesse a vagueza.

Eu não soube o que responder, principalmente por ter que encarar aqueles olhos gigantes estatelados. Lysander era tão parado quanto uma amoeba, mas eu me sentia encurralada em algum tipo de beco sem saída que nem aparatar seria a solução. Ficamos alguns instantes quietos, e eu temia que ele desse um passo para me beijar. Foi quando decidi falar o primeiro nome que me veio à cabeça.

— Malfoy.

— O Scorpius? — ele arqueou a sobrancelha, levemente duvidoso. — Pensei que se odiavam.

— É uma mistura de amor e ódio, admito. — sorri amarelo, querendo dar um tapa na minha própria cara.

— Desde quando estão juntos?

— Não estamos juntos. Apenas ficamos casualmente.

— E você gosta dele?

— Aham. — assenti implorando que Merlin o fizesse acreditar. — Gosto.

— O Lorcan sempre diz que garotas têm a tendência de querer nos enganar quando nos dão um fora e acabam inventando histórias. Não acho que você esteja me enganando. — respirei aliviada ao ouvir, cheguei até a relaxar meus músculos. — Mas não acredito que seja o Scorpius.

— Lys, ele até veio para a Toca neste fim de semana. Ainda não, hm, contamos para ninguém, mas — limpei a garganta, tomada pelo nervosismo. — estamos tentando achar a oportunidade certa.

— Não contaram para ninguém? — neguei com a cabeça. — Não sei, Rouxinol, se você precisa de um tempo para pensar, tudo bem, eu espero você. Eu sempre vou te esperar.

— Lys, eu estou falando sério. Eu estou envolvida com o Scorpius e não é justo com ele e nem com você continuarmos nessa situação. — minha fala não convenceria nem o meu irmão. Levei a unha do indicador à boca para roer, não estava aguentando a tensão. Ele ficou parado piscando para mim sem reação alguma. — Não quero que fique magoado, somos amigos para sempre.

— Tudo bem, Rouxinol. — ele cedeu, graças à Merlin. — Acho melhor voltarmos lá para dentro. Devem estar notando nossa ausência.

Assenti um pouco desconfortável, mas não pensei duas vezes antes de abraçá-lo. Estava me sentindo péssima por não ter sido sincera com ele. Só que dizer que eu não gostava dele e que absolutamente nada nele me atraía poderia ser pior do que ele ter que simplesmente se conformar com o fato de eu só vê-lo como amigo e gostar de outra pessoa.

Agora, contanto que o idiota do Malfoy nunca descobrisse isso, a minha vida tenderia a voltar aos trilhos da normalidade e perfeição. A minha única missão até o final da noite era apenas não dar na cara que era uma mentira.

Voltamos para a sala da Toca, onde os adultos estavam sentados no sofá colocando o papo em dia. Sorri para Lysander antes de mirar a escada que eu subiria para repensar nas minhas ações. Infelizmente, Dominique estava à espreita me esperando.

— E aí? — perguntou animada, quase que com os olhos brilhando.

— Eu só espero não ter feito a maior merda da minha vida. — tentei sorrir, mas era praticamente impossível.

— Por dispensar ele?

— Outch! Não. — ralhei. — Depois te conto os detalhes.

— Isso está me cheirando sujeira.

— Podridão. E não me deixe esquecer de matar a Roxanne antes de dormirmos.

Dominique ficou sem entender nada. E eu me ocupei em beber alguma coisa e ficar sentadinha ouvindo uma conversa entre Lily, Hugo e Lucy. Seria o melhor refúgio que eu poderia achar, mesmo sentindo eventuais olhares de Lysander.

Certo tempo depois, vovó Molly nos chamou para irmos à mesa, pois o jantar seria servido. Na extremidade direita estavam os adultos, e na esquerda os mais novos. Alvo fez questão de ocupar a cadeira da ponta, tendo de um lado Lorcan e do outro o Malfoy. Ao lado de Lorcan, estava Roxanne, depois Lysander, Dominique, James. Ao lado do Malfoy, uma cadeira vazia e Lily. Percebendo que Hugo pegaria a cadeira vazia, corri levemente para pegar o lugar e, claro, sorrir vencedora para o tampinha. Ajeitei-me na cadeira e comecei a me servir.

Durante uma boa parte do jantar todos estavam ocupados tagarelando sobre coisas sem importância e assuntos desconexos, e eu estava feliz comendo minhas ervilhas. Roxanne às vezes sorria para mim, com aquela aura maligna que só ela tinha, mesmo que um pouco distraída com o que Lorcan falava. Até que, de repente, uma voz calma e meio morta falou um pouco mais alto do que o irmão.

— Você sabe o que é um Rouxinol, Scorpius Malfoy? — Lysander perguntou sério encarando o Malfoy com seus olhos arregalados. Eu apenas abaixei a cabeça e fingi que não estava ali.

— Não faço ideia.

Luscinia megarhynchos é um pequeno pássaro anteriormente classificado como um membro da família Turdidae mas pertencente à família dos Muscicapideos que são restritos ao velho mundo. O canto do rouxinol é um dos sons mais bonitos na natureza, inspirador de canções, contos de fadas, livros e poesias. Para alguns poetas, o rouxinol era equivalente a uma musa. — explicou parecendo uma fita destrambelhada. O Malfoy assentiu, educadamente.

— Interessan-

— Qual a sua cor favorita?

— Amarelo.

— Para qual time você torce?

— Chudley Cannons.

— Seu NOM em Poções?

— Excede as Expectativas.

— Como está se saindo como capitão do time da sonserina?

— Bem, eu acho.

— O que você viu nele? Além de um QI duvidoso, parece ter o cérebro do tamanho de uma minhoca. O senhor Binns não implicaria com ele à toa. — Lysander, pela primeira vez desde que eu o conheci, usou um tom maldoso. Ele não dirigiu o rosto a mim enquanto falava, apenas abaixou a cabeça como se estivesse remoendo o assunto. Sua expressão era de serenidade.

— Me desculpe não saber o que é um Rouxinol, senhor do QI não duvid-

— Hmmmmm, essas ervilhas estão deliciosas, vovó! — gritei acenando para a minha vó, que sorriu em retribuição. Foi uma situação, no mínimo, esquisita. E eu tinha certeza que teria de prestar contas dela mais tarde. — Do que estava falando mesmo, Lorcan?

— Sobre as Vespas de Wimbourne. — ele estava levemente corado com a situação, e mais desajeitado do que o próprio irmão. — Mas acho que deveríamos falar sobre como o desempenho do Al em herbologia está melhorando.

— Ah, claro. — meu primo rolou os olhos com um sorriso torto nos lábios. — O professor Neville me ama tanto quanto meu tio Ronald, sem contar que aquelas plantinhas nojentas desenvolveram um afeto por mim depois de um pouco de empenho.

— Tenho certeza que não tem nada a ver com a filha dele. — analisou Lily Luna ao meu lado, com uma cara nada amigável. — Estou de olho em você, irmãozinho, já disse que está proibido de ficar com as minhas amigas.

— E desde quando você manda em alguma coisa, cabeça de abóbora?

— Desde que o papai disse que-

— Eu sei que a sua tendência é defender o seu amorzinho, Weasley, mas — o idiota do Malfoy começou a sussurrar disfarçadamente. — tem algum motivo específico para ele estar me olhando como se quisesse me lançar um crucius?

— Esse é o desejo de todo mundo, se quer saber. — murmurei azeda, sorrindo em seguida. — Quer mais ervilha?

— Não. — franziu o cenho me olhando pelo canto do olho. Apoiou o cotovelo na mesa antes de continuar comendo e fingindo prestar atenção da discussão de Alvo e Lily. — Estranha.

— Idiota.

— Rostranha.

— Rato albino. — os cantos de sua boca se configuraram de modo maligno.

— Gorda.

— Frouxo.

— Olha quem fala.

— Eu odeio você.

— Que coincidência.

Recusei-me a continuar a troca carinhosa de insultos com o Malfoy. Primeiro porque não queria me irritar mais do que já estava, segundo porque não causaria uma boa impressão e Lysander poderia ficar realmente chateado por eu ter inventado uma pequena historinha.

Após o jantar me ocupei exclusivamente em degustar um mousse feito pela minha tia Fleur. Sentei-me no último degrau da escada e fiquei observando a movimentação da sala, até que Dominique veio ao meu lado.

— Conta logo o que rolou, meus nervos não aguentam tanto suspense. — pediu ocupando o estreito espaço ao meu lado. Suspirei cansada e fitei os olhos curiosos de Dominique com tédio.

— Você sabe como ele é direto. Mal me aproximei e ele já me perguntou por que não respondi às cartas dele. O Al fez o favor de me deixar constrangida ao dizer para Lorcan que éramos ficantes e eu pedi que ele fosse comigo lá fora para conversarmos melhor. — coloquei a última colherada do doce na boca. — Comecei falando que eu estava triste e alterada naquela noite, eu ia dizer que não podíamos ter algo por causa da nossa amizade quando ele disse que poderíamos, só não caso eu estivesse gostando de alguém.

— Ai, Morgana.

— Então a sua brilhante prima teve a excelente ideia de dizer que sim, que está gostando de outra pessoa. E adivinhe de quem.  

— Lorcan?

— Claro que não, Dominique. — rolei os olhos. — Eu falei o primeiro nome que veio na cabeça.

— Alvo!

— Malfoy.

— Malfoy? — minha prima segurou uma gargalhada. — Fala sério, Rose, isso não convenceria nem o seu irmão. Era mais fácil dizer que era o Al, com certeza ele te ajudaria a segurar essa barra.

— Não me julgue, eu estava com medo que ele me beijasse. Tsc, eu sou uma retardada.

— E ele por um acaso acreditou?

— Não muito. Eu até sentei ao lado do Malfoy durante o jantar para dar uma reforçada na ideia, mas não pareceu convincente. Além de que estou me sentindo péssima por fazer isso com ele.

— Agora não adianta se lamentar. — colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha. — No meu ponto de vista, seria mais justo você dizer para ele que simplesmente não gosta dele desse modo.

— Eu ia dizer, Dominique, mas ele me deu uma brecha e o lado burro do meu cérebro decidiu que seria uma boa oportunidade dizer que eu estou gostando de outra pessoa.

— Você pegou pesado dizendo que era o Malfoy.

— Eu sei. — grunhi. — Não tem mais jeito.

— Se você quiser dizer para ele que mentiu e que na verdade não gosta dele, fica tudo certo de uma vez. Caso queira continuar com essa história sua, acho melhor convencê-lo de que não está mentindo.

— E como eu faria isso?

— Aí é com você, darling. Enquanto você coloca sua cabeça para pensar, vou procurar o meu boy. Com licença.

Se eu tivesse escolhido, algumas horas antes, ir atrás da poção para arder de febre por um tempo, com certeza não estaria em uma situação deprimente como a que eu me encontrava. Sentada na escada, sem mousse, sem perspectiva e, pela primeira vez na vida, cercada por uma grande confusão que eu tive a capacidade de armar sozinha. Para piorar, tinha que admitir que Dominique estava certa, de novo.

Foi pensando em um futuro difícil com Lysander Scamander me chamando de mentirosa e me igualando a pessoas como Brian Wood e Hubi Spinnet que eu me levantei de onde estava e marchei em passos decididos até Scorpius Idiota Hyperion Malfoy, que estava de pé conversando com Alvo, Lily e Roxanne. Lysander estava um pouco afastado, próximo de Lucy e Louis.

— Scorpius — chamei tocando o seu ombro e torcendo, do fundo do coração, para não contrair nenhuma doença infecciosa. —, preciso falar com você.

— Não quero. — respondeu com uma risada irônica.

— Quantos anos você tem? Sete?

— Não é questão de idade, Pimentão, eu só não quero ouvir sua voz irritante. Minha cota já deu.

— É urgente.

— E daí?

— Por favor. — grunhi cheia de raiva, me segurando para não lhe descer um tapa. — Dois segundos.

— Você fica estranha com essa voz de psicopata. — disse me entregando um pequeno potinho sujo de mousse. Ele deu meia volta, ignorando a conversa que acontecia entre Roxanne e Alvo, e olhou para mim. — Um…

— Aqui não. Lá fora.

— Sua sorte é que eu estou bonzinho hoje, e simpático. Se não te deixaria falando sozinha para deixar de ser mandona desse jeito.

Ao invés de dar uma resposta sem educação ou revirar os olhos, tentei dar um sorriso amigável enquanto caminhávamos para fora da Toca. Assim como com Lysander, andei suficientemente longe para que qualquer imagem vista da janela ou da porta pudesse ser facilmente desmentida, por causa da distância. No meu caso, ela seria inventada.

Scorpius Malfoy era uma figura excêntrica no mundo. Alto, magro, cabelo praticamente platinado, olhos cinzas e dentes irritantemente brancos. A maioria das garotas o achava maravilhoso, lindo e consideravam sua beleza como algo bem próximo à perfeição. Diziam que ele era simpático, engraçado, cheio de energia e extremamente carismático. Eu discordava de tudo. Para mim, Scorpius Malfoy não passava de uma lagartixa albina ranzinza.

— Já foram mais do que dois minutos com você me encarando desse jeito. Por Merlin, você está ficando muito perto do Scamander. — reclamou com os braços cruzados, me fazendo acordar para a realidade. — Dá pra falar logo o que quer?

— Ok. Eu preciso que você fique aqui. — segurei os braços dele e o empurrei até a minha frente, de modo que ele ficasse de lado para a Toca. Dei alguns passos para ficar em sua frente. Se Lysander fosse xeretar algo, nos veria um de frente para o outro. — Coloque as mãos na minha cintura.

— Hã?

— Coloque essas suas mãos grotescas na minha cintura. — repeti estridente. — Agora.

— Weasley, acho que as ervilhas te fizeram mal.

— O que custa colocar as mãos na minha cintura?

— Higiene.

— Malfoy.

— Primeiro me diz que merda está acontecendo, depois vemos se eu passo a seguir suas ordens, Pimentão.

— Eu preciso que o Lysander tenha a impressão que estamos bem próximos. — ele me olhou com tédio, batendo o pé direito freneticamente no chão.

— E o seu objetivo com isso seria qual, exatamente?

— Enganar ele.

— O que houve com o seu Código Moral?

— Nada que seja da sua conta. Agora coloque as mãos na minha cintura.

— Você é tão estranha quando quer. — disse cedendo à minha ordem. E, ugh, suas mãos eram pesadas demais. — Ainda não entendi por que quer enganar o coitado do Scamander.

— Coitado do Scamander? Desde quando é defensor dos pobres e oprimidos?

— Eu sou uma boa pessoa, Weasley, exceto com você, que parece uma múmia pré-histórica. — riu irônico virando o rosto em direção à Toca. — Conte logo o que você fez.

— Você sabe que o Lysander gosta de mim, e deve imaginar que depois daquela festa as coisas pioraram um pouco. Assim que eu vi ele hoje, tentei explicar que não poderíamos ficar juntos e… Eu acabei me confundindo e disse sem querer que estava gostando de alguém. Por puro ato falho e nervosismo, eu disse que era você. — despejei tudo causando um leve espanto em seus olhos. — E agora preciso convencer ele de que ficamos casualmente.

— Eu sempre soube que todo o seu ódio era um disfarce para uma baita queda que você tem por mim. — gargalhou idiotamente, sorrindo feito um campeão. — E ele acreditou?

— Pode ter certeza que se ele tivesse acreditado, eu não estaria aqui, no escuro, esperando que ele acredite que estamos, no mínimo, conversando bem próximos.

— Estamos há quase um metro de distância. — exagerou ao olhar seus braços esticados. Os cantos de seus lábios formaram uma curva para cima quando ele me puxou para mais perto. — E já se passaram mais do que dois segundos.

— Por favor, cale a boca.

— Como você é grossa. E além de tudo, uma mentirosa de carteirinha.

— Não sou mentirosa, apenas… Você preferiria que eu dissesse que não gosto de você simplesmente porque você não me atrai ou que eu não gosto de você porque gosto de outra pessoa?

— Eu preferiria você quieta. Sua voz é aguda e meu ouvido dói quando você grita. — respondeu com uma falsa ingenuidade, como se não estivesse me ofendendo. Bufei de raiva. Talvez mais um minuto seria o suficiente para convencer Lysander lá de dentro. — As duas opções são ruins, só que a segunda dá esperanças.

— Merda. Eu só não queria magoar ele.

— A merda começou quando você decidiu beijar ele na festa. Se não tivesse beijado, eu não estaria tendo que te aguentar agora.

— Obrigada pelo consolo.

— Podemos entrar? Você me entoja.

— Você é uma criança de cinco anos em um corpo adolescente. — suspirei bem fundo. Ele deu ombros, sem tirar as mãos da minha cintura. — Obrigada pelo favor.

— Está me devendo uma.

— Eu sei. — olhei para a cara de tédio do Malfoy antes de fitar a Toca. Forcei a vista para enxergar uma sombra na porta. Torci para que, pelo menos, não fosse o meu pai. — Só mais uma coisa. — pedi colocando minhas mãos em sua nuca. — Dá para você abaixar um pouco? — ouvi seu praguejar antes de ter seu rosto bem na frente do meu. Estávamos completamente desajeitados, encarando um ao outro como se estivéssemos nos beijando. A única coisa suportável foi respirar o hálito de maracujá dele, proveniente do mousse. Poderia ser pior.

— Weasley, pelo amor de Merlin. — ele resmungou antes de bufar e me beijar.

Ugh.

A primeira coisa que eu pensei ao sentir aqueles lábios estúpidos encostados aos meus foi um grande remelexo no estômago. Mas, como eu não estava em uma posição propícia para vomitar ou algo do tipo, relaxei meus braços ao me sentir envolvida e inevitavelmente próxima demais ao acéfalo em minha frente. A pressão entre as nossas bocas diminuiu gradativamente, causando uma leve abertura das mesmas. Eu pensei que seria o momento ideal para parar, afinal, estava bem longe dos meus planos trocar saliva com o Malfoy, seria a verdadeira ruína do meu Código de Conduta, não que ele fosse imaculado, devo dizer.

Só que não foi bem como eu planejei — o que, novamente, não foi uma grande surpresa. Scorpius Malfoy simplesmente se viu no direito de colocar aquela língua dentro da minha boca e segurar a minha nuca. E embora o meu lado inteligente quisesse abortar a missão e ir correndo contar para Lysander que eu era uma mentirosa, o lado burro prevaleceu e decidiu fazer outra estupidez: corresponder.

O resultado foi que eu fechei os olhos e quando eu abri, sabe-se lá quanto tempo depois, o Malfoy puxava o meu lábio inferior com seus dentes. Aqueles olhos cinzas idiotas sorriram antes da sua própria boca, o que me fez lembrar de onde eu estava e o que eu estava fazendo.

— Você tem dois segundos para parar de me morder. — disse causando uma risada escandalosa nele.

— Aaaaaa, Weasley, por Merlin! Você não consegue deixar de ser chata nem beijando.

— Eca.

— Eca, heim? Veja pelo lado bom, agora você pode dizer para quem quiser que ficamos casualmente sem peso na consciência.

— Isso é horrível do mesmo jeito. Agora tenho germes seus na minha boca.

— Vá, Weasley, sei bem que isso era tudo um plano seu para conseguir outro beijo. Eu sei, sou inesquecível.

— Cala a boca. — grunhi batendo em seu ombro. — E bico fechado para qualquer pessoa que não se chame Lysander Scamander.

— Tudo bem. — riu passando a mão pelos cabelos. — Não esqueça que está me devendo três.

— Três?

— Um por eu ser legal com você, outro por eu ter feito o favor de te beijar e outro por eu seguir suas ordens desconexas.

— Você é um idiota.

— E você uma mentirosa.

Quando chegamos à sala novamente, tudo parecia estar em perfeita ordem. Pessoas conversando, dando risada e ninguém notando que eu, Rose Weasley, estava tentando contornar da forma mais fidedigna possível uma situação que beirava ao caos.


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Notas finais do capítulo

O que houve com o código moral da Rose será? [kkkkkkkkkkkkk]

Aiai... Mas e vocês, o que acharam? Gostaria que vocês parassem com essa timidez e me contassem se estão gostando, se está chato, se querem ver logo o pega scorose, se shippam Rose/Lysander [rosander??], etc. Adoro ler os coments e ficaria muito contente em ter um retorno de todos vocês ♥

A próxima att sai dia 24, se Merlin quiser! Ok?

Vejo vocês em breve!

Bjs no core ♥



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