A sala de estar da família Toledo Prattis Lopes aconchegavam os vários participantes de um evento religioso ensurdecedor. Pessoas circulavam, riam e conversavam alto, especialmente a festeira Luísa e a atrapalhada Gabriela, que eram as primeiras a bagunçar a festa, - embora sem intenção -, resultando à casta Mônica o esforço sobre-humano de manter a festa nos seus padrões mais elevados de organização.

Enquanto todos se ocupavam dentro da casa, Jéssica buscava Angelina, a mais nova, que se esgueirara para fora do casarão, a pedido do noivo Henrique. Preocupava-se com a amiga, há uma hora daquela - já passara das 20h -, sozinha nos jardins daquele lugar. E atrás daquele rapaz! Por mais que pensasse, Jéssica não encontrava uma razão lógica para Angelina interessar-se por um homem tão machista, mau caráter, antipático e bronco, que certamente não a merecia.

Após minutos de procura, finalmente a jovem Lopes aproximara-se do casal, que parecia estar tendo uma terrível discussão:

— Mas eu quero entender porque você está dizendo isso! - Gritava Angelina, recebendo do rapaz um olhar carrancudo.

— Está tão difícil entender que eu não quero mais casar com você?

— M-Mas... Por quê? Até outro dia estávamos planejando nosso casamento.

— Eu mudei de ideia, Angelina. Sinto muito, mas eu não quero fazer parte dessa sua família.

— Tudo isso por causa da Mônica? Eu sei que ela não gosta de você, e que é um sentimento de antipatia mútua, mas você estaria se casando comigo, e não com ela!

— Acorda, Angelina. Você acha mesmo que tem espaço para mim nessa casa? Suas irmãs nem mesmo me chamaram para essa festa! E ainda tem essas indigentes que moram na sua casa, que pensam que são as rainhas do pedaço!

— Henrique! Eu não admito que você fale assim delas! Essa casa é tão minha quanto delas! Não acredito que você foi capaz de dizer algo assim... - Disse, tendo uma forte sensação de não reconhecimento daquele homem que se encontrava à sua frente.

— Ok, você tem toda a razão. Eu que sempre estive sobrando aqui. E é exatamente por isso que não quero mais continuar com essa relação. Nunca vai dar certo.

— Henrique, nós podemos fazer dar certo. - A certeza na voz de Angelina o confundia, mas acima de tudo, o irritava. Virara os olhos, contrariado, enquanto a outra continuava vivendo no seu conto de fadas fracassado. - E elas acabarão se acostumando a sua presença, eventualmente, quando a gente se casar.

— Angelina, eu não pretendo vir morar nesse casarão, com tanta gente que me despreza. E esse casarão é da sua família há anos. Você jamais sairia daqui para morar comigo. Não temos futuro juntos!

— Claro que temos, nós nos gostamos e estamos noivos! - Dissera, tomando a mão do rapaz, que a rejeitara rudemente.

— Quer saber? É impossível falar com você! Eu estou fora daqui. Cansei dessa situação. Nós terminamos aqui.

— Henrique! - Disse, tentando puxá-lo em vão.

Os olhos de Angelina marejavam ao vê-lo partir, tão decidido. A jovem não saberia dizer, naquele momento, se estaria de coração partido, com o orgulho ferido, ou com uma soma das duas coisas. Teria sido abandonada antes mesmo de subir ao altar. Pior, antes mesmo de dormirem juntos. Bom, pensando bem isso logo lhe parecera um consolo no momento. Mas... E se ficasse para titia como a irmã mais velha, Mônica? Embora, no caso de Mônica, fosse mais uma questão de vocação, do que falta de oportunidades. Porém, e ela, porque estaria ficando sozinha? Não seria boa o suficiente? Não seria tão bonita? Como ele pode tê-la abandonado daquele jeito!

— Angel, o que está acontecendo aqui? - Perguntou Jéssica, aproximando-se, e automaticamente recebendo um fardo de rosto molhado para um forte abraço repentino.

— O que há de errado comigo, Jes? O que há de errado comigo? - perguntava sem parar, enquanto entocava seu rosto no ombro de apoio.

— Nada... Nada... - Sussurrava em seu ouvido, enquanto retirava os cabelos que insistiam em cair sobre os olhos úmidos da amiga. - Ele não era homem para você, Angel.

Angelina a encarou, cortando o abraço. As palavras de Henrique faziam mais sentido agora. Por isso ele a teria deixado. Toda essa intolerância familiar era o que estava levando-a para essa fracassada vida amorosa. Em questões de segundos, Angelina saíra correndo para dentro do casarão, em direção ao seu quarto, localizado no segundo andar, terceiro cômodo à esquerda.

Enquanto isso, Jéssica finalmente entendia o que havia feito. Teria sido insensível, no entanto... quem teria magoado Angelina não teria sido ela. Ela jamais faria algo assim, ao menos não propositalmente. Mas Henrique sim. Henrique sempre a magoava, e não se importara de dar as costas e se afastar, deixando-a aos prantos.