Âmago da Meia-noite escrita por Shantalas


Capítulo 5
O Castelo Dongau


Notas iniciais do capítulo

Parte dois de dois



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/768567/chapter/5

Após o breve lance de escadas, eles continuavam castelo adentro, passando por corredores e portas, os criados e guardas no caminho faziam breve reverência. O Duque pergunta:

— E as novidades?

— Sim – Natanael passa a mão por algumas de suas mechas grisalhas – Após alguns erros, conseguimos arrancar uma informação intrigante dos Goblins.

"Subestimamos esses seres, achamos que o caminho mais curto seria eliminando um a um até que um deles cedesse. Mas são criaturas prontas para o combate e a guerra, não se importam nem um pouco em morrer ou ver seus companheiros morrendo. Isso nos levou para uma segunda abordagem, que o rei menos gosta, mas pela vida da sua filha, tive certeza de que ele não se importaria tanto.

O primeiro resistiu às pancadas e não disse nada, acabou morrendo por causa do exagero dos guardas que não estão acostumados a lidar com aquele corpo menor deles, o segundo não disse nada e acabou perecendo também. Esse foi nosso segundo erro. São criaturas carniceiras, tenho certeza de que sentem menos dor que nós humanos. "

— Não muitos deles restaram – Kal comenta, mas parece ter sido ignorado.

— Nós tivemos que chamar Browson – O conselheiro diz, com receio.

— O que? Logo ele? – Duque Claudio diz incrédulo.

O grupo agora subia por uma longa escada em caracol que atravessava os andares do castelo. Os dois guardas ainda os seguiam logo atrás de Kal. A voz do Conselheiro ecoava nas paredes de pedra enquanto continuava a falar:

— Sim, me vi encurralado pela determinação desses Goblins, foram feitos para matar ou morrer.

— Mesmo assim, os métodos de Browson podem fazer com que confessem qualquer coisa, até mentiras, para se verem livres.

— Não é muito diferente de qualquer tortura – Natanael responde – Mas a forma como aconteceu, me fez acreditar que era verdade.

Eles terminaram o lance de escadas e seguiram por um corredor até uma porta, havia dois guardas do lado de fora, além de alguns homens com trajes aristocráticos e mulheres da corte, duas delas chorando com lenço na mão. Natanael parou na frente deles, a alguns metros da porta, e falando em tom mais baixo continuou:

— A rusticidade dos Goblins era tamanha que eles não se importaram em ser furados pelos ossos dos próprios companheiros...

— Por favor – O Duque diz sério – Sem detalhes, pelo bem da princesa

— Desculpe Princesa – Se a princesa se incomodou em ouvir aquilo, escondeu muito bem, ela apenas assentiu para ele continuar, já Kal fez uma careta de choque e olhou brevemente para Daniel. Natanael continuou – Então, após.... – Olhou para a princesa com receio - .... Iniciar o processo de empalhamento da cabeça de um Goblin morto na frente dos sobreviventes, um deles pareceu não gostar da ideia. Eu sei, parece ridículo, depois de tudo que eles sofreram, o próprio Browson já estava desistindo de fazê-los confessar ainda essa manhã.

"Então, um deles entrou em pânico, começou a dizer que ele, um grande Goblin como ele, não queria terminar sua vida como enfeite na parede de um homem, achou a ideia absurda. Então Browson prometeu uma cremação para seu corpo e ele confessou que uma Bruxa chamada Yulma, que habitava em uma floresta próxima os contratou para alvejar a princesa. Ninguém acreditou, todos achavam que o Goblin estava caçoando de nós, até porque seu medo de ser empalhado era sem fundamento. Somente depois que a tortura continuou e os outros Goblins demonstraram um medo que nem mesmo Browson os colocou, foi que passamos a acreditar"

O Duque reage como se houvessem lhe xingado e responde incrédulo:

— Isso é mentira! Essas técnicas de Browson fazem com que as vítimas digam qualquer coisa! Principalmente essas criaturas diabólicas!

— Não! – O conselheiro Natanael diz mais alto – Você não viu a reação deles! Estavam condenando o amigo! Disseram que a alma deles sofreria para sempre. Tentamos arrancar mais informações, mas os Goblins restantes conseguiram colocar medo no amigo deles. Ele morreu com suas partes na boca, mas preferiu não falar mais nada!

— Já chega disso! – O Duque grita com nojo

— Senhores – A princesa chama sutil.

Todos no corredor, as damas da corte, os aristocratas, olhavam para eles. Natanael os observou de volta, sem jeito. O Duque acenou, nervoso e disse para eles em voz alta:

— Trouxemos alguém que poderá ajudar a nos dizer sobre o estado de nossa princesa.

Não responderam nada de volta, apenas cochicharam entre si. Nessa hora a porta do quarto, que era vigiada por dois guardas, se abre. De lá sai um homem que era similar ao Duque, porém maior, mais forte, suas sobrancelhas eram mais grossas, junto com sua barba grande, lhe dava uma aparência de urso. Seus olhos eram de um azul frio, mas naquele momento estavam vermelhos. Usava um manto vermelho sobre roupas de couro e botas negras. Uma espada longa se achava em sua cintura e um machado grande de duas lâminas nas costas.

Todos se calaram e observaram aquele homem alto e com o semblante triste. Quando ele se virou e viu o Duque junto com o conselheiro, Daniel e os outros, sua expressão mudou, franziu as sobrancelhas, deu longos passos e sacou a espada. Havia duas palavras talhadas na lâmina, em um idioma desconhecido.

— O QUE DIABOS SIGNIFICA ISSO?! – A voz do homem ecoou alta e feroz pelo corredor do castelo, e era possível notar que ele não se esforçara muito para isso.

O conselheiro, em um reflexo inconsciente, se apertou contra a parede no lado direto, próximo a princesa. O Duque Claudio se viu em súbito desespero e ergueu as mãos de forma defensiva dizendo:

— Calma Claus! Não sei...

A Mão esquerda do homem grande agarrou Cláudio e o empurrou contra a parede esquerda do corredor, tirando-o de sua frente, e apontou a espada no rosto de Kal, parando a centímetros do nariz, e vociferou:

— Como se atreve a colocar os pés nesse castelo?

Todos congelaram por alguns segundos. Os olhos de Daniel quase saltaram da face e seu coração parecia um tambor. Kal estava surpreso, mas também havia uma mistura de nojo e ódio em sua expressão.

— Pai – A princesa chama com receio

O Rei, de forma sombria, recua a espada e coloca todo o peso de seu corpo na perna da frente. Todos ao redor respiram, mas a princesa se adianta de segura o braço do pai.

— Essas pessoas vieram ajudar a salvar a Mel, seu amigo os enviou. – Havia um tom de súplica na voz da princesa.

— Ele não é meu amigo – O rei diz sem tirar os olhos de Kal.

— Mas... – O Duque diz na defensiva – ...O ancião os enviou, você quem pediu.

Kal reuniu as mãos na altura da cintura e segura seu antebraço, bem em cima do ferimento. Somente Daniel sabia, para os outros, parecia apenas uma posição de descanso qualquer. Quando todos perceberem que, aparentemente, nada ia acontecer, o conselheiro Natanael ajeita sua postura e pergunta:

— Esse rapaz lhe causou algum transtorno?

— Eu não pedi para estar aqui – Kal finalmente diz infeliz – Umbuzeiro me enviou para auxiliar esse moleque, não pergunte o motivo porque aquele velho não me explicou.

O Rei não responde a seu conselheiro, fica apenas examinando Kal de cima a baixo, então diz ameaçador:

— É melhor que você não mexa um músculo, ou tem a minha palavra que vai perder a cabeça.

Kal pisca os olhos várias vezes seguidas. O Rei olha para Daniel e o chama com um gesto, o garoto se aproxima, sem conseguir esconder a tensão no corpo. Mudando um pouco sua voz, tentando parecer mais tranquilo, O Rei pergunta:

— Qual o seu nome garoto?

— Daniel.... Brasil, quero dizer – Daniel sentiu que o nome do qual o Ancião prometera iria passar mais credibilidade, mas seu nervosismo o confundiu. Ele prometera a si mesmo que não se intimidaria, principalmente porque Mogno e Sangue-de-Dragão disseram que ele precisava de um tutor por ser muito jovem. Só que a entrada dramática de Rei da Gleba-Rubra o intimidou, não era só o fato de ser um Rei, mas sim sua presença, altura, e a sonora voz, mesmo falando normalmente sua voz impunha temor.

— Brasil, de Pau-brasil? – Indaga o Rei.

— Sim. – Daniel confirma desconfiado.

— Você é bastante jovem para ser batizado na sociedade de Umbuzeiro.

— Na verdade foi o nome que o ancião me prometeu – O jovem rapaz sentiu, no olhar azul frio do Rei, que mentir para ele não seria uma boa ideia.

— Então posso lhe chamar de Daniel mesmo? – O Rei mostra o quarto do qual havia saindo, com guardas na porta – Vamos nos adiantar, espero que a fé de Umbuzeiro em você seja recompensada.

Antes de seguir para o quarto, O Rei lança um olhar congelante a Kal e entrega sua espada a seu irmão, o Duque, dizendo:

— Se ele respirar, ative a espada e arranque seus membros - Então observou brevemente os guardas no fundo do corredor, os mesmos que escoltaram o grupo até ali, e foi o suficiente para eles também entenderem o recado, empunharam suas espadas e escudos e se colocaram logo atrás de Kal.

Daniel entendia aquele idioma talhado na lâmina, passou parte do final de sua infância lendo livros com aquela escrita, muito tempo atrás, antes mesmo da Mata Viva, significava "Ira da tempestade".

O Duque ficou parado com a espada erguida na frente de Kal. O conselheiro, a Princesa, O Rei e Daniel se retiraram aos poucos, indo até a porta. Daniel sentiu pena de Kal e queria muito fazer algo para melhorar a situação dele, mas não teve coragem para questionar o rei, muito menos bater de frente com ele, então alimentou aquela ideia para tentar agir mais tarde, afinal, já era um homem de 14 anos.

O Guarda abriu a porta para eles entrarem, Daniel demorou a entrar ficando por último e trocou olhares com Kal, balançando a cabeça sutilmente de forma positiva. Ele queria dar forças a seu acompanhante para suportar a situação e dizer que faria algo para ajudar, mas o que Kal entendeu foi "Você está com sérios problemas".

...

Yulma estava sozinha na porta de sua cabana quando duas sombras se aproximam. Duas criaturas baixinhas e verdes. Se moviam ardilosamente pela floresta, uma delas portando uma peça de madeira, com um arco na ponta. Eles espreitavam no limiar da clareira atrás de uma árvore.

— Venham logo aqui seus idiotas! – Rugiu a bruxa. Ela flexiona a mão do braço enfaixado, o mesmo que mutilou no ritual.

— Mil desculpas, minha senhora

Os dois Goblins se aproximam temerosos. As orelhas grandes e largas estavam abaixadas, como um cão suplicante. Ambos usavam retalhos de armadura de couro que cobriam grande parte do corpo, divergindo apenas por algumas placas de metal vestidas na criatura que não portava a balestra.

— Que diabos aconteceu com o resto de vocês? – Diz a velha irritada.

Os dois Goblins caem sob um joelho e inclinam suas cabeças para baixo. O que vestia algumas peças de aço, que era alguns centímetros maior e mais largo que o outro, apresenta-se solenemente.

— Sou o soldado de infantaria Gogue à seu dispor, minha senhora. Somos a dupla que conseguiu alvejar a princesa.

— Já sei disso, sua criatura verminosa! Quero saber dos outros. – Yulma vociferou.

— Perdão senhora – A outra criatura, que está com a besta, se desculpa – Sou Magogue, soldado de arquearia e o mais rápido do exército. Os outros Goblins foram capturados antes que conseguissem fugir das muralhas da cidade.

— Mas que inferno! – Yulma xinga, mal conseguindo conter impulsos raivosos de mover o braço enfaixado. – Seu maldito chefe não vai gostar disso.

— Devemos partir e dar as notícias à ele, senhora? – Gogue pergunta.

— Não.

Yulma entra na cabana, vai até o baú de madeira próximo ao caldeirão e, de dentro da bagunça de materiais, puxa um virote com a ponta de prata juntamente com uma lasca de espelho. A velha retorna e entrega as coisas a Magogue.

— Existem um lobisomem adentrando o extremo norte da Floresta Soturna, tragam-me o corpo do maldito o quanto antes.

A dupla examina os itens com assombro, Gogue com o pedaço de espelho e Magogue com a seta. O maior deles se preocupa e lança a duvida sem encarar a bruxa:

— Rastrear uma criatura dessas pode levar meses. Como poderemos achá-lo?

— Pff – A velha estala os lábios impaciente – Para que você acha que serve esse espelho? Para examinar essa sua cara doente e feia? Corte o seu dedo na ponta do espelho e ele lhe mostrará o caminho!

Com receio, Gogue faz um pequeno corte no dedão usando o caco. O sangue suja a superfície do espelho e é absorvida, entrando no reflexo, passando a existir unicamente do lado de lá. Os Goblins exclamam impressionados. A imagem mostra uma floresta de árvores grandes, maiores que o comum e a gota vermelha deslizando numa direção, como uma bússola.

— Se perderem esse espelho – Yulma sorri sinistra – Tortura vai parecer carinho perto do que reservo para a alma de vocês.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Âmago da Meia-noite" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.