Rebel Mermaid escrita por nekokill3r


Capítulo 19
As ordens da presidente




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Logo ao acordar sou obrigada a ir para o refeitório e me enturmar, por mais que minhas mãos ainda estejam amarradas. Fico de cabeça baixa o tempo todo, tentando ignorar os olhares estranhos e desconfiados, como se eu que tivesse sido telessequestrada. A vergonha toma conta de mim assim que me sento na mesa com os outros, que me olham meio espantados, mas tentam disfarçar agindo como se não tivessem reparado nenhuma diferença.

 —– Estou com inveja dessas pulseiras elegantes —– diz Johanna se jogando ao meu lado, e tento rir. —– Já leu o meu motivo para viver?

—– Li ontem —– respondo baixo. —–, e percebi o quanto você é uma pessoa carinhosa.

—– Da próxima eu escrevo um motivo para morrer, mal agradecida —– bufa ela e eu acabo rindo de verdade. —– Desde que aquele seu amigo chegou você se esqueceu da gente, hein?

—– Perdão, na verdade estava trancada no meu quarto tentando não me matar —– admito o que eles já devem estar sabendo. —– Tem alguma novidade de Peeta?

—– Nada —– diz Finnick dessa vez, que permanecia rindo junto com Annie. —– Por que tirou aquela peruca tão linda?

—– Onde aquilo era lindo? —– questiona Johanna com uma sobrancelha erguida. —– Fazia ela parecer uma cidadã refugiada da Capital.

Nada digo depois disso, só fico rindo enquanto eles discutem qual cor ficaria melhor no meu cabelo. Viro o rosto para o lado e vejo Ethan entrar pela porta, a cara de sono visível por ter ficado junto comigo e coça os olhos para não cochilar em pé. Ele me vê e eu sorrio, o deixando um pouco sem graça e apenas me dá um aceno de mão.

Mudando o rumo, começo a me desesperar quando o vejo vindo em nossa direção. Não, por favor, peço comigo mesma repetidas vezes, não venha para cá ou Johanna vai me infernizar pelo resto da vida. Porém não há muito o que fazer, uma vez que ele se senta no espaço vazio ao meu lado.

—– Bom dia... —– deseja ele envergonhado.

—– Bom dia! —– responde Johanna e percebo a ironia na voz dela, para me lançar um sorriso desconfiado. —– Então você é o famoso Ethan?

—– Famoso? —– pergunta ele sem entender, a olhando com as sobrancelhas erguidas.

—– Sim. Sabe, a Krystal me visitou uma vez e disse sobre você, ela falou que gosta de... —– começa ela e tapo sua boca com as mãos, o que não ajuda muito por conta das amarras. Johanna simplesmente me dá um tapa leve e percebo que ela babou nos meus dedos. —– Ela falou que gosta de você.

—– Oh, mesmo? —– pergunta ele com as bochechas vermelhas, mas não consegue evitar um sorriso.

—– Sim, sim —– confirma ela rindo.

Percebo que a odeio de verdade por conta disso, pois Ethan fica olhando para mim e não sei onde posso me esconder. Após alguns segundos Finnick vê minha situação e começa a conversar com ele, pergunta sobre coisas do 4 e também se ele se lembrava que o ajudou a aprender a pescar quando era menor. Fico encantada conforme ele responde, a maneira que coloca a mão sobre a boca para rir, o jeito que seus olhos observam tudo quando está muito envergonhado, a forma que o uniforme fica bem nele, o cabelo que ainda que bagunçado o fazia ficar mais bonito. Droga, penso enquanto continuo o analisando, talvez eu realmente goste dele de verdade.

Prestes a ir embora, ele me pergunta se eu já havia tomado café da manhã e eu digo que não mostrando as mãos. Então o vejo enfrentar a fila mais uma vez e pegar uma bandeja para mim, me dando tudo na boca. Seria uma atitude que eu estaria apreciando de verdade se estivéssemos no meu quarto apenas nós dois, mas a cada mordida que dou escuto as risadinhas atrás de mim —– até mesmo Annie entrou no meio. A pior parte talvez seja admitir que gostei do que ele fez, e acho que vai ser uma verdade que guardarei junto comigo por um certo tempo. Depois de me fazer comer tudo, se despede, eu lhe desejo um bom dia de trabalho e ele me deseja um dia sem surtos, e o vejo se distanciando. Preciso suportar as piadinhas sem graça dos três, reviro os olhos e fico bufando com todas, mas no fundo me alegro por eles terem gostado de Ethan.

Volto para meu quarto mais ou menos às 13:00, quando a enfermeira entra e me livra das amarras. Suspiro aliviada mexendo os pulsos, ainda não acreditando. Ela me dá o aviso de que se eu tentar me machucar de novo vai parar de vir me visitar, e dou minha palavra de me esforçar ao máximo. Mas assim que ela sai e me deito na cama recolocando as munhequeiras pretas, penso no por quê de eu estar dessa forma sendo que estou tomando os remédios e converso com os outros com muita frequência; acho que posso ter o melhor tratamento, com o mais eficiente médico especial, e nada disso vai me ajudar. Talvez seja irreversível que eu tenha essas crises, então um dia tudo está bem e sem alucinações, e no outro já vejo coisas que não existem e me levam à tentativa de suicídio.

Pelo menos tenho pessoas que se importam comigo perto de mim e agora, mais do que nunca, tenho Ethan. Ele não vem no horário normal de almoço. Tento não surtar, também não posso ser o tipo de pessoa que depende emocionalmente de outra para fazer tudo, e decido comer sozinha enquanto vejo meu caderno de libras para me distrair.

Não tendo nada para fazer, decido ir visitar Johanna e a cena que encontro é pior do que imaginava; ela estava com aquela roupa que usava para ir aos treinos, a manga estava um pouco para cima por conta da agulha em sua veia, a mão estava sobre os olhos e penso que estava chorando, até me notar ali e vejo que é, na verdade, uma frustração terrível.

—– O que houve? —– pergunto me aproximando da cama, e me sento no colchão.

—– Se lembra da segunda chance para entrar em algum esquadrão? —– pergunta ela de volta e afirmo com a cabeça. —– Bem, eu tive um ataque de pânico mais uma vez. Não consegui passar. Eles não vão me dar outra oportunidade.

—– Sinto muito... —– digo segurando em sua mão, ela está começando a chorar. —– Sinto muito mesmo, Johanna...

Mas metade de mim não sentia, na verdade, estava aliviada por ela não ter conseguido passar. Sabe-se lá como estão as coisas nos arredores e não é nem preciso estar por dentro das notícias para saber que agora tudo é um grande caos, evidenciando o fim da paz que costumávamos ter. Não queria que ela fosse porque sei que não tem um pingo de ideia na cabeça, e eu me sentiria ainda mais mal se soubesse que Johanna acabou morrendo pela própria estupidez.

Converso com ela tentando distraí-la assim como fiz com Peeta, conto sobre os beijos entre Ethan e eu, os abraços que tivemos, as duas noites que ele dormiu comigo e percebo que Johanna se alegra, mas é notável perceber a tristeza em sua voz e as lágrimas quase transbordando. Da mesma forma que ela me deu um motivo para viver, eu a recordo do quão importante ela era, a relembrando de que a minha vida seria mais sombria se eu não tivesse sua amizade e companhia. A abraço diversas vezes, falo mais um pouco do por quê gosto tanto dela e quando Johanna dorme, sei que deve ter mudado um pouco a opinião de sair do 13 e voltar para seu distrito. Entendo bem que ela queira voltar para casa, eu também quero muito, porém devemos ver a situação atual e esperar mais um pouco até que a guerra esteja vencida.

Dou mais algumas voltas pelos corredores do hospital, encontrando Finnick e Annie aos beijos e risadas em cima da cama. Saio antes que eles possam me ver, voltando para o meu quarto. De certa forma é tão horrível permanecer aqui, sem certeza de nada. Nem mesmo a presidente Coin veio me ver mais, acho que ela desistiu de mim já que eu sempre pareço estar fazendo isso. Plutarch também é outro que não dá muita importância pra minha presença, e pareço ser útil apenas para acalmar Peeta. Todos parecem ocupados com coisas importantes, a revolução do Tordo está os abalando de forma que quase ninguém mais dorme ou come direito, mas eu queria que de algum jeito fossem mais humanos.

Desisto de pensar nessas coisas e tomo meu banho, depois pego a peruca e fico a penteando com meus dedos. Sinto saudades de Tigris, apesar de tudo. Acho que se algum dia eu a rever, vou me sentir muito envergonhada por não ter conseguido proteger a roupa que havia me presenteado, mas sou grata por ela não ser como o resto das pessoas cruéis da Capital.

Fico distraída e a hora passa sem que eu perceba, então Ethan entra com as típicas bandejas e um sorriso, eu retribui alegre por vê-lo. Ele se senta ao meu lado na cama, coloca a comida na mesinha e tapa meus olhos. Por não saber o que estaria aprontando, começo a rir.

—– Tenho um presente para você —– o ouço dizer. Estando de olhos fechados encarando o escuro, ouvir a voz dele dessa forma quase me faz arrepiar. —– Arrisca adivinhar o que é?

—– Uma viagem de volta ao passado? —– chuto ainda rindo, e ele nega. —– Uma passagem para casa? —– Ele também nega. —– Não sei o que pode ser.

Sem mais ideias do que estaria me aguardando, fico calada, rindo algumas vezes. Sinto a respiração dele perto do meu rosto e é quase inevitável não sorrir quando nossos lábios se encostam, me fazendo arrepiar de vez. Quero muito saber de onde ele está conseguindo tanta coragem para fazer essas coisas, sendo que antes sequer conseguia falar olhando para o meu rosto.

Beijando o meu nariz duas vezes e depois minha boca —– com um beijo de verdade —–, ele coloca algo em cima da minha mão. Cansado de tentar me fazer adivinhar tira a mão dos meus olhos e então vejo o meu aparelho novo para o ouvido, na cor preta e com alguns detalhes em azul claro. Eu olho para Ethan encantada, tiro o velho o colocando depressa e até ouço os barulhos do começo do corredor de forma perfeita.

—– Muito obrigada —– agradeço sorrindo, e ele retribui. —– Não só pelo aparelho... pela sua companhia e pelos beijos também...

Ethan sorri mais uma vez olhando para o chão, depois para mim.

—– Aquilo que Johanna disse é verdade? —– pergunta ele o que eu temia. —– Sobre você gostar de mim...?

E agora, o que devo dizer? Mentir e dizer que era brincadeira ou admitir o que não confirmei nem para mim mesma? Considerando os acontecimentos recentes, acho que está mais que óbvio que também gosto dele e que o quero por perto. Ele deve saber disso, mas quer ouvir de mim para ter certeza.

—– Sim, é verdade... —– admito rápido para não me arrepender. —– Você acha isso... algo ruim?

—– Jamais acharia —– confirma e me dá um dos seus mais belos sorrisos.

Comemos juntos falando sobre nossa infância, ficamos rindo muito dos tropeções que já havia acontecido com ele até dar a hora de voltar ao trabalho. Nunca sei bem o que ele faz de verdade, mas com certeza é algo importante para não ter o direito de nem duas horas e meia de intervalo. Sinto meu coração começar a se apertar quando o vejo arrumando as coisas.

—– Ei... —– chamo, me sento mais para frente deixando as pernas balançando. —– Você vai voltar?

—– Acho que não... —– responde ele ficando de frente comigo. —– A presidente Coin está meio brava por estar saindo tanto sem a permissão dela, então hoje vou ficar a noite toda acordado com Beetee.

Isso é culpa minha, digo par mim mesma, por conta dos meus surtos agora é ele quem está pagando.

—– Promete que não vai tentar se machucar? —– pergunta ele observando minhas mãos livres.

—– Vou tentar o meu melhor, mas de qualquer forma já tiraram tudo o que podia me machucar daqui —– respondo dando de ombros.

Ethan se aproxima mais encostando no meu rosto, eu pisco várias vezes para disfarçar o impacto que seu toque tem e ele sorri tímido, deixando suas bochechas vermelhas.

—– Por favor, não faça nada, está bem? —– pede ele e confirmo com a cabeça. —– Quase perdi você duas vezes para a Capital, não quero perdê-la de novo para seus traumas.

—– Você não se incomoda de estar beijando uma maluca? —– pergunto irônica, segurando em seu braço.

—– Talvez esse tenha sido o motivo para que eu gostasse tanto de você... —– responde ele me surpreendendo, o que faz meu coração acelerar.

Inclinando o rosto para frente encosta minha testa na sua, dou um pequeno sorriso e ele também. Ficamos segundos assim quando se lembra que está atrasado alguns minutos, então me dá um beijo rápido e vai embora apressado —– e eu não aguento a risada quando ele tropeça e quase bate o rosto na porta —–, me deixando com um sorriso bobo estampando na cara.

Mal posso acreditar que as coisas estão tomando um rumo certo, uma direção a qual sei para onde estou indo. Ainda fico muito tempo acordada, mas não é por insônia ou por não conseguir parar de pensar, dessa vez fico relembrando e revivendo cada momento desde que Ethan chegou. É inacreditável a forma que sempre estivemos ligados, ainda que não fossemos tão próximos; sei que ele, assim como eu, estivemos observando um ao outro de longe sempre querendo saber mais, sempre tentando se aproximar mais, porém nunca permitindo que tal coisa acontecesse. Finalmente, penso comigo mesma sorrindo para o teto, algo de bom finalmente aconteceu comigo depois de tudo o que passei.

Pego um motivo para viver, vendo que é o último. Sinto até uma certa pena por ter de abrí-lo, porém é melhor do que nada. O que sobrou foi o de Annie, que me faz ler rápido ansiosa para saber o que ela pode ter escrito.

Porque você é especial

Sorrio agradecida por ela ter me dito isso, uma vez que nunca acabei conseguindo me aproximar muito por conta do que aconteceu no dia do casamento, mas levo em conta que Annie não sabe de nada e continua a me tratar da melhor forma possível.

Estou ajeitando a minha cama e me enfiando nos cobertores pronta para dormir, mas a porta se abre e me viro com um sorriso gigantesco achando que era Ethan e que desaparece ao perceber que era, na verdade, Plutarch.

—– Olá, Krystal, perdão vir te procurar tão tarde assim —– diz ele rápido e afirmo com a cabeça.

—– Alguma coisa aconteceu com Peeta? —– pergunto apressada com um certo medo.

—– Dessa vez, não —– responde ele se aproximando um pouco mais. —– Peeta foi mandado para acompanhar o esquadrão 451, o mesmo que Katniss também está. E, bem, vimos aquele dia o quanto ele se acalmou na sua companhia.

Não, Plutarch, peço desesperada, não diga o que eu estou pensando que é.

—– Decidimos que você vai acompanhá-lo para que o ajude nos momentos de surtos, na intenção que ele não machuque ninguém —– anuncia Plutarch e continuo no mesmo lugar em pé, mas é como se já não sentisse o chão. —– Sua única missão é mantê-lo calmo, tirando isso, cuidaremos de sua segurança. É recomendável que se arrume hoje, porque vão sair amanhã bem cedo.

Me sinto uma Avox. Parece que algo se perdeu, não encontro minha voz, nenhum som sai da minha boca. Assim que consigo engolir em seco, pergunto somente:

—– Quem fez isso? Quem quis que eu fosse junto com ele?

A resposta era óbvia, ainda que Plutarch não tivesse dito nada. Venho a ouvindo há muito tempo, é dessa forma que eles fazem qualquer coisa sem perguntar o motivo, é dessa forma que curvam as cabeças e obedecem. Mas, mesmo assim, sinto meu coração falhar umas duas batidas quando a resposta vem de verdade.

—– Ordens da presidente Coin.


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