No final da minha última aula, eu já tinha planejado e replanejado sair correndo da faculdade o mais rápido que eu pudesse, umas mil vezes, mas, assim que eu saí do prédio, cheia de confiança por não ter tropeçado nele outra vez no corredor, Takanori me encontrou.

— Chi-chan! — eu precisava conseguir fazê-lo parar de me saudar daquele jeito antes que se espalhasse pelos quatro cantos do inferno em que estávamos. — Como foi seu primeiro dia?

— Normal — disse, sem esconder o quanto estava desconfortável com aquela situação. Talvez ele me deixasse em paz…

—  Eu não sabia que tinha passado nessa faculdade! Psicologia, né? É a sua cara! — eu sorri amarelo. Ah, se eu ganhasse um dólar toda vez que me diziam aquela frase…

— Desculpe, mas eu estou atrasada pra pegar o ônibus… — disse, desesperada pra sair dali. Quão difícil era conseguir uma transferência pra outra universidade depois de um dia? Eu não me importava se fosse em outro estado… Melhor se fosse em outro país ou planeta…

— Mas eu ia justamente te oferecer uma carona pra casa - ele disse e eu desconhecia a meiguice da sua expressão. — A gente podia vir juntos também, se você quiser. Kouyou foi quem te trouxe?

Eu ia recusar todas as suas propostas, talvez não de um jeito muito educado, quando outro problema, igual ou maior, entrou no meu campo de visão: Suichiro, o garoto de quem eu gostei no Ensino Fundamental, pra quem me declarei e fui rejeitada. Eu joguei pedra na cruz?!

— Rápido! — disse pra Takanori, meio desesperada. — Finge que a gente está conversando!

— Mas nós estamos conversando — ele deu risada do meu desespero.

— Não.  Mas alguma coisa séria, uma conversa de verdade!

— Ouch — ele brincou. — Pra mim, estava sendo uma conversa séria e de verdade.

— Por favor! — implorei e ele ergueu as sobrancelhas. Achei que fosse dizer mais alguma coisa imbecil, mas ele segurou minha mão entre as dele, com gentileza.

— Fique tranquila, eu sei que seu dia foi bem estressante, mas você vai se sair bem, não importa o que você escolher, Chi-chan — Suichiro estava agora perto o suficiente pra poder nos ouvir e eu me forcei a sorrir na direção de Takanori, sem desviar meus olhos dos dele. — Agora, vamos — ele puxou meu braço pra se prender no dele e retirou meus livros do meu outro braço, carregando-os e me conduzindo pro estacionamento. — Eu te deixo em casa, querida!

Meus olhos se fixaram por um breve momento na expressão congelada de Suichiro e eu demorei um pouco mais do que deveria pro meu cérebro processar aquele “querida”.

— Então, como eu me saí? - ele disse, rindo, ao abrir a porta de seu carro pra mim e colocar meu material no banco de trás.

— Bem. Obrigada — ainda estava atordoada. O que é que eu tinha feito pra merecer um castigo daqueles como primeiro dia de aula?

— E você vai me explicar o que foi isso? — Takanori perguntou e eu ponderei. Por um lado, ele tinha me ajudado, sem fazer nenhuma pergunta. Por outro, era tão constrangedor!

O barulho de seu carro ligando me despertou de meu transe e foi então que eu percebi que estava sentada no banco do passageiro do carro dele e já estávamos saindo do estacionamento e ganhando a rua.

— Espera, eu não concordei em pegar carona com você! — esbravejei.

— Desculpe, eu sei que você não disse que sim. Na verdade, eu tive a impressão de que me diria alguma coisa bem elaborada pra justificar porque teria de ir de ônibus — ele respondeu, sério. — Mas, eu achei que, com por parte da minha “atuação”, eu disse que te levaria em casa, seria meio contraditório se você fosse vista no ponto de ônibus logo em seguida, né? E eu realmente estava falando sério quando te ofereci pra te levar e buscar em casa…

— Você só se aproveitou da situação! — eu agora estava brava. Se fosse doida, me jogaria do carro em movimento.

— SInto muito, não era minha intenção!

— Ah, tudo bem, não é como se você tivesse me feito algo grave… — cruzei os braços e tentei me acalmar.

Ele dirigiu em silêncio até estacionar na frente da minha casa. Quando eu ia descer, ele segurou brevemente minha mão, pra me fazer olhá-lo.

— Quem era aquele cara? — ele perguntou e não pareceu que estava tentando ser intrometido, nem nada. Na verdade, me pegou de surpresa, porque eu não achei que ele tinha visto Suichiro ou percebido o olhar assombrado do outro, nos olhando.

Eu podia mentir! Mas, por algum motivo, eu contei a verdade.

— Seu nome é Suichiro. Estudou comigo no Ensino Fundamental e eu gostava dele. Achei que ele também gostasse de mim da mesma maneira e me declarei, mas ele me rejeitou. Doeu muito, eu fui pro Ensino Médio e acabei tendo o azar de ele entrar na mesma faculdade. E agora estou te contando tudo porque me ajudou a fugir de uma das conversas mais constrangedoras da minha vida. Obviamente, nomeando esta a conversa mais constrangedora da minha vida.

Ele deu risada e, de alguma forma desconhecida, eu também me senti com vontade de rir, aliviada de ter colocado tudo aquilo pra fora.

— Você ainda gosta dele? — Takanori perguntou e eu estranhei.

— Claro que não.

— E por que não quis falar com ele?

— Não sei. Só não quis.

— Você sabe o que ele deve ter pensado ao te ver conversando e indo embora comigo, não sabe? — eu o encarei, questionadora. — Ele provavelmente acha que eu sou seu namorado agora!

Eu não estava pronta pra ouvir aquela frase! Eu achava que estava…