O Segredo de Tixe escrita por Heringer II


Capítulo 11
Dez


Notas iniciais do capítulo

Chegamos ao capítulo final! Tensões, mistérios? Ah, sim.

Espero que gostem! ^^ ♡



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Lívia continuou a fugir na sua moto, até chegar em uma área de planície, sem morros ou relevos altos. Olhou para trás e se impressionou ao ver que Kelvin ainda a perseguia. Percebeu que o homem já estava ofegante, sentiu pena e desceu do veículo, deixando que ele se aproximasse.

— Por que... você... parou? — perguntou, com dificuldades para puxar o fôlego.

— Antes, eu tenho outra pergunta para te fazer. Vale mesmo a pena tudo isso?

— O que quer dizer?

— Olha só o seu estado! Não percebe que você está se matando aos poucos? Todo esse esforço vale a pena por uma jóia?

— Não estou interessado numa mísera jóia. Quem a quer é Cândido. Eu só estou seguindo ordens.

— Bom, então acho que Cândido está abusando de vocês.

— Ele pode estar, mas o dinheiro compensa.

— Dinheiro?

— Ele disse que, se eu e Maycon conseguíssemos a jóia, nos daria 25 mil.

Lívia mostrou uma cara de incrédula.

— Sério? Não acha que isso é um pouco... utópico?

— Ele não mentiu. Ele nos mostrou a maleta de dinheiro que está disposto a nos entregar, se conseguirmos a jóia.

— Mesmo assim, acha que vale a pena passar por isso apenas para ter esse dinheiro?

— Você não entende.

— Então me explique!

Kelvin parou, tentando recuperar o fôlego.

— Eu era dono de uma pequena mercearia em Canela. Eu tenho uma esposa e... tinha... uma filha.

— "Tinha"?

— Os negócios não iam bem. A mercearia faliu, não conseguimos pagar o aluguel e perdemos a casa. A solução foi morar na rua, onde passávamos fome, pegávamos chuva e tínhamos que pedir esmola. Para piorar, minha filha, que então tinha 7 anos, provavelmente devido à chuva, pegou uma pneumonia. Não tínhamos dinheiro para o tratamento. — a voz do homem começou a falhar e lágrimas começaram a escorrer. — Um dia... Eu fui acordá-la e percebi que ela estava morta...

Lívia ouvia àquela história estarrecida.

— Eu percebi que minha esposa também estava apresentando os primeiros sinais da doença. — continuou Kelvin. — Seria demais para mim perdê-la também. Quando eu achava que havia chegado ao fim, Cândido surgiu. Ele disse que estava atrás de algo. Prometeu que, se eu o ajudasse nessa busca, ele daria um lugar para eu e minha esposa ficarmos, e também me daria o dinheiro que eu te falei. E para mostrar que não estava brincando com nossa cara, ele pagou o tratamento de pneumonia da minha mulher, e lhe deu um serviço temporário numa creche em Canela, onde ela também poderia dormir.

— Aquela creche próxima à universidade onde eu trabalho?

— Sim.

— Mesmo assim, o que você está fazendo é errado.

— Você pensa que eu não sei disso!? — disse Kelvin, gritando e caindo de vez no choro. — Mas o que eu posso fazer? Querendo ou não, eu devo a Cândido! Se para compensar tudo que ele fez eu preciso me envolver numa caçada maluca à uma merda de cidade que talvez nem exista, que assim seja!

— Kelvin... É o seu nome, não é?

— É...

— Escuta, eu sei que isso pode parecer o certo agora, mas tudo isso não vale a pena. Sua esposa sabe que você matou um homem?

— Na verdade, acho que ela nem sabe que eu estou aqui.

— Ela gostaria de saber que você foi o responsável pela morte do homem na igreja?

— Acho que não.

— E sua filha? Se orgulharia ao saber que o pai dela se envolveu nessa trama toda?

Kelvin começou a chorar novamente.

— Venha. Eu também posso te ajudar. Talvez eu não tenha tanto dinheiro quanto Cândido, mas... Você não vai precisar matar ninguém.

— Como você pretende me ajudar?

— Eu posso te arrumar um emprego como zelador na universidade, por exemplo. Não paga muito bem, claro. Mas você nunca mais vai precisar atirar em um inocente de novo. E aí?

Kelvin olhou para o chão, como se estivesse analisando a proposta.

— Você promete?

— Sim, Kelvin. Eu prometo.

Kelvin aproximou-se lentamente da historiadora. Lívia podia ver um pouco de alegria nos olhos do homem. Quando ele estava a poucos passos dela, uma bala atingiu a lateral do seu pescoço, matando-o.

Lívia se assustou ao ver mais um homem morrer diante de seus olhos. Olhou para os lados e viu que um grupo tático da Polícia Militar estava se aproximando.

— O homem foi abatido! Cerquem a área! Cerquem a área! — dizia o policial.

*

Emanuel aos poucos se aproximou de Cândido.

— Então eu devo tudo isso a você? — perguntou o perito criminal.

— Você me deve muito mais do que isso, Emanuel.

— Você ordenou a minha morte!

— Eu não queria, Emanuel. Mas você não me deixou escolha! Mas isso não tem importância agora. É aqui onde você vai morrer.

Cândido pegou sua arma e atirou. A bala conseguiu acertar pouco abaixo do ombro de Emanuel.

O perito criminal correu, enquanto desviava dos disparos do delegado. Parou em frente à Gruta da Pratinha.

A Gruta da Pratinha é uma das mais belas atrações do parque nacional. Ela possui uma formação rochosa bem peculiar que serve de teto. Mas a beleza da gruta está nas suas águas. A água da Pratinha é cristalina e possui um tom de azul claro que, só de olhar, já acalma.

Ao entrar na água, de tão clara que ela é, dá a impressão de que se está flutuando. A água também é calma e quente, o que aumenta mais a vontade de dar um mergulho. Há quem diga que a Gruta da Pratinha passa uma vibe de praia. O que não deixa de ser verdade, é um ótimo lugar para relaxar... Desde que ninguém esteja te perseguindo com uma arma na mão.

Emanuel se viu totalmente encurralado. Cândido chegou até ele rapidamente, e logo apontou sua arma para o perito criminal.

— Depois de tudo que eu fiz por você... — disse Emanuel.

— Você sempre se mostrou um rapaz imprudente, Emanuel. Mas eu tenho que admitir, você era um dos melhores policiais com quem já trabalhei.

— Me diga, por que quer tanto essa jóia?

— Bom, já que você está com o pé na cova, te contarei. Emanuel, alienígenas, seres de outros planetas, civilizações mais avançadas do que a nossa... existem.

— Você está louco.

— Escute! Há alguns anos atrás, eu visitei a Chapada Diamantina com a minha família. Diziam que aqui haviam muitos avistamentos de OVNIs. Eu nunca acreditei nisso. Até que, em uma noite, eu vi, próximo ao Morro do Pai Inácio, algumas luzes verdes estranhas, que faziam movimentos circulares. Eu me aproximei para ver melhor. E lá estavam, criaturas estranhas, humanóides, altas. Mas quando tentei me aproximar, elas simplesmente desapareceram.

— Isso parece mais aqueles boatos de internet.

— Foi o que todos pensaram. Ninguém acreditou, mas eu nunca esqueci aquela noite. Quando eu descobri que Flávio Deodoro Mirantes tinha passado pela mesma experiência, e que ele havia conseguido manter contato com as tais criaturas e ainda por cima, havia conseguido um elo para se conectar com elas novamente, tentei falar com ele. Mas ele simplesmente me ignorou.

— E por isso, resolveu matá-lo?

— Entenda! Imagina o quanto isso será significativo para a humanidade! A maior descoberta de todas! A prova de que não estamos sozinhos no universo. E se eu provasse isso? Imagine, Emanuel! Eu seria o homem que mostrou a verdade ao mundo.

— Para mim, você é um maluco.

— Einstein foi chamado de maluco. Cristóvão Colombo idem. Thomas Edison, Galileu Galilei... Todos eles foram desacreditados.

— Mas você em nada se compara a eles.

— Eu te darei mais uma oportunidade, Emanuel. Só uma. Me entregue a jóia!

Emanuel a tirou do bolso. Olhou para Cândido, e depois, simplesmente, a arremessou no fundo do lago cristalino da gruta.

— Foi um prazer trabalhar com você, Emanuel.

Cândido atirou em Emanuel. A bala atingiu o meio do seu torso. Emanuel caiu, o seu sangue vermelho se destacava no meio daquelas águas azuis cristalinas.

Cândido observou o perito criminal agonizando de dor por um tempo, e partiu em seguida.

Emanuel sentiu sua vista ficar ofuscada, até escurecer totalmente. O perito criminal perdeu a consciência em poucos segundos.

*

Emanuel abriu os olhos, a dor havia sumido. Tudo estava escuro.

"Onde estou?"

Sentiu que estava deitado em um chão de pedra. Estava seco.

"Que estranho. Onde está a água? Eu ainda estou na gruta?"

Levantou-se. Imediatamente percebeu que estava dentro de uma pequena caverna.

Olhou ao redor e viu que, à sua frente, havia uma luz. Talvez fosse a saída da caverna. Seguiu até lá.

Aproximou-se da saída e notou que a luz do sol refletia um brilho laranja na parede. Chegou mais perto para ver e percebeu que o brilho laranja era provocado por umas jóias que estavam ali, ainda na forma bruta. Eram o mesmo tipo de jóia que ele estava carregando até pouco tempo atrás.

Saiu da caverna e o que encontrou o fez ficar boquiaberto. Estava ainda numa área ambiental, mas com poucas árvores. O que mais havia ali era, justamente, casas.

Emanuel percebeu que as casas eram construídas de forma que ficassem "misturadas" à natureza. Eram feitas de pedras, mas havia o mínimo de impacto no local em que foi construído, como se os prédios tivessem sido feitos com a preocupação de não degradar a natureza. Entre os homens, esse tipo de construção era conhecida como "Arquitetura Orgânica", e teve como principal influente o arquiteto Frank Lloyd Wright.

Emanuel continuou caminhando, e viu várias outras casas construídas nesse estilo. Parecia... uma cidade.

Existiam algumas pedras enormes, em formatos de esferas perfeitas, com estranhos símbolos esculpidos nela. Emanuel percebeu que os símbolos eram muito parecidos com os que Lívia tinha mostrado a ele antes.

Notou também que havia uma estrada pavimentada, com corrimões dourados ao lado. Difícil dizer se era ouro de verdade. Evandro saberia analisar isso.

Seguiu aquela estrada, até encontrar na sua frente um estranho homem. Ele era incrivelmente alto, aparentava ter cerca de dois metros e meio de altura. Esse "homem" notou a aproximação de Emanuel, e virou-se para o perito criminal. Foi então que Emanuel viu suas outras características. Tinha pele esverdeada, um rosto que parecia humano, olhos de cor azul-marinho.

Emanuel se assustou ao ver aquele homem peculiar, queria fugir, mas algo parecia prender seus pés ali.

O homem verde se aproximou.

— Eu sinto o pavor em você. — a tal criatura estava falando com Emanuel, em português claro, mas não abria a boca. Parecia estar se comunicando por telepatia. — Não tema, Emanuel. Não irei machucar você.

— Como sabe meu nome?

— Cabe a mim saber.

— Como assim "cabe a você"? Quem é você? Ou melhor, o que você é?

— Pode-se dizer que eu sou o guardião dessa cidade. Eu não tenho nome, minha identificação faz-se desnecessária.

— Eu ainda estou no Parque Nacional da Chapada Diamantina?

— Sim e não.

— Como assim? Não entendi.

— Siga-me e entenderá.

O homem andou em direção à entrada da estranha cidade. Emanuel o seguiu.

— Você é um alienígena? — perguntou Emanuel.

— Sim.

— Sério, de verdade?

— Por que és tão cético? Por que é tão difícil de imaginar que, em um universo vastíssimo, apenas este pequeno planeta conseguiria ter vida?

Emanuel não respondeu.

— Eu vim de um planeta não muito distante daqui. Minha raça surgiu de forma semelhante à humana. Aos poucos, fomos evoluindo, e quando atingimos um nível de evolução considerável, começamos a instalar pequenas colônias em outros planetas. A Terra foi um deles. E essa cidade é uma das nossas colônias.

— Então, onde estão os outros?

— Já foram embora.

— E só ficou você?

— Sim.

— Por quê?

— Porque alguém tinha que proteger esta cidade, e os segredos dela.

— Segredos?

— Nós chegamos aqui muito antes de seus ancestrais primatas surgirem. Construímos nossas pequenas civilizações e esperamos até que uma raça que apresentasse uma possibilidade de evoluir a inteligência aparecesse.

— Essa raça é a nossa?

— Sim. Acompanhamos tudo, desde a época dos dinossauros, até o amadurecimento dos primeiros mamíferos. Quando percebemos que o Homo erectus havia desenvolvido a capacidade de manipular o fogo, vimos que uma raça inteligente poderia surgir. E nós acompanhamos sua evolução.

O homem fez surgir algumas figuras na frente de Emanuel, pareciam hologramas, que mostravam o Homo erectus evoluindo para o Homo neanderthalensis e enfim, Homo sapiens.

— A raça humana tinha tudo para ser uma parceira nossa na evolução. — continuou a criatura verde. — Até que ela mostrou sua verdadeira essência.

A criatura mostrou a Emanuel imagens dos portugueses desembarcando no litoral sul da Bahia, onde começaram a matar e escravizar os indígenas que ali existiam.

— A humanidade se mostrou uma raça violenta, e isso nos fez desistir de ajudá-los na sua evolução. Nossa intenção era compartilhar do nosso conhecimento, mas vocês não se mostraram dignos.

— Está me dando um sermão?

— Não, Emanuel. Só estou te explicando o motivo de até hoje não termos feito contato direto com vocês. A humanidade poderia estar bem mais evoluída do que está hoje. Mas vocês sempre usaram o seu conhecimento para as coisas erradas. Usaram suas tecnologias para se destruírem e não para evoluírem.

Foram mostradas imagens das bombas atômicas sendo jogadas nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, da Guerra do Vietnã e dos atentados do 11 de Setembro.

— E parece que vocês não têm nenhum interesse em reverter essa situação...

A criatura mostrou imagens da floresta amazônica sendo desmatada, das atuais reservas indígenas sendo destruídas e de pessoas sendo sequestradas para serem vendidas no mercado negro.

— Não acha que está generalizando? — perguntou Emanuel. — Nem todas as pessoas são assim.

— Mas querendo ou não, isso é uma síntese do que a humanidade vem fazendo nos últimos séculos. Mas não pensem que perdemos totalmente a esperança em vocês. Até hoje, eu faço alguns contatos alguns humanos, para abrir suas mentes.

— Tipo... Eu?

— Sim. Eu já tive o prazer de conversar com grandes figuras brasileiras. Compartilhei parte do meu conhecimento com eles. O imperador Dom Pedro II, Tiradentes, o Marechal Deodoro da Fonseca, o poeta Manuel Bandeira. Além disso, contatei outras pessoas menos influentes.

— Como Flávio Deodoro Mirantes?

— Ah, sim. O entusiasmo dele por descobrir vida fora deste planeta me incentivou a contatá-lo. Também contatei Cândido Assis há um tempo atrás, mas ele queria saber de coisas que ainda não estava pronto para saber. Ele é uma pessoa gananciosa, é por causa de pessoas assim que a humanidade está como está.

— Mas afinal, onde estou?

— Você ainda está no Parque Nacional da Chapada Diamantina. No exato lugar onde estava quando ficou inconsciente. Eu apenas te trouxe para um plano existencial diferente. É assim que escondemos essa cidade.

— Quer dizer que eu estou em... outra dimensão?

— Se quiser chamar assim, está bem. Mas para nós, o conceito de "dimensão" diferencia-se um pouco. Sabe, a minha raça ainda está em constante evolução. Acreditamos que em pouco tempo, a ideia de viver em um mundo de apenas três dimensões espaciais, altura, largura e profundidade, será ultrapassada. Mas isso é uma coisa que você não entenderia. Venha comigo, vou contar-lhe um pouco sobre este lugar. Às vezes, me sinto solitário. Desde que meus amigos foram embora, esta cidade foi esquecida.

"Pelo tempo e pelos homens fora esquecida", Emanuel lembrou-se do primeiro verso do enigma.

— Há mais de um século atrás, um grupo de exploradores encontrou esta cidade. De fato, naquela época ela ainda não ficava escondida. Eles a descreveram num documento, que anos mais tarde foi encontrado.

"No documento número 512 jaz relatada".

— Quando acharam essa carta, uma outra equipe decidiu explorar o local, liderados por um padre. Nós ainda tentamos contatá-lo, mas quando eu percebi que ela tinha intenções gananciosas, decidi esconder a cidade e mantê-la assim. Só entra aqui quem eu quero. Olha... A entrada é ali.

Três arcos se erguiam majestosamente. Um maior no centro e dois iguais, menores, nas laterais.

"A tríade de arcos marca a entrada da cidade perdida".

O homem verde levou Emanuel por vários lugares. Mostrou-lhe a fonte na praça central, os prédios com mais de um andar, as belíssimas estátuas que se assemelhavam às esculturas gregas. Era realmente inacreditável que tudo aquilo estava ali, escondido.

O homem dirigiu Emanuel até uma montanha relativamente alta, com uma correnteza que, ao passar por ela, dividia-se em dois rios. Emanuel notou que a montanha era cheia de diamantes, que brilhavam fortemente à luz do sol.

"Na montanha dos diamantes ainda pode ser encontrada."

— Eu posso saber por que me trouxe aqui? — perguntou Emanuel.

— Como eu já disse, Emanuel, eu tenho fé na humanidade. Eu acredito que vocês ainda podem se tornar uma raça superior, vocês só precisam de algo que os force a fazer isso.

— Acabar com a perversidade humana é algo meio difícil.

— Mas que pode acontecer.

De repente, Emanuel percebeu que as águas dos rios começaram a subir, até atingir os seus pés.

— É impressão minha ou o volume desse rio está aumentando?

Emanuel olhou para frente e viu que a criatura tinha desaparecido.

A água dos rios continuou a subir, agora atingia seus joelhos. Momentos depois, sua cintura. Seus peitos. Em poucos segundos, Emanuel estava submerso em água. Tentava chegar à superfície, mas a água só aumentava. Começou a perder o fôlego, sentiu seu corpo aumentar o peso. Emanuel estava afundando. Mais uma vez, sentiu seus sentidos diminuírem. Sua visão escureceu-se novamente. Emanuel estava inconsciente de novo.

*

Cândido já estava bem longe, dirigindo seu automóvel. Quando estava prestes a voltar para a estrada principal, ouviu uma forte barulho de sirenes. Logo apareceram na sua frente quatro viaturas da Polícia Militar. De cada uma delas, desceram pelo menos uns cinco policiais, todos armados com submetralhadoras Taurus MT-40.

— Cândido Assis, você está preso por orquestrar e ordenar um assassinato no município de Canela, Rio Grande do Sul, e por uma tentativa de assassinato nesta cidade. Saia do seu veículo pacificamente, caso contrário reagiremos com violência!

Cândido ainda pensou em escapar, mas notou que o poderio bélico dos policiais à sua frente era enorme. Seu simples revólver não serviria.

Saiu do veículo com as mãos na cabeça. Os policiais militares se apressaram e algemaram o meliante. Cândido Assis agora era um homem preso.

*

Emanuel acordou. Tossiu até cuspir a água que o afogava. A primeira coisa que enxergou foi o rosto de Lívia Moretti, que acabara de lhe fazer uma respiração boca a boca.

— Graças a Deus! — disse a historiadora, abraçando-o.

O perito criminal olhou ao redor e viu os paramédicos que também ajudaram a ressuscitá-lo. Perto dele também estavam alguns policiais militares.

"Mandou bem, Marcos", pensou.

— Lívia! Está tudo bem? — perguntou Emanuel.

— Estou, sim.

— Onde está o delegado?

— Ao que tudo indica, já está sendo procurado. Não deve ir muito longe.

— E Kelvin? O cara que te perseguiu.

Um semblante de tristeza assumiu o rosto de Lívia.

— Ele... Morreu. E o outro homem?

— O Maycon? Também está morto. Agora, podem me levar para o hospital?

— Por quê? Sente-se mal?

— Na verdade, não. Mas eu tomei um tiro...

— Emanuel, não brinque com uma coisa dessas!

— Não estou brincando, o delegado Cândido me deu um tiro.

— Emanuel, os paramédicos não encontraram nenhum indício de tiro em você?

— O quê? — Emanuel tateou seu corpo, procurando pelo buraco feito pelo disparo. Não encontrou nada.

— Mas eu jurava que...

— Os médicos disseram que você tinha sido afogado. Tem certeza de que o delegado atirou em você? Não o afogou?

— Tenho certeza!

Emanuel olhou para as águas cristalinas da gruta, e viu que de fato não havia marca de sangue.

*

Naquela noite, Emanuel e Lívia estavam conversando no quarto do hotel em que se hospedaram.

— Então Kelvin, na verdade, só queria manter suas família? — questionou Emanuel.

— Sim. — Lívia respondeu. — Eu tinha convencido ele a parar, mas os policiais o mataram antes.

— Estive conversando com um dos policiais, inclusive. Ao que tudo indica, Maycon tinha herdado uma pequena loja de seu falecido pai, mas não tinha dinheiro para mantê-la. Como não queria ver o negócio de sua família falir, ele decidiu ajudar Cândido nessa trama.

— Cândido apenas se aproveitou da necessidade deles. Afinal, por que ele estava tão interessado naquela jóia?

Emanuel lembrou-se da experiência que passara. O homem verde, a cidade perdida, as coisas misteriosas que viu por lá, as palavras do homem.

— Eu não sei, Lívia. — mentiu. — Infelizmente, não sei.

Os dois escutaram as pessoas do lado de fora cantando uma música: "E eu vou, e eu vou... E eu vou, eu vou... Vou subir a ladeira do pelô...".

Olharam pela janela e viram várias pessoas, cantando e dançando. Alguns tocavam surdos, tan-tans, bongôs, e outros instrumentos de percussão. Lençóis, assim como todas as outras cidades da Bahia, tinha a fama de ser alegre.

— Vamos olhar? — Emanuel perguntou.

— Vamos.

O perito e a historiadora deixaram o quarto e se dirigiram até a rua, onde deixaram aquela música contagiar-lhes. Apesar de ainda estarem tristes, por causa da morte de Evandro, aquela foi a primeira vez, desde que pisaram na cidade, que eles de fato aproveitaram a viagem.

*

Horas depois, voltaram ao aeroporto. Lívia e Emanuel sentaram-se do lado um do outro. Em questão de minutos, o avião decolaria, e eles retornariam para Canela.

— Meia-noite no meu quarto, ela vai subir. — Emanuel começou a cantar baixinho. — Ouço passos na escada, vejo a porta abrir...

— Um abajur cor de carne, um lençol azul. — Lívia continuou a canção, após ouvir Emanuel sussurando-a e reconhecê-la. — Cortinas de seda, o seu corpo nu...

A viagem seguiu com os dois lembrando outros sucessos da MPB e discutindo sobre os cantores e compositores brasileiros. 

*

Duas da manhã, desembarcaram no município de Canela.

Emanuel acompanhou Lívia até a rua Borges de Medeiros, que ficava em frente à Catedral de Pedra. Os dois pararam para observar a igreja.

— Foi aqui que tudo começou. — disse Emanuel.

— Foi um dia difícil.

— Realmente.

— O que você vai fazer agora, Emanuel?

— A vida de um perito criminal está sempre em movimento, Lívia. Eu devo seguir investigando cenas de crimes. E você?

— Acho que só voltarei a dar aula depois de amanhã. Duvido que eu acorde cedo hoje.

Emanuel riu. Os dois se olharam.

— Bem, moramos longe um do outro, mas podemos nos ver depois. — disse Emanuel.

— Eu adoraria.

Lívia aproximou-se devagar do rosto de Emanuel. O perito criminal e a historiadora se beijaram.

— Tchau. — Lívia se despediu.

— Tchau.

A historiadora seguiu em direção à sua casa, até Emanuel perdê-la de vista naquela escuridão da madrugada.

Emanuel deu um pequeno sorriso, colocou seu chapéu derby na cabeça, e foi embora.


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Notas finais do capítulo

Deixarei as notas finais para o epílogo.



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