Contos de uma Viajante do Tempo Vol 1 - James Dean escrita por Sofia Casanova


Capítulo 8
Capítulo 8




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Olívia guardou sua bolsa dentro do assento da moto, subiu na garupa e colocou o capacete. Sem muita cerimônia agarrou -se no peito dele.

— Pra onde vamos agora?

— Vou te mostrar o Monte de Dante, onde tudo pega fogo no verão.

            James Dean não andava de moto, ele voava. Olívia sentia um frio na barriga a cada acelerada um tanto irresponsável que ele dava. Apesar de povoada, Los Feliz não tinha tanta gente na rua naquele momento e nem trânsito o que permitiu que ele acelerasse livremente. Debaixo de uma árvore, numa rodovia vazia, ele parou a moto.

— Sobreviveu? - perguntou ele

— É... você ainda não acelerou o suficiente para que eu questionasse essa minha…

— Escolha de estar aqui comigo?

— Não... minha vida. Vai ter que fazer melhor.

            Ele pegou sua mão e atravessaram a rodovia para o outro lado da calçada, onde tinha vista para parte da cidade. O monte de Dante era onde anualmente pegava fogo no verão ou quando os raios caiam.

—Ninguém tem permissão de morar ou ir lá, somente a defesa civil. Mesmo com todo esse fenômeno de queima as florestas insistem em crescer e os animais voltam. A natureza da vida é sempre mais forte, somente nós não temos a permissão de seguir nossos instintos. Pecados mortais.

Olívia estava hipnotizada . Apenas balançava com a cabeça concordando com suas palavras. Ele não era o chato complicado que ela achava. Talvez houvessem dois James Dean.

— De qualquer forma, não acredito que alguém encontre uma solução para isso.

—Não vai mesmo. - Olivia desviou a atenção para o monte – Alguns eventos naturais não podem ser revertidos. E seria perigoso inventar algo achando que vai conter o fogo.

— Venha, vou te mostrar a ponte da poesia.

            Eles foram até a Ponte de Shakespeare. Haviam algumas pessoas batendo fotos nas construções góticas da ponte. Ele a levou para ver o rio que corria por debaixo e as árvores.

— Esqueci de dizer que a Ponte é sem graça. Vou pôr combustível na moto e te levar pra andar em círculos por Los Feliz.

            Olivia usou o banheiro do posto enquanto James enchia o tanque.  Ela estava confusa em relação a ele, pois a impressão que tivera antes estava totalmente equivocada. Como ela ia salvar a vida dele sem interferir na trajetória de vida, do sucesso? Mais cedo ou mais tarde ela teria que andar com ele no meio dos famosos se as coisas fossem longe de mais. Mas ela precisava ter acesso a ele e a casa dele e aos segredos. Ao atravessar a loja ficou surpresa ao ver que as pessoas reagiam a ele de forma natural não como um ator mas um vizinho. Ele conversava com um rapaz que olhava a moto dele e ao aproximar-se percebeu que eram adolescentes que gostavam de motos.

— Sua carruagem está pronta. - disse ele

            Ele diminuiu a velocidade para que ela pudesse ver as casas dos famosos, dos gangsters e locais para comer e comprar roupa. Depois de dar voltas por quase 2 horas, eles pararam em uma casa que ficava fora da visão .

— Esta é minha casa. - ele disse, tirando o capacete. - Preciso fazer uma ligação. Você se importa?

— Não. - Olívia por dentro celebrava. Ela estava exatamente onde queria estar.

            Não era uma mansão, apenas uma casa grande, escondida da visão de quem passa na estrada. Haviam plantas que se agarravam às paredes e às grades próximas as janelas, um jardim limpo com poucas flores que não possuíam cheiro e nenhum pássaro cantando. Não se podia ouvir barulho algum de carros, buzinas, motos. O lugar perfeito para se esconder ou matar alguém.

            Não era luxuoso mas era limpo. Não existiam muitas mobílias, apenas o essencial para parecer ser casa de rico. Pelo que observou ao entrar, ele mal ficava ali ou talvez houvesse algum lugar favorito mas definitivamente não era a sala.

— Preciso ligar pro meu agente ,não demoro.

— Sim, tudo bem. - Disse Olívia sentando-se no sofá.

            Ela viu uma cesta com revistas de famosos e pegou alguns. Diferente das de 2017, as antigas eram cheias de propagandas e poucas fotos do que realmente interessava. Uma propaganda de lingerie aqui, uma piada machista ali. Pelo menos as revistas de 2017 são baratas e cheias de fofocas que vão direto ao assunto. Olívia se perguntava por que alguém assinaria essa revista tão cheia de propaganda.

— Eu sei, vi as fotos nos jornais.

            Olívia aguçou bem os ouvidos enquanto fingia ler alguma fofoca.

— Ele me seguiu a manhã toda, se fosse uma mulher diriam que era minha esposa raivosa e ciumenta. Sabe aquele programa que você me falou, ainda está de pé? Depois a gente se fala então.

            Olívia estava folheando a 3º revista, mostrando indiferença a tudo a seu redor. Havia a foto de algum ator que ela mesma nem sabia quem ela mas que assumiu a homossexualidade.

— Meu Deus, ele é gay? Mas que desperdício!

Ela percebeu que do outro lado da sala, James a observava e ela mostrou indiferença.

— Humm... Quero ver este filme nos cinemas, parece bom.

—Posso levá-la se você quiser.

Ele atravessou a sala e sentou-se na ponta do sofá.

— Se eu souber de que filme você fala.

— We're no Angels. Adoraria assistir com você, se não estiver ocupado.

— Não vou estar.

Olivia guardou a revista e o silêncio começou a ser constrangedor. Ele a olhava e ela suava as mãos.

— É muita coragem sua me trazer aqui na sua casa. Eu poderia te fazer refém mas você nem parece ter medo de mim.

— Você quer me fazer refém?

—Não.

— Pois é.

Olívia riu. Ela perdeu a oportunidade de ficar calada.

— Onde você mora?

— Estou hospedada no Hotel Rosewood.

— Você não quer se hospedar em Los Feliz?

—Ah… não posso eu trabalho no necrotério.

— Ah é! Me esqueci do seu lance gótico.

— Que? - Olívia fingiu estar ofendida

— Ah, me perdoe, eu quis dizer, seu lance científico.

— Hum...melhor.

— Venha, te levo até o Hotel antes que você chegue tarde. Não quero que a senhoria pense mal de você.

Olívia chegou a Rosewood por volta das 6 da noite.

— Quero agradecer pelo dia que você me proporcionou. Você é realmente muito gentil e um cavalheiro, nunca conheci alguém como você. – Ela sabia que estava mentindo. Antes dele houve Donald O’Connor.

Olívia por um momento exitou. Ela não deveria ter dito aquilo.

— Eu que agradeço por você não ter me feito refém.

— Bom...mais uma vez obrigada pelo tempo que passou comigo.

— A gente se vê para assistir aquele filme.

— Sim. Esperarei.

            Olívia subiu as escadas e virou-se pela última vez para se despedir. Pegou a chave na entrada e viu quando ele acelerou a moto. Ela sentia-se muito cansada e desejava urgentemente um banho. No chuveiro ela ficou pensando sobre o dia que tivera e que estavam fora de seus planos. Ela não costumava interagir com ninguém. Era sua regra, mas ver James Dean de perto não deixou alternativa se não arriscar. Após o banho, separou as roupas sujas que deixaria na lavanderia durante a semana . Vestiu um vestido leve e simples para tomar café quando o telefone tocou. Ela pensou ser a Senhora Marple cobrando pelo dia.

— Alô?

— Anne Masterson?

— Sim?

— Chegou bem no seu quarto?

— Desculpe-me mas quem fala?

— Seu refém.

— Ah… James...você me assustou.

 Ela sentiu o coração bater muito forte. Esperou o pior. Ele riu do outro lado da linha.

— Você está bem ?

— Sim… bom saber que meu refém está dando sinal de vida. Você chegou bem?

— Sim, cheguei.

— Como você sabe o número daqui?

— Pedi para a senhoria da recepção.

— Ahhh ...

— O que vai fazer amanhã depois do seu lance científico?

Olivia adorava quando ele falava “lance científico.”

— Bom, acho que não terei nada depois do meio- dia mas não é certeza. Provavelmente almoçarei aqui perto e voltarei para o hotel, mas não é certeza, vai depender muito do legista.

— Humm... bom só liguei para saber como estão as coisas senhorita Masterson. Tenha uma boa noite.

— Você também, James. Adeus

— Adeus.

Apesar de ansiar por uma xícara de café, Olívia estava cansada e ansiosa pelo dia de amanhã. Pegou sua agenda de 1950 e anotou o dia de hoje ressaltando observações que quebravam todas as suas teorias sobre James Dean.

 

(…) Ele é amável e atraente. Eu estava errada sobre ele o tempo todo. Ele é cativante e consegue convencer uma garota a fazer o que ele quer facilmente, mas não vi até agora maldade nisto. Espero que ele me convide para o cinema. Não sei por onde começo nas investigações, mas acho que devo conversar com ele sobre os boatos de prostituição de Hollywood.

            Olívia desistiu de descer e vestiu seu pijama. Colocou o despertador para tocar às 6 da manhã e tentou dormir. Ela sabia que era pedir demais mas ela queria que James ligasse de novo.

            Na manhã seguinte, com sua roupa de “enfermeira”, desceu para tomar café. Ela estava alheia naquela manhã e já estava arrependida de ter arrumado um emprego . Ela havia sido contaminada por um vírus chamado James Dean. Estava intoxicada. Será que ela o encontraria no caminho da Faculdade? Será que ele estava na porta do Hotel esperando-a ou tomando café no Stacey para segui-la?

            Ao voltar para seu quarto, Olívia se deu conta de que havia perdido sua bolsa com seus Óculos e documentos de identificação. Ela jurava que havia entrado com a bolsa. Mas não iria perder tempo procurando. Pegou dinheiro na sua mala para pagar o dia anterior e o de hoje, pegou sua bata, seu livro de anatomia, caderno, estojo.

            Olhou para o relógio: eram 7:00 em ponto. Desceu até a portaria mas não havia ninguém. Pegou um papel e enrolou o dinheiro dentro e escreveu uma carta justificando a quantia, colocou na mesa da Senhora Marple e foi embora. Não podia andar devagar para talvez encontrar James no caminho mas estava bem atenta. Naquela manhã, não haveria aula de anatomia, mas uma autópsia de um ricaço que morrera afogado na piscina.

— Senhorita Masterson ,por favor, anote tudo de forma legível.

— Sim, senhor.

— Há água nos pulmões e o estômago estava completamente cheio de álcool sem nenhum alimento sólido . Não ha lesão no pescoço ou no corpo que indique luta. Conclui-se que a Causa Mortis foi afogamento.

            Olívia anotou os dados e passou a limpo na máquina de escrever. Ela se lembrou de que James poderá morrer afogado também, mas só no Álcool. Supostamente. Entregou ao médico quatro documentos pra que ele assinasse e assim facilitar o despacho de 4 corpos que estavam detidos lá.

            Ela estava lavando a mesa de autópsia mas sua mente estava longe. Ela estava literalmente com a cabeça virada. Fez anotações do trabalho para estudar mais tarde. Tirou a bata e a colocou na lavanderia do necrotério onde só os funcionários tinham acesso. Ao meio – dia ela foi liberada: passou na secretária, assinou o ponto , acertou que receberia por semana, trabalharia Segunda e Quarta os dois horários, Terça e Quinta somente pela manhã, aplicaria provas pela manhã se possível e que sexta- sábado e domingo teria os dias livres pois eram dias de atuação de outro médico legista. Ela teria aquela quinta-feira livre para lavar a roupa e passar a sexta estudando. Precisava se esforçar para não perder o estágio até conseguir salvar James. Ao sair da faculdade seus pensamentos foram interrompidos .

— Psiu... Psiuuuu

            Olívia olhou para o lado para saber quem estava tentando chamar sua atenção, se realmente era com ela aquele “psiu”.

— Ai... enfermeira... estou com uma dor...preciso de ajuda.

James Dean estava de moto a poucos metros da porta da faculdade. Seu coração disparou. Ela andou em sua direção sorrindo, sem acreditar que ele havia encontrado o seu posto de trabalho.

— Enfermeira, me ajude. Eu sinto uma dor muito forte.

— Onde está sua dor?

— Aqui, nos meus lábios.

  Antes mesmo de qualquer reação da parte dela, ele a puxou em sua direção e deu um beijo inesperado. Inesperado também foi a reação dos rapazes que se aglomeravam na porta da faculdade.

Ela sentia seu rosto corar.

— Então… você me encontrou...

— Quer dar uma volta?

 Olívia comprimiu os lábios. Ela ainda estava sobre o efeito do beijo. Há anos ela não sabia o que era beijar alguém.

— Acho que não dá.

— Por quê?

— Tenho que lavar roupa e este uniforme.

— Você faz depois.

—É porque eu realmente preciso lavar. Nós poderíamos almoçar hoje, eu não vou fazer nada a tarde.

— No Parsey’s. Reservei uma mesa para nós .

— Certo. Eu vou levar a roupa pra lavanderia e você me espera.

— Eu vou resolver algo no estúdio e te espero na porta do Hotel em 30 minutos.

— Combinado.

— Ah, a propósito. - Ele levantou o assento da moto e entregou a bolsa dela – você esqueceu isso.

— Meu Deus, eu procurei por toda a parte. Ai, que alívio.

Ele a puxou e deu outro beijo.

— Eu te levo pro Hotel, sobe.

  Olívia, sem pensar duas vezes, se ajeitou com seus livros, pôs o capacete e agarrou-se nele. O trânsito naquela região ficou um caos e eles demoraram mais de 20 minutos para chegar ao hotel.Quando desceu no Hotel, subiu ao seu quarto rapidamente. Separou em uma sacola a roupa que levaria para lavar, jogou o uniforme na sacola e tomou um banho. Maquiou-se e decidiu que não usaria seu óculos nem levaria bolsa. Tomou um banho de perfume e outro de desodorante, usou uma calça Capri com uma camisa de botão com as pontas amarradas na barriga como era a moda da época, fez uma trança nos cabelos. Com muita pressa, correu para a lavanderia. Sua roupa estaria pronta amanhã de manhã.

Voltou para porta do Hotel e James estava lá, esperando.

—Pronta?

Ela definitivamente estava pronta. Para tudo.


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