Contos de uma Viajante do Tempo Vol 1 - James Dean escrita por Sofia Casanova


Capítulo 9
Capítulo 9




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27 de agosto

1 mês e 3 dias para a morte de James

— Eu fiz aula de dança mas não é fácil. Alguns têm talento para sapateado e o meu talento é leitura

— Sei exatamente como se sente. - disse Olívia

— Depois mostro o livro de poesias completas que estou lendo. Acho que combina com você.

— Você acha?

— Sim. Você não parece ser do tipo que gosta de poesias eróticas.

Além de persuasivo ele conseguia ler as pessoas, principalmente se elas forem transparentes como Olívia.

— Não… não gosto.

Uma mão estava apoiando o queixo e a outra estirada sobre a mesa se permitindo receber as carícias dos dedos dele.

— De quem é ?

— O que?

— O livro.

— Meu.

— Não... - Olívia riu. - quero dizer, quem escreveu.

— Ahhh. Withcomb Riley.

— Sei quem é... mas acho que nunca li uma poesia dele.

— Acho-as bastante parecidas com você. Você vai gostar.

— Quero ler ,então.

— Consegui uma coisa pra você.

— O que?

— Ingressos para o filme que você quer ver.

— Sério?

— Vamos no sábado .

— Mas o lançamento não é dia 1?

— Sim, mas tenho cortesia para uma sessão privada.

— Haverão outros atores lá? Mas...eu não tenho roupa pra ir.

— Não… só pessoas selecionadas e nem foi anunciado para o público. Quer dizer, vai ter alguns famosos sim, mas não vai ser estilo a festa do Oscar.

Neste momento, o prato havia chegado.

— Você pode dar graças? - perguntou ele.

— Claro!

  Até os anos 80, os Estados Unidos era a maior nação cristã, perdeu em 2017 para o Brasil que se tornou a maior nação cristã do mundo. O hábito de dar graças se resumiu ao dia de Ação de Graças.

  Olívia deu graças pelo alimento e depois começaram a comer. Ela tinha que dar um jeito de se manter distante dos atores daquela época.

— Então... posso ir com um vestido normal? Quero dizer...como se fosse um encontro?

— É um encontro. E não, você não pode ir com um vestido normal. Eu sei onde arranjar um vestido para você.

  Ou ele era o homem perfeito ou os anos 50 não havia ensinado os homens a judiarem das mulheres , mas Dean sabia exatamente o que fazer para derrubar qualquer parede.

— Eu posso cozinhar algo pra você qualquer dia desses. Você tem alergia a alguma comida? Tem algum prato que detesta?

— Gosto de tudo.

— Então, vou fazer um prato gostoso. Só me diga o dia.

— O que você vai fazer sexta e sábado?

— Tirando o cinema, eu vou pegar a roupa na lavanderia, estudar, anotar algumas coisas da aula, pagar à senhora Marple. Só.

— Vamos pro Novo México Sábado de noite. Depois do cinema.

Ele não recebia não como resposta.

— O que vai ter lá?

— Um casamento. Um amigo vai se casar com a filha de um fazendeiro e vai ser uma festa mexicana daquelas. E não se importe com a roupa, são pessoas simples.

Olívia queria dizer que não podia mas ele cortou.

— Só voltaremos de madrugada.

Mais uma vez ela tentou falar.

— Você pode levar suas coisas pra minha casa, te trago de volta no domingo de noite.

Olívia ficou olhando-o . Ela estava tentando pensar em algo mas perto dele ela não pensava. Mais uma vez tentou resistir mas ele foi mais rápido.

— Você pode dizer para a senhora Marple que você vai para um congresso e só voltará domingo de noite para que ela não pense mal de você, se isso te incomoda.

Ele já havia arquitetado tudo na mente. Ela não teve escolha

— Tá. - ela sorriu

Resistir seria perda de tempo.

***

 -Eu vou deixar o pagamento adiantado porque eu só vou voltar domingo. Deixei alguns de meus pertences no quarto.

— A senhorita só vai pagar metade, já que não vai fazer usufruto de jantar e café.

A senhoria deu um comprovante de pagamento e ficou com um.

— Boa viagem senhorita Masterson. Nos vemos no domingo.

Ela entrou no táxi com Dean e seguiram até sua casa em Los Feliz. Ele a hospedou em seu quarto de hóspedes no primeiro andar.

— Espero que você goste do seu humilde quarto.

Era uma cama de casal com colchas brancas e uma janela que dava para o jardim da parte de trás da casa.

— Está perfeito. - disse Olívia.

— Fique confortável. Eu vou comprar o jantar da gente e um lanche, a gente podia assistir filmes na sala hoje.

— Tipo, uma sessão até de manhã?

— Se você aguentar. Eu volto logo, fique a vontade.

  Olívia esperou que ele fechasse a porta da sala, ouvindo atrás da porta do seu quarto. Colocou com rapidez as roupas no guarda- roupa concentrando-se no som da moto. Ligou o gravador do celular e colocou no soutien, pegou sua máquina fotográfica digital e pôs no bolso. Para garantir que não havia ninguém em casa, fingiu que James estava esperando-a na sala.

—James, cadê você? Já desfiz as malas. - ela desceu as escadas de forma ruidosa. Queria ter a certeza que não havia absolutamente ninguém em casa. - James? - propositalmente andou por alguns cômodos. - Alô? James você está aqui? - Silêncio. Pôs a cabeça na cozinha. - Alô? Alguém em casa? - Silêncio. - Ah que pena… acho que ele saiu… vou esperar no quarto então. - Silêncio.

— Aqui é Olívia Weiss e estou com um gravador no peito. Estou no ano 1955 , 27 de Agosto. Estou na casa de James Dean em uma batalha em favor de sua vida. Não há ninguém em casa agora e preciso de um plano para salvá-lo . Vou observar pelas janelas do primeiro andar se existe alguém que vigia a casa. - Olívia subiu as escadas e abriu as portas dos cômodos que encontrou. - Alguns quartos são de hóspedes e as janelas estão fechadas. Opa! Achei o quarto dele e a janela esta aberta. O quarto está bagunçado. Vou ver se daqui dá pra ver o que preciso. - Olívia foi em direção à janela que estava aberta. - jardim, sem carro, sem caseiro, sem empregada. Nenhum carro estacionado na rua.- ela virou-se para observar o quarto. - Não acho que vou encontrar algo aqui. Quero deixar registrado que se eu desligar o gravador é porque alguém chegou. Aqui tem violão, bola de futebol americano, um quadro com um pôster de um filme. Sem livros. - Olívia voltou para a janela. Nenhum movimento – Quero em 20 minutos ter meu relatório gravado. - ela abriu o guarda-roupa dele e fechou. Abriu as gavetas e estavam vazias e algumas com maços de cigarros. - Nada. Vou
sair do quarto.

  Sempre com os ouvidos bem atentos, andou pelo corredor, procurando algum escritório ou local cheio de livros e documentos. A última porta estava trancada. Ela olhou pela fechadura e não identificou nada, apenas uma parede branca. Na porta de frente a esta ela olhou também pela fechadura e viu uma mesa. Bateu na porta para garantir que não havia ninguém para não ser pega de surpresa.

— James, já estou pronta, você está aí? Ouvi passos no corredor. - ela abriu a porta e não havia ninguém. - Excelente. Estou em um escritório e não há ninguém. Tem uma estante cheia de livros, uma mesa com cadeira, talvez seja o escritório dele. - ela procurou pelas gavetas da mesa. Haviam recibos de gasolina, maço de cigarros vazio, revistas. Abriu outra gaveta e havia um envelope grande, amarelo . Ela pegou o envelope e ficou perto da porta para ouvir qualquer movimento estranho.

  Haviam fotos dele no envelope e ela passou uma a uma: Sem camisa, roupas de banho, deitado na areia com um homem. Ele estava muito jovem na foto, diferente de como está hoje, talvez o corte de cabelo. Após 5 fotos, Olívia tomou um choque: haviam fotos dele transando com uma mulher.

— Agora, estou vendo fotos dele com pessoas que não conheço e ele esta fazendo sexo com elas, mas não sei se é um filme pornô ou apenas fotos.

   Ela não reconheceu a mulher mas provavelmente alguém que, assim como ele, estava procurando seu lugar ao sol mas encontrou o inferno. Talvez tenha sido nesta época que ele teve que dormir com pessoas de ambos os sexos para conseguir chegar aonde chegou. Olívia dispôs as fotos na mesa e registrou as imagens com sua câmera digital. Ela devolveu o envelope cuidadosamente e saiu do escritório.

— Estou voltando para meu quarto. Vou perguntar a James hoje se ele conhece Bosco Niemens. Preciso inventar uma história e ver o que consigo. Fim da gravação.

  Olívia guardou tudo em sua mala , pegou seu livro de anatomia e foi em direção à sala. Sentou-se no sofá e folheou o livro mas sem interesse algum. As fotos não saiam de sua cabeça. Hollywood era um poço de miséria e cada luxo por metro quadrado escondia o verdadeiro lixo que era. Eram 15:30 da tarde quando James finalmente chegou. Ele entrou com sacolas e passou por ela, atravessando a sala e indo direto à cozinha.

— Eu soube que teremos forte tempestade então comprei tudo que precisávamos para hoje e amanha, pra ninguém precisar cozinhar e sobreviver a esta noite.

— Precisa de ajuda aí?

Silêncio.

— Voltei. - ele se jogou no sofá. - e ai? O que quer fazer? - ele pegou o livro das mãos dela – o que é isso?  Um pulmão…Seguimento Lingular Esquerdo , Seguimento Apical …como uma menina como você pode gostar disso? - ele segurou o livro.

— Eu não gosto, eu preciso. Gosto de poesias. Cadê as que você ia ler pra mim.

— Vou pegar. - com um só pulo ele levantou-se do sofá e subiu as escadas.

  Olívia se perguntou por que ela estava mentindo para si mesma? Era mais do que óbvio que ela não estudaria até segunda-feira. Se ela não puser freio, ele faria da sua vida uma miséria total: festas, comida de rua, festas, dormir tarde, festas de novo, cinema. Olívia estava ciente que não estava apaixonada por ele mas ela sentia algo e além desse algo, a obrigação de defender sua vida até o fim do prazo que seria dia 30 de Setembro. O mais assustador na data era que Donald O’Connor morreu velho em 27 de Setembro de 2003 e seu aniversário era amanha, dia 28 de Agosto.

Jogou o livro no chão e esperou que ele descesse. Olhou pela janela e não viu nuvem alguma, mas os Estados Unidos era sempre assim: não havia nuvem alguma mas depois de algumas horas, vinha uma neve daquelas.

— James Withcomb Riley– disse James vindo em sua direção – Você pode levantar do sofá?

  Olívia levantou-se e ele deu-lhe o livro para que segurasse. Pediu licença para que ela desse espaço e armou um sofá-cama. Ela nem imaginava que isso existia naquela época. Ele abriu as janelas e jogou-se no sofá.

— Pronto, agora pode deitar.

— Eu não sabia que existia isso aqui. Eu adoro sofá-cama. - disse ela

— Achei que este sofá fosse novidade.

— Ah... eu tenho uma tia que tem problema nos ossos e ela usa um desses porque é ortopédico.

— Ahhh...

Foi por pouco.

— Me mostra a parte que parece comigo. - desviou ela do assunto.

Ele folheou algumas páginas até que encontrou o que queria.

 

Quando ela voltar para casa! De mil maneiras
Imagino a ternura
De minha alegre acolhida; sim, vibrarei
E a tocarei, como quando, nos velhos tempos,
Toquei suas mãos de menina, sem ousar erguer
Os olhos, tal era minha doce aflição.
Depois, o silêncio. E o perfume de seu vestido.
A sala oscilará um pouco e, por algum tempo,
Enevoados ficarão meus olhos – até mesmo minha alma.
E haverá lágrimas, sim. E um nó na garganta,
Por saber que tanto desmereço o lugar
Que seus braços prepararam para mim. E o tom soluçante
Acalmo com beijos, antes que a face lacrimosa
Mais uma vez se esconda no velho abraço.

— Talvez haja alguém no Texas que se sente assim já que você está bem longe - perguntou ele, tirando os óculos

— Acho que minha mãe não me receberia desta forma.

— Não há ninguém lá te esperando para ir ao cinema?

Olívia riu.

— Não, ninguém quer ir ao cinema comigo. Não lá.

—Nem os dá faculdade?


Este era o gancho que Olívia precisava para tocar no assunto.

— Falando nisso… eu ouvi uma coisa estranha de alguns alunos enquanto estava trabalhando. Você se importaria de me dizer se é verdade?

— O que foi?

— Um rapaz estava conversando na janela do meu escritório… ele disse...ele disse que desistiria de ser ator porque foi oferecida a ele uma proposta de sexo em troca de oportunidade e era sexo com outro homem. Ele também disse que o homem que ofereceu afirmou que todos fazem isso. É verdade?

— Bom… - James ficou pensativo. Ele voltou a deitar-se - Ele não mente completamente, mas nem todos precisam fazer sexo para conseguir algo. Alguns começam com carreira anônima de modelo, outros trabalham na prostituição pura sem ligações com produtores de cinema e alguns infelizmente alguns fazem favores sexuais . Um dos meus agentes por exemplo é envolvido com essas coisas, arruma meninas para festas e orgias e é envolvido com rituais de magia negra, essas baboseiras que ele acredita.

— Bosco Niemens? - perguntou Olívia

— Você conhece ele?

— Foi esse o nome que o rapaz da faculdade citou.

— Bosco Niemens é um feiticeiro excêntrico. Provavelmente, se eu colocar a cabeça na janela eu o verei vigiando minha casa. Ele favorece a muitos em Hollywood e por isso ele nunca é indiciado por aliciamento de menores e promoção de prostituição.

— Parece até que ele tem ciúmes de você… pessoas assim são capazes de matar.

—Ele acha que sou fantoche dele e já provei que não, por isso me vigia para saber onde estou, quando estou, com quem ando.

Olívia teria que ficar de olhos bem abertos para perceber se está sendo seguida ou vigiada enquanto estiver na casa dele. Bosco Niemens é um fanático, sociopata e cafetão. Ela não ficaria admirada se ele tivesse ligações com o trafico de mulheres. Olívia sentiu gotas de água sobre sua face e percebeu que a chuva começara a cair e o vento soprara as gotas para dentro da casa, caindo neles e no sofá. James fechou a janela e as cortinas.

— Que tal uma sessão ?

— O que vamos assistir?

— Tenho Western, Spagetti, Terror , Detetive e os Clássicos do Romance.

— Qual você programou pra ver?

— Terror.

— Adoro.

Ele tinha uma coleção de rolos de filmes de terror. Ele abriu um armário que guardava uma grande tela, montou o equipamento de rolos de filmes .

— Venho já. - Ele subiu as escadas e voltou com edredons e travesseiros.- A temperatura vai cair daqui pra de noite.

  Ele deitou-se e ela preferiu sentar-se para assistir aos filmes de mortos-vivos. Ele alisava suas costas, um convite claro para que ela se aninhasse em seus braços, o que ela estava evitando. Quando ela cansou as costas , deitou-se e ele procurou sua mão, acariciando-a. Ela reagia ao toque das mãos, não queria que ele se sentisse rejeitado e de fato não queria rejeitá-lo. Entre trovões, relâmpagos e chuva forte, a noite seguia entre lanches, mais filmes e por fim, antes das 22:00, eles cochilaram nos braços um do outro.

Dia 2 – 28 de Agosto

  Olívia acordou no sofá da sala, sozinha. As janelas estavam abertas e o sol estava lindo, como se nenhuma tempestade tivesse acontecido. Cheiro de bacon assado e café estavam no ar.

— Bom dia – disse James, pondo a cara fora da cozinha

— Oi… - Olívia levantou-se rapidamente - vou usar o banheiro, venho logo.

  Ela havia dormido com maquiagem e provavelmente estava com a cara parecendo uma arte abstrata de Picasso. Ao se olhar no espelho estava do jeito que sempre ficava: cabelo armado, os olhos borrados de rímel e o rosto oleoso. Havia também uma espinha acima da sobrancelha. Ela tirou a calça Capri e a camiseta, vestiu um roupão, lavou o rosto com sabonete e escovou o dentes. Prendeu os cabelos e desceu para comer.

— Quer café ou suco? - perguntou James

— Vou precisar de café. Muito café.

— Fiz um especial : Cappuccino com creme de baunilha. Já experimentou?

— Não, sempre quis aprender a fazer esse tipo café, mas provavelmente eu colocaria o creme na boca.

— Não seja por isso – ele levou o spray de creme de baunilha na boca dela e apertou.

Tinha gosto de suspiro e derretia como algodão doce.

— Isso é bom mesmo. Como você ainda não comeu isso tudo? - ela falou de boca cheia

— Descobri hoje que tinha esse creme aqui. Acho que é da Brigite, ela geralmente toma café aqui quando vem limpar a casa. Quando ela chegar na segunda vai estar apenas a embalagem.

Olívia sentou-se à mesa e fez seu prato: Ovos, bacon, fumegantes, e torradas de cebola.

Ele deu graças pelo alimento.

— Toda aquela comida de ontem não me fez ficar com menos fome hoje.

— Todo dia é de comer, é o que sempre digo. – disse Olivia cortando a gordura do bacon e colocando na boca.

— Você me prometeu um almoço.

— Quando posso fazer?

— Amanhã. Você me diz o que precisa que eu compro.

Olívia cortava o Bacon com o garfo mas James comia com a mão.

— Não sei você mas eu amo bacon. - disse ele, comendo com as mãos e com os cotovelos na mesa.

 Ela não tinha o costume, nem na guerra, de comer com a mão. A mãe a repreendera tantas vezes.

— Seu bacon está delicioso – ela disse. - Eu não sei fritar bacon, sempre acho que fica cru e gelado. Eca!

— Você tem que deixar fora da geladeira antes de dormir ou dependendo da quantidade, 1 hora antes de fritar quando acordar. Se não descongelar bem não frita.

Quando as torradas e os ovos acabaram, Olivia pegou o que sobrou do bacon e comeu com as mãos.

— Vamos pra praia hoje? - perguntou ele – Tenho amigos que estarão lá e são gente boa.

— Eu não tenho roupa de banho.

— A gente compra na loja aqui perto.

Após o café, Olívia levantou-se para lavar os pratos e ele a impediu. Disse que cuidaria de tudo. Depois do banho, usou um vestido simples e foram procurar uma roupa de banho.

— Que horas são? - perguntou ela

— São 08:30. Acho que chegaremos por volta de 10:00 horas lá, talvez menos, depende do trânsito.

Encontraram uma loja ha poucos minutos. Olívia, que não queria estragar o programa , tratou de procurar um maiô ou biquíni com muita rapidez. O choque cultural de épocas era muito forte. Em 2017 os biquínis eram cada vez mais ousados e os de 1955 foram feitos para que a mulher se sentisse bem vestida mesmo com poucas roupas. Encontrou um biquíni com o top tomara que caia florido e a calcinha que batia no umbigo. James ainda comprou para ela um chapéu de praia e um óculos escuro. Ela ficava com vergonha da forma como ele a cortejava, mimava e gastava. Na casa dele, ela usara um vestido simples por cima do seu novo biquíni e ajudara -o a arrumar uma mala para caso eles precisassem ficar por lá, o que Olívia esperava de coração não precisar.

— Quero bater uma foto sua . - disse ele com uma máquina fotográfica nas mãos.

Olívia evitava registros mas não tinha como negar para ele.

—Claro.

— Aqui, neste coqueiro. - ele colocava uma lâmpada pequena , própria para máquinas fotográficas.

De chapéu e de óculos ,ela posou.

— Agora tire o óculo e o chapéu.

  Olívia, a contra gosto, tirou o chapéu mas viu um carro aproximando-se deles e a expressão de James tornou-se dura. Um homem alto, calvo e de aparência arrogante saiu do carro em direção a eles.

— Ei amigão, onde esteve. Liguei pra você ontem o dia todo e só dava ocupado. Tirou do gancho de novo?

— Oi, Bosco. O que quer? Vou sair. - ele desmontava a câmera fotográfica e colocava em uma bolsa.

O coração de Olívia gelou. O feiticeiro em pessoa estava na frente dela, provavelmente o assassino dele. Ela não escutou o que eles estavam conversando mas queria ficar invisível naquele exato momento. Ele virou-se na direção dela e voltou a conversar com James.

— Me ligue quando der, começaremos na segunda.

Ele não a cumprimentou, nem sorriu. Olívia julgou que ele devia pensar que ela era mais uma na cama dele e que por isso não a tratou com educação. Ela não se importava desde que ele ficasse longe.

— Me perdoe por isso. - disse ele

— Por quê ?

— Eu não queria que ele descobrisse você.

— Esse é o bruxo de quem falamos?

— Ele mesmo. Provavelmente um dos meus 3 agentes deu um sinal de alerta de que eu estava com alguém. Pois é. Eu pago para que eles trabalhem pra mim e eu sou controlado por três: um bruxo, um fofoqueiro e outro menos pior que me arrumou ingresso para irmos ao cinema amanhã. Eles trabalham duro para vender a minha imagem de rebelde, alcoólatra e Don Juan. Acho que se descobrissem que na verdade bebo refrigerante, cerveja e leio poesias eu iria falir Hollywood.

— Eles que vão perder se você sair de vez.

— Ou eu. Não sei de que vou trabalhar. Talvez volte pra casa e ajude meus tios na fazenda.

— Ou a gente viaja para bem longe daqui. Poderíamos viajar no tempo, para o futuro.

— É? E para que ano você me levaria?

— Humm… uns 2017.

— 2017? O que tem lá? Robôs? Aliens?

— Err... não exatamente… Mas você poderia ser dono da maior montadora de Porsche ou de Moto, por exemplo.

— Ou ser dono de uma escola de dança.

— Ou dono de um teatro e dono e uma escola de dança... em Londres.

 Ele a tomou pelas mãos e começou a dançar

— Eu ia ter uma companhia de dança e teatro e com o dinheiro, cobriria você de joias, vestidos caros.

Ele a beijava no pescoço

— Gosto de muitas joias, Sir. Dean. Quero ter joias nos cabelos e longos colares que vão até o pé, porque não gosto de sentir frio. Ah... e meus cachorros serão Chihuahuas irlandeses do pêlo vermelho.

— Existe esse tipo de cachorro? - perguntou ele

— Na verdade, inventei agora.

— Assim como inventou nossa vida em 2017?

— Não é de todo, mentira. Se você pudesse viajar para o futuro, você iria?

— E porque eu iria?

— Para sumir de vez das vistas dos seus 3 agentes psicopatas, por exemplo.

James riu,incrédulo.

— Você tem uma imaginação fértil.

— Também pretendo ser escritora se nada der certo.

Ele fechava o porta malas do Porsche.

— Mas se você pudesse, você iria?

— Não. - respondeu ele – Gosto do ano que vivo e também, posso lidar muito bem com os meus 3 agentes psicopatas.

— Você que sabe . - ela deu de ombros. - Posso dar um jeito neles, se você quiser. - ela abriu a porta do carro e sentou-se no banco da frente.

— Você vai obrigá-los a ser seus cobaias na aula de anatomia?

— Pensei em algo menos gentil, mas sua ideia é boa. Estamos precisando de mortos voluntários na faculdade. - ela colocou o cinto de segurança.

  Ele dobrou o teto do carro para que ficassem expostos ao sol e ao vento. Entrou no carro e colocou seus óculos escuros.

— Vamos pra praia , viajante do tempo. Não temos hora pra voltar.

  Quando saíram da casa dele, Olívia olhou atentamente para a rua, procurando algum carro escondido, vigiando-os ou seguindo-os. Quando pegaram a estrada, o vento forte e o calor ficaram intensos. James ligou a rádio e a música que tocou era familiar para Olívia, era uma de suas favoritas.

— Essa música é linda, James. Você já ouviu antes?

— Não… não que eu me lembre. Quem canta?

— Cliff Richards . Essa música chegou em primeiro lugar nas rádios de Londres.

Ela aumentou o volume e começou a cantar.

The young ones,

Darling we're the young ones,

And young ones shouldn't be afraid.

To live, love

While the flame is strong,

for we won't be the young ones very long

— Você canta bem. - disse ele

— Obrigada. Você acha que eu me sairia bem em Hollywood em uma carreira de cantora?

— Acredito que sim, ultimamente eles têm feito muitos musicais. Mas te aconselho a não tentar, eles se cansam rápido de quem canta e dança.

   Era uma realidade: Em 2017 não existiam mais filmes cantados e quando havia algo, geralmente era alguma série para adolescente tentando lançar algum cantor na mídia, mas nada que se comparasse ao cantores da geração de 1938 à  1950. Não havia talento de verdade, apenas dinheiro.Quando finalmente chegaram na praia, ele diminui a velocidade do carro e sempre buzinava para um ou dois que falava com ele. Encontraram uma vaga em meio ha um mar de carros e motos. As praias brasileiras que Olívia visitara eram muito mais bonitas que as da Califórnia mas ainda assim, esta conseguia uma façanha que outras não possuíam: convidar a conversar e a jogar com estranhos. O ambiente não era para os tímidos. James colocou seus braços nos ombros dela e andaram em direção a um bar.

— Ei, Dean.

— Ei, Jimmy. Onde estão todos?

— Estão perto dos 7 coqueiros.

— Valeu.

  Eles andaram pela calçada em direção ao local. Fervia de gente naquele lugar e em sua maioria, adolescentes. As nuvens cobriam o sol uma vez ou outra mas não mudava o calor daquela manhã. Olívia estava desejando um mergulho.

— Alguns dos meus amigos dos Sets de filmagem estão aqui. A maioria são figurinos, aspirantes, modelos. Você vai gostar deles. Olha eles lá. - apontou.

  Haviam de fato apenas 7 coqueiros no local mas todos tinham formas diferenciadas: um era reto, outro em forma de C, outro em forma de U ou S. Eram coqueiros anormais para os padrões botânicos.

— E ai, Djean! quem é vivo sempre aparece. Você chegou e a cerveja também!

— Hey, Carl. Essa é Anne. Anne este é Carl, ele ajuda a montar os Sets mais difíceis.

—Olá, Anne. Quer cerveja?

— Não, obrigada.

— Você é menor de idade?

—Não, eu prefiro refrigerante.

— Temos refrigerante ali no pote vermelho, pegue a vontade

—Obrigada.

— HEEEY ,Dimmy – gritaram mais adiante – JÁ JÁ TEREMOS CHURRASCO!

— Estaremos lá! - gritou ele

— O QUE?

— EU DISSE, ESTAREMOS LÁ!

 O rapaz confirmou com a cabeça e continuou dançando.

— Vou procurar um lugar pra ficar Carl, não se esqueça de mim quando começar o churrasco!

— Sem problemas. Cynthia chega daqui a pouco com a carne.

James pegou na mão de Olívia e procuraram um lugar na areia.

— James, querido! Você veio.

Uma jovem, com biquíni de bolinhas vermelhas e uma touca na cabeça , acenou para eles.

— Ei, Ellen.

— Fique aqui comigo e com o Paul

  James conduziu Olívia até o casal. Haviam dois guarda-sóis abertos e Paul deitou-se embaixo de um deles.

— Olá. - disse Olívia

— Elen – a moça estendeu a mão – esse e meu noivo, Paul.

— Anne. Olá , ela acenou para Paul

  Ela tirou o vestido e o chapéu e deixou dobrado perto de James. Manteve os óculos escuros e deitou-se na areia. James estava sentado mais acima, debaixo da sobrinha, e acariciava a testa dela. Ele conversava com o casal do lado e Olívia apenas sorria ou acenava com a cabeça, sem participar muito. Depois de algum tempo, um carro estacionou perto de um dos 7 coqueiros e com grandes caixas de som.  Uma grande quantidade de gente se aglomerou para dançar e outros preferiram mergulhar.  Elen e Paul foram tomar banho de mar enquanto Olívia e James ficaram deitados, preguiçosamente na areia.

— Eu poderia dormir aqui até o inverno. Faz muito tempo que não sei o que é praia. - Disse Olívia

Olívia surpreendeu-se ao ouvir The Young Ones tocar outra vez.

— James... minha música está tocando de novo.

Ainda deitada, inclinou a cabeça para trás e olhou em direção a ele, e cantou.

Tomorrow,

why wait till tomorrow,

Tomorrow sometimes never comes.

So Love me,

there's a song to be sung

And the best time is to sing while we're young.

Once in every lifetime

comes a love like this.

I need you and you need me.

Oh my darling can't you see.

Young dreams

Should be dreamed together,

Young hearts shouldn't be afraid.

And some day when the years have flown

Darling, this will teach the young ones of our own.

— Você tem uma voz adorável .

— Você precisa me ouvir fazendo o som da guitarra e da bateria com a boca

  Ele riu. Olívia era a única que ele conhecia que fala várias coisas emendadas e fazia parecer engraçado. Unia um elogio a alguma piada ou declaração de amor com alguma situação engraçada. Ela, certamente, era diferente das moças daquela época. Qualquer uma delas perto de Olívia, não riria de nada do que ela falava, porque segundo as boas maneiras, uma moça deve ser silenciosa, misteriosa e calma. Ela falava muito, era transparente, sincera e agitada.

  Alisando o queixo dela, ele a beijou. Foi o primeiro beijo de língua desde que se conheceram. Naquele tempo, beijo de língua era coisa de casados: para Olívia era um prêmio visto que não beijava desde a década de 50 e ainda pulou pra 2015 e viveu até 2017 sem saber o que era isso, literalmente e para James, era a primeira que não estava com ele pelo que ele podia oferecer: oportunidade de atuar. A primeira em quem ele confiava.

            A amiga de James, dona de uma grande casa na praia Hermosa da Califórnia, chegou com todo o aparato alimentar para um churrasco. Depois de alguns mergulhos, eles foram até a casa dela, seguindo seu carro até lá. A tarde toda foi festa, piscina, insolação e churrasco. Veio uma forte chuva mas ninguém quis sair da piscina. Haviam atores que Olívia sabia que futuramente seriam grandes nomes na calçada da fama mas naquele momento eram Zé Ninguém, modelos caçando algum casamento e alguns apenas ali por sexo. James não tinha vergonha de mostrar que estava com Olívia, ou Anne: alisava seu rosto, tocava em sua mão, beijava. Ele não escondeu de ninguém. Infelizmente, alguns vizinhos se incomodaram e a festa acabou às 18:00 com a chegada da polícia.

            Olívia não sabia o que era se divertir e relaxar desde que entrara na faculdade. Sempre tensa, rígida, dura e disciplinada, nunca tinha tempo para se divertir porém James Dean veio e pôs tudo de cabeça pra baixo: enquanto estivesse ali, esqueça as regras, disciplina, comer verduras e ir para a cama às 21:00 horas. Com ele, não havia hora. Cansada até os ossos, Olívia só queria cama. Depois de um banho demorado e muito condicionador nos cabelos, ela enrolou-se no roupão. Passou creme no corpo e penteou os cabelos. Pegou seu secador e foi até o quarto de James.

— Você se importa se eu usar o secador?

— É sério que você está me pedindo permissão pra usar o secador?

— Eu não quero que a energia venha cara.

— Não, não vai vir cara e nem vai faltar energia no Norte porque você esta usando o secador.

  Olívia morava só e sabia que tinha que ser econômica em tudo o que fazia, até porque não era rica. Mesmo tendo vida boa na casa de seus pais, ela fora ensinada desta forma e isso a ajudou a se adequar ao racionamento da Segunda Guerra. Ela ligou o secador e tentou modelar o cabelo o mais rápido possível pois estava com muito sono e dormir com o cabelo molhado não era ideal para cabelos como os dela.

— Acho que você é a única nos Estados Unidos com cabelos longos . - disse James entrando no quarto dela.

— Tenho pena de cortar. Acho que desde a guerra só cortei umas 3 vezes e olhe lá que nem foi isso tudo.

Ela desligou o secador e começou a retirar os fios presos no pente.

— Você fica diferente sem topete. Fica tipo: "Está faltando algo na sua cabeça" - disse ela

Ele riu

— Sua cabeça diminui, eu acho.- ela acrescentou

Ele gargalhou

— Mas eu ainda consigo te reconhecer. - disse ela andando em direção ao guarda-roupa.

Abriu sua mala e percebeu que não havia levado pijama.

— Ai, que droga.

— O que foi?

— Esqueci o pijama no hotel.

— Eu te dou uma camiseta minha. - ele levantou-se e andou em direção a seu quarto.

Ele voltou com uma camiseta preta de botão.

— Acho que preto combina com você. - disse ele. Entregou a camiseta a ela e voltou a deitar-se na cama. - Posso dormir aqui hoje?

— Pode! Eu adoraria. - ela andou em direção ao banheiro. Fechou a porta atrás de si e perguntou – Eu vou fazer o almoço amanhã, você gosta de comida italiana?

— Gosto.

— Você tem macarrão e molho? Vou precisar de queijo também e se tiver alguma carne eu farei umas almôndegas. Não sei se é italiano na verdade, eu que inventei o prato , sabe? James? - ela abriu a porta e James já não estava no quarto.

Ela apagou a luz do banheiro e ficou se questionando onde ele havia ido. Ouviu passos pesados no corredor.

— Voltei. - disse ele – O armário já está abastecido , esqueci de dizer que Brigite fez compras na terça. Tem o que você precisa para fazer o almoço na geladeira ou no armário.

— Bom, então… - ela desforrou a cama e deitou-se. - Você vem? - ela bocejou

— Você ficou linda nesta blusa. Ficou melhor do que eu – disse ele fechando a porta atrás de si.

Ela acendeu o abajur para que ele não caminhasse no escuro até a porta. Ele andou em direção da cama, sentou-se e pegou nos pés dela.

— Você não me contou sobre sua cicatriz. - disse ele – Como foi?

Ele sentou-se perto de seus pés e acariciou a cicatriz.

— Bom, eu era enfermeira. Estava faltando remédio e fui buscar em um posto que havia sido abandonado. Foi bombardeado mas ainda haviam remédios lá. Haviam alguns homens  nazistas pervertidos rondando o lugar e me viram. Eu corri por entre os escombros e escorreguei e foi ai que cortei. Meu pé ficou enganchado no meio de algumas pedras.

— E os pervertidos?

— Eu tinha uma arma, matei os três.

— Essa é minha garota. - ele beijou os pés dela. - Quantos anos você tinha?

— 17 anos.

— Então você tem 27 anos?

— Sim.

— E não casou?

— Algumas de nós que voltamos da Guerra, não voltamos tão normais quanto no dia que fomos. A guerra te fode toda e de bônus você fica com pesadelos quando dorme. Eu tenho 27 mas me comporto como se tivesse 40 anos. Eu não consigo ser como as outras meninas e ainda fica difícil me adaptar.

— Não pensa em casar?

— Não penso. Mas não significa que não queira…apenas não penso... não mais.

— Você encontrou alguém lá?

— Como assim?

— Algum rapaz?

— Se eu encontrei ou eu o matei ou morreu na maca enquanto eu costurava o intestino. - Olívia respondeu rápido.

  Agora, James já sabia que ela era 3 anos mais velha do que ele e uma solteirona que veio da guerra e provavelmente grita no meio da noite achando que está no front.  Ele deitou-se ao seu lado e apagou a luz. Trouxe o lençol para si e a abraçou. Eles ficaram dispostos em forma de concha e ele disse .

— Deve ter sido difícil para você por todos esses anos. - ele disse , sussurrando .

— A gente supera com o tempo. Mas meus pais não ficaram nada felizes.

— Porque eles querem que você se case?

— Sim e que eu desista da ideia de morar só. Eu já estou tão velha que o mínimo que pode acontecer comigo por morar só é ter menopausa.

James riu.

— Você não é tão velha assim.

— Sou sim. Sou aquelas velhas corocas que grita com crianças e destrói as bolas que caem no quintal.


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