Chamas Negras escrita por Benuzinha


Capítulo 7
Pronunciamento! O exército de Atena avança




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— Sísifo voltou! – alguém muito animado passou gritando bem perto da casa de Elisa - Sísifo voltou e o Grande Mestre está convocando todos para um pronunciamento daqui a uma hora.

Ao ouvir aquilo, a jovem, que havia acabado de acordar, vestiu uma das túnicas que Regulus lhe dera, lavou o rosto com a água da bacia ao lado cama e saiu correndo.

O Cavaleiro de Leão já vinha ao longe e Elisa, ao vê-lo, esqueceu todas as regras de etiqueta e comportamento que havia aprendido em suas infinitas lições na infância e correu na direção dele, abraçando-o com toda a força que tinha.

— Eu soube da notícia! – ela disse por fim, soltando-o – Seu tio acordou, não é?

— Sim – ao vê-la tão radiante, Regulus sorriu também e estendeu uma sacolinha de pano com pão e frutas em seu interior.

— Obrigada. O que foi? Você não está feliz? – ela franziu o cenho, enquanto ambos paravam sobre a sombra de uma árvore. Dessa vez ele não fez menção de entrar na casa.

—Estou muito – ele meneou a cabeça. – Mas é que... acabamos perdendo mais um companheiro também. O Cavaleiro de Capricórnio que foi nessa missão de resgate.

— Ah, eu entendo. Ele deve ter dado seu máximo para conseguir resgatar seu tio.

— Ele derrotou três deuses dos sonhos – Regulus anuiu.

— Três deuses?! Ele conseguiu derrotar deuses?

— Isso mesmo – Regulus assentiu com seriedade.– Ele foi até o mundo dos sonhos e fez Sísifo acordar. Ele era muito poderoso.

— Mas não se sinta culpado por ficar feliz com a recuperação de seu tio. – ela o analisou cuidadosamente.

— Eu não... – ele começou e então se interrompeu – É, talvez você esteja certa.

— Uma vez alguém me disse que os cavaleiros lutam dispostos a dar suas vidas– ela continuou. 

— Isso é verdade – ele assentiu, sua costumeira vivacidade voltando um pouco – Você tem razão, eu não devo me abater por isso.

— Isso, Regulus! O mestre do Santuário vai mesmo fazer um pronunciamento importante?

— Sim. Nós agora devemos dar o próximo passo e avançar contra o castelo de Hades agora que Sísifo quebrou a barreira do sono de Hypnos.

— Barreira do sono? – ela o fitou, confusa.

— Sim, Hypnos, um dos deuses que lutam do lado de Hades, lançou essa barreira que adormecia qualquer um que chegasse perto do castelo.

— Outro deus. – Elisa fez uma careta – E você também vai?

— Claro que sim! –a expressão dele agora era de expectativa.

— Eu não vou mentir dizendo que não ficarei aqui morrendo de preocupação, mas... – ela olhou para as pinturas que continuavam a aumentar no céu e se esforçou ao máximo para sorrir para ele. - Boa sorte! Lute como o grande cavaleiro que você é e mostre pra esses espectros!

— Obrigado – ele sorriu de volta. – Agora vem, vamos até o coliseu, logo vai começar o pronunciamento do mestre.

Havia já bastante gente reunida e aquilo a deixou um pouco nervosa, ela nunca gostara muito de multidões. Percebendo o desconforto da amiga, o jovem cavaleiro a levou até um ponto mais afastado, de onde ela poderia ver o que acontecia sem tantas pessoas em volta.

— Você não gosta muito de ficar no meio de muita gente, não é? – ele estudava com aqueles olhos penetrantes.

— Não muito –  respondeu ela, um pouco constrangida.

— Não tem problema, daqui você vai poder ver. Eu tenho que ir para perto dos outros cavaleiros, agora.

— Tudo bem. Eu estarei vendo você daqui – ela acenou enquanto ele se afastava, mas ele havia avançado poucos metros quando ela o chamou – Regulus!

Ele se virou para atendê-la.

— Eu vou te esperar. – Elisa acenou.

E, dessa vez, ele respondeu com um de seus sorrisos radiantes, antes de se afastar novamente.

Saber que Regulus finalmente entraria pra valer na guerra a deixou sentindo como se tivesse uma pedra no estômago e ela conseguiu comer uma das maçãs que ele trouxera com muito custo.

O Grande Mestre começou a falar e sua voz grave e profunda ecoou pelo Santuário, no entanto, ele não estava junto com os soldados. Regulus e ao outros cavaleiros de ouro, ao contrário, estavam ali, bem de frente para o restante do exército, numa posição de destaque. Depois que o mestre terminou seu discurso, convocando os guerreiros para a batalha, Sísifo também se pronunciou e Elisa finalmente pôde ver como ele era. Parecia mesmo um verdadeiro líder, pensou. E vendo Regulus ali a seu lado, era fácil ver a semelhança entre eles.

No final, ele chamou um menino, disse a todos que aquele garoto teleportaria o exército até o castelo de Hades e, antes que Elisa pudesse pensar o quanto aquilo era impossível, o grupo inteiro havia desaparecido.

— Acho que nesse lugar tudo é possível mesmo – resmungava ela, andando na direção do posto médico.

— Elisa! – uma voz feminina a chamou.

— Melina! –Elisa andou na direção da moça.

— Estava vendo o pronunciamento?

— Sim.O seu noivo estava lá?

— Estava! Estou tão nervosa. – Melina retorcia as mãos.

— Vai dar tudo certo, tenho certeza – Elisa tentou tranquilizá-la.

Mas a verdade era que ela mesma estava longe de manter a si própria tranquila. Não apenas temia por Regulus, como também por Kagaho. Será que ele também sairia da floresta e participaria do confronto?

Com isso em mente e, sabendo que todo o local estaria praticamente vazio e assim, muito mais fácil de sair sem correr o risco de ser notada, Elisa decidiu que precisava saber se Kagaho havia ido mesmo ou não. Sua cabeça estava tão distraída que ela quase cortara todos os seus dedos enquanto picava as ervas medicinais, em menos de uma hora que passara lá dentro. Por isso, foi com certo remorso que ela foi  até Konstantinos, dizendo que não se sentia bem.

— É, você está com um cara esquisita, mesmo, desde que chegou – o médico olhou para ela com uma expressão indecifrável. – Não sei o que está se passando, mas pode ir. Preciso de você com todos os dedos.

Murmurando um agradecimento, ela se despediu dos colegas e saiu, sem dar chance a si mesma de mudar de ideia.

Dessa vez, ela sentiu o calor bem mais próximo dos limites do Santuário e isso a acalmou de imediato. Assim que passou pelas primeiras árvores, viu no meio das sombras o contorno inconfundível de uma das asas negras de Benu. Logo que se aproximou, ele a brindou com um de seus olhares mais arrogantes.

— Espere aqui - disse ele, apenas.

— Mas o que...

Sem entender o que acontecia, Elisa observou o espectro andar justamente na direção que ela havia acabado de vir. Com um movimento rápido e preciso, ele  agarrou algo que se escondia atrás de uma árvore, bem na entrada.

— Petros! - ela se espantou ao ver homem que Kagaho segurava pelo pescoço.

— Esse é o seu colega inconveniente? - Kagaho perguntou  friamente.

O homem se debatia, tentando se soltar e Elisa temeu que Kagaho pudesse queimá-lo com suas chamas negras. No entanto, o espectro parecia bastante calmo e, ela notou, o ambiente ao redor não ficara mais quente. A verdade é que parecia até mais frio.

— Me solta seu espectro maligno! - gritava o homem.

— O que acha que devo fazer com ele, Elisa? - Kagaho perguntou, sem tirar os olhos do outro.

— Eu sabia! - bradava Petros, agora - Sabia que você não era confiável, sua intrusa!

— Pode fazer o que quiser com ele - resmungou ela, sua compaixão pelo homem diminuindo consideravelmente.

— Ótimo - o ambiente ficou instantaneamente mais quente.

— Não, espera! - ela gritou na mesma hora e teve que impedir que seus lábios se curvassem em um sorriso, porque Kagaho, que agora voltava o rosto para ela, tinha por debaixo de uma máscara de profundo tédio, aquele curioso brilho de diversão no olhar.

— Tem certeza? - ele perguntou com o ar arrogante de costume e, ao vê-la anuir, soltou Petros, que caiu pesadamente no chão.

— Você vai me matar agora, espectro? – Petros tentava mostrar toda sua coragem como servo de Atena, embora o tremor me seu corpo tirasse um pouco do efeito.

— Não por enquanto. – Kagaho aproximou-se até ficar a poucos centímetros de Petros, que se encolheu diante dele – Mas você vai esquecer que me viu aqui. Ou a ela. E se disser para alguém o que aconteceu aqui hoje, eu vou te encontrar – as chamas rodopiaram ao seu redor – e você nunca mais se livrará de mim, porque eu o perseguirei até o inferno. E você sabe que eu posso.

Petros estava agora totalmente paralisado, como se Kagaho fosse uma serpente prestes a devorá-lo. Pouco a pouco, ele conseguiu se levantar e, a um gesto de Kagaho, se afastou finalmente, andando o mais rápido que podia, sem olhar para trás.

Um silêncio pesado caiu sobre os dois e ambos continuaram olhando na direção que Petros seguira, mesmo quando ele já não era mais visível. Elisa pensava consigo mesma se, depois daquilo tudo, deveria voltar ou continuar, afinal, já estava ali de qualquer maneira.

— Você não está irritado? - ela perguntou por fim.

— Por quê? – ele desviou a atenção para ela enfim.

— Por eu ter sido seguida - ela analisava cuidadosamente uma folha de um galho de uma árvore qualquer.

— Não.

— Não? - ela repetiu bobamente, virando-se para ele tão rapidamente que por pouco não deu um jeito no pescoço.

— Eu já esperava que acontecesse mesmo. - ele deu de ombros e começou a andar para o interior da floresta - Você até deu sorte que não foi um cavaleiro. Se fosse, nós provavelmente teríamos lutado e você não ficaria muito feliz quando eu o matasse.

— Convencido. - ela resmungou enquanto o seguia, sem prestar muita atenção no caminho – Você acha que ele vai falar alguma coisa para alguém? Eu tenho vindo para cá escondida, não sei como vão reagir.

— Nem mesmo seu amigo de Leão sabe? – ele pareceu achar graça da situação.

— Não tive coragem de dizer – admitiu ela. – E... se souberem que ainda está aqui, podem querer vir atrás de você, e eu não quero que isso aconteça.

Ele parou e a analisou demoradamente.

— Eu acredito que ele terá o bom senso de ficar calado –  respondeu ele,com tranquilidade e recomeçou a andar. – Além disso, praticamente o Santuário inteiro está fora agora.

— Então você sabia disso?

— Claro que sim. Na verdade, foi por isso que eu fui até a borda da mata – ele gesticulou com uma das mãos. – Eu tinha certeza que você viria.

— Então você não vai lutar?

— Não – ele respondeu calmamente – Não agora.

Ouvir aquilo a inundou de alívio e ela quase tropeçou nele quando Kagaho parou de repente, num local diferente da noite anterior.

— Tem uma coisa ali que acho que vai gostar. – ele apontou para um tronco velho caído no chão.

Primeiro ela olhou para a madeira já entrando em decomposição, sem entender, depois, uma suspeita começou a crescer em seus pensamentos e, com o coração pulando de ansiedade, ela se aproximou do local que ele havia apontado. Com cuidado, ela levantou uma parte da madeira e, dando um gritinho de felicidade, avistou algumas salamandras da espécie que estava descrevendo.

— Não acredito! – ela olhou para ele e sorriu largamente – São justamente da espécie que estou estudando.

— Que sorte a sua então – ele se recostou em uma aveleira que parecia ter umas boas centenas de anos. – Para mim são todas iguais.

— Isso é maravilhoso – ela pegou uma das salamandras e a observou com os olhos cheios de adoração, o incidente com Petros já esquecido. – Nem sei como te agradecer.

— Eu não quero nada – ele respondeu com aspereza.

— Você não tem nenhum sonho? Nenhum desejo? – ela pegou uma pequena sacolinha, que sempre carregava para o caso de encontrar alguma erva que estivesse em falta e colocou uma salamandra dentro, junto com um pedaço do tronco velho e um pouco de terra.

— Não. Eu já abandonei todos os meus sonhos, há muito tempo – o humor dele ficara ainda pior e ele se levantou, abrindo as asas negras.

— Você já vai? –perguntou ela, erguendo-se  também.

— Eu não pretendo lutar, mas quero estar por perto caso seja necessário.

— E você volta?

— É provável – a resposta dele a deixou bobamente feliz.

— Então até logo. - acenou enquanto ele se afastava.

Na volta, Elisa decidiu ir direto para casa, já que dissera a Konstantinos que não estava bem. Além disso, pensou, bastante satisfeita, a salamandra ocuparia o resto do seu dia.

Pouco depois do entardecer, quando Elisa já estava com os olhos e as mãos cansados de tanto fazer anotações,uma batida soou na porta e ela sentiu um temor irracional de que fosse Petros com um grupo de soldados para confrontá-la sobre sua relação com Kagaho.

Contudo, foi a voz de Regulus que ela ouviu do outro lado, chamando-a.

— Você voltou! – ela correu até a porta e a abriu de uma vez só.

— Antes do que eu esperava – ele encolheu os ombros e entrou.

— O que houve?

Regulus sentou em uma cadeira e Elisa acendeu algumas velas, já que a escuridão se anunciava com o pôr-do-sol.

— Na verdade correu tudo diferente do planejado, eu nem cheguei a lutar.

— Então aquela barreira do sono não tinha quebrado?

— Tinha sim, mas o castelo tinha outra barreira. Sísifo nos mandou aguardar um sinal – ele tirou o elmo e o revirou distraidamente entre as mãos.

— E então?

— Foi uma história bem confusa.Os Cavaleiros de Áries e de Libra lutaram diretamente com Hades, junto com o Grande Mestre e parece que o Cavaleiro de Pégaso também. Eles conseguiram destruir o castelo, mas agora Hades foi para o céu.

— Como assim o céu?

— Uma escada gigantesca surgiu e ele subiu até o céu, bem na nossa frente. E agora nós temos que descobrir uma maneira de chegar lá.

— Pelo menos todos voltaram bem, não é?  - ela tentou se mostrar otimista.

— Na verdade nem todos. O Cavaleiro de Libra e o Mestre foram mortos por Hades.

— Isso é terrível.

Estranhamente, mesmo não sendo próxima dos dois, Elisa sentiu os olhos marejarem.

— Você ficou triste – ele comentou, surpreso.

— É que são tantas perdas – ela enxugou os olhos.

— Mas não se preocupe. Nós vamos encontrar uma maneira de chegar até Hades e acabar com isso de uma vez por todas – ele cerrou o punho, cheio de determinação e recolocou o elmo – Eu vim aqui te avisar para você não ficar preocupada.

— Já vai? – ela o observou levantar.

— Tenho que ir. Agora preciso ficar sempre a postos, mais do que nunca.

— É verdade – ela sorriu. – Depois que vocês vencerem essa guerra, teremos todo o tempo do mundo para conversar.

A verdade é que ela queria muito acreditar naquilo.


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