Desafios do Destino III - Desastres e Desfechos escrita por Vale dos Contos Oficial


Capítulo 3
A Biblioteca das Memórias




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O terror ainda me açoitava conforme eu tombava naquele lombo magro e sem forças da Ave do Marfim. Ela, com suas penas feridas e machadas de sangue, me carregava até o nosso alvo: a biblioteca onde passei minutos de minha vida preso em uma gaiola enferrujada e pendurada sobre livros e estantes corroídos e perdidos enquanto via uma mulher sofrendo com um pó ácido que descia do teto.

—Você quer mesmo ir para lá? O lugar é muito hostil.

—Não parecia ser quando eu o vi pela primeira vez.

—Com Násser vivo, ali era um cachorrinho indefeso e manso; com ele morto, a fera interior de cada ser surgirá como desafios.

—Além daqueles que eu precisei passar?

—O medo psicológico é o mais te afetará, pois a Biblioteca sabe do que você já passou e do que aguentou. Suas memórias estão gravadas em todos os livros das estantes. Afinal, você foi o escolhido.

Escolhido não era a palavra mais correta a se dizer, afinal, a profecia decidiu escolher outro tipo de construção: "Filho do Destino". Eu não poderia ser filho dele, eu sabia quem eram meus pais e que eles tinham me criado pela vida toda, pais são aqueles que dão amor e carinho, proteção e defesa, não aqueles que te colocam em perigos intermináveis com armadilhas em cada canto que você pisa de um terreno e seco e destruído pela ambição deles.

Assim como o inferno em nossas vidas, o pouso até o telhado íngreme do lugar quase nos fez escorregar e cairmos em uma vala que não havia antes.

—Por que aqui há esse buraco?

—Com o retorno de Nýchta e Efiáltis, o Campo dos Traidores começou a se expandir progressivamente. Isso levará a degradação do mundo, ato que Destino não previu.

—Ele sabia que os pais estavam presos naquele Túmulo, não sabia? – A enorme águia não responde e fez um movimento com as asas, que seria o seu "dar de ombros" e indicar um "não sei" como resposta.

—Ele pode saber onde enterrou os pais, mas foi sensato que os Mestres os retiraram de lá e os devolveram ao palácio.

—Aquilo tudo era um palácio?

—Aquele é o Palácio da Tríade, antigamente o da Duade de Diamante, composta pelo casal Nýchta e Efiáltis. A primeira, a dona da Noite, era bela e consagrada por milhares de estrelas luminosas; o segundo, – rígido, porém, benévolo – tinha poderes para destruir o mundo com um estalo de dedos. – Com muito esforço, a ave levantou voou e pousou em frente da porta gigantesca de madeira. Eu saí de suas costas para que descansasse. O bico estava imóvel, mas a história prosseguia por telepatia. – Quando soubemos do nascimento dos três irmãos, os trigêmeos que reinariam o mundo conforme as leis da natureza, uma profecia foi pincelada em nossas mentes. Um deles, o mais ganancioso, seria o arauto da destruição. Suspeitávamos do Tempo, pois tinha o poder de controlar e alterar a linha da história e fazer com que ditadores morressem de doenças novas e incuráveis ou fazê-los bondosos somente com carinhos em suas ideias. Começamos a guia-lo conforme os pais queriam, mas esquecemos de que outro se mostrava promissor em seu o arauto: a Morte, uma bela mulher trajada com vestes mais negras que a escuridão.

A Ave parou de relatar os fatos assim que ouviu um barulho no interior do prédio. No momento em que se levantou para me proteger, um soco de pedra a jogou para longe e uma forte ventania me sugou para dentro. Eu queimava incessantemente, meu corpo começou a se dissolver conforme minha pele era salpicada por uma espécie de poeira branca, o pó que feria tudo e todos. Os livros ao meu redor começaram a incendiar e as luzes queimavam minha visão como o clarão de um castigo corruptível.

—Por favor, me escute! – A Ave gritava em minha cabeça. – Isso é seu teste! Seja forte! – E tudo se calou. Apesar do esforço, eu não conseguia me mover; a cada instante que mexia as minhas mãos, meu corpo ardia ainda mais. Meus gritos não saíam, como se fosse um mandato daquele lugar: sem som, sem vida. – Pare de gritar! Eu posso te ouvir e isso não é mostrar esforço! Sei que está cansado, todos nós estamos, e você não teve tempo de se recompor para a última batalha.

Ele falava em primeira pessoa no plural como se estivesse com muitas pessoas em seu corpo... Será que era isso? "Nada se cria, tudo se transforma". Será que isso era o sinal de que ele tinha a mente de todas as aves dentro dele? Com a morte dos Mestres, será que Rosália era a única que mantinha o equilíbrio? E onde ela estaria?

Uma explosão me jogou para longe e, ao olhar mais de perto, encarei uma enorme faca enferrujada em meu peito. Isso fez com que a dor se espalhasse ainda mais e com que, finalmente, meus gritos ecoassem pelo lugar.

—Estamos aqui! – Uma mulher raquítica e pálida surgiu em sua frente. Ela carregava uma bola de cristal, a mesma que Rosália o entregara. O movimento ligeiro de seus braços fez a cena toda mudar. – Você entrará nesse livro e terá que sair o mais rápido possível! Aqui estará as suas respostas!

Fui sugado para dentro daquilo que eu imaginava ser um livro. As páginas brancas se coloriram de preto e cinza, além do vermelho das labaredas que dançavam ao meu redor. O terreno de areia seca e quebrada, todo lotado de rachaduras que liberavam uma quantidade incessante de magma, era infinito. O que eu teria que descobrir ali?

Uma fumaça negra e fétida surgiu em minha frente e apontou para um canto; lá, existia uma enorme estátua de duas pessoas que eu conhecia: Morte e Tempo.

—Aqui eles estão, presos em uma história que nenhum dos dois pode descobrir e evitar. – A névoa densa e obscura falava comigo. – Você precisa os libertar antes que o Destino descubra que está aqui.

—E onde é "aqui"?

—Você deduziu isso há alguns minutos, acho que consegue imaginar.

Eu estou dentro dele? A minha voz se calou assim que eu notei que alguém se aproximava. Era uma cavalaria toda branca, mas somente um alazão estava com seu cavaleiro. O corpo reptiliano dele brilhava uma luz esverdeada que fazia o mundo se curvar inteiramente a ele.

—Ele está aqui. Deve ter deixado os pais lutando contra seus servos.

Eu encarei as estátuas e nada de ideias de que como poderia os libertar. Meu corpo ainda ardia do pó branco da biblioteca. Será que ajudaria? Porém, eu não tinha nenhum pouco comigo. Ao chutar o chão, notei que a areia se levantou e revelou uma rocha branca. Passei o dedo e gritei de dor por senti-lo derretendo. Ali havia a rocha de onde saiu aquele pó ácido. Será que eu conseguiria usá-la?

—Você não os libertará! – Eu vi uma foice voando em minha direção. Felizmente, a pontaria foi péssima e errou; infelizmente, a distância foi de uns dois ou três milímetros, certamente meu cabelo foi picotado.

Uma vez, toquei naquele armamento e senti um impulso enorme em mim, um de rebeldia e desordem; necessitaria controla-lo afim de cortar o tanto que precisaria da pedra. Com mãos firmes, comecei a forçar a lança no chão e muita poeira branca se levantava, o que fazia meu corpo arder intensamente. Era como se um enxame de abelhas me atacasse para eu conhecer o fim da minha vida. Era como se usassem a faca enferrujada para me rasgar e usar a minha pele para pisar.

—Nem ouse a fazer isso! – Destino me alcançou no instante em que eu cortei o chão mais um pouco e arremessei tudo até a estátua. Tudo esquentou como o inferno e eu derretia de dor da explosão. Ao encarar mais fundo, notei que a cavalaria fugia. Duas pessoas estavam em minha frente: uma mulher sem rosto e com vestes rasgadas e um homem, metade velho e metade novo, uma divisão perfeita da simetria do corpo humanoide.

—O que você fez?! – Destino tomou a foice de minha mão e correu para cortar os irmãos. Nisso, eu desapareci em uma nuvem negra. Eu reapareci na Biblioteca e a Ave do Marfim em minha frente, com lágrimas em seus olhos.

—Você sabe o que fez? Ou o que viu?

—Eu salvei a Morte e o Tempo.

—Infelizmente, tudo aconteceu antes de eu te contar o resto da história. – Ela pausou para enxugar a água salgada de seu corpo. – A Morte, uma bela mulher trajada com vestes mais negras que a escuridão, tinha uma mente tão bem elaborada que conseguiu nos enganar terrivelmente. Ela comandou os irmãos para tirarmos os olhares dela. Era ela quem queria tomar o poder, ela era o Arauto.

—E você não é a Ave! – A esfera de cristal cortou o ar e aquela miragem da Ave, que se desfez no ar.

A esfera se desfez em uma mulher de idade, mas com o corpo forte e no lugar.

—Rosália!

—Meu querido, que bom que te encontrei! – Ela era seguida por quatro pequenas aves, todas miúdas e pálidas. – O que aconteceu? – Falei tudo o que aconteceu desde o momento em que a perdi de vista. – A Duade está solta, afinal. Isso será bom se derrotarmos o Destino. A terceira força desiquilibra o mundo, ainda mais com o poder de prever o futuro.

—Foi assim que ele conseguiu controlar tudo? – E ela afirmou.

—Por hora, você precisa descansar. O Destino sabe o que você fez e sabe quem está o ajudando.

—E essas pequenas?

—São minhas irmãs. – A Ave do Marfim adentrou a biblioteca depois de derrubar a porta de madeira. Os livros, a poeira e as estantes não estavam mais lá. – Finalmente não terei que mais ouvir quatro vozes em minha mente.

—Eu sei como é isso. Os Mestres também me deixavam louco, isso que Salústio está desaparecido.

—Você ainda não o encontrou?

—O paradeiro dele é incerto e creio que demoraremos para desvendar onde esteja. – Minha visão começou a clarear e a desaparecer. – Você precisa dormir. Eu pressinto que o cansaço te apagará por algum tempo. – As Aves se aproximaram de mim e fizeram uma espécie de cama com suas penas soltas. – Durma bem.

 


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