Piloto Automático escrita por Pinguim Maligno


Capítulo 3
Danna e Thomas


Notas iniciais do capítulo

Hey!
Bem, gostaria de avisar que esse capítulo não começa no fim do anterior, haha, por isso decidi postar os dois no mesmo dia, hahaha.

E mais uma coisa, quero agradecer a minha beta pelo trabalho nesse capítulo, sério, não sei o que essa história seria sem ela ♥


E sem mais enrolação, boa leitura!



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Danna Stones nunca imaginou que ao chegar ao ensino médio se tornaria uma delinquente. Odiava como essa palavra soava, e também todo o significado por trás dela. Mas mesmo assim, era eternamente grata pela detenção que levou no término de aulas daquela sexta.

Quando saiu da coordenação e se dirigiu à saída ouviu um barulho vindo da área dos banheiros. Assustou-se, pois na teoria todos já haviam saído, exceto ela, o diretor e uma professora, e os outros dois se encontravam na diretoria.

A escola onde ela estudava tinha dois pisos. No primeiro ficavam as salas de aula do maternal e dos fundamentais, a cantina e os banheiros, enquanto no segundo estavam as salas dos ensino médio, a coordenação e a sala do diretor.

Temerosa, aproximou-se do lugar de onde o barulho aparentemente surgiu. Checou o banheiro feminino e não encontrou nada de anormal, no entanto ao abrir a porta do banheiro masculino a garota teve uma horrível visão: um menino inconsciente caído ao chão. E sem nem mesmo perceber, Stones arregalou os seus olhos e deixou um alto e estridente grito escapar da garganta.

Sentiu sua respiração ficar mais acelerada, estava chocada. Tentou sair de lá para avisar alguém, no entanto seu corpo parecia não responder, por isso começou a se desesperar mais e mais. Poucos minutos se passaram até os responsáveis chegarem, mas para Danna foram longas e tortuosas horas, não conseguiu nem mesmo checar se o garoto estava bem.

O que soube depois foi muito pouco, em sua opinião. O menino estava  intoxicado devido ao uso exagerado de medicamentos, por isso uma lavagem gástrica foi feita. Pelo que disseram, se tivessem demorado mais um pouco as chances de sucesso no procedimento poderiam baixar.

Os pais de Danna foram buscá-la, do jeito que são preocupados não deixariam a filha andar por aí sozinha depois de uma experiência tão traumática. Foi quando os dois chegaram que a Stones conseguiu se sentir, mesmo que minimamente, melhor.

Abraçou-os, sentia-se segura, protegida, finalmente podia chorar. Não sabia o porquê, mas estava com medo, indagava-se das circunstâncias que levaram o garoto — posteriormente descobriu que seu nome era Yuuto — a tentar suicídio.

Era tão sortuda, pensava. Queria poder ajudá-lo, mas seria ela capaz?

[...]

Na semana seguinte, Danna se viu na obrigação de ir para a escola. Por isso, ignorou os pedidos de seu pai para que faltasse às aulas. Mesmo se sentindo completamente devastada, não se daria ao luxo de faltar, estava no início do último ano escolar e também queria notícias, afinal, não é todo dia em que um garoto tenta se matar no banheiro da escola.

Chegando ao colégio Bárbara Cecília, notou uma movimentação estranha vinda do pátio. Todas as turmas de ensino fundamental I e médio estavam reunidas, aparentemente a pedido do diretor. Após um tempo, e a notícia de que o jovem Yuuto Ume tentou suicídio acabou sendo dada.

Os rostos ali demonstravam expressões completamentes diferentes. Alguns estavam surpresos, outros aparentavam estar devastados, mas uma das reações mais assustadoras foi a que chamou a atenção de Danna. Um garoto não muito longe dela exibia um sorriso, lágrimas ameaçavam a cair de seus olhos e enquanto isso uma menina o abraçava, dizendo coisas como “a culpa não foi sua, está tudo bem…”

Isso era estranho. Primeiro, Stones precisava respeitar o momento, não iria ser tão invasiva ponto de interromper os dois. Não naquela hora. Segundo, que ligação haveria entre aquela pessoa e Yuuto? Teorias iam se formando em sua mente, e ela sabia que para montar aquele quebra-cabeça precisaria de mais peças.

Os alunos foram liberados cedo, cerca de meia hora depois do comunicado ter acontecido. A maioria escolheu permanecer na escola por mais um tempo, grande parte morava longe e quase nenhum ônibus iria passar naquele horário. Essa era a chance que Danna esperava para obter informações.

Sua não tão demorada busca deu frutos rapidamente. Descobriu que Yuuto cursava o nono ano, era adorado pelos professores e era pouco sociável, as duas pessoas mais próximas dele eram Catarina e Thomas, — segundo Danna, provavelmente eles eram as crianças de antes… — mas aparentemente o trio teria se desfeito há algumas semanas, com o começo do namoro de Catarina e Thomas.

Estava desconfortável, era como se fosse uma verdadeira Sherlock Holmes invadindo a privacidade e a vida dos outros por apenas julgar necessário, mas ao mesmo tempo se sentia responsável pelo menino, afinal, ela tecnicamente o salvou, não poderia ignorar uma coisa dessas, aliás, nem se quisesse o faria, não conhecia Yuuto, no entanto estava determinada. Determinada a ajudá-lo, determinada a descobrir mais sobre o garoto e determinada a salvar uma vida. E por isso, decidiu falar com Thomas, ele com certeza teria algumas respostas.

Ela procurou por um menino alto, ruivo e com algumas sardas. Com isso, depois de alguns minutos o encontrou. Estava sentado em um canto qualquer do corredor, usava fones de ouvido e parecia estar triste,  ao se aproximar dele foi impossível não notar que tinha acabado de chorar.

— Ah cara — disse, assustando o garoto.— Tempos difíceis, não? — Sentou-se ao lado de Thomas, fitando-o.

— S-sim… — Desviou o olhar, não se sentia confortável encarando outra pessoa.— E-eu ainda não acredito nisso tudo.

— Nem eu, como deixamos isso acontecer? Mal consigo crer que todos nós ignoramos a situação daquele menino. E esse diretor idiota? Não pensa antes de sair dizendo.

— … Me desculpe perguntar mas quem é você, conhece ele?

— Oh sim — Corou um pouco, ao notar que falou e falou e esqueceu de se apresentar.— Me chamo Danna, sou do terceiro. E não, não o conheço pessoalmente.

— Deve ter sido assustador… digo, quando viu Yuuto no chão… se estivesse em seu lugar, eu...—  suspirou — acho que não conseguiria fazer nada.

— Como sabe que eu o encontrei?

— Ué, o diretor disse. — Esboçou um pequeno sorriso. — Não conseguiu prestar atenção nele, suponho. Aliás, meu nome é Thomas. — Levou uma de suas mão na direção dela, para cumprimentá-la.

— Prazer, Thomas. — disse enquanto apertava sua mão.— Respondendo sua pergunta, foi uma das piores coisas que já presenciei na vida. Me assustei, é claro, mas me senti em apuros, e foi tudo tão rápido...

— Entendo. A sensação de incapacidade nessas situações é bem mais comum do que parece. Acho que o Yuuto deve ter se sentido assim também. Totalmente…desamparado.

— Parece que vocês são bem próximos. Suspeita do motivo dele ter chegado nesse extremo?

— N-não. — Estava claramente desconfortável. — P-por que acha que eu sei?

— Calma, como eu já disse, você parece ser amigo dele.

— Hum… veio aqui só para tentar arranjar alguma informação de mim, não é? — Levantou-se, encarando a terceiranista. — Não devia ter caído no teu papinho falso, fingindo se importar com o Yuu, que merda, viu.  — Saiu andando para fora da escola, foi ao encontro da menina de antes, que aparentemente esperava por ele para voltarem juntos.

E enquanto os dois lentamente se afastavam, Danna ficou sem reação, sua mente trabalhava a mil no propósito de entender todo o significado que aquele diálogo trazia. Era óbvio que Thomas sabia alguma coisa, mas o quê? Estaria ele envolvido? Talvez guardasse algum segredo do amigo. E por que toda a culpa? Claramente estava carregando um enorme fardo. O quebra-cabeça que insistia em tentar resolver ganhava cada vez mais peças.

[...]

— Meu filho, meu filho, finalmente aprendeu a ser homem, não é mesmo? Haha, acha que não notei que você e aquela garota começaram a namorar? — a mãe de Thomas dizia entre garfadas. — Sabe, eu realmente fiquei preocupada com você depois daquela situação.

“Aquela situação” era o fato de Thomas ser gay.

Ele nunca realmente viu algum motivo para se abrir com seus pais sobre sua sexualidade, os estereótipos sociais estavam ao seu favor, era como se a sociedade pudesse o classificar como hétero apenas pelo fato de não ser efeminado, o que o ajudava a permanecer no armário. Pelo menos até o momento em que seu pai descobriu tudo, ao ver suas mensagens com Yuuto.

— Mãe, pode parar agora, sério. — Não era de seu interesse discutir sobre seus “namoros”, já não bastava o absurdo que tinha de ouvir do pai. Se deixasse a conversa fluir por mais tempo era bem capaz de vomitar ali mesmo. — Podemos mudar de assunto?

— C-claro querido.— Dona Helena não entendia o porquê de seu filho não se abrir mais com ela, igual antigamente. No fundo, queria compreender e aceitar sua criança do jeitinho que era, mas sua mente estava tão deturpada por preconceitos e falsas curas que acabou ficando cega ao quanto, mesmo sem querer, o fazia mal.— Como foi o dia hoje?

— Longo. Conheci uma tal de Danna, foi uma das piores coisas que já me aconteceu. E… amanhã não vai ter aula.

— Por quê? A semana acabou de começar.

— A escola resolveu dar recesso… — Suspirou para soar mais calmo do que realmente estava — um garoto tentou suicídio sexta passada, no fim das aulas. — A vontade de chorar veio a tona. Talvez tivesse sido melhor continuar no assunto anterior.

— Meu Deus! Quem foi a pobre alma?

—...Y-yuuto Ume.

 — CÉUS! Ainda bem que você se afastou desse tipo de gente, ele poderia ter te convencido a tentar algo parecido!

— MÃE! Por favor, não vê como-

— Hey, não me venha com mi mi mi não, rapaz! Você sabe muito bem que pessoas assim são mais propensas ao Diabo! É só ver o número de suicídios! Não percebe que esses viados se matam aos montes? — Helena ao perceber o quão chocado seu filho ficou, decidiu tentar amenizar as coisas. — Amor, ambos sabemos que o mundo atual é bastante...diferente, mas não é por isso que temos de relativizar tudo. Sabe, seu amigo não seguiu a ordem natural que o Senhor nos propôs, como você já deveria saber, o natural é Adão e Eva, não Adão e Ivo. Talvez esteja nos planos do nosso Salvador tirar o menino da Terra e o salvar. Se fomos pensar por esse lado… não vê como até o pior pode na realidade ser um bem? Haha!

Thomas estava sem palavras, totalmente enojado pelo o que acabara de ouvir. Repetia para si mesmo que aquela mulher na sua frente falava tudo aquilo por ignorância, a intenção não era o machucar, sim, ela estava sendo manipulada, a culpa não era dela, talvez conseguisse mudar a opinião de sua mãe a base do diálogo.

Mas tudo aquilo era uma enorme ilusão para si próprio, pelo menos naquele momento. Ela não apenas o xingou, também xingou Yuuto, e chegou a sugerir que tudo o que estava acontecendo poderia não passar de um plano divino. Estava sem chão e totalmente desacreditado, uma enorme dor se instalou em seu peito. Sem mais aguentar não só esse, mas como a maioria dos almoços em família, Thomas explodiu.

— DROGA — gritou, quando finalmente caiu em prantos — DROGA, DROGA, MIL VEZES DROGA! A SENHORA É BURRA OU SÓ SE FAZ MESMO? CARALHO, POR QUE SEMPRE SÓ SAI MERDA DA SUA BOCA? POR QUE A SENHORA INSISTE EM SER UMA TOTAL IGNORANTE? — Sentiu a respiração ficar cada vez mais ofegante, suas mãos também chegavam a tremer — Por que a senhora finge que me ama? POR QUE VOCÊ SÓ ACREDITA EM PASTORES, E NÃO EM MIM? REALMENTE E...— Foi cortado por um tapa.

— CALA A BOCA! SEU MERDA, NÃO FOI PRA ISSO QUE TE CRIEI, VOCÊ JÁ FOI MANIPULADO! ELES FIZERAM OUTRA VEZ A TUA CABEÇA! E eu… — disse, com uma ponta de medo — achando que tivesse desistido dessa ideia de… virar gay…

— M-mamãe…. — Já havia se arrependido. Mil e uma coisas passavam por sua mente. E agora, iria apanhar? Seria finalmente expulso de casa? Era tanto medo e tanta angústia ao mesmo tempo que mal conseguia pensar. — O que quis dizer foi… — De novo foi interrompido, mas dessa vez era apenas a fala de sua mãe.

— Não ligo para o quis dizer, o que me importa foi o que disse, e esses foram os pensamentos que estavam presos aí dentro, não é? Infelizmente… isso não é algo que Cristo aprova. — Levantou-se, retirando seu prato da mesa — E quando seu pai chegar para te buscar, nós três teremos uma longa conversa sobre como nós iremos corrigi-lo. — Subiu para seu quarto, deixando finalmente Thomas sozinho.

Tentou respirar fundo para se acalmar, mas não adiantou. Depois de um tempo, pegou seu celular junto dos fones de ouvido e colocou a música “Hitchcock” do grupo Yorushika.

Fechou os olhos. Quanto mais o ritmo acelerava, mais vontade de chorar tinha. Mas, a doce voz o trazia uma certa sensação de paz, era como se a melodia estivesse lá, abraçando-o. Estava, pela segunda vez no dia, jogado em um canto qualquer, sofrendo silenciosamente. Queria se esquecer de tudo, renascer. Ao mesmo tempo, sentia tanta falta do seu Yuu. Falta da sua voz, do seu abraço, do seu aconchego, tudo. E Yorushika era tão a cara dele…

Notou que o tempo fechou, talvez fosse sinal de uma forte tempestade. As nuvens cinzas compunham a totalidade do céu. E, observando o cinza tomar conta da sua visão, Thomas só tinha uma frase em sua mente.

“Querer ver somente o céu azul é egoísta?”


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler esse capítulo, se possível, favorite e comente, vai ajudar muito na minha missão de inflar meu ego, há ~ ♥



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