Eu não sabia que podia haver tanta dor para um só momento. Mas a mistura de emoções que tomaram conta de mim era alarmante, o pavor, o receio, o ódio, o desespero era tudo tão poderoso, tão forte, tão atordoante. Eu não conseguia me controlar, não sabia dizer nem ao menos como eu cheguei ali tão rápido, eu estava preparado para uma luta, mas o que aconteceu foi algo que eu nunca imaginei. Assim que eu a vi daquela forma tudo pareceu evaporar, o ódio que tomou conta de mim foi maior do que eu jamais imaginei que poderia ser. Não poderia chamar aquilo de luta, eu levei quatro segundos para desmembrar cada parte do corpo daquele vampiro, o fogo que o consumiu em seguida não aplacou meu ódio, eu deveria tê-lo feito sofrer muito mais, mas eu não consegui segurar a raiva que surgiu dentro de mim, não consegui dominar a força ou meus movimentos. 

No momento em que me virei e a olhei novamente, o ódio deu lugar ao desespero. Alice estava ao seu lado, minha irmã parecia chorar um choro sem lágrimas. Ela segurava a mão de Camille, Carlisle estava a socorrendo. Havia tanto sangue, mas o cheiro que fazia minha garganta queimar de sede não era o que realmente me incomodava. Ela estava tão ferida. Eu podia ver a marca da mordida em seu pescoço, era profunda demais e ainda sangrava. Sua perna estava encharcada de sangue. Seu cabelo castanho estava quase preto de tão molhado. Eu me agachei puxando-a para meu colo, ela não se moveu. Sua respiração estava fraca e seu coração tão baixo que eu quase não conseguia ouvi-la. 

—Camille, meu amor, acorde. -eu implorei beijando sua cabeça. -Por favor, meu amor. Acorde. 

—Emmett, pressione o ferimento no pescoço. -pediu Carlisle me entregando sua camisa. -Alice, tire seu cachecol e me entregue. 

Eu fiz o que ele pediu, tomando cuidado para não machuca-la ainda mais. Ela não demonstrou nenhuma reação e aquilo me deixou ainda mais desesperado. Ela não deveria sentir algo? O que aquilo significava? 

—Emmett, meu filho, os ferimentos dela são profundos demais. -disse Carlisle preocupado. - Não há nada que a medicina possa fazer. 

Eu olhei para ele desesperado novamente. Meu olhos voltaram para a mulher no meu colo, seus olhos estavam fechados, sua respiração fraca, sua temperatura estava baixa. Havia tanto sangue. Eu não podia perde-la. Mas ela me perdoaria? Eu poderia lidar com sua raiva, mas jamais poderia lidar com sua morte. 

—Por favor, pai, salve ela. -eu implorei o olhando. -Eu não posso perdê-la, por favor, eu te imploro. Não deixe ela morrer, ela é tudo para mim. 

Eu pude ver a dor nos olhos de Carlisle, ele assentiu e respirou fundo, vi seus olhos ficarem negros enquanto ele puxava Camille para seu colo, eu deixei de má vontade, não queria me afastar dela. Ele afastou o cabelo dela e olhou para seu rosto. 

—Camille, me perdoe por isso. -ele sussurrou antes de suas presas rasgarem sua pele. 

Os olhos de Camille se abriram repentinamente, um grito alto saiu de sua garganta e ela chorou antes de desmaiar novamente. Carlisle então a mordeu em seus pulsos e a soltou. Eu a puxei novamente para perto de mim beijando seu rosto. 

—Me perdoe por fazer isso, meu amor, mas eu não posso te perder. Não posso. -eu sussurrei em seu ouvido. -Por favor, me perdoe. 

—Alice, guie Emmett para um lugar seguro. -ele pediu se levantando. -Tirem a Camille daqui. 

  Alice assentiu e então ficou de pé, me esperando. Segurei Camille com mais cuidado, apoiada em meu peito e então corremos para fora dali. Eu pude ouvir Edward desesperado tentando acordar Bella, mas eu não conseguia pensar em mais nada naquele momento. Eu corri atrás de minha irmã pelo o que pareceu horas, eu não sabia mais onde estávamos, mas tinha certeza de que não estávamos mais em Phoenix. Assim que paramos, Alice desapareceu por alguns segundos, voltando em seguida com um carro preto. Abri a porta entrando no fundo com 

Camille e a deitei no banco, colocando sua cabeça em meu colo. Ela ainda estava imóvel, mas eu conseguia ouvir seu coração batendo mais forte. 

—Para onde vamos? -eu perguntei sem tirar os olhos da menina em meu colo. 

—Juneau. Carlisle tem uma casa lá, é seguro e estamos apenas cinco horas de lá. Vou dirigir por três, vamos abandonar o carro e então correr para lá. É afastado, ninguém vai conseguir ouvir os gritos dela e então será seguro para que ela complete a transformação lá. -Alice explicou dirigindo. -Não se preocupe, vai dar tudo certo, como já havia um pouco de veneno de James no corpo dela e Carlisle acrescentou mais, ela vai acordar em dois dias e meio. 

Eu assenti sem responder. Me foquei apenas na garota que eu amava, ela estava sentindo muita dor? O movimento do carro estava piorando tudo? Ela iria me perdoar por transforma-lá? Eu tinha tantos planos para ela, poderíamos nos casar, ela faria faculdade, teríamos uma casa em Londres, como ela desejava, se ela quisesse envelhecer eu continuaria ao seu lado a amaria todos os dias de sua vida humana e quando esta acabasse eu acharia um jeito de acabar com a minha. Não ligava para morrer se já tivesse passado tempo suficiente com ela. Mas não era assim que a vida dela deveria ter acabado. 

Após duas horas de viagem ela chorou, seus olhos azuis se abriram, sem se fixar em mim e procuraram por ajuda. Segurei seus braços a impedindo de se machucar ainda mais e ela chorou, suas lágrimas partiram meu coração mais uma vez. Como alguém podia machucar um anjo como ela? Assim que Alice parou o carro ela já havia adormecido novamente.

Eu me lembrava perfeitamente da dor, o fogo que nos queima de dentro para fora, nos fazendo cair em sonos pesados e acordar agonizando diversas vezes por dias. Eu corri com ela no meu colo mais uma vez, tão rápido quanto antes. Alice me guiou pelas florestas. 

Quando chegamos em Juneau já era noite e estava nevando. A casa de Carlisle me lembrava um pouco da casa de Forks, ela também ficava no meio da floresta, alguns quilômetros de um enorme penhasco que dava caminho para o mar. Alice procurou pela chave reserva e ascendeu as luzes subindo as escadas com pressa. Não parei para olhar o lugar, apenas segui minha irmã até um dos quartos. Allie abriu a porta e eu entrei colocando Camille deitada na cama. Observei seu rosto agonizado, provavelmente sua mente vagava da dor para pesadelos. 

—Emmett? -Alice chamou. -Por que não vai ascender a lareira para aquecer a casa? Ela vai sentir frio durante a noite. Pegue algumas lenhas do lado de fora e cobertas novas no closet principal. Eu vou limpar a Camille, trocar suas roupas e fazer curativos novos nela. Você também deveria tomar um banho e se trocar, tem roupa para você nesse quarto. 

—Não quero sair de perto dela. -eu disse sem tirar os olhos dela. 

Minha irmã colocou sua pequena mão em meu ombro e se agachou ao meu lado no chão. 

—Precisamos tentar deixar as coisas mais confortáveis para ela e quando ela acordar novamente essa noite, você não vai querer assusta-la ainda mais com essa roupa ensanguentada. Faça o que estou pedindo, vou cuidar bem dela.

Eu olhei nos olhos dourados de Alice por mais alguns minutos antes de assentir e então conseguir me levantar e fazer tudo o que ela pediu. Desci as escadas em uma velocidade relativamente humana e ascendi as luzes da casa. Ali era um pouco parecido com a casa que tínhamos em Forks, as paredes eram todas brancas, as janelas eram de vidro e muito compridas, todas estavam fechadas e as cortinas impediam que alguém visse o lado de dentro, havia uma lareira de mármore no canto de uma das paredes. Os móveis estavam cobertos por plásticos. Peguei alguns pedaços de madeira onde Alice havia dito que teria e acendi a lareira da casa. Quando entrei de novo eu ouvi Alice conversando com Camille. 

—Vai ficar tudo bem, vamos cuidar de você Camille. -ela dizia baixo. -Sei que está assustada agora, mas tudo vai ficar bem. Bella está segura agora, ela vai se recuperar logo e você também. Você foi muito corajosa Camille.

Parei de ouvir e entrei no outro quarto parando em frente ao espelho, minha camisa branca estava totalmente encharcada de sangue. Tirei minhas roupas tomando um longo banho, tirei todo o resquício de sangue de mim, isso deveria ajudar a controlar a sede e o medo de Camille. 

Quando saí do banheiro havia uma troca de roupa em cima da cama, uma calça jeans preta e uma blusa de mangas compridas da mesma cor. Vesti tudo o que Alice deixou ali e voltei para o quarto onde elas estavam. Minha irmã estava sentada em uma poltrona ao lado da cama. 

—Bem melhor. -ela sorriu. -Vou ligar para Jasper e mandar que ele venha até aqui, ele poderá ser útil para acalmar a Camille durante a transformação. Também vou aproveitar para falar com Edward e ver como Bella está. 

Eu assenti e respirei fundo tomando seu lugar na poltrona. Alice saiu do quarto fechando a porta atrás de si, sem olhar para trás. Voltei minha atenção para Camille novamente, sua aparência estava um pouco melhor. Alice havia dado banho nela, seu cabelo ainda estava molhado, mas dessa vez estava limpo e tinha cheiro de shampoo de framboesa. Suas roupas haviam sido trocadas por uma calça de moletom branca, uma regata da mesma cor e um casaco de tricô bege. O machucado em seu pescoço havia sido tampado por um curativo digno de ter sido feito por uma médica com anos de prática. 

Peguei sua mão e a olhei receoso. 

—Meu amor, sou eu. -eu disse baixo. -Não sei se consegue me ouvir agora, mas quero que saiba que eu estou aqui com você. Não sairei do seu lado. Eu espero que possa me perdoar por ter tomado essa decisão por você. Eu te amo, muito. Mais do que eu consigo explicar, mais do que parece ser possível. Eu juro que vou te ajudar a passar por qualquer coisa que venha pela frente agora e se você me perdoar, eu jamais sairei do seu lado novamente. 

Deitei-me ao seu lado sem largar sua mão e afastei alguns fios de cabelo de seu rosto. Sua mão fez uma leve pressão na minha, tão sutil que eu me perguntei se havia apenas imaginado. E como prometido, ela acordou durante a noite, seus gritos de dor e seu choro ecoaram pela casa. Alice e eu ficamos ao seu lado o tempo todo. Quando ela voltou a abrir seus olhos já era manhã, ainda nevava lá fora, mas a lareira manteve a casa aquecida. 

—Emmett... -ela sussurrou fraca, seus olhos procuraram por mim. 

Eu me aproximei e ela olhou em mim por alguns segundos antes de fechar os olhos de novo e adormecer mais uma vez. Quando Jasper chegou já estava de tarde. Ele tomou o lugar de Alice quando a mesma teve que ir se juntar à Carlisle, para ajuda-lo com a história que teria que ser inventada sobre Camille. Jasper se sentou ao meu lado e logo o quarto tinha um clima mais calmo. Camille respirou fundo parecendo um pouco aliviada, e eu agradeci o olhando. 

 -Obrigado. 

—Disponha. -ele respondeu dando de ombros. -Você está preparado para tudo o que vai acontecer a partir de agora? Tudo vai mudar, mais uma vez. 

Eu assenti. 

—Estamos acostumados com isso. -eu disse dando de ombros. 

—Mas ela não está. -ele me lembrou. -Bella ainda está desacordada, Alice disse que ela deve acordar amanhã cedo, Edward não vai sair do lado dela e os pais delas estão indo para lá. 

Charlie deve chegar ainda hoje de tarde e Renée chegará durante a madrugada. 

—Vocês já cuidaram de tudo? -eu perguntei o olhando novamente. 

—Sim. -ele afirmou. -Alice planejou toda a história e já repassou tudo para os outros. Não precisa se preocupar com isso agora. 

Eu assenti agradecido. Eu não conseguia pensar em nada além de Camille agora, teria que explicar a ela toda uma nova vida, dizer que havia muitas coisas que ela perderia e eu não sabia como ela reagiria sobre isso. Respirei fundo afastando esses pensamentos, eu ainda tinha mais um dia para pensar no que dizer e no momento eu só queria ficar ao lado dela. Ela acordou ainda mais três vezes, ela gritou de dor algumas vezes, sua voz já estava bem mais clara e os ferimentos haviam cicatrizado, nem marca havia mais, tirando é claro, as claras cicatrizes das mordidas em seu pescoço e pulsos. 

—Por favor, por favor, me mate. -ela implorou uma vez. 

—Meu amor, isso vai passar. Não falta muito agora. -eu disse tentando a acalmar. 

Jasper colocou sua mão em seus ombros, fazendo-a dormir novamente. No dia seguinte Alice estava de volta. Ela entrou no quarto e trocou as roupas de Camille mais uma vez. Quando ela saiu do quarto ela sorriu. 

—Ela vai acordar dentro de cinco minutos, já deve conseguir nos ouvir perfeitamente agora. -ela informou. -Jasper, preciso que você a acalme desde agora, não vai ser fácil explicar tudo isso para ela. Emmett, você está pronto? Estou aqui para te ajudar. 

—Estou pronto. 

Minha irmã assentiu e ligou a luz do quarto enquanto entravamos, ela fechou as cortinas e ficou perto da janela. Jasper ficou parado na porta acalmando o ambiente e eu fiquei ao seu lado. A diferença nela era nítida. Sua pele já branca tomou um tom de mármore liso e perfeito, os longos cabelos castanhos e lisos pareciam mais brilhosos, com mais vida do que nunca. Seus lábios estavam vermelhos e levemente mais cheios, os cílios escuros e longos. O moletom havia dado lugar para um vestido preto, botas da mesma cor que iam acima de seus joelhos e um longo casaco cinza. Ela estava deslumbrante. 

Seu coração ficou mais alto e Jasper passou a se concentrar apenas nela, deixando-me ansioso novamente. O palpitar de seu coração pareceu crescer dois décimos e então se calou. Tudo ficou silencioso, me dei conta que todos tínhamos prendido a respiração. Alice me olhou encorajando-me e eu respirei fundo. 

—Camille, meu amor? Sou eu. Abra os olhos. 

 O silencio pareceu durar uma eternidade, até que finalmente, os olhos que antes eram azuis foram abertos mostrando o carmim que noticiava sua nova espécie. Agora ela era como eu.