Telma na Luta escrita por ArnaldoBBMarques


Capítulo 10
Caça às fugitivas




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O silêncio do escritório foi quebrado pela notícia da supervisora, que chegou de repente.

— A Carol fugiu de casa de novo! Ai ai ai, seu caso está complicado, hein, Telma?

Telma ficou impassível, embora já sentisse o olhar irônico das colegas. Perguntou, bem calma:

— Foi briga com a mãe outra vez?

— Não! Dessa vez foi premeditado. Ela só deixou um bilhete dizendo que ia morar com um garoto e que não queria voltar.

Telma impressionava-se de ver o número de casos de adolescentes que se afastavam da família e iam de encontro à marginalidade. Pelo que já aprendera no curto tempo de estágio ali no Conselho Tutelar, muitas vezes a culpa era dos pais, que não sabiam dialogar e tinham a família desestruturada, mas também tinha que admitir que era muito fácil para as meninas. Naqueles ambientes havia muitos garotos que trabalhavam para traficantes e ganhavam mais que os pais delas, então não lhe faltavam recursos para sustentar as novinhas que colecionavam como quem coleciona figurinhas. Bastava frequentar bailes funk para conhecer gente assim, e logo aquelas meninas burras estavam tão envolvidas no tráfico quanto seus companheiros.

— Pegou uma rabuda, hein, Telma!

Telma não respondeu, apenas sorriu e concentrou-se nas fichas que estava preenchendo. Tinha esperanças. E no meio da tarde recebeu no telefone a mensagem esperada.

Rico: descobri onde ela tá. Me encontra às 5 no Jalapinho.

Telma colocou uns óculos escuros bem grandes e rumou ao local combinado. Era uma lanchonete, felizmente ficava fora do bairro perigoso. Encontrou Rico terminando um açaí. Sentou ao lado dele e mirou a tela do celular que ele lhe exibiu.

— Está com o Zé Mauro. O endereço tá aqui, ó.

Telma esperou o recebimento daquelas informações em seu celular, e discretamente conferiu todos os dados.

— Agora paga outro açaí...

Telma sorriu e meteu a mão na bolsa. Não podia pagar muito com o que recebia no estágio, mas Rico era um bom camarada. Tinha a impressão de que ele gostava dela.

— Está bom?

— Ah vou aceitar. Aproveita que é liquidação, e se botar mais cinquentinha eu te conto mais uma!

Telma meteu mais uma vez os dedos na carteira. Ia ficar sem dinheiro, mas não estava arrependida.

— Eu vi aquela sua prima, como se chama?

— A Carla?

— Isso. Eu vi ela no baile do Gardenal com o Zenildo. Já é a segunda vez. Ouvi dizer que o Zenildo está chamando ela para ir morar com ele!

Telma agradeceu e despediu-se. Essa agora! Ficara sabendo até demais, como dizia o ditado, atirou no que viu e acertou o que não viu. O que fazer, agora? Pensou, primeiro o dever profissional, depois cuidaria da casa.

No dia seguinte, a supervisora reuniu todo o pessoal antes de dar os parabéns para Telma.

— Graças à Telma, aquela moça foi encontrada! A polícia chegou e pegou ela na casa de um marginalzinho que já está preso, e ela já está de volta à casa da mãe!

Todos bateram palma. A supervisora prosseguiu:

— O pior já passou. Agora vamos conversar com mãe e filha, e encontrar uma solução.

Telma continuou seu trabalho de rotina, curtindo o triunfo. Não mais olhares irônicos, agora só caras de admiração em volta. Mas na saída, Renata parecia preocupada.

— Você não contou para ninguém de mim lá, contou?

— Não contei não. Mas acho que você devia parar de ir lá!

Tranquilizou a colega e saiu rapidamente. Tinha outro assunto para resolver. A conversa com tia Vitória começou séria.

— Ai, foi só eu soltar um pouco aquela menina, que ela aprontou de novo!

— Calma, tia. Primeiro de tudo precisamos descobrir como é que ela vai lá sem ninguém saber.

— Matando aula ela não está, porque eu ligo para a escola. Ah, mas eu deixei ela ir estudar na casa de uma colega semana passada. Amanhã ela vai lá de novo.

— Deixa comigo.

Ao lado do portão do clube, Telma não teve que esperar muito. Quando Carla se aproximou, virou-se de lado para não ser reconhecida de longe, e quando ela ia entrando, pegou-a pelo braço.

— Já para casa, moça!

Achou graça no susto que ela tomou, mas não deu mole e foi logo puxando-a.

— Assim que você estuda, é? Anda que no caminho a gente conversa!

Caminharam até o ponto de ônibus. Passada a surpresa, Carla voltou a exibir seu conhecido ar sonso.

— Ah Telma, eu conheci um gatinho aí no baile, queria só dar uns beijinhos... você vai contar para a tia?

— Ela já sabe!

— Ah Telma, sacanagem!

— Só uns beijinhos, é? Eu estou sabendo de tudo!

— Eu vou morar com ele!

— Quer sair daqui com polícia, que nem a Carol?

Carla não respondeu, e armou um bom sorriso maroto. Enquanto o ônibus não chegava, Telma a segurou pelo ombros e falou olhando bem nos olhos dela:

— Eu já passei por isso! Pensa que é brincadeira? Eles botam a gente para trabalhar na boca! E se não quiser ameaçam de morte! Êh menina, por que você não aprende com os meus erros? Tem que repetir os mesmos erros? Olha que eu estou aqui para te orientar! Deixa de ser metida!

Depois daquela Carla não disse mais nada, mas não tirou o sorriso enigmático do rosto. Quando chegaram, Telma prontamente a conduziu para o quarto, e deixou lá trancada.


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