Pokemon Randomizer Nuzlocke - Região de Kanto escrita por Rice s2


Capítulo 4
04. Confiança


Notas iniciais do capítulo

Depois de muito tempo, estou retornando com essa série. O fato de eu ter parado foi por causa das novas responsabilidades que surgiram com o trabalho, com a família, com os amigos, com os estudos e outras coisas relevantes. Mas o que me motivou mais a continuar a contar a história da Mariko foi justamente o retorno que obtive dos leitores e suas opiniões. Vocês não sabem como isso dá uma baita energia pra se manter motivado e gerar novas ideias. Então, com a pandemia que assola o Brasil, meu tempo tem sido bem livre... Por isso pensei bastante no que fazer com ele e cá estou. Sei que passou uns 2 anos até a última atualização da minha história, mas creio que esse tempo não seja desculpa para perder o foco. Bom, sem puxar muito tempo de vocês, aqui está mais um capítulo das minhas experiências com Pokemon Randomizer Nuzlocke - Região de Kanto.



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Capítulo 4 – Confiança

Confiança não é algo que não se constrói da noite para o dia. Ela requer tempo e dedicação para que haja um convívio saudável de ambos os lados. É um sentimento sincero de crença e fé, onde temos a oportunidade de aceitar tudo o que o outro nos oferece. Entretanto, tudo pode vir a ruir em um simples instante, quando algo ruim acontece e nos faz duvidar sobre todas as decisões que realizamos com o decorrer da nossa jornada. E é justamente nesse momento em que somos verdadeiramente testados.

— E-Estou pronta. — Permanecendo do lado oposto a de Hibiki na arena de batalha que se encontra atrás do laboratório do professor Oliver, Mariko observa seu oponente com nervosismo. É a sua primeira batalha, assim como a de Samantha que olhava com ingenuidade para o garoto ali na frente. Hibiki, entretanto, não demonstrava qualquer sinal de emoção, permanecendo perfeitamente sério ao manter os olhos fixados em Mariko. O professor, inclusive, se encontrava na região central da arena, fora da área de combate, aguardando pacientemente pela confirmação do outro treinador. Notando tal sinal, o garoto então joga a Pokébola na arena e libera uma criatura orelhuda, quase quadrúpede e de coloração azul-bebê e com algumas pequenas manchas azul-escura espalhadas nas costas, assim como diversas protuberâncias espinhosas nesse mesmo local. Com um grunhido intimidador, Samantha até se afasta um pouco daquele Pokémon, ficando próxima o suficiente de Mariko para se proteger do eminente perigo. A garota, sem saber que tipo de monstro era aquele, realiza uma análise com a Pokédex que havia recebido mais cedo.

— Nidorina. Um Pokémon roedor. É a forma evoluída de Nidoran♀. É a versão feminina do Nidorino. Com orelhas grandes, pode ser facilmente confundida com um coelho. Seus espinhos nas costas são extremamente venenosos, protegendo-a efetivamente contra predadores. Quando está em família e amigos, costuma escondê-los para não machucá-los. —

— Okay, isso é um problema… — Mariko dizia com certa preocupação após ouvir tais informações sobre o Pokémon de Hibiki. — Porque você deu um Pokémon evoluído pra ele? Não tenho chance alguma! — Com reclamações soltas ao vento, o professor simplesmente limpava o ouvido com um dos dedos mindinhos da mão, assoprando a sujeira que logo removeu segundos depois. Hibiki, que em nenhum momento havia se pronunciado, dava um singelo sorriso sádico no rosto, proferindo então tais palavras que seria o estopim para a garota de cabelo vermelho.

— Com medo? Pode desistir se quiser… — Com pose arrogante, o garoto apenas fazia graça com a cara da menina enquanto seu Pokémon, Nidorina, dava um grunhido de repúdio para Samantha.

Aquilo havia atingido Mariko igual a um Chifre-Broca de um Rhyhorn. Fechando a Pokédex calmamente e o guardando entre seus pertences, logo diz de maneira bem séria. — Professor, tô pronta. — 

Era possível notar que, naquele instante, uma fúria havia consumido a garota por completo, estando absorvida em um puro desejo de acabar com o seu oponente com todas as forças. Samantha, inclusive, não estava de fora, pois não havia gostado de ter ouvido sua treinadora ser chamada de covarde e de ter sido julgada sem razão pela Nidorina. Com um olhar determinado e em posição de combate, a pequena e ingênua Aipom aguardava pelo início da batalha. Oliver sentia a tensão no ar e ambos só esperavam pelo anúncio. Um silêncio calmo tomou conta do cenário naqueles poucos segundos, mas era só o prelúdio de um grande desastre natural. Com a mão levantada para o alto, o professor subitamente a desce para baixo, como se estivesse feito do próprio braço uma espada afiada, cortando o ar na sua frente e anunciando o início da batalha com um grito.

Comecem! — 

Rapidamente, Mariko aponta na direção de Nidorina, brandindo em alto e em bom tom.

— Samantha, arranhão! — 

Com movimentos rápidos e saltos habilidosos, Samantha realiza um giro proficiente no ar, deixando o peso da grande mão que fica grudado na ponta da sua cauda fazer o resto do trabalho. A Nidorina, entretanto, a observa com certo espanto, recebendo em cheio o golpe que atingia seu corpo por ser incapaz de se esquivar sem o comando do treinador. Recuando brevemente na arena, ela ainda permanecia de pé, mantendo um olhar agressivo na direção da pequena e ágil Aipom. Hibiki assistia seriamente para aquele combate, como se aquilo não valesse seu tempo. Com um breve gesto com a mão, só anuncia seu comando, como se não fosse nada demais.

— Nidorina, use arranhão também. — 

Como um rugido, o Pokémon berra brevemente e corre na direção de Samantha, levantando as patas dianteiras e movendo-as para cima e para baixo rapidamente, querendo arranhá-la no rosto e no resto do corpo com agressividade. Mas o tamanho e a leveza da pequena Aipom foi o fator crucial para que evitasse receber tal golpe, tornando-a possível se desviar das garras da Nidorina e escapar ilesa de quaisquer danos que fosse receber.

Tch. —  Hibiki não parecia ter gostado daquilo, mas não se abalou. Enquanto isso, Mariko se vangloria por dentro, gostando da agilidade de Samantha e de seu pensamento rápido. 

— Samantha, use arranhão mais uma vez! — 

Aproveitando a guarda baixa da sua oponente, a Aipom realiza um flanqueio rápido pela esquerda, utilizando a cauda como um ponto de distração para fazer a Nidorina olhar para o outro lado. A ideia deu certo, pois com a atenção na direção oposta, Samantha usa os pequenos bracinhos de marshmallow para atingir as pernas da inimiga com bastante rigidez. Com as partes inferiores trêmulas e infligidas com um dano moderado, Nidorina já não conseguia se mover muito bem, sentando-se no chão enquanto rangia as próprias presas. Mesmo com tal situação, Hibiki não parecia fraquejar. Parecia que ele estava… Esperando.

— Isso! Muito bem, Samantha. —  Já contando vitória antes mesmo de ganhar, a pequena lêmure saltava de alegria de um lado para o outro, até que algo acontece. No último salto, ela cai no chão, como se tivesse perdido suas forças de uma hora pra outra. Alguma coisa aconteceu. Hibiki, que estava sério, começava a rir porque sabia exatamente sobre essa situação. — Samantha, não! O que você fez com ela?! — 

— Eu? Nada. Você mesma deveria saber o que está acontecendo… A Pokédex lhe disse, não foi? — 

— Veneno… — 

Como a Pokédex havia explicado antes da luta, os espinhos de Nidorina são bastante venenosos. Caso um Pokémon oponente atinja esta área, em poucos segundos o predador fica envenenado, enfraquecendo seus sentidos e tornando-o incapaz de agir e reagir. E era exatamente isso que estava acontecendo com Samantha — ela foi envenenada. Nidorina, que antes estava sentada e  observando, começa a se levantar e caminha lentamente na direção da pequena Aipom que agonizava de dor no chão. Com um olhar raivoso, ela aguarda pela ordem.

— Nidorina, ruja. — 

Ao abrir a boca, um aparente rugido estridente ecoou pelo campo de batalha, tão alto que poderia ser ouvido até mesmo na floresta ali próxima da cidade. O professor, que observava toda o combate, teve até mesmo que tapar os ouvidos com ambas as mãos por ser um barulho muito alto. Samantha gritava de medo e começava a chorar, pensando que poderia morrer ali mesmo. Escondendo o rosto de vergonha com os pequenos bracinhos, Mariko via a derrota bem na sua frente. Seu Pokémon havia perdido a razão de lutar e não sabia o que fazer, pois estava fraca demais para reagir.

— Não… Mas que merda Hibiki! Você tá trapaceando! — 

— Eu? Trapaceando? Poupe-me do inútil julgamento. Isso é somente a habilidade natural da minha Nidorina. — Com um breve sorriso esnobado, ele continua com o breve discurso. —  Seu Pokémon a atacou e agora está pagando o preço. Tudo o que te resta agora é desistir dessa idéia fútil de ser uma treinadora e voltar pra casa brincar de boneca, como as meninas devem fazer. — Finalizando com uma risada, Hibiki se aproveitava do sofrimento alheio, assim como a Nidorina que parecia rir junto.

— Você tá errado… — Mariko cerrava os punhos com força, observando aquela cena bem ali na frente. Não gostava de estar naquela situação... Não gostava nem um pouco. — Você está errado! — Ver Samantha assim a fazia lembrar da primeira briga que teve no primário, quando algumas meninas maiores e mais valentonas se sentiram incomodados e com inveja do chamativo cabelo vermelho de Mariko. Decidindo dar uma “sessão de beleza especial” com tesouras e chicletes na hora do intervalo, vários fios foram cortados e grudados desajeitadamente enquanto a mantinham presa com força pelos braços e pernas, mas após se debater o suficiente, ela se soltou e utilizou das mesmas armas das valentonas contra elas. Naquele momento, ninguém havia aparecido para salvá-la, somente no instante em que todo o estrago havia feito e que as mesmas pediram por socorro aos professores presentes, alegando que a responsável por tudo tinha sido a própria Mariko. E naquele dia em diante, ela aprendeu a resolver seus próprios problemas e a ajudar aqueles que poderiam estar na mesma situação, porque não queria que outros sofressem o mesmo tipo de tortura. — SAMANTHA! — Com um grito, ela tenta ganhar a atenção da própria Pokémon que se mantinha fechada para tudo. Um dos ouvidos da Aipom se mexe, fazendo-a parar de tremer e permanecer atenta nas palavras da jovem treinadora.  — Fica de pé! Você não tá sozinha! — Levantando a cabeça bem devagar, podia-se ver a surpresa nos olhos marejados da pequena lêmure que fitava na direção da menina. Esquecendo-se por um instante toda a aflição, a dor, o desespero… Abandonando tudo que fosse ruim naquele segundo, Mariko complementa ao assentir com a cabeça confiantemente, afirmando que poderiam vencer essa batalha. — Eu vou te dar um doce se você ganhar. — A tristeza de antes se transformava em animação, mudando de olhos chorosos de Samantha para olhos brilhantes e estrelados. Com um sorriso de ponta a ponta, ter dito aquilo a fez ganhar forças.

— Um doce? Você acha que subornar seu Pokémon com doces vai adiantar de algo? — Descrente daquilo que ouvia, teve que conter a própria risada para não perder o controle de tão engraçado que achou.

Por incrível que pareça, havia dado certo. Samantha, que antes estava agonizando por causa do veneno da Nidorina, agora tenta se levantar com dificuldade, mas com determinação nas alturas. Utilizando a própria cauda como apoio, o pequeno corpinho sem forças que tremulava de dor mantinha-se de pé. Hibiki, por um lado, não acreditava no que via, mas por outro, não queria que isso acabasse. Ver um momento como esse, onde a força de vontade dá energias suficientes para continuar a batalhar, é incrivelmente excitante. Estando disposto a encerrar a curta carreira de treinadora Pokémon da Mariko, ele aguarda pelo próximo comando justamente para trucidá-la no próprio jogo.

— Samantha, use arranhão! —

Por estarem frente a frente, Samantha não precisou se afastar ou se aproximar para garantir uma distância razoável para atacar, utilizando então a grande mão que fica preso na própria cauda como arma. Com movimentos rápidos, o membro se movia de um lado para o outro com agressividade, tentando atingir o corpo da Nidorina em pontos vitais e evitando tocar nos espinhos pontiagudos, mas por causa da fraqueza gerada pelo estridente rugido e pelo envenenamento, a velocidade não foi suficiente, pois sem receber o comando, a roedora azul desviava com facilidade, como se fosse uma brincadeira de criança.

— Nidorina, sua vez. Use arranhão! —

Hibiki começava a se empolgar com o combate, proferindo as ordens com mais motivação que antes e esbanjando uma feição que fez até mesmo o professor Oliver se orgulhar por um momento. Nidorina havia percebido isso e sentia essa energia vindo do treinador. Erguendo-se então na frente da pequena Aipom, o corpo ereto da Pokémon era do tamanho de duas da Samantha. Reunindo as próprias forças que acumulou com o entusiasmo, Nidorina desce as patas dianteiras com tremenda agressividade, gerando um grande impacto no chão e levantando poeira no ar, como se algo estivesse explodido. Uma breve cortina de fumaça se forma, deixando ambos os Pokémons invisíveis e incapazes de se verem ou serem vistos.

— Samantha! —

— Nidorina! —

Em coro, ambos os treinadores chamam por seus Pokémons em preocupação e, segundos depois, duas silhuetas eram vistas na cortina que sumia lentamente. Grunhidos constantes vindo da Nidorina podiam ser escutados. Ela olhava fervorosamente para a pequena lêmure. Samantha, que chiava covardemente e de maneira temerária, havia se esquivado por pouco, ficando com os bracinhos levantados para o alto ao curvar o corpo para o lado. Mariko solta um suspiro de alívio por vê-la bem, enquanto Hibiki arregalava os olhos, surpreso por aquilo não ter garantido a vitória desejada.

— Samantha, finalize com arranhão! —

— Desvie Nidorina! —

A batalha poderia ter se estendido um pouco mais e ter garantido a vitória ao Hibiki por causa do envenenamento se não fosse por um fator crucial: o terreno. Quando Nidorina havia realizado o arranhão, a golpe utilizado foi forte o suficiente para criar uma pequena cratera e prender as patas dianteiras nas rachaduras do chão, impedindo-a de se mover e tentar desviar do ataque de Samantha. Com a oportunidade, não precisaria agir mais que o necessário para prejudicar ainda mais o próprio corpo, acumulando o restante das forças para desferir o acerto decisivo. Com o bracinho direito, a Aipom atinge o rosto da Nidorina com tanta força que a fez se soltar da armadilha e a jogar na direção de Hibiki, inconsciente. Um acerto crítico. Com olhos que girava em espiral, o professor Oliver percebe que aquela luta não poderia mais continuar e, com isso, levanta um dos braços, anunciando o resultado.

— Nidorina está incapaz de batalhar. A vitória é de Mariko e Samantha! —

ISSO! — Brandia Mariko alegremente após ouvir tais palavras, jogando ambos os braços para o alto em comemoração.

— I-Impossível…! — Atônito com o resultado, Hibiki apenas coça a cabeça com uma certa vergonha no rosto e retorna Nidorina para a Pokébola.

— Inesperado, eu suponho… Não é, Hibiki? — O professor começava a dizer com certo prazer, mantendo um breve sorriso enquanto caminha na direção de Samantha, já bem enfraquecida e ofegante. — Porque você não para de atuar um pouquinho e pega aquele antídoto no armário? — Analisando-a dos pés a cabeça com cuidado e gentileza, Oliver se ajoelha ao lado da Aipom, deixando-a se apoiar em uma das pernas enquanto ela aguarda confortavelmente pelo remédio. Vendo o sobrinho ir correndo ligeiramente para o laboratório procurar pela medicação, não deixou de rir ao ver a cara de surpresa de Mariko.

— E-Espera aí… Atuação? — Por mais que estivesse preocupada com sua Pokémon, saber sobre o fingimento do garoto foi a que mais lhe chocou. — Ele tava agindo daquela maneira porque? —

— Difícil de acreditar, né? Mas em partes, a culpa é minha. Eu que pedi pra ele agir assim. E você foi exemplar. —

— Você é maluco, sabia? —

— Só um louco reconhece outro... Aliás, aquela estratégia do doce até que não foi ruim.  — 

— E-Estratég-AAAAHHH! Claro! Claro! Estratégia, sim! Eu sou uma gênia das batalhas Pokémon! — Cruzando os braços e mantendo o nariz empinado, Mariko se orgulha por pensar nessas coisas de última hora. — Hibiki nunca teve chance contra mim, nem mesmo aquela Nidorina, ha ha ha ha ha! —

— Bom, vamos levá-la pra dentro. Ficar nesse sol não faz bem pra saúde. — Pegando Samantha no colo, o professor Oliver a carrega igual a um bebê recém-nascido para dentro do laboratório.

Mariko, após assentir com a cabeça, segue o professor logo ao lado, mas sem tirar os olhos da pequena Aipom em quem confiou e que lhe garantiu a vitória. Estava orgulhosa e sabia que teriam boas aventuras daqui pra frente. Com toda a agitação do dia, a noite chegou rapidamente e as ruas da cidade ficaram escuras, dando destaque às luzes dos postes que indicavam as idas e vindas de pessoas casuais que aproveitavam os pontos comerciais. Residências emanam conforto acalorado junto a família, sons de criaturas noturnas ecoavam com as brisas da floresta e o belo céu estrelado dava o toque final para transformar o momento em algo perfeitamente proveitoso.

— O estado dela é ruim, mas uma boa soneca a deixará nova em folha. — Colocando Samantha em uma pequena cama médica, Oliver injetava o antídoto  com uma agulha no bracinho da Samantha assim que Hibiki trazia até ele e a deixava descansar, seguindo então para a sala do laboratório, se sentando em um dos sofás e esticando as pernas na mesa de centro. — Sugiro passar a noite aqui, Mariko. Ela não vai acordar até amanhã de manhã. —

— E-Ela pode dormir no… Meu quarto… — Hibiki não demonstrava mais aquele comportamento arrogante e imponente de antes, revelando ser um garoto totalmente mais tímido e covarde diante de ambos. Até a Nidorina, que se alimentava de rações ali do lado estava bem mais calma e carinhosa com todos.

— E-Espera, porque no seu quarto? Aliás, quem é você? Seu nome é Hibiki mesmo? — Emburrada com tudo isso, já não sabia se poderia confiar em um mentiroso como aquele garoto.

— A-Hem… — Com um leve pigarro para atrair a atenção para si, o professor começa a responder gentilmente as perguntas de Mariko e informar coisas mais além. — Como eu disse antes, esse é o Hibiki e sim, esse é o nome dele. Ele é um tímido e sensível ator mirim que faz vários papéis de teatro na escola. E pra custear esse curso, ele faz uns bicos comigo como meu auxiliar. O fato dele ter agido daquela maneira, como você já sabe, foi porque eu pedi pra ele. Muitos jovens vivem no mundo da fantasia, achando que tudo vai ser as mil maravilhas e ser sempre tudo alegre feito um Wooper no lago… Mas eu tento quebrar essas esperanças sempre que posso com a ajuda dele. Se o treinador ou treinadora iniciante não se abala com as provocações, consegue superar os desafios e aprende com as perdas, então estão aptos a encarar nosso mundo caótico. Mas se desistem com a primeira barreira… Bom… Essa Nidorina já passou por uns dez treinadores. —

— Por isso ela é evoluída… —

— Não somente isso, como também pegou leve com você. Se investisse com força total, era bem provável você parar a luta e vir pra cima de mim querendo uma batalha justa contra um Pokémon decente. Ou talvez tivesse acontecido algo pior… Como ver você chorando. —

— Professor, rude. — Reclamava Mariko ao fazer uma feição de raiva.

— Ei, você pode ter até mesmo a graça de um Gardevoir, mas ainda precisa controlar essa fúria de Exploud. —

— Engraçado… Mamãe me disse a mesma coisa. —

— E é mentira? —

— Heh… Não. — Com um breve sorriso, ela começava a sentir falta da mulher que lhe torturava quase todos os dias e lhe dava o maior amor do mundo. A mãe de Mariko podia ser muitas coisas, mas era genuinamente sincera e gentil, uma qualidade que muitos menosprezam e poucos possuem. Provavelmente, por esse horário, estariam jogando conversa fora durante a janta e aproveitando as histórias malucas da senhora Megumi na calçada. — Alias, professor… Não acha que tá na hora de comer? — Um breve ronco era ouvido na sala, deixando-a com vergonha por emitir algo constrangedor da barriga.

— Putz, verdade! — Ele tava um tapa na própria testa por ter esquecido algo tão importante quanto comer. Se tinha algo que mais amava no mundo além dos Pokémons, era justamente comida. — Hibiki, você já sabe o que fazer! —

— Err… S-Sim senhor. — Nervosamente ele se curva um pouco e segue para a cozinha em passos apressados.

Por um instante, Mariko pôde ver um breve sorriso vindo do rosto de Hibiki. O que seria essa “coisa” que o garoto sabia fazer? O professor apenas ria de leve, achando graça da feição da menina por não saber o que estava acontecendo. Segundos depois, barulhos de pratos, talheres e panelas podiam ser escutados do cômodo mais a frente. Algo estava sendo preparado. Mesmo com pouca inteligência, é possível entender que esse som representa comida. O cheiro também entregava a resposta, o que abria o apetite de todos os presentes. E então, após vários minutos e muita espera, Hibiki, que antes ocupou do próprio tempo no fogão para criar o jantar da noite, se aproxima dos dois, carregando com uma das mãos uma bandeja com três pratos de comida.

— Ohhh! Omurice! — Dizia o professor animado pela refeição, esfregando ambas as mãos igual a uma mosca esfomeada.

— F-Foi o que consegui pensar com o pouco tempo que eu tive. — Hibiki ria sem graça após a apresentação dos pratos.

— Café da manhã, agora? — Questionava Mariko um pouco confusa, mas sem deixar de apreciar no cheiro delicioso que lhe dava água na boca.

— Qualé, vai julgar sem antes provar? Emiko te daria uma surra se você pensasse nisso. — Sem fazer cerimônias, Oliver já estava devorando a comida com satisfação.

— N-Não foi isso que eu disse! — Só de pensar, já sentiu um arrepio na espinha. Negando com a mão com a mão rapidamente, ela logo nota uma coisa escrita de mal jeito com ketchup encima do prato de ovo com arroz. — “Me desculpe  por hoje”... Caraca, você é tímido mesmo. —

— E-Eu… N-Não… — Sem conseguir finalizar a frase, ele se esconde parcialmente atrás do professor, escondendo o próprio rosto de vergonha.

— Biki, desencana. — Já o apelidando, ela se dava de ombros, começando então a dar uma colherada na comida com um sorriso. — Só pelo fato de você saber cozinhar já te torna mais legal que esse velhote aqui. —

— Quem é que você tá chamando de velho, “piveta”? — Com um levantar de uma das sobrancelhas, o professor observa-a seriamente após ser ofendido.

— Você mesmo, coroa! — Apontava para ele com a colher.

— Nem sangrou ainda e já quer tirar sarro igual uma mulher adulta. HÁ! —

O jantar encerrou bem rápido naquela noite. Com difamações engraçadas e risadas contagiantes, todos agora estavam satisfeitos e deitados com a cabeça no travesseiro enquanto observam o mesmo teto do laboratório. Com o professor dormindo em um quarto, Mariko e Hibiki estavam no outro sem dormir. Talvez a companhia do sexo oposto os deixavam nervosos demais para pregar os olhos. Ou talvez seja o silêncio constrangedor que ajudava no clima esquisito. Independente da razão, um ronco grave vindo da Nidorina que dormia no canto do cômodo os assustou brevemente, gerando olhares confusos e criando uma experiência cômica, fazendo-os rir o suficiente para quebrar o gelo. Após isso, Mariko foi a primeira a falar.

— Biki, porque você atua? —

— E-Eu quero entender as pessoas… —

— E não é mais fácil perguntar pra elas? —

— Pessoas mentem, Mari. — Contagiado pelo apelido, decide então chamá-la por um também. — Elas… Elas só mostram o que querem mostrar. —

— Você acha que eu minto? —

— Sim, eu acho… — Ele se virava, agora mantendo um olhar sério para a garota. — Mas você não mentiu pra mim… Você mente para si. —

— Eu… — Ela não entendia bem o que aquilo queria dizer. Ver aqueles olhos azuis lhe deram um certo medo após palavras tão concisas, mas não conseguia virar o rosto ou tirar os olhos dos dele.

— Você é forte, Mari… Eu te invejo por isso. — Voltando a olhar para o teto, ele começava a fechar os olhos, como se o sono chegasse aos poucos.

— Espera… Você me acha forte porque eu quero ser uma treinadora? —

— Eu não conseguiria viajar sozinho, nem sou capaz de conversar com alguém normalmente. Tenho muito medo. — Escondendo o rosto por debaixo da coberta, Hibiki não queria ser visto daquele jeito fraco.

— Então porque não viaja comigo? Até um Pokémon você já tem. —

— Não posso… O professor vive ocupado com várias pesquisas… Se eu não estivesse aqui para ajudá-lo, nem um jantar decente como hoje a gente teria… —

— Então você quer passar o resto da vida como um assistente e um mentiroso que força os novatos a desistirem com difamação e batalha perigosa? É isso? — Ela negava com a cabeça, descrente com tamanho absurdo. — E eu achando que esse desejo de entender as pessoas fosse alguma coisa, mas é só da boca pra fora. Quer saber… Retiro o que eu disse antes. Você realmente não é tão legal assim. Boa noite. — Virando para o lado, ela tenta dormir de maneira forçada, fechando os olhos contra a vontade.

— Mari…? —

— Quié… —

— Sem café da manhã pra você amanhã. —

Com uma breve risada, Hibiki não percebe um travesseiro voando na direção dele, o atingindo em cheio e o fazendo desmaiar na hora pela força utilizada pela garota. Talvez a brincadeira tenha sido de mal gosto, pois ela havia realmente adorado a comida dele. E saber que não poderia se deliciar no dia seguinte era uma afronta. Deixando-o inconsciente para dormir tranquilamente, ela então tenta finalmente descansar depois de um dia duro de treinadora Pokémon. Caindo nos sonhos infantis, a noite que assola Kanto escondia muitos mistérios. Entre eles, um transporte contendo várias cargas estava prestes a revelar algo incrivelmente peculiar para a jornada. 


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