Seth se mexeu, ansioso. Uma folha caiu de seu pelo cinzento.

Na forma de lobo, costumava ser desajeitado. Antes não tinha se acostumado com todo o seu tamanho e suas patas compridas o faziam descontrolado – quando pensava em se mexer, já estava lá. Sua noção de espaço era estranha.

Agora, porém, já se habituara com o jeito que as coisas eram. Cresceu ainda mais como humano: atingira a altura de Quil agora, um dos mais baixos do bando, com pouco mais de 1,85 m, e era quase tão musculoso quanto Embry – um os mais esguios do bando. Ainda cresceria mais, tanto em altura quanto em massa muscular. Provavelmente ficaria maior que os dois.

Como lobo, também crescera. Suas patas não pareciam mais desproporcionais ao resto se seu corpo. Se acostumara com sua forma, sua velocidade, sua força, e aprendera a se adaptar ao crescimento que ainda ocorria.

Mas ainda costumava mexer as patas para todos os lados e andar em círculos quando estava impaciente. Isso não mudara.

Os lobos reclamavam em sua cabeça, mandando-o ficar quieto, mas não conseguia. Pensava em Aurora. E se algo acontecesse? Ela estava lá, sozinha...

“Sue está com ela, você sabe”.

“Mesma coisa que estar sozinha!”, rebateu, ainda ansioso. Os protestos vieram de mais de um lobo, dessa vez.

“Cala a boca, moleque, ela criou dois filhos e um deles é você, tenha respeito!”, a repreensão maior veio de Leah. Ele se encolheu, envergonhado.

“Não foi isso que eu quis dizer. E se ela ficar com frio? Eu não estou lá para aquecê-la. E se mamãe deixa-la sozinha por um tempo e ela se afogar? A audição dela é normal, não vai ouvir nada. E se...”

“Seth, cala a boca”.

“É, cara, você está pior que todos os outros bobos apaixonados”.

“Desculpa. Não consigo evitar. Ela é tão pequena... Vocês sabem o quanto esses bebês ficam doentes por qualquer coisinha”.

Aparentemente, esse era o problema. Os lobos eram para seus imprintings aquilo que eles mais precisavam, aquilo que eles queriam que eles fossem. Emily, Kim e Rachel, que já atingiram a maturidade, queriam que eles fossem seus namorados. Já a pequena Claire, que sequer sabia escrever seu nome ainda, via Cuil como seu melhor amigo, seu irmão mais velho. Renesmee com Jake, também.

Agora, Aurora? Não tinha sequer idade para querer que Seth fosse algo. Ela era apenas um bebê que sequer conseguia se sentar. Era tão frágil, tão... quebradiça. Seth se sentia um protetor que tinha que defendê-la de tudo, até mesmo do que não fosse perigoso.

Era estranho. Até ele sabia que estava exagerando.

“Ok, ok, silêncio todo mundo!”, a voz de Sam soou alta na mente de todos, fazendo-os se calarem.

Depois que a matilha se dividiu, durante a gestação de Renesmee, dois alfas passaram a coexistir. Isso era, teoricamente, impossível – e realmente foi por um tempo. Eles trocavam farpas o tempo todo, esquecendo que um dia foram um bando. Que já foram irmãos.

Descobriram que conseguiam se comunicar através dos pensamentos quando quisessem. Depois disso, todas as desavenças entre eles já haviam sido resolvidas, então resolveram testar até onde poderiam ir. Era um campo totalmente novo, não havia registros na história Quileute de dois bandos, então tinham que descobrir o que fazer por si mesmos.

As coisas foram acontecendo naturalmente, e então ali estavam – Jacob e Sam eram alfas. As duas matilhas dividiam seus pensamentos como uma só, como costumava ser antes, mas a de Sam só respondia às suas ordens, e Seth e Leah só respondiam à Jake.

Sam estava se preparando para deixar o bando. Não aconteceria hoje, nem semana que vem, nem mesmo ano que vem – mas estava próximo. Com os genes de lobo, amadurecera rápido. Poderia se passar por um homem entre vinte e vinte e cinco anos, calmamente. Dessa forma, ainda tinha algum tempo, mas esse tempo não duraria para sempre. Emily não iria parar de envelhecer, como ele poderia fazer, e ele queria poder construir sua vida ao seu lado. Queria poder se casar, finalmente, ter seus filhos.

Jared e Paul também tinham sua permanência no bando contada. O prazo de validade não tinha data marcada, mas existia.

Já Embry não tinha nada que o prendesse à vida humana, não tinha porquê parar agora. Brady e Collin ainda eram muito jovens e não conseguiriam parar de se transformar nem se quisessem. E Quil ainda tinha mais de quinze anos para começar a se preocupar com isso, além de Seth, que teria que esperar ainda mais.

Jake – por mais que esse nunca tivesse sido seu desejo – teria que assumir o bando por completo. Ele tinha sangue alfa em suas veias e uma autoridade nata que ficava cada vez mais aparente. Renesmee pararia de envelhecer, uma hora, e ele iria viver a imortalidade com ela.

Assumir o bando era sua obrigação.

Dessa forma, decidiram que as duas matilhas tinham que coexistir. Sam ensinaria a Jacob o que a vida o obrigara a aprender – fora o primeiro lobo a se transformar e tivera que lidar com as coisas sozinho. Amadurecera anos em pouquíssimo tempo. O bando começava a se acostumar com a ideia de que Jake assumiria a liderança, e Jake também precisava se acostumar com isso.

Quem não gostava muito disso tudo era Leah. Quando passou para a matilha de Jacob achou que as coisas melhorariam, e por um tempo foi assim. Estava longe dos pensamentos apaixonados dos garotos e, principalmente, de Sam. Por mais que o alfa fosse controlado, às vezes era inevitável deixar escapar algum pensamento impróprio sobre Emily – coisa que Leah, mais do que qualquer outro ali, não queria saber. Às vezes seus sentimentos também se mostravam muito intensos, o que ainda machucava um pouco, por mais que ela tentasse esconder. E o pior, definitivamente, era quando ele percebia que deixara escapar mais do que devia e lançava a ela seus olhares de culpa e pena.

Isso era mais do que ela podia suportar.

Mas as coisas estavam melhores, no geral. A dor ainda existia e provavelmente existiria para sempre. Além de perder seu primeiro amor, Leah o perdera de forma traumática – para sua prima, sua melhor amiga, sua irmã. O golpe doera em sua autoestima, em seu orgulho, em seus sentimentos. Depois disso tudo só piorou. Sua transformação, que fora um choque tão grande que causou o ataque cardíaco que matou seu pai. E todo o resto depois disso.

Era difícil. Mas, apesar de ainda doer, não sangrava mais. A ferida nunca se curaria: a cicatriz permaneceria para sempre. Atualmente, só latejava às vezes.

Uma hora, iria diminuir ainda mais.

“É só uma reunião de rotina. É o seguinte: vocês sabem da situação de Seth. As coisas continuam tranquilas por aqui, então as rondas são apenas por precaução, como sempre. Continuaremos com o padrão: ninguém patrulha sozinho. Sei que tínhamos combinado que iríamos seguir o esquema de duplas e tornar os tempos mais curtos, para não sobrecarregar ninguém, mas eu e Sam conversamos e chegamos a conclusão de que o bando é grande e dois são poucos. Então vamos voltar ao tempo original, e agora seguiremos em trios”.

Alguns garotos começaram a protestar, mas Jacob rosnou antes que o impedissem de continuar a falar. O grande lobo avermelhado arreganhou os dentes, agachando-se em posição de ataque. Só isso já foi o suficiente para arrepiar os pelos dos demais, fazendo-os se encolherem e abaixarem as orelhas, subitamente quietos. Voltando à posição normal de antes, Jacob voltou a falar como se não houvesse parado.

“Como eu disse, vocês sabem da situação de Seth. Ele ainda está resolvendo várias coisas, então vamos dar apenas um turno por dia, até que ele consiga se ajeitar melhor. Tudo bem, garoto?”, dirigiu-se diretamente a Seth, fazendo-o se empertigar, ajeitando a postura.

“Perfeito”.

“Ótimo. Seth, você fica com o turno da noite, com Paul e Sam. Depois que as férias acabarem, reorganizaremos as rondas de novo. Entendido?".

“Sim, Jake”.

“Beleza. Pode ir, então, está dispensado. Ah, Nessie quer ver Aurora. Acho que passo na sua casa mais tarde”.

Seth murmurou uma confirmação rápida em pensamento antes de deixar a clareira repleta de lobos e correr pela floresta, indo para casa. Nesses quase cinco dias com Aurora, nunca a deixara tanto tempo sozinha quanto agora.

Era estranho.

A bebê tinha menos de cinco dias de vida. Seu corpinho não chegava a pesar três quilos e ela era a coisinha mais frágil que ele já vira na vida.

Mesmo assim, Seth tinha a sensação de que não era ela quem dependia dele.

Era exatamente o contrário.