Ampulheta escrita por hina dono


Capítulo 8
Uma Guerra Necessária


Notas iniciais do capítulo

Boa tarde! Só um aviso, pessoal: eu vou demorar para postar o próximo capítulo. A história tá chegando ao "clímax" e eu preciso de tempo para escrever os capítulos. Quero fazer tudo com calma :)



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 Humilhado, era como ele se sentia.

Também havia fúria e desejo de sangue em meio aos seus sentimentos, mas a humilhação era predominante. E pensar que o temível Dai-Youkai, Sesshoumaru do Oeste, engoliria mais de quatrocentos anos de orgulho e pediria um favor. Pior, não um favor qualquer. Na carta  enviada ao seu tio duas semanas antes, havia intercedido, pela primeira vez em sua longa existência, à favor de um humano perante um Dai-Youkai como ele. E é claro que Norio não deixou de frisar esse detalhe ao responder-lhe: 

Estimado Sesshoumaru 

 Os portões de meu castelo sempre estarão abertos para você. Talvez os móveis estejam um tanto empoeirados, mas não creio que isso seja um empecilho para sua visita. Terei um imenso prazer em ajudá-lo com quaisquer questões que tenham saído de seu controle. 

 À sua espera 

Norio, Lorde do Norte 

Sesshoumaru enxergou vermelho ao ler o conteúdo da carta. Ajuda? O grande Sesshoumaru, pedindo ajuda? Seu pai deveria estar revirando-se na tumba, tamanho desgosto seu primogênito havia lhe dado.

 Tomado pela ira, permitiu-se perder o controle por um momento, destruindo tudo ao seu redor. Móveis, almofadas, os finos vasos e a porcelana do chá que Jaken tinha trazido há pouco - destruiu tudo. E daí que todos os servos podiam ouvi-lo? Talvez presenciar seu descontrole fizesse com que eles pensassem duas vezes antes de traí-lo. Medo sempre fora seu melhor escudo, afinal.

 Após algum tempo - não sabia precisar quanto - sua ira abrandou. Mais calmo, saiu do cômodo que até há pouco lhe servia como refúgio - precisava fazer os preparativos para sua ida ao Norte.

 *** 

 - Está tudo bem, Yuki-Hime - disse Jaken, acalmando a pequena princesa. - Ouviu? Está silencioso. Já passou. 

Ainda que por fora parecesse calmo, por dentro perguntava-se o que teria acontecido para fazer seu mestre agir daquela forma. Quer dizer, ele sabia muito bem o que vinha acontecendo, mas era preciso muito mais do que algumas aldeias destruídas para deixá-lo naquele estado de nervos.

 Jaken suspirou cansado. Nas últimas duas semanas, várias aldeias humanas localizadas no território do Oeste foram atacadas por youkais. Apesar de os assuntos humanos serem de responsabilidade dos Daimyos e não do Lorde do Oeste - este governava somente sobre os youkais -, Sesshoumaru resolveu assumir o controle da situação. Não podia ignorar aquele óbvio afronte contra sua excelentíssima pessoa.

Jaken admirava a bondade de seu mestre, mas, devido à sua excessiva generosidade, tinha sobrado para ele, Jaken, cuidar dos cidadãos que apareciam nos portões do castelo pedindo ajuda. Ainda que após cuidar de seus ferimentos, enviasse-os para o vilarejo de Inuyasha, o irmão hanyou de seu Lorde, era ultrajante que um youkai completo como ele tivesse de cuidar de humanos.  

— O que eu não faço pelo Sesshoumaru-sama? - sussurrou para si mesmo.

Voltando sua atenção para a criança, notou que ela ainda parecia um pouco assustada. E com razão: aquela era a primeira vez que via, ou melhor, ouvia, o pai ter um ataque de raiva.

Pobrezinha.

Suspirou novamente.

 - Não deixe que a felicidade escape com tantos suspiros, Jaken-sama. 

 - Rin. - Virou-se ao ouvir a voz da rainha. 

 - Hahaue! - Yuki correu para os braços da mãe, sendo acolhida com carinho.

 - Ahhh, Yuki-chan! Você está tão pesada! - falou, fingindo cambalear com o peso da filha. A menina riu. - Não ria de sua pobre mãe! Estou falando sério! Você cresce tão rápido que um dia vou acordar e ter que escalar um pé de feijão para te ver!

 - Hahaue! - exclamou, entre risos divertidos. - Eu não sou um gigante!

 - Mas pode vir a ser! Nunca se sabe! - respondeu, com os olhos arregalados em falso medo. 

 Rin claramente estava tentando distrair a filha para que esta esquecesse o acontecido. E de fato conseguiu, mas só por alguns minutos. Jaken pôde ver a princesa risonha encolher-se no colo da mãe ao ouvir a voz do pai, que havia acabado de entrar na cozinha, chamá-lo:

 - Jaken. 

 - H-hai... - sussurrou em resposta.  

Por ter passado tanto tempo servindo-o, podia dizer que aquele era um dia ruim. E durante esses momentos Sesshoumaru odiava falar além do necessário e mais ainda, ouvir conversa fiada. Sendo assim, o melhor a se fazer era respondê-lo com palavras monossilábicas. Pelo jeito, Rin também aprendeu uma ou duas coisas sobre o humor de seu esposo, pois ao vê-lo não perguntou o que tinha acontecido ou tentou iniciar uma conversa, apenas saiu do local, levando a filha consigo. 

 - Vem, Yuki-chan, vamos lá fora. A árvore cerejeira já está quas... 

Jaken ouviu a voz de sua Lady ficar mais fraca até desaparecer. Ficou com um pouco de pena delas - principalmente da menor. Não devia ser fácil para a menina entender porquê o pai vinha se afastando no último ano. Para ela, Sesshoumaru era apenas seu querido pai, mas para o mundo ele era um guerreiro que matava os inimigos sem piedade. Aquele que ocupa o trono não pode demonstrar sentimentos - isso o tornaria fraco perante os inimigos, oferecendo a eles a tão aguardada oportunidade para um ataque. E ele já tinha sido imprudente demais desposando Rin. Se continuasse agindo carinhosamente na frente de todos aqueles intrusos, perderia ainda mais força entre os súditos.

 Jaken suspirou novamente. E daí que sua felicidade se esvairia? Não podia evitar. 

 - Jaken! Estou falando com você! 

— Hai! 

 Essa não! Divaguei enquanto Sesshoumaru-sama falava. 

 - Iremos para o Norte amanhã ao alvorecer. Faça os preparativos. 

— P-para o Norte?!

 Sua surpresa foi tamanha que ele esqueceu momentaneamente que aquele era um dia ruim. Desculpou-se no mesmo instante, dizendo que iria cuidar de tudo. Só atreveu-se a respirar novamente quando Sesshoumaru saiu da cozinha, deixando-o para trás. 

 *** 

— Você vai viajar? - perguntou Rin. 

A lua já ia alto no céu quando ela decidiu recolher-se. No entanto, antes de dirigir-se aos seus aposentos, passou pelo quarto da filha - fazia parte de seu ritual noturno observar o sono tranquilo dela antes de ir dormir. Entretanto, qual não foi sua surpresa ao deparar-se com o esposo - que esteve distante durante o dia inteiro -, fazendo exatamente o que ela pretendia fazer? 

 Sesshoumaru parou de acariciar os cabelos da filha, como se tivesse sido pego praticando um crime terrível. Rin sorriu. Em outra época não atreveria-se usar a palavra "tímido" para descrevê-lo, todavia, agora que o conhecia de fato, essa era a palavra que melhor o definia como pai. Não "severo" ou "distante", mas tímido. Isso porque, para todos os efeitos, ele não teve pai. Ninguém o ensinou a amar um filho; estavam mais preocupados em ensiná-lo a matar. Saber disso a entristecia terrivelmente, mas também deixava-a orgulhosa por vê-lo tentar, mesmo não sabendo exatamente como

 Ele não respondeu sua pergunta de imediato. Primeiro  aproximou-se dela, tomando-a pela mão e conduzindo-a ao quarto principal. Só quando chegaram aos seus aposentos foi que ele disse: 

 - Sim, irei para o Norte.

 - Para o Norte? - Rin soou surpresa. - Mas por quê? 

— Negócios. 

— Sesshoumaru-sama...

 - Não é preciso que se preocupe.

 - É claro que me preocupo! - exaltou-se. - Você sequer gosta desse seu tio! Por que iria lá? - De repente, como se uma vela tivesse sido acesa, a mente dela iluminou-se, trazendo à tona uma terrível explicação para aquilo. - Quão ruim é a situação? - Foi direta.

Só havia um motivo para Sesshoumaru ir visitar o tio depois de mais de um século: as coisas tinham saído de seu controle e ele precisava de ajuda. Isso também explicava o ataque de fúria que teve mais cedo naquele dia.

 - Tenho tudo sob controle.

 - Não minta!

 - Rin - pronunciou seu nome em tom de aviso.

Ela ignorou.

 - Mais alguma aldeia foi atacada? - perguntou. Sentiu o sangue gelar quando não recebeu uma resposta. - Quantas? 

 Sesshoumaru ficou em dúvida sobre contar ou não. Não queria preocupá-la - tanto é que todos os humanos que chegaram feridos até ali, foram tratados e depois mandados embora sem que ela soubesse -, mas agora não tinha mais jeito. Sua esposa sempre foi inteligente demais para os padrões humanos. Era melhor contar logo a verdade. 

— Cinco. 

 - Cinco? Cinco aldeias destruídas? 

— Cinco cidades. 

 - O q-quê? - O choque da notícia fez com que ela cambaleasse para trás.

Cinco cidades já tinham sido destruídas? E em tão pouco tempo? Sendo assim... 

 - Rin... 

 - Quem? - sussurrou sua pergunta. Não havia necessidade de dizer mais, Sesshoumaru não era tolo.

 - O Leste - falou, sem hesitação dessa vez - e o Sul. 

 Rin não estava conseguindo acompanhar. Pelo pouco que conhecia sobre a divisão dos territórios e seus respectivos Lordes, o Sul sempre foi o mais recluso. Após a Grande Guerra Youkai, o exército vitorioso dividiu o país em quatro, e cada um dos Dai-Youkai, conhecidos como Irmãos Cachorro, assumiu o controle de uma parte. O Oeste ficou a cargo de seu falecido sogro, Inu no Taishou; o Leste, com Inumaru, também já falecido; o Norte, o maior entre os territórios, com Norio; e o Sul, com a única mulher entre o grupo: Chiyo. Pelo que Sesshoumaru contou-lhe, está última tinha sérios desvios de caráter, o que levou os outros Lordes a afastarem-se dela. E talvez esse tenha sido um erro fatal.

 - O Sul? Mas você disse certa vez que a Lady Chiyo tornou-se reclusa e nunca deu sinais de querer outra guerra! - expôs seus pensamentos. 

 - De fato, a irmã de meu pai  nunca faria algo tão estúpido quanto desafiar-me. Não sem a certeza de que poderia vencer. Mas seus filhos não herdaram a inteligência da mãe. 

 - O que quer dizer? 

 - Andei investigando. Aparentemente, a velha Chiyo caiu de cama. Quem governa agora é a filha, Chinatsu. 

 - Chinatsu? - perguntou, confusa. Durante suas conversas Sesshoumaru nunca antes mencionou esse nome. Porém, se era filha de Chiyo, então eles eram primos. 

 Ele suspirou brevemente. Estava pensativo.

 - Como eu já lhe disse, Chiyo é, ou era, maligna. O tipo de predador que gosta de brincar com a comida - explicou, fazendo-a arrepiar-se. - Os outros Lordes teriam relevado isso caso os maus hábitos dela não tivessem estendido-se para os de sua própria espécie. No fim, ela foi exilada.

 Sim. Humanos não tinham valor algum para os youkais, mas eles prezavam a própria espécie. E por que não iriam? Caso todos eles fossem eliminados, quem sobraria para os grandes Lordes governarem?

 - Nunca cheguei a conhecê-la, de fato. Tudo o que sei, aprendi com as histórias - completou.

 - Mas se isso é verdade, por que essa tal de Chinatsu está fazendo isso? Por que nos atacar?

 - Rumores dizem que ela ficou noiva de Rihan há algum tempo. - Sesshoumaru cerrou o maxilar ao dizer isso. Devia estar condenando a si mesmo por não ter previsto aquela situação. 

 - Você não tinha como saber. - Rin tentou consolá-lo.

 - É meu dever como Lorde saber de tudo. 

 Rin suspirou. De nada adiantaria dizer que nesse mundo apenas Deus está ciente de tudo. Ainda que os Dai-Youkais fossem como Deuses andando sobre a terra, eles não passavam de um pálido reflexo do Criador. 

 - Você acha que Lorde Norio irá ajudar? - Mudou de assunto. 

 - O preço será alto, mas, sim, ele vai. 

 É claro. Nada naquele mundo era dado de graça. Tudo tinha seu preço. E podia apostar que a ajuda do Norte custaria muito caro. 

 - Sinto muito - disse, olhar fixo no chão. - Está tendo problemas por minha causa, não é mesmo? Por eu ser humana. 

 - Sim.

 Ela riu levemente.

 - Você poderia ter negado. 

 - Rin - disse ele, aproximando-se dela. Segurando seu queixo, fez com que ela olhasse-o nos olhos. - Já faz tempo que eles estão à espera de uma oportunidade para tentar derrubar-me. É verdade que ao casar-me com você dei a eles exatamente o que queriam, mas... - apertou levemente seu queixo para impedi-la de desculpar-se novamente - mas, eu não me importo. Se este Sesshoumaru pudesse voltar no tempo, desposaria você novamente. - Moveu a mão para a nuca dela, acariciando seus fartos cabelos. - Lutarei com prazer nessa e em quantas outras guerras estourarem. Por você, massacrarei o inimigo. E se este Sesshoumaru tiver que pedir ajuda, que seja. Você vale a pena, Lady Rin.

 - Eu te amo. 

 O que mais ela poderia dizer além de "eu te amo"? Não haviam palavras o suficiente em seu vocabulário para explicar como sentiu-se ao ouvir aquela singela declaração. Honestamente, ela frequentemente sentia-se insuficiente. Fraca, frágil, humana demais. Não estava à altura dele, era o que pensava. Porém, com aquelas simples palavras, Sesshoumaru a fez sentir-se a mais graciosa entres as mulheres. 

 - Eu te a-amo - repetiu, sua voz falhando devido às lágrimas que não tentou impedir de cair. 

Sesshoumaru não retornou as três pequenas palavras - nunca o fazia. E não era preciso. Rin sabia perfeitamente que ele amava-a. O amor dele por ela estava presente em cada olhar, cada toque, cada palavra - pronunciada ou não. E todo o amor que compartilhavam ficou ainda mais evidente quando ele tomou seus lábios em um profundo beijo; quando levou-a para o futon que dividiam; quando tirou-lhe as vestes e amou-a - algumas vezes lenta, outras, fervorosamente - por horas a fio. 

 Mais tarde, uma Rin cansada demais tentou iniciar uma conversa para impedir a si mesma de dormir antes da partida dele.

 - Sesshoumaru-sama...

 - O quê? 

 - Yuki-chan já tem cinco anos... Você gostaria de ter mais... filhos? 

Sesshoumaru arregalou os olhos levemente. Tinha sido pego de surpresa. Se ele gostaria de ter mais filhos? Sorriu divertido.

 - Durma, Rin.

 - Eu não posso... dor.. - Bocejou, exausta. Logo em seguida, sua respiração tornou-se mais profunda: tinha adormecido. 

 Sesshoumaru velou o sono da esposa por mais alguns minutos. Examinava o subir e descer do peito nu dela com um olhar carinhoso.

 - Eu te amo - sussurrou, como fazia todas as noites depois de ter certeza que ela dormia.

Levantou-se, então, cobrindo-a com um lençol. E, após vestir a si mesmo, rumou para a saída do quarto. Jaken já aguardava-o, todos os preparativos prontos. Depois de um rápido banho, Sesshoumaru e ele partiram juntos de Ah-un em direção ao Norte. 

 No caminho, lembrou-se da pergunta sonolenta de Rin. Se ele queria ter mais filhos? Sorriu novamente. Não viu necessidade em contar para ela que seu cheiro havia começado a mudar, exatamente como aconteceu quase seis anos antes.

Eles tinham tempo.  


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Notas finais do capítulo

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