O destino do tigre - POV diversos escrita por Anaruaa


Capítulo 31
Aliados - Kishan




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Depois de passarem um dia inteiro trabalhando juntos, Ren e Anamika decidiram viajar, tentando convencer outros grupos a se juntarem ao dela na luta contra Lokesh, ou o demônio que ele havia se tornado. Eu não entendi o que havia acontecido entre eles, mas Anamika estava diferente. Ela estava gentil. Parecia relaxada e feliz. 

Pensei que aquilo era bom. Talvez Ren tivesse finalmente superado seus sentimentos por minha noiva e estivesse seguindo em frente. Isto não era difícil de se supor, afinal, apesar do jeito selvagem de Anamika, ela era admirável: forte, corajosa, guerreira, além de lindíssima. Pensei na deusa Durga sorrindo para mim, com seus lábios de rubi e senti um pouco de inveja de Ren. 

Ren levaria o fruto e o lenço, então, antes que eles partissem, nós providenciamos suprimentos o suficiente para um mês inteiro. Eles pretendiam ficar fora por uma semana, mas os eventos diplomáticos poderiam se estender, e eles ficarem fora por mais tempo.

Kelsey chegou um pouco antes deles saírem. Ela despediu-se de Ren e lhe entregou o kamandal. Eu sabia que ela estava triste e eu, não sei ao certo o motivo, me sentia melancólico.

Anamika pediu para que Kelsey e eu cuidássemos de seu acampamento. Eu comecei a reunir os homens para estudarmos estratégias de batalhas que tornassem o exército mais efetivo. Havia muitas mulheres no acampamento e a maioria era indefesa. Concordamos que seria bom treinarmos também com elas e as ensinarmos técnicas de lutas e o manejos de armas, para que elas pudessem se defender e eventualmente, defender o acampamento, se fosse preciso. A profecia dizia que Lokesh seria derrotado por uma mulher. Se era assim, fazia sentido ensinar algumas outras ao menos o básico de batalha. 

Em pouco tempo, eu já era um conselheiro de guerra respeitado. Os homens me procuravam para pedir conselhos e eu, de certa forma, assumi o comando. Kelsey ajudava nos treinamentos com as mulheres, participava de alguns conselhos de guerra, tomando notas ou apenas como ouvinte e ajudava na organização geral do acampamento. À noite eu ia até sua tenda, deitava minha cabeça em seu colo para descansar, conversava enquanto ela acariciava meus cabelos e a beijava com carinho e ternura. 

Eu estava feliz. Naquele acampamento eu tinha o melhor dos dois mundos: ali, eu podia ser quem eu sempre fui: um guerreiro, comandando as tropas, desenvolvendo estratégias de guerra, colocando-me à frente da linha de batalha. Eu tinha o respeito e a admiração de pessoas que eu também respeitava e admirava. E eu tinha Kelsey. Eu a amava mais do que tudo. Tê-la comigo depois de um dia de trabalhos era a melhor das recompensas. Sem Ren para disputar a atenção da minha noiva, ela era plenamente minha, e eu pude sentir a maravilha de ser amado desta forma. Eu não senti saudades de casa e não me importaria em ficar naquela época.

Três semanas após sua partida. Ren e Anamika voltaram. Assim que os homens começaram a entrar no acampamento, Kelsey, que estava treinando com o arco e flecha, largou a arma no chão e correu para o meio da tropa. Eles haviam conseguido reunir outros exércitos que os acompanhavam. A maioria daqueles homens não conhecia Kelsey. Preocupei-me que algum deles pudesse atacá-la, temendo que ela fosse um inimigo. Gritei seu nome, mas ela não me ouviu.

Eu empunhei minha espada e corri atrás dela. Então, encontrei Kelsey e Ren abraçados. O rosto dele encostado no dela, sua postura relaxada, como se sentisse alívio e os olhos fechados. Várias pessoas olhavam para os dois de forma interrogativa e em silêncio. Eu os encarava decepcionado. 

Um guerreiro chinês bateu nas costas de Ren e disse algo em voz alta, mas eu não prestei atenção. Ren soltou Kelsey imediatamente. Ela se virou e olhou assustada para mim e para os outros que a encaravam. Ren sorriu para Kelsey e apertou seu braço friamente, antes de virar-se e entregar seu cavalo para um soldado. Então, começou a dar ordens para os homens do acampamento, como se ele fosse o novo comandante. Os homens o trataram com respeito, mas explicando-lhe que eu já tinha começado a organizar os recém-chegados. Ren acompanhou o guerreiro chinês para cozinhar na fogueira no centro do acampamento. 

Eu saí para continuar organizando os homens. Eu estava triste. Parecia que Kelsey nunca deixaria de colocar Ren em primeiro lugar. Mas também havia algo mais. Assim como eu me sentia à vontade onde estávamos e me sentia eu mesmo novamente, parecia que Ren também se sentia assim. E como antigamente, Ren era o príncipe herdeiro, o verdadeiro dono de tudo. E eu era um mero substituto. Foi assim que ele se colocou desde que voltou ao acampamento. Da mesma forma que acontecia na época de nossos pais.

Ao longo daquele dia, não falei com Ren ou Anamika. Eu apenas os observava de longe. Reparei que Anamika estava sempre ao lado de Ren, deixando-o falar. Ela era linda e parecia uma rainha ao lado de seu rei. Ren esbanjava sorrisos e simpatia. Ele sempre fora um bom político e estrategista. Todos os comandantes estavam a seus pés. Em pouco tempo, os soldados do nosso grupo, que antes dirigiam-se a mim como seu comandante, passaram a observar e ouvir o meu irmão, reunindo-se ao redor dele e de Anamika. Eles o olhavam com admiração. Senti raiva dele. Kelsey chegou quando eu os observava.

— O que está acontecendo? — perguntou.

Eu respondi, ainda encarando Ren e Anamika. 

— Meu irmão está roubando o show, como de costume. Treinei os guerreiros por duas semanas, e agora eles se voltam para ele, Anamika cai por ele e até minha própria noiva não pode manter suas mãos longe dele.

— Você está com ciúmes.

Virei-me para ela, magoado.

— Claro que estou com ciúmes!

Kelsey me olhou nos olhos e desculpou-se:

— Sinto muito, Kishan. É comigo que você deve estar bravo. Senti saudades de Ren, mas não foi adequado ter ido atrás dele assim.

Suspirei, culpado, pois meu ciúmes não era só por causa dela. Segurei suas mãos e beijei uma, depois a outra. 

— Estou exagerando. Perdoe-me.

— Se você me perdoar.

— Sempre.

Coloquei meus baços em seus ombros e voltei a observar o grupo à nossa frente. Depois de alguns instantes, Kelsey me perguntou:

— Kishan, o que exatamente significa ser um consorte? É como um companheiro íntimo, esse tipo de coisa?

— Você quer dizer, no nosso tempo ou agora?

— Agora.

— Significa um companheiro de vida. Geralmente um consorte é o cônjuge de um monarca reinante. Por que você quer saber?

— Isso significa casamento? — ela gaguejou.

— Pode significar noivado também — coloquei a mão nos ombros de Kelsey e a virei para mim. Seus olhos estavam úmidos. — O que há de errado, Kelsey?

— Anamika disse que Ren agirá como seu consorte até a guerra terminar.

— Entendo.

Levantei a cabeça e olhei para Ren e Anamika. Ela olhava para ele com carinho e admiração. Como Durga olhava para mim. Aquilo me incomodou mais do que eu gostaria. Parecia que eu estava com mais ciúmes de Ren e Anamika, do que de Kelsey, que estava claramente abalada com a nova relação de meu irmão. 

— Não quero colocar qualquer um de nós em uma situação perigosa porque não consigo seguir as regras de etiqueta próprias para este tempo. Você é meu noivo e Ren é… dela. Eu deveria ter ficado ao seu lado.

Assenti, balançando a cabeça enquanto observava os dois. Anamika era linda e eu desejei o lugar do meu irmão. Eu não sabia o que tinha acontecido entre os dois durante o tempo em que estiveram fora. Talvez eles tivessem se apaixonado e se comprometido de fato. Talvez, depois de matarmos Lokesh, Ren decidisse ficar com Anamika e se tornar seu consorte. Nesse caso, eu voltaria com Kelsey para o futuro e nós dois teríamos uma vida tranquila, longe de magias, maldições e guerras. 

Senti uma melancolia e uma pontada de inveja de meu irmão. Ele teria a vida que eu desejava e eu teria a vida que ele queria ter. Mas pelo menos eu estaria com Kelsey, a mulher que eu amava.

Durante o banquete, lugares especiais foram reservados para Kelsey e para mim. Ren e Anamika sentaram-se juntos, como anfitriões. Eu fui traduzindo tudo o que era dito para Kelsey, que me sorria agradecida.Todos ficaram impressionados e maravilhados quando Anamika, usando o lenço e o fruto dourado, cobriu “magicamente” a mesa com toalhas finas e a encheu com bandejas de comida. Kelsey fez um som de protestou e levantou-se. Eu a  puxei de volta.

— O que está feito está feito, Kelsey. Ren, obviamente, vem instruindo-a na utilização dos presentes de Durga.

Kelsey estava com ciúmes de Ren e da atenção que Anamika estava recebendo ao usar os prêmios pelos quais ela arriscou a vida. Eu a entendia, pois também estava me sentindo assim, pela atenção que Ren vinha recebendo de todos. Kelsey ficou pensativa, tocando o colar de pérolas, que ainda estava consigo. Ela mal tocou sua comida e colocou a cabeça entre as mãos, parecendo nauseada. Perguntei se ela estava bem e ela disse que sim, mas que queria ficar sozinha para pensar. Eu a acompanhei à sua tenda e depois fui para a minha.

Ren finalmente entrou na tenda tarde da noite. Ele parecia um pouco distante, mas me parabenizou pelo trabalho que fiz no acampamento.

— Eu não fiz sozinho. Kelsey me ajudou.

Ele sorriu brevemente.

— Tenho certeza que sim.

Enquanto ele se trocava eu também lhe parabenizei pelo bom trabalho em trazer os outros exércitos.

— Eu também não fiz sozinho. Anamika foi perfeita. Ela é inteligente e soube imediatamente o que fazer. Ela está pronta para se tornar a Deusa. Amanhã bem cedo vou levar todas as armas e prêmios de Durga e vou ensiná-la a usá-los todos. Em breve estaremos pronto para terminarmos nossa missão e matar Lokesh.

Assenti, balançando a cabeça.

Na manhã seguinte, levantei-me à tempo de ver Anamika e Ren deixarem o acampamento em direção à floresta. Ren levava a mochila, que antes era nossa. Ele me deixou no comando, pedindo para que eu me reunisse com os generais convidados.

Depois do café, eu me reuni para uma conferência com todos os comandantes, servindo como intérprete. Entre os comandantes, estavam general chinês Xi-Wong, Jangbu, que preferia ser chamado de Tashi, e seu exército,que era completamente feito de voluntários recrutados de diversas tribos que viviam na região do Tibé, Zeyar e Rithisak onde hoje seriam a Tailândia, Myanmar/Birmânia e Camboja e General Amphimachus, que era um dos Espartanos e agora servia ao rei Alexandre, O grande. 

Kelsey chegou um pouco depois de nos reunirmos. Ela parecia alarmada. Eu a apresentei a todos como minha noiva e companheira de batalhas. Todos a cumprimentaram com um aceno de cabeça e ela retornou os cumprimentos gentilmente. 

— Estamos discutindo estratégias de batalha e eu sou seu tradutor. Cada líder estava se preparando para discutir o que viram na guerra até agora e irão falar sobre bens que vão trazer a aliança. Estamos tentando manter um registro de tudo.

Ela assentiu preocupada. 

— Ok, mas nossa mochila sumiu. Sabe onde pode estar?

— Sim, Ren e Anamika estão praticando com as armas.

— Fanindra também?

— Fanindra também. Precisamos continuar agora, Kells. Será que você poderia ficar e tomar notas?

Kelsey prendeu a respiração e por alguns segundo, parecia que ela iria desmaiar. Mas ela logo se recompôs, contrariada:

— Por que não? Aparentemente não sou necessária em outro lugar.

Entreguei a ela um bloco de notas e uma caneta. Ela começou a tomar notas de tudo o que eu lhe dizia. Quando o general Amphimanchus começou a falar, Kelsey pareceu ansiosa e começou a fazer perguntas. O general apresentou seus homens: Leonato, Demetrius, Stasandor e Eumenes.

— Nós nunca ouvimos falar das terras de onde vieram. Isto é, exceto a Índia, é claro — disse ele com um sorriso de político. — Meu rei terá… o prazer de aprender mais sobre suas cidades.

Kelsey sussurrou:

— Aposto que ele teria.

O general continuou:

— Talvez enquanto esta batalha durar, poderemos falar do estabelecimento do comércio?

Os homens do Tibete e Myanmar pareciam interessados nesta oferta, mas não o general Xi-Wong. Kelsey baixou os olhos e começou a rabiscar o bloco de notas furiosamente. Ela estava preocupada e começou a me explicar o que ela sabia sobre o império Macedômico. Pelo que ela sabia, Alexandre, o Grande, nunca conquistara nada além do Himalaia. Ela temia que mudássemos o rumo da história. Eu entendia seu temor, mas não podia me preocupar com aquilo naquele momento. 

Continuamos a conferência e ao fim, agradeci a todos pelas contribuições e disse:

— Cada um de vocês tem experimentado grandes perdas, mas sinto que juntos conseguiremos a vitória e livraremos nossas terras desse demônio.

Depois que todos saíram, Kelsey me elogiou:

— Você foi incrível. Acho que todos eles ficaram impressionados.

— Eu usei aquele discurso de um dos meus velhos professores de artes marciais. Tecnicamente, o daimyo no Japão que surgiu com o conceito de Fūrinkazan, ou vento, floresta, fogo e montanha, não nascerá por mais um século.

— Bem, talvez você esteja destinado a ser a antiga fonte que os inspirou.

Eu peguei suas mãos e as segurei entre as minhas. 

— O que há de errado, Kelsey?

Suspirando suavemente, ela falou:

— Eu sei que nós estamos destinados a fazer isso para derrotar Mahishasur ou seja lá como Lokesh esteja chamando a si mesmo nesses dias. Eu só quero ter o cuidado de não acabarmos reescrevendo toda a história. Quer dizer, e se Alexandre, o Grande decidir sair agora para conquistar a China? E se isso estragar tanto o nosso futuro que nem mesmo poderemos ir para casa?

Eu beijei seus dedos e olhei em seus olhos. 

— Seria tão ruim se nós não pudéssemos? 

— O que quer dizer?

— Quero dizer que, mesmo sem Nilima e alguns de seus outros amigos, você poderia — fiz uma pausa — aprender a ser feliz vivendo aqui, comigo, no passado?

— Eu… eu acho que poderia aprender a viver aqui sem o conforto do mundo moderno, desde que você e Ren estejam aqui.

Eu segurei seus ombros e sorri. 

— Há uma parte de mim que se sente em casa aqui, Kells. Não me interprete mal. Se você estivesse no futuro, eu moveria montanhas para chegar lá, mas enquanto você estiver ao meu lado, eu me sinto… bem. Não há mais nada que eu precise no universo senão você. 

Eu a beijei suavemente. Mas a imagem de lábios rubis, levou minha mente a outro lugar.


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