O destino do tigre - POV diversos escrita por Anaruaa


Capítulo 23
Lordes da chama - Kishan




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Ren e Kelsey estavam cada vez mais próximos. Ele parecia aceitar o fato de que ela e eu éramos noivos, e, ainda que falhasse algumas vezes, ele respeitava a nossa relação. Ren nunca mais tentou beijá-la, nem pediu a ela que o aceitasse de volta. E isto era o que mais me preocupava. Os dois eram amigos.

Mas a amizade deles só me mostrava o quanto eles eram ligados. Ela se sentia à vontade com ele, os dois se entendiam, gostavam das mesmas coisas. Comecei a questionar as minhas certezas: “Será que Kelsey é mesmo o meu destino? Eu serei feliz com uma mulher que não é minha plenamente? Será que eu não mereço um amor por inteiro?".

Na manhã seguinte, nos disfarçamos novamente e seguimos para o templo. Nós nos desviamos da multidão e subimos as escadas em direção ao terraço. Quando chegamos ali, fomos cercados pelos guardas Bodhas. 

— Por que vocês vieram aqui? — um guarda perguntou. — Por que perturbam nossos líderes neste momento mais sacrossanto?

Kelsey se adiantou e começou a falar com os homens:

— Valentes guerreiros, nós não queríamos causar alarde. Somos viajantes e temos novidades da rainha Rakshasa. Acreditamos que a informação é suficientemente importante para justificar a intromissão. A rainha Rakshasa jogou uma terrível magia em nós. Ela tentou nos impedir de alertar seu povo.

Ren adicionou uma história pessoal da rainha de Rakshasa torturando-o. Kelsey segurou a mão dele e murmurou palavras de conforto. Uma lágrima desceu pelo seu rosto. Isso pareceu convencer os guardas de que estávamos sendo sinceros.

— Venha conosco — um guerreiro ordenou.

Seguimos dois dos guardas pelo curioso templo. O lugar era belo, mas parecia uma ode aos Lordes da Chama, com grandes estátuas de mármores, representando-lhes e a uma mulher, que supomos ser sua amada Lawala. O guarda puxou uma cortina enorme e vimos os Lordes da Chama reclinados confortavelmente perto da jovem no lago de lava. Os dois homens davam-lhe petiscos e enchiam sua taça enquanto murmuravam-lhe suavemente. Uma mulher escovava seus cabelos, enquanto outra esfregava creme em sua pele.

A menina não se parecia com um Bodha. Sua pele era branca e livre de tatuagens. Os dois pareciam conseguir razões para tocá-la. Eles seguravam sua mão e beijavam-lhe os dedos. As mulheres eram constantemente solicitadas a fazer uma coisa ou outra para deixá-la confortável. Elas afofavam o travesseiro e alisavam seu vestido. Ninguém nos notou. Era quase como se estivéssemos invisíveis. Os dois irmãos estavam completamente envolvidos por aquela mulher. Olhei rapidamente para, Kelsey entre Ren e eu e não pude deixar de notar alguma semelhança.

Kelsey deu um passo à frente, mas foi impedida pelo guarda que sussurrou:

— Temos de esperar para que o ritual seja concluído.

— Que ritual?

Ele balançou a cabeça e apertou o dedo nos lábios. Voltamos a olhar para os Lordes. Um deles inclinou-se para a menina e disse:

— É a hora, jovem.

O outro irmão sentou-se e bateu palmas. Servos entraram carregando um objeto retangular coberto com um tecido de seda. Os Lordes da Chamas, de pé, gentilmente puxaram a menina e levaram-na em direção ao objeto. Um dos Lordes tirou a seda que cobria, revelando um espelho brilhante e explicou:

— Este espelho pertencia a nossa amada Lawala. Prometeram-nos que um dia ela voltaria para nós.

O outro homem assumiu.

— Pedimos para contemplar seu reflexo. Se você é de fato nossa Lawala, assumirá a sua verdadeira forma e nos alegraremos juntos. Se você é apenas uma menina sacrificada para as montanhas, seu corpo mudará. Você vai se tornar uma Bodha, uma cidadã da luz — ele beijou-lhe a mão e acrescentou: — Se você é minha Lawala, você deverá me escolher.

— Se ela é Lawala, ela vai me reconhecer como o que ela ama — o outro irmão respondeu sombriamente.

Eu me senti um pouco desconfortável com aquilo.

A menina parecia assustada com o tom abrupto, mas quando eles notaram, suas expressões tornam-se mais leve.

— Você está pronta? — um deles perguntou baixinho.

Ela assentiu com a cabeça e se virou para o espelho. De primeira, nada aconteceu, mas, em seguida, uma luz parecia crescer das cortinas. A menina apertou as mãos contra o rosto e estremeceu levemente. Seu cabelo se moveu como se estivesse em uma brisa e lentamente os fios castanhos foram substituídos por brancos. Sua pele iluminada começou a brilhar e quando ela levou as mãos ao rosto, eu vi refletida no espelho, o reflexo de joias rosa sobre os olhos.

— Eu… eu sou Bodha — ela sussurrou.

Os Lordes da Chama apertaram os punhos. O peito arfava, sua pele brilhante esmaecia, e seus rostos torceram-se em decepções. O chão sob nós sacudiu. O templo mergulhou na sombra. 

Ren e eu seguramos os braços de Kelsey. O espelho rachou-se e caíram pedaços do vidro pelo chão. A menina gritou, e os servos rapidamente conduziram-na para longe. Um dos irmãos gritou:

— Lawala! — e afundou os joelhos, enquanto o outro, em um gesto febril, jogou suas mãos para a estátua de Lawala. A estátua rachou.

— Não, Shala! — Wyea gritou para o irmão, mas era tarde demais.

O mármore marfim tinha se dividido. A estátua se inclinou sobre Kelsey, mas eu a peguei em meus braços, tirando-a do caminho. 

— Eu estou bem. Nem mesmo um arranhão. 

Os Lordes da chama a ouviram. Eles pararam o que estavam fazendo e olharam para ela. Kelsey se virou para eles, e os irmão acalmaram-se. Os rostos deles, antes endurecido pela dor e pelo ódio, tornaram-se suaves. Os dois só tinham olhos para Kelsey. Eles caminharam em sua direção, ignorando a mim e a Ren, que se colocou à frente dela. 

— Eu sou Shala — o Lorde da Chama anunciou e estendeu a mão para Kelsey.

Eu me preparei para puxar Kelsey, mas o outro irmão, Wyea, tocou meu ombro e o de Ren e nos empurrou. Senti meu corpo ser lançado há metros dali. Bati em uma parede com tanta força, que perdi a consciência. 

Quando acordei, notei que Ren estava ao meu lado e também havia acabado de recuperar a consciência. Nós nos levantamos imediatamente e ao mesmo tempo. Kelsey estava deitada em uma espreguiçadeira, sem o disfarce Bodha e os dois homens estavam com ela, sorrindo gentilmente. Ela parecia assustada. 

— Não importa como você chegou aqui — declarou Wyea. — E você ainda é uma pura, caso contrário não teria sido capaz de entrar na câmara interior do templo — disse Shala. — Isso significa que você é elegível para o teste.

Eu não sei porque, mas fiquei feliz em ouvir aquilo. Não que tivesse importância, mas eu sorri. Virei-me para Ren, que também sorria satisfeito. Nós fechamos a cara um para o outro. 

Nos voltamos à Kelsey e eu percebi que ela havia tomado o lugar daquela garota que chegou a Bodha pelo vulcão. Olhei rapidamente ao redor, e vi que a estátua de Lawalla, havia sido restaurada. O espelho quebrado também havia sumido, bem como o chão que havia se rachado instantes antes, estava intacto.

Tentei ir até Kelsey, mas não consegui. Ren também tentou sem sucesso. Uma parede invisível nos bloqueava a passagem. 

Enquanto isso, Kelsey estava do outro lado, sendo acariciada por aqueles gêmeos indistinguíveis, que não conseguiam manter as mãos longe dela. Ren e eu tentávamos bater na barreira, gritávamos por ela, que parecia não nos escutar, mas podia nos ver. Também não conseguíamos mais ouvir o que eles falavam. 

Vi quando Kelsey empurrou as mãos de um dos homens e falou algo a eles, de forma enérgica. O gêmeo apontou para nós e falou algo. Kelsey  respondeu, mas seu rosto então, parecia amedrontado.

Durante um tempo, eu os observei conversando. Os gêmeos pareciam querer agradar Kelsey e convencê-la de algo. Mas Kelsey era teimosa e acabou irritando um dos gêmeos, que agarrou seu pulso e torceu. Eu rugi alto de ódio e frustração. Kelsey respondeu altiva e corajosa, então, o outro irmão a pegou pelo cotovelo e a virou. 

Kelsey desafiava os irmãos, que iam ficando claramente irritados. Ren e eu tentávamos quebrar a parede de vidro desesperadamente, mas não conseguíamos. Os servos dos Lordes da luz, atravessaram, levando um espelho, que foi colocado à frente de Kelsey. Ela foi arrastada pelos irmão, que seguravam cada um em um de seus braços. 

Quando olhou para o objeto, Kelsey riu e ergueu a mão, emitindo seu poder de raio e quebrando o espelho em vários pedaços que se espalharam. Alguns guardas vieram em nossa direção e nós os atacamos. Ren e eu rolamos para onde estava a parede de vidro, que tinha sido desfeita. Corremos em direção à Kelsey e nos colocamos à sua frente.

Os gêmeos haviam se afastados alguns passos de Kelsey e a olhavam surpresos. Eu peguei a espada de ouro de Durga e a movimentei, separando as lâminas. Lancei uma para Ren. 

— Por que vocês dois não tentam intimidar alguém um pouco maior que vocês? —Provoquei.

Os dois me olharam e riram.

— Que divertido — Wyea comentou. — Eles desejam lutar por sua mulher.

— Talvez devêssemos saciá-los — disse o outro. — Eles me lembram o que nós éramos muitas, muitas vidas atrás.

Shala bateu palmas. Um servo apareceu e ele emitiu instruções.

— Tenha o campo de batalha preparado e leve nossas armas.

— Nós vamos permitir-lhes algum tempo para se preparar — Wyea ofereceu.

Ele estalou os dedos e fogo saltou em torno de nós.

— Esperem! Ouçam! — gritou Kelsey. — O que realmente viemos fazer aqui é…

O fogo nos abrangeu. Quando as chamas diminuíram, estávamos em um terreno rochoso e plano acima do vale. Em toda a extensão do vale havia montanhas negras. As pedras negras sob nossos pés se desfaziam em pó quando pisadas.

— Nós estamos em uma espécie de platô na borda de uma montanha. A única maneira de sair é saltar daquele abismo para a montanha ou descer pelo penhasco. Parece muito longe — Concluí.

Nós estávamos discutindo se o Lenço Divino poderia fazer uma ponte de corda quando a terra tremeu. Duas colunas de fogo subiram do templo muito abaixo e se torceram no ar. Então, tocou a terra. Os círculos em chamas diminuíram até desaparecerem completamente. Diante de nós estavam os Lordes da Chama. Eles estavam vestidos para a batalha, usando armaduras e cotas de malhas. Seus cabelos, antes brancos, agora estavam negros. Os Lordes da Chama inclinaram-se sobre nós e estenderam suas armas. 

— O que é isso? — Perguntei.

— É de nosso costume apresentar nossas armas aos nossos adversários antes de começar a batalha.

Ren e eu pegamos as armas dos gêmeos e oferecemos-lhes as nossas. 

— Não confiem neles! —protestou Kelsey em um sussurro. 

Nós avaliamos rapidamente as armas dos Lordes e as devolvemos, pegando as nossas de volta. Ouvi Kelsey explicar à Ren sobre uma das armas que vimos. 

— Eu sei que arma é aquela — sussurrou. — O Sr. Kadam mencionou-a. É uma Gáe Bolga.

— O que é isso?— Perguntei.

— É da mitologia nórdica. Não vou entrar em detalhes agora, mas quando a arma entra na carne as farpas aparecem. A única maneira de removê-la é… cortá-la.

Ren grunhiu.

— Bom saber.

— Vocês estão prontos? — Shala chamou do campo de batalha.

Kelsey me entregou o broche de Durga, e eu murmurei “armadura e escudo.”, sendo envolvido, em seguida, pela armadura negra e dourada. Ela entregou o broche de Ren, que logo estava vestido com sua armadura. Kelsey se abaixou para pegar seu arco e flecha, mas Ren colocou a mão na dela. 

—O que está fazendo, Kelsey?

— Lutando com você.

Ele balançou a cabeça e suspirou.

— Eu não quero que você se machuque.

— Vou atirar de longe.

Ren estava prestes a dizer algo mais quando um fogo queimou o arco e as flechas, que desapareceram. Wyea apareceu atrás de Kelsey, em um círculo de fogo.

— Você é o prêmio, minha querida, não um guerreiro.

— Acho que já ouvi isso antes. Eu sempre fico nas arquibancadas. Quero lutar pela minha própria liberdade. É claro que você não pode me negar isso.

A forma em chamas de Shala materializou-se ao lado de seu irmão.

— Por que estamos esperando?

— Ela deseja lutar — Wyea explicou.

— Ela não pode.

Wyea limpou um pouco de pó preto de sua armadura.

— Admiro seu espírito. Talvez devêssemos deixá-la.

— Não — Ren e eu dissemos ao mesmo tempo.

— Vê como são protetores? Esta batalha será memorável.

— Tudo bem. Eu vou assistir desta vez, sob uma condição. Vocês dois — apontando para os gêmeos — tem que fazer uma luta justa. Não… desmaterializar ou jogá-los do penhasco.

Os Lordes da Chama encolheram os ombros.

— Será justo — Wyea disse — mas você vai aceitar os vencedores sem argumentos, quem quer que seja. De acordo?

— Espere um segundo, Kells — Ren começou.

— Concordo. Mas entendam uma coisa… se trapacearem, não haverá barreiras. Eu usarei todo o poder à minha disposição contra vocês.

— Aceitamos — Wyea sorriu e acariciou a bochecha de Kelsey, que o afastou com um grunhido. 

— Você não ganhou nada ainda. Mantenha as mãos para si mesmo.

Os irmãos gêmeos riram e então desapareceram, e uma trombeta soou.

— Acho que isso significa que é a hora — murmurou Kelsey. Ela beijou minha bochecha e sussurrou: — Isso é para dar sorte.

Então, virou-se para Ren.

—Bhagyashalin, Ren.

— Vejo você do outro lado, Kells.

Ela lhe beijou o rosto e disse:

— Tenha cuidado.


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