Quando O Amor Chegar escrita por kcaldas


Capítulo 5
A despedida


Notas iniciais do capítulo

Essa semana fez um mês que eu comecei essa história. Eu não tinha nenhuma pretensão de continua-la, ia ser somente um capítulo, mas a história foi crescendo dentro de mim junto com a vontade de ver esse casal mais desenvolvido na história dessa novela. Então nasceu esse capítulo como um presente meu para comemorar esse um mês, ele é totalmente novo e não tem nada a ver com o andamento da novela, peguei ideias que eu ando lendo de vcs nas redes sociais e nos grupos e tentei transformar na cena mais bonita que eu consegui. Gente, me perdoem se não ficou do agrado, eu realmente tentei. Também acho que agora as nossas histórias sigam rumos diferentes, a novela está enrolada e segue um ritmo diferente do que veremos por aqui. Fica aqui o meu muito obrigado de coração por todos que estão lendo e me mandando mensagens para continuar! Aproveitem e depois me digam o que acharam!



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A DESPEDIDA

Reunindo suas últimas forças, Aurélio deixou a fazenda Ouro Verde sem olhar para trás. Chegando à cidade encontrou seu pai e Jorge que o esperavam no único hotel da cidade. Disfarçou as lágrimas que havia deixado pelo caminho. Ao chegar, perguntou logo por Ema e Jorge informou que a menina estava segura e hospedada na casa da família Benedito.

— Aquela cascavel não tinha o direito de fazer isso com a nossa família. Onde já se viu, expulsar da sua própria casa um Barão! Julieta Bittencourt não sairá impune.

— Me desculpe Barão, mas Julieta agiu extremamente dentro da lei. Além disso, estou de prova que ela lhes ofereceu uma boa quantia pelas suas terras. Ocorre que o Barão não quis nem ouvir a proposta dela.

— Ora Jorge, de que lado você está? Sou eu que pago os seus honorários!

— Há muito tempo que o senhor não paga meus honorários Barão! Se continuo lhe prestando serviços é pela amizade que temos desde quando meu pai era advogado do senhor.  

— Jorge tem razão meu pai. A culpa foi do senhor. Julieta foi justa e nos ofereceu uma boa quantia que nos salvaria dessa situação em que estamos agora, o senhor que é muito teimoso!

— Até você Aurelinho! Você também se bandeou para o lado da serpente! Eu estou sozinho nesse mundo? Onde está o Imperador que não vem me buscar?

— Papai pare com esse teatro dramático! O senhor está ótimo, não vai morrer agora e não temos tempo para essas besteiras! – Aurélio estava, pela primeira vez, tomando à frente de seu pai para conduzir um problema: 
      – Jorge, eu queria primeiro agradecer por conduzir meu pai até aqui, você é muito mais que um amigo para nós, é praticamente da família. Eu preciso te pedir um favor como um irmão.

— Claro Aurélio, nos conhecemos há muitos anos, farei o que estiver ao meu alcance para ajudar vocês saírem dessa situação.

— Obrigado meu amigo. Não esperava outra resposta de você.

— Diga-me, o que eu poderia fazer Aurélio?

— Jorge, você sabe que eu me formei na mesma faculdade que você .

— Sim, Aurélio, você é bacharel em Direito, se formou quatro anos depois de mim. Nunca entendi porque nunca quis advogar.

— Eu nunca me interessei por exercer a advocacia porque eu nunca precisei. Nunca foi uma paixão pra mim, fiz a faculdade que meu pai queria que eu fizesse. Por mim, você sabe que teria estudado botânica, me interessava muito mais em cuidar da plantação do que das relações das pessoas.

— Veja se isso tem cabimento Jorge? – Gritou o Barão que estava esquecido naquela conversa. – Aurelinho estudou na melhor faculdade do Brasil, é um advogado formado e nunca se interessou em tirar o diploma da gaveta.

— Pois é meu pai, hoje eu tirei esse diploma da gaveta. Jorge, era isso que eu queria pedir para você.

— Aurélio, você quer trabalhar comigo? É isso que eu estou entendendo?

— Não é só uma questão de querer, meu amigo. Eu nunca utilizei esse diploma porque nunca precisei. Meu pai sempre me afastou dos negócios da família e bancou nossos luxos sem restrições. Agora o jogo virou, ele já está velho e não tem como ganhar esse jogo. Cabe a mim agora tirar a minha família dessa situação que ele nos colocou.

— Aurélio, tem certeza que é isso que você quer? Eu preciso te alertar que o mundo da advocacia é um pouco mais cruel do que esse mundo que você conheceu até hoje aqui no Vale do Café e nas suas viagens pelo mundo.

— Eu sei Jorge, não estou esperando encontrar um mundo cor de rosa lá fora, mas eu preciso começar de algum lugar.

— Se é assim, conte comigo meu amigo! Tenho ainda alguns clientes para visitar aqui no Vale do Café e na região, partimos para São Paulo amanhã à noite.

— Aurelinho, você vai para São Paulo com Jorge? Você vai me abandonar a minha própria sorte? Ah eu vou morrer sozinho!

— Papai pare de drama eu já disse! O senhor vai ficar com Ema. Amanhã falarei com a senhora Benedito se pode abriga-los, só por algum tempo para que eu possa resolver essa situação.

— Obrigado Jorge, eu não teria como começar se não fosse a sua ajuda.

— Não precisa me agradecer Aurélio. Tenho certeza que você se sairá muito bem, sempre foi estudioso e aplicado, rapidamente vai conseguir se restabelecer. Mas agora, descansem. Vocês devem estar exaustos. Foram muitas emoções por hoje. Amanhã à noite voltarei para busca-lo. Boa noite.

— Boa noite Jorge. Mais uma vez obrigado por tudo.

O Barão nem se deu ao trabalho de responder. Estava profundamente irritado por tudo que havia passado naquela tarde e mais ainda com a fuga de Aurélio do Vale do Café. Para ele, essa ideia de Aurélio ir embora para São Paulo nada mais era do que uma fuga dos problemas.

De alguma forma, talvez o Barão tivesse razão. A saída de Aurélio do Vale do Café também poderia ser uma fuga, mas não dos problemas financeiros da família, mas do amor que o arrebatara da forma mais encantadora, mas pela mulher mais dura que já havia conhecido. 
      Convencido de que Julieta jamais lhe daria uma chance, concluiu que o melhor a fazer era se re-estabelecer longe dali.

No dia seguinte, mal o sol raiou, ouviu-se batidas na porta. O Barão dormia feito uma pedra e roncava feito um porco que nem se mexeu na cama. Aurélio que mal tinha conseguido dormir logo foi atender e Ema o abraçou aos prantos.

— Papai, eu mal consegui dormir esta noite. Eu tentei dormir para ver se ao acordar era tudo um pesadelo, mas em vão. Pode me explicar de uma vez por todas o que é que está acontecendo?

— Infelizmente minha filha isso tudo é um pesadelo, mas está na vida real. Seu avô não conseguiu administrar as dívidas da família e perdemos tudo para Julieta Bittencourt, a nova dona da Fazenda Ouro Verde e de todas os nossos bens.

— Eu fugi dessa conversa ontem, com medo dessa resposta. Quer dizer que perdemos tudo? Estamos pobres?

— Sim minha filha, estamos pobres! Mas, ainda temos a nossa dignidade. Eu tenho um diploma engavetado. Quanto a isso não se preocupe, hoje à noite vou a São Paulo com Jorge e em seguida começo a trabalhar com ele.

— Trabalhar? Mas papai, o senhor nunca trabalhou? Como pode a essa altura da vida começar?

— Tudo tem uma primeira vez na vida minha filha, e trabalhar não é nenhuma desonra. Eu nunca trabalhei porque nunca precisamos, seu avô sempre cuidou de tudo, mas com a idade avançada dele, acho que cabe a mim essa responsabilidade agora. Só peço que você cuide dele na minha ausência. Acha que pode leva-lo com você para a casa dos Benedito?

— Sim, acredito que não haverá problema. Sou amiga das irmãs Benedito desde criança e dona Ofélia me trata como uma filha. Eles têm um quarto sobrando agora que Elisa e Jane estão em São Paulo, posso dividi-lo com vovô.

— Ótimo, faça isso então. Vou acordar o seu avô e vocês partem para a casa dos Benedito. Eu ficarei tranquilo sabendo que vocês estarão bem. Ainda está com o seu cavalo?

— Sim, eu ia devolver, mas Julieta permitiu que eu ficasse com ele. Mesmo sabendo que ela foi a responsável por toda a nossa derrota, eu não consigo sentir raiva dela.

— É importante que você saiba minha filha que Julieta foi justa. Em nenhum momento usou de deslealdade, muito pelo contrário, fez uma oferta irrecusável para o seu avô. Ele que é muito teimoso e não admitiu vender as terras para uma mulher, ainda mais, para a Rainha do Café.

— Papai não jogue a culpa da nossa falência em meu avô. Ele sempre nos sustentou na vida luxuosa que tivemos. Agora que está no final da vida, não merecia esse revés.

— Está certa minha filha. De qualquer forma, sou eu que vou ter que resolver isso e posso ir tranquilo sabendo que você cuidará dele.

Ema acordou o Barão e rumou em direção a casa dos Benedito. Estava triste pela situação que se encontrava a sua família, mas confiante que seu pai ia conseguir pelo menos remediar a situação e devolver a dignidade dos Cavalcante.

Sozinho no hotel Aurélio ainda pensava nos acontecimentos dos últimos dias. A reviravolta em que se encontrava a sua vida. A derrocada da família e principalmente o amor arrebatador por Julieta. Não podia acreditar que um amor tão forte, que queimava tão vivo em seu peito foi sufocado pela frieza de uma mulher que mais parecia ter uma pedra no lugar do coração.

Respirou fundo para o dia começar direito. Na verdade, ele já começava bem, Ema adiantou o seu trabalho indo até o hotel e resgatando o Barão. Agora, poderia resolver as últimas pendências no Vale do Café e partir para o seu recomeço em São Paulo.

Não entendia do ofício que ia exercer, apenas cursou Direito para satisfazer um desejo do seu pai. Apesar disso, foi excelente aluno, sempre dedicado aos estudos, mas sem grandes paixões pela profissão. Ao se formar ganhou o título de Doutor, pelo qual alguns lhe chamavam no Vale do Café.

Sua família sempre teve muito dinheiro, para sustentar gerações, com a conclusão da faculdade, deu o diploma de presente para o pai e tratou de fazer o que mais gostava, cuidar de seus cavalos, plantas e viajar! Viajou para boa parte da Europa, amava Paris e Veneza. Nessas oportunidades foi com Ema, já que a mãe dela havia falecido no parto e não teve tempo de aproveitar o casamento juntos.

Casou-se muito jovem, como os casamentos eram realizados naquela época, por conveniência, num acordo entre as famílias. Logo a mãe de Ema engravidou, mas tinha uma saúde frágil e teve uma gravidez difícil, não resistiu ao parto da menina.

Após a viuvez, teve alguns encontros casuais, mas nada de muito sério. O namoro mais longo foi com Josephine, sua colega de faculdade, que reencontrou tempos depois numa das idas à São Paulo. Chegaram a ficar juntos por 3 meses, mas Josephine nunca quis se prender a nenhum homem.

Ela era linda, loira, dona de um corpo escultural, olhos claros e um sorriso convidativo a sua boca perfeita. Eles eram incompatíveis, ela gostava da noite, dos bares, de teatro, dos concertos, e Aurélio, apesar de gostar um pouco da noite, sem dúvida, buscava uma companheira para a vida inteira e não apenas para a parte boêmia dela. A incompatibilidade era total. Depois de terminarem nunca mais a viu e nem soube notícias.

Terminou de se arrumar e saiu rumo à casa de chá de dona Ágatha para fazer o desjejum. Ao chegar foi surpreendido pelo olhar curioso da proprietária que estranhou a presença dele ali tão cedo, ainda mais sem a companhia do pai e da filha.

— Bom dia dr. Aurélio, que posso fazer pelo senhor?

— Bom dia dona Ágatha, por favor, eu gostaria de um café forte e com pouco açúcar e um pedaço de bolo.

— Mas é claro, senhor, é para já! Mas, se me permite a pergunta. O senhor está sozinho ou devo colocar um lugar a mais na mesa?

Aurélio se limitou a apenas responder que estava sozinho. Não iria alimentar a curiosidade da maior fofoqueira da cidade. Mais tarde todos iriam saber dos infortúnios da sua família, mas por hora, era melhor que ninguém soubesse.

Enquanto esperava pelo seu pedido, começou a ler o jornal da manhã e não percebeu que Julieta Bittencourt entrara no estabelecimento. Foi despertado pela saudação de Dona Ágatha à ela.

— Ora, ora, hoje até parece um dia de sorte, o filho do Barão de Ouro Verde e a Rainha do Café no meu humilde estabelecimento, quanta honra!

— Como o seu estabelecimento está bem frequentado hoje d. Agatha. Aliás, já sabe da novidade? – Julieta olhou diretamente para Aurélio que já a olhava desde a saudação.

— Mais que novidade dona Julieta, conte-nos. Novidades são tão raras aqui no nosso pacato Vale do Café.

Ao cruzar com o olhar de Aurélio, prontamente desistiu de mencionar sobre a falência do Barão e a tomada das terras. Não tinha prazer em tripudiar no inimigo, ainda mais sendo ele pai do homem que há dias tirava o seu sono.

— Eu resolvi guardar a novidade só pra mim d. Ágatha.

— Mas assim a senhora me mata de curiosidade.

— Não se preocupe que não vale morrer por isso não!

Julieta não conseguia nem disfarçar que desde que entrou no salão e avistou Aurélio não tirava os olhos dele. Era uma perturbação a presença daquele homem. Não bastavam os seus pensamentos a atormentarem, a presença dele a todo momento naquela cidade também tirava o seu sossego. Impulsionada por esses pensamentos se direcionou à mesa de Aurélio:

— Bom dia senhor. Eu vim apenas repetir o que lhe disse ontem, eu não sou uma pessoa má. Desejo do fundo do meu coração que você e sua família se re-estabeleçam...

— Eu agradeço a preocupação da senhora, mas já estou tratando disso. – Aurélio a interrompeu.

Contrariada por ser interrompida por ele, Julieta continuou:

— Ah, já está? Fico feliz por isso. Posso saber como pretende se re-erguer, logo o senhor que nunca trabalhou.

— Eu não lhe devo satisfações, mas eu posso te dizer se faz questão de saber. Vou embora do Vale do Café.

Julieta recebeu aquela notícia como uma apunhalada nas costas. Aurélio  ia embora do Vale? - Pensou tão forte que teve medo de ter soltado alguma coisa em voz alta, ficou feliz que não havia entregado seus pensamentos. Com o tom mais natural que conseguiu fazer tentando se refazer do baque da notícia apenas disse:

— Fico feliz pela sua família e espero vê-los re-estabelecidos em breve. – Julieta saiu da casa de chá desconcertada pela notícia de que Aurélio iria embora. Saiu tão rápido dali com medo de que seu corpo mais uma vez emitisse sinais involuntários que não deu nem tempo de saber que Aurélio ia apenas para São Paulo advogar na capital com Jorge.

Julieta pediu ao motorista que retornasse para a casa, pois ela queria passar na Igreja e depois precisava resolver assuntos pendentes, tomaria um coche de volta assim que terminasse tudo. Ela entrou na Igreja e agradeceu muito à Deus por ter mandado Padre Gregório, seu único amigo, ao Vale do Café.

O Padre era a única pessoa que sabia tudo de sua vida. Ele lhe ouvia em confissão mas tinha se tornado um conselheiro diante de todos os infortúnios que tinha passado na vida. Avistando o Padre de longe fez sinal que iria ao confessionário. Depois de tantos anos de amizade atendendo aquela serva o Padre já reconhecia a aflição de Julieta ao longe:

— Diga Julieta, o que lhe aflige?

— Preciso confessar que pequei novamente Padre.

— Julieta mas eu te ouvi em confissão ontem. O que você fez minha filha?

— Eu pequei de novo Padre. Cometi o pecado da luxúria novamente. Entreguei-me aos beijos dele. Só que dessa vez fui eu que o beijou.

— Julieta, se os dois são pessoas livres e sentem um amor um pelo outro não há pecado nenhum a confessar.

— Não, padre! Não há amor. Ele disse que me ama, antes eu sabia exatamente o porquê. Usava de uma tática para tentar se livrar das dívidas que tinha comigo. Mas agora, ele confunde meus pensamentos, não consigo entender porque insiste em dizer que me ama. E o pior é que por mais que eu tente eu não consigo me livrar dos pensamentos que me levam até ele Padre. Eu não sei o que está acontecendo.

— Julieta, claramente você não é indiferente a esse homem. O que está acontecendo com você é o que parecia impossível. Você está apaixonada.

— NÃO!!! – Julieta ficou tão apavorada com as palavras do Padre que deu um grito ali mesmo, despertando a curiosidade dos poucos fieis que estavam ali. Até se esqueceu que estava no confessionário. – Isso é impossível Padre! – falou sussurrando novamente. – O senhor sabe tudo que eu passei na minha vida, sabe muito bem que não existe espaço para essa tolice.

— Julieta o que eu sei é que o verdadeiro amor é um presente de Deus. Não tenha medo dele minha filha. Viva-o em toda a sua plenitude. Permita-se amar e ser amada Julieta. Sua vida mudará.

— O que o senhor está dizendo. Eu não acredito nesse amor que o senhor está falando. O amor que eu conheço é aquele que prende, que sub-julga, que sufoca e é capaz até das maiores atrocidades só para satisfazer seus próprios desejos.

— O que você passou com o seu falecido marido Julieta foi horrível, mas tem que ficar no seu passado. Não é disso que eu estou falando. Eu estou falando do amor que chegou através desse homem que você me descreveu, que perturba os seus pensamentos e descontrola os seus sentidos como nunca aconteceu com você. Você foi casada com uma pessoa que só lhe fez mal Julieta, entregou sua juventude a ele e eu sei o quanto você sofreu com esse casamento marcado pela violência. Mas tudo isso já faz muito tempo Julieta, tente perdoar e se livrar dessa mágoa que reside no seu coração. Receba esse amor que Deus está enviando para você.

— Nunca Padre! Eu jamais vou me entregar. Jamais serei fraca e me deixarei iludir por esse sentimento patético que o senhor chama de amor.

— Tudo bem Julieta. Rezarei por você para que Deus tenha misericórdia do seu coração petrificado pelos revezes que sofreu da vida. Reze 5 ave marias e 3 pais nosso para o descanso do seu coração.

Julieta ficou ali rezando.

Ao terminar suas orações, saiu da igreja com as palavras do padre martelando em sua cabeça. Pegou o primeiro coche disponível na praça, mas ao invés de ir para a casa, pediu ao cocheiro que a levasse para um lugar mais afastado.

Não conhecia direito a cidade, mas disse que queria paz e desejava ficar por algumas horas sozinha. O cocheiro então sugeriu que ela fosse para a cachoeira das sete voltas. Era afastada e pouco frequentada pelos moradores da cidade. Com sorte não seria incomodada. Julieta aceitou a sugestão e rumou à cachoeira. Chegando ao lugar combinou com o cocheiro de busca-la em três horas. Queria tempo para pensar e organizar suas ideias antes de ir para a casa.

Aurélio terminou de tomar o café da manhã e rumou à casa dos Benedito. Queria explicar ele mesmo a dona Ofélia e ao senhor Felisberto pelo o que estava passando e dos cuidados que precisava para o seu pai. Felizmente o Barão era um homem muito querido na cidade e a família Benedito era muito amiga de Ema. Não precisou dar grandes explicações e ficou tranquilo com os cuidados prometidos à sua família. Pediu o cavalo de Ema emprestado para resolver as últimas pendências que faltavam e se despedir de algumas pessoas e principalmente de alguns lugares que para ele eram especiais.

Aurélio nasceu e cresceu no Vale do Café, deixou a cidade apenas na época da faculdade, mas não se acostumou com a vida agitada da cidade grande. Gostava mesmo do ar puro da fazenda, da simplicidade dos dias no interior. Disparou com o cavalo que não deu tempo nem de ouvir Ema se despedindo dele. O primeiro lugar que queria se despedir era afastado e não podia perder tempo. Aurélio, sem saber, também foi para a cachoeira da sete voltas.

Julieta ficou admirada com tamanha beleza do local. Sabia que o Vale do Café tinha seus encantos naturais, mas não imaginava que era tão bonito. O cocheiro estava certo aquele era um lugar calmo e tranquilo, perfeito para ficar a sós com os seus pensamentos.

As palavras do padre não saiam da cabeça dela. Como pôde se deixar levar pelos encantos de Aurélio? Era possível estar apaixonada? E se estivesse mesmo? Como fazer para se desapaixonar? Desconhecia por completo aquele sentimento e não sabia o que fazer com ele.

A notícia de que Aurélio estava de partida também mexera com ela. Apesar da sua razão gritar para que se afastasse daquele homem, a verdade é que seu coração, por muitos julgados como de pedra, inflamava pedindo para que ela ficasse perto dele. Eram tantos sentimentos juntos que Julieta sentiu-se tonta. Procurou a sombra de uma árvore, sentou-se, fechou os olhos e ficou apenas lembrando dos momentos que esteve nos braços de Aurélio.

Como num passe de mágica, ele se materializou ali na sua frente, pregando-lhe um susto!

— Desculpe eu não queria despertar a senhora.

— O que o senhor está fazendo aqui? – Julieta levantou-se depressa e colocou-se em pé como um soldado em ordem de batalha. – Acaso está me seguindo?

— Ora, mas a senhora é muito egocêntrica mesmo, pensa que o mundo gira ao seu redor? Como lhe falei mais cedo estou indo embora do Vale e queria me despedir dos locais que pra mim são especiais, pois foi onde nasci e cresci. E a senhora, posso saber o que faz aqui num lugar tão afastado de suas propriedades. Acaso comprou a cachoeira também? Seria uma pena que para pisar nesse lugar tão bonito tivesse que pedir ordem à Rainha do Café.

— Não dei liberdade ao senhor para fazer troça comigo! Eu disse ao cocheiro que não conhecia a região e pedi que me trouxesse num lugar tranquilo em que pudesse ficar em paz.

— Cocheiro? Mas eu não vi ninguém esperando a senhora.

— Eu pedi que viesse me buscar em algumas horas. Eu gostaria de ficar SOZINHA!

— Ah, entendi. Então mais uma vez me desculpe pelo incômodo dona Julieta, acredite a senhora era a última pessoa no mundo que eu pensaria encontrar aqui. Não vou lhe incomodar. Quero apenas tomar um banho e prometo que me retiro logo... mas... antes de eu lhe deixar, me diga, em que estava pensando? Quando a encontrei parecia que estava sonhando acordada. Era em mim que pensava?

— Petulante! O senhor não se cansa de me atazanar não é mesmo!

— Eu acho que tenho razão, mas já entendi que não vai admitir. Sabe Julieta...

— O que foi? Por que interrompeu o que dizia se estou calada?

— Eu já lhe falei dos meus sentimentos por você, eu já senti você nos meus braços, seu corpo corresponde tanto quanto o meu, mas eu acho que você esconde algo do seu passado. E pelo tamanho da armadura de ferro que você veste deve ser algo muito grave.

— A minha vida não interessa nem ao senhor nem a ninguém.

— Tudo bem. Não se aflija. Eu não vou te incomodar com esse assunto que tanto lhe faz mal. Mas já que está aqui e o destino parece que mesmo contra a sua vontade quer nos unir, eu tenho uma proposta. – Aurélio segurou as mãos de Julieta e continuou – Esqueça do mundo que está fora daqui. Respire fundo. Aproveite esse momento em que estamos só nós dois e esse presente da natureza aos nossos pés e não pense em mais nada. Esqueça que eu sou o filho do Barão e até mesmo que você é Julieta Bittencourt e permita-se apreciar esse momento. Nada é por acaso...

As palavras de Aurélio soavam como música para os ouvidos de Julieta. A mais linda que já tinha ouvido em toda a sua vida. E envolvida por aquela música, baixou a guarda.

Não disse nada, mas Aurélio entendia o seu corpo, não precisava traduzir. Ele não se aproximou, dessa vez a puxou para o corpo dele e entregaram-se um ao outro no beijo mais abandonado que já tinham dado.

Julieta sentia que seu coração ia sair do peito tamanha a velocidade que batia. Como Aurélio sugeriu ela esqueceu naquele momento que era Julieta Bittencourt, lembrou-se de Julieta Sampaio, a menina que sonhava em encontrar um amor e conhecer o mundo.

Beijar Aurélio fazia o tempo parar. Fazia esquecer que o mundo existia. Só queria estar ali com ele e dessa vez não queria controlar seus instintos mais profundos, verdadeiramente não queria só beijá-lo, queria ser dele por inteiro.

Aurélio desejava tanto aquela mulher que perdia a noção do tempo também. Seu coração inexperiente com aquele sentimento forte que rompia o peito, ele se sentia um adolescente com a primeira namorada. Na verdade, não era a primeira namorada, mas era o seu primeiro amor verdadeiro. Desses que só tinha visto em livros, puro, despretensioso, daqueles que só importa a pessoa amada e nada mais.

Ele queria mais do que beija-la mas tinha medo da reação dela. A última coisa que queria era estragar aquele momento que os astros se uniram para proporcionar. Nem no seu melhor sonho imaginou que encontraria Julieta naquele lugar que mais amava no Vale do Café.

Sentia Julieta entregue, mas seu desejo não tinha pressa. Queria demonstrar todo o seu carinho por aquela mulher. Beijava-a demoradamente, a boca, o pescoço os ouvidos. Experimentou soltar um pouco do cabelo dela. Ficou paralisado quando ela mesma terminou de soltar os cabelos. Ficou ainda mais bonita, se é que isso era possível. Ele tirou o paletó e a gravata. O calor dos beijos de Julieta quase o queimava vivo.

Julieta abriu os primeiros botões da camisa dele. Nunca havia tocado um homem com paixão. Sentia-se um pouco confusa, pois não sabia direito o que fazer. Mas, apesar disso, não tinha medo. Aurélio, ao contrário de todos os homens que tinha conhecido na vida, inspirava-lhe confiança. Ele abriu o restante da camisa. Julieta subiu suas mãos do abdômen dele até o peito, escorregou pelas costas onde descia suavemente, e, agora com a ponta dos dedos, finalmente tirou a camisa dele.

Aurélio ousou um pouco mais e num beijo mais ardente e demorado abriu a parte de cima do vestido de Julieta, revelando apenas os seus ombros. Com tantas camadas de roupa usadas pelas mulheres naquela época, era impossível conseguir desnudá-la abrindo apenas um fechecler. Beijou cada parte que descobrira do corpo de Julieta. Escorregava sua língua pelo corpo dela o que a fazia sentir um prazer totalmente desconhecido.

A essa altura já tinha esquecido completamente quem era. Só conseguia saber do desejo que estava sentindo e que era incontrolável, até mesmo para ela, a Rainha do Café. Não queria controla-lo, pela primeira vez queria deixar-se levar como as águas da correnteza daquele rio, queria deixar seu corpo correr na correnteza do corpo de Aurélio.

Não conseguindo mais controlar seus instintos mais primitivos desnudaram-se. As pesadas vestes agora serviam apenas de lençol para os corpos daqueles amantes. Aurélio amou Julieta como jamais amara uma mulher antes. O desejo que já havia sentido por outras mulheres, até mesmo pela sua primeira esposa era um desejo físico, natural do animal quando envolvido com uma fêmea.

Julieta era diferente.

Ela dominava todos os seus sentidos. Não era só desejo carnal que incendiava aqueles corpos, mas o desejo de ter nos braços a mulher que queria ao seu lado por toda a vida. Por isso, era cuidadoso, paciente, mas ao mesmo tempo viril. Queria que ela também sentisse que ali estava o homem que ia fazê-la feliz a vida inteira.

Envolvia Julieta nos braços e entrelaçava o corpo dela no dele. Tinha uma sede insaciável pela boca dela, quanto mais a beijava, mais não queria desgrudar os seus lábios. Estava sobre Julieta, seus corpos estavam completamente unidos, os braços dela erguidos, as mãos dele entrelaçadas as dele, ele parou um instante de beija-la porque precisava dizer aquilo se não iria explodir. Olhando bem no fundo dos olhos de Julieta sussurrou sem desviar o olhar.

— Eu te amo!!!! Eu te amo como nunca amei ninguém em toda a minha vida! Vem ser a minha mulher!

Ouvindo isso Julieta deu um leve sorrido e fechou os olhos novamente, aquele era o SIM dela. Aurélio voltou a beija-la. O mais profundo dos beijos. As respirações ficaram mais ofegantes. Os movimentos se aceleraram. Gozaram juntos do maior prazer que aqueles dois já tiveram.

Julieta, sem dúvida, pela primeira vez em toda a sua vida sentiu prazer ao lado de um homem. O único sexo que conheceu foi vindo da violência do falecido marido. Aurélio era o seu homem, a tratava como rainha e cuidou do prazer dela mais do que o seu próprio. - "Aquele homem não existia". - Pensava ela.

O padre tinha razão, era um presente de Deus, só tinha essa explicação para aquele amor. O mais completo e livre dos sentimentos. O amor que uniu não só os corpos, mas aqueles dois corações que se queriam como se não houvesse amanhã.

Ficaram ali ainda por algum tempo, sem saber precisar quanto. Julieta deitou no peito dele fazendo carinho.

— Acho que foi Deus que mandou você aqui. Eu procurei o lugar mais afastado da cidade para pensar em como me afastar de você e como mágica você surgiu.

— Eu não sei quem foi, só sei que vou agradecer para o resto da vida ao anjo que me trouxe até você. – Aurélio desencostou um pouco e inclinou levemente o seu corpo para olhar pra ela.

— Eu te amo Julieta. E agora eu sei que me ama também, mesmo que não fale, eu sei que me ama também. Eu quero me casar com você. Quero que você seja minha mulher.

— Aurélio, vamos com calma, por favor. O que aconteceu aqui foi especial demais pra mim... - Julieta hesitou, mas depois continuou - Mas você tinha razão, eu tenho contas do passado a acertar. Por enquanto eu te peço que o que aconteceu fique apenas entre nós.

— Julieta eu não posso entender, eu quero gritar para o mundo que eu te amo! Que eu sou seu homem e que você é minha mulher. Somos livres, não estamos fazendo nada de errado. Já sei, é por causa da minha situação financeira. A Rainha do Café não pode ficar com o filho do Barão falido, é isso?

— Claro que não, isso não tem a menor importância agora. Acredite, eu também quero gritar para o mundo, mas eu preciso me livrar de algumas amarras que me prendem. Hoje foi só uma delas, há muitas outras a serem quebradas. Além disso, você disse que estava indo embora do Vale do Café. Espero que não seja verdadeira essa notícia.

— Infelizmente é verdade. Vou me mudar para São Paulo por um tempo. Vou trabalhar com Jorge.

— Ah, eu realmente sinto muito que você tenha que se mudar. Ainda bem que São Paulo não é tão longe. Vai poder voltar sempre que quiser ao Vale.

— Voltarei assim que você tiver uma resposta para mim. - Aurélio se virou totalmente para olhar nos olhos de Julieta, seguro o seu rosto e continuou - Julieta eu te amo! É só você me dizer sim que eu volto correndo para os seus braços. Eu sei que você me quer, vou esperar o seu tempo. – Terminando de dizer isso, beijou Julieta novamente.

Os beijos de Aurélio eram tão intensos que ascendia nela o fogo de tê-lo novamente, mas não podia. Perdeu-se no tempo em que estava ali, mas certamente já estava próxima da hora marcada com o cocheiro.

Vestiram-se e ficaram ali sentados aguardando os minutos finais daquela despedida.

— Aproveite a sua estada no Vale do Café, mas cuidado. Não dê muita confiança aos homens por aqui viu.

Julieta achou engraçado o modo dele falar dele e sorriu.

— Eu não acredito que você tem ciúmes de mim.

— Ué? Por que não teria? Você é linda, desejável. Qualquer homem daqui poderia se apaixonar facilmente por você e tentar se aproximar.

— Não se preocupe, eu sei me cuidar muito bem. Você foi o único homem que se aproximou de mim em todos esses anos.

Escutaram o barulho do coche chegando. Julieta se levantou e se despediu dele com um beijo apaixonado. Estava rendida àquele amor inesperado que fazia tão bem a sua alma.

— Boa sorte na sua nova vida em São Paulo e volte logo ao Vale do Café.

— Obrigado. Eu voltarei assim que você me chamar. – Beijaram-se novamente até ela partir. Aurélio tinha o coração apertado, mas sabia que aquele não era um adeus, era um “até breve meu amor, estarei aqui te esperando”, então ficou em paz.

Despediu-se de Julieta com o coração apertado por estar deixando-a no Vale, mas ao mesmo tempo tonto de felicidade pelos momentos que passaram juntos. Finalmente ele podia se despedir da cidade e de tudo que era velho na sua vida.

O amor por Julieta lhe dava a vontade de uma nova vida! Saiu dali com a certeza de que em breve estaria de volta em uma outra situação. A despedida do Vale do Café foi muito além do que ele poderia imaginar. Ao invés de estar triste, sentia-se renovado. Estava pronto para voltar a São Paulo e recomeçar, mas é claro que, com motivos para retornar em breve!


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