Yellow - Dramione escrita por LeslieBlack


Capítulo 21
...Bloody Sunday


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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O chão sob seus pés sumiu. O ar subitamente rarefeito a fez arfar, deixando as coisas confusas. Se já não estivesse ajoelhada tentando amparar Max, Hermione com certeza cairia. “Malfoy… Como assim, envenenado? Por quê?”, atordoada, foi o que pensou na hora. Sentindo o pavor já a dominar completamente, a grifinória temeu perdê-lo para sempre. Diferente de quando o viu sucumbindo e coberto de sangue, dessa vez era realmente Draco, e não um Bicho-Papão.

Seus ouvidos ainda zumbiam quando ela procurava sua varinha que foi largada ali perto, e ao pegá-la, apontar para Max. Se Draco foi envenenado, Max poderia ter sido também. A saliva em excesso saindo da boca do garoto poderia muito bem significar isso. Ainda pensando em Malfoy e na ocasião em que foi chamada de sangue-ruim pela primeira vez, ela falou de um jeito decidido e desesperado olhando para o lufano no chão.

Cara de lesma!

Quase que imediatamente, Max fez uma careta e começou a vomitar lesmas. Uma por uma, parecia não ter fim. Agradeceu mentalmente a Merlin, Godric Gryffindor e Ron pelo ruivo ter usado aquele feitiço para defendê-la no segundo ano, por mais que o resultado na época não tenha sido dos melhores. Ela fez Max vomitar lesmas e torceu para o veneno ser igualmente expulso do corpo do garoto, quando respondeu o patrono corpóreo de Harry. O espectro azul em forma de cervo já havia desaparecido, mas Hermione não precisava de um lembrete. Aquele pedido de ajuda não sairia de sua mente tão cedo, não importando o quanto tentasse esquecer depois.

Expecto Patronum!  

Uma luz azul saiu de sua varinha, dando forma a uma lontra que impassível, apenas a olhava. Hermione falou com o máximo de clareza que conseguiu, mas seu tom não escondia de todo a aflição que a consumia mais a cada segundo.

— Faça-o vomitar, Harry. Leve-o à Ala Hospitalar imediatamente. Eu… encontro vocês lá, ok?

A lontra foi embora em uma velocidade impressionante. Não foi possível refrear o desespero em seu tom de voz, mas esse era o menor dos problemas de Hermione. E com certeza algo irrelevante para as pessoas que tinham suas vidas em risco agora mesmo, já que o essencial era que todos permanecessem vivos.

A guerra já havia deixado uma quantidade enorme de baixas, não era justo que houvesse mais vítimas. Pessoas morrem todos os dias, é verdade. Entretanto, esse não é o tipo de pensamento que queremos ter quando um amigo está sucumbindo em nossa frente. Tentando não pensar em um desfecho ruim para aquela situação, a grifinória se dedicou ao amigo que ficava cada vez mais pálido.

Accio bezoar. - Esperou, alerta para algo eventualmente voando em sua direção. Nada. Tentou novamente, precisava ter certeza. - Accio bezoar.

Mais uma vez, nada. Ela desconfiava que o problema não seria resolvido com tanta facilidade, mas comprovar isso não deixava de ser decepcionante. Ainda assim, levantou-se do chão e do jeito que pôde, trouxe Max consigo.

— Nem ouse morrer, Maximilian Roger Owens. Eu mato você, ouviu bem?

A bruxa disse quando apoiou o amigo, da mesma forma que ele já fez com ela certa vez. Já com a roupa imunda e com a ciência que a vida do garoto estava em suas mãos, usou o feitiço Accio novamente, dessa vez para atrair uma vassoura. O corpo de Max estava junto ao seu e as lesmas a sujavam ao entrar em contato com sua blusa branca, mas tudo o que a grifinória sentiu foi alívio ao ver que ao menos dessa vez o feitiço havia dado certo.

Hermione não era uma amante de vôos ou altura, mas reconhecia aquela como uma Cleansweep, vassoura que os meninos usavam tempos atrás. Depositou suas últimas esperanças no pedaço de madeira enfeitiçada que pairou ao seu lado. Max se apoiava à sua maneira na parede quando Hermione tentava o colocar em segurança em cima da vassoura. Ao conseguir, o imitou. Mesmo que sem jeito, a garota ficou atrás de Max, seus corpos colados. Ela deu o impulso necessário para a Cleansweep levantar vôo, começando assim um longo caminho rumo à enfermaria de Hogwarts. Com Max debilitado e ela própria com horror a voar, quase caíram várias vezes. Entretanto, sentir medo sobre subir em uma vassoura naquele momento crítico não era opcional.

Durante algum tempo, o plano deu certo. Hermione não era uma expert em vôo, e Max estar quase desmaiando também não era de grande ajuda. Entretanto, devido a proximidade dos corpos, ela conseguia segurá-lo quando o garoto ameaçava cair. Manobrar aquele - na concepção da garota - “objeto assassino” não era exatamente divertido. A maior dificuldade era quando precisavam virar algum corredor. Se em linha reta e com o caminho limpo já não era fácil para Hermione, ter que comandar aquilo em outras circunstâncias só ajudava a aumentar sua exasperação. Voando aos solavancos, mais de uma vez fez o lufano saltar perigosamente para frente, como em um acidente de carro. Isso fazia com que o medo de derrubá-lo aumentasse, e a consequência era Max mais firmemente preso em seu abraço, machucando-o. Hermione suava frio, se desculpava, mas tudo o que vinha de Max eram palavras desconexas, uma vibração estranha, gemidos de dor e o nome de sua tia.

— Aguente firme. Nós vamos chegar logo, confie em mim.

Mal disse isso, Max escorregou da vassoura tão subitamente que a grifinória não foi capaz de segurá-lo a tempo. A queda foi inevitável, assim como o sentimento de culpa que Hermione sentia há algum tempo e só fez se intensificar. O pé direito do rapaz foi a primeira coisa a chegar ao chão de pedra do castelo. Devido a velocidade, ele caiu em um péssimo ângulo. Seu joelho esquerdo foi o próximo a sentir a dor, seguido por quadril e cotovelos. O corpo do lufano girou na queda, e ele só não pôde captar imediatamente a dor do pouso desajeitado, pois já estava suficientemente machucado. Por puro reflexo protegeu o rosto com os braços. Hermione desconfiava que só por isso ainda estivesse consciente.

Jogado no chão, Max gemia de dor. Assim que o garoto lhe escapou, a morena saltou da vassoura. Preocupada com o amigo, mal notou o barulho que a Cleansweep fez ao bater em uma parede e partir-se ao meio. Correndo até ele, tentou erguê-lo novamente. Os óculos quadrados que escondiam o belo olhar castanho de Max estavam quebrados e pendiam de seu rosto. Antes que algum deles pudesse fazer algo para impedir, o objeto caiu no chão. Ambos ignoraram o fato absurdamente irrelevante se comparado a magnitude dos outros acontecimentos. Completamente sujo e exausto, o lufano não se moveu quando Hermione o sentou e desfez o feitiço que o fazia vomitar. Usou as forças para falar, por mais difícil que fosse.

— Tia Mary… Diga a ela, Jean…

Um nó se formou em sua garganta, os olhos marejaram. Ela fungou, tentando controlar o choro e a tremedeira nas mãos. A voz de Hermione embargou quando ela lutou para libertá-la.

— Eu não sou sua coruja, Maximilian. Fique vivo e diga você.  

— ...que a amo e agradeço… Peça que me perdoe.

— Você não está pedindo perdão por morrer, não está mesmo!  

A morena começava a descontrolar-se. Max fechou os olhos, os lábios se arqueando em um sorriso. Perto da morte, o garoto parecia sereno. E então como um flash, uma imagem nítida do lufano se fez presente na cabeça de Hermione. Ele embaixo de pedras, rosto livre de óculos e sangrando. Ela lembrou cada detalhe do dia em que salvou Max pela primeira vez. Conseguiu ajudá-lo na Batalha Final, quando ele mesmo não aparentava ter esperanças de sair vivo dali e simplesmente ter aceitado seu fim. Já no presente, o garoto sentado ali parecia em paz, totalmente tranquilo, apesar das circunstâncias. Morreria, era isso.

Mas Hermione era uma guerreira, não era de sua natureza cair sem lutar. Não seria agora que iria se render, tampouco deixaria o garoto seguir com aquilo. Mesmo o lufano já tendo se submetido ao fim quase certo, não era algo que ela estivesse disposta a fazer. Gostava de Max, o novo amigo era doce, criativo e gentil. O bruxo era generoso ao ponto de deixar de lado os próprios problemas por alguns minutos para se aproximar e contar uma de suas histórias maravilhosamente mirabolantes, ou apenas perguntar o que ela estava lendo.

Eles tinham essa paixão em comum, a vida de pessoas reais ou imaginárias contadas das mais variadas formas. Enquanto ela preferia os livros, Max se sentia mais confortável com as histórias narradas oralmente. Isso trazia um calor humano que não era muito comum no dia a dia do lufano. Apesar de simpático, ele também era tímido. Não era para qualquer um que se abria como costumava fazer com Hermione no pouco tempo em que eram amigos, e isso significava muito.

Talvez nem o lufano soubesse se a empatia se devia ao fato de ter sido Hermione a salvá-lo no dia da Batalha Final, aos gostos em comum ou por simplesmente gostar do jeito dela. A ordem das coisas não tinha importância, o fato era que considerava a sabe-tudo de Hogwarts como sua melhor amiga. A sinceridade de sua gratidão foi expressada pela voz solene.

— Obrigado, Jean… Fez tudo o que pôde. - Resignado, ele disse por fim.

Aquilo a atingiu como um soco. Max havia desistido da vida, da possibilidade de ser salvo e de tudo à sua volta. Ele não queria saber como seria o futuro? A vontade dela era de gritar, sacudi-lo e exigir que Max ficasse bem. A morte dele era revoltante sob tantos aspectos, tão errada que ela não saberia por onde começar a reclamar, mesmo se estivesse suficientemente sã para fazê-lo. Segurando o rosto do amigo entre as mãos, ela tentava mantê-lo acordado.

Estava começando a ficar ressentida com Max por ele desistir, e isso não fazia o menor sentido. Entretanto, a razão já havia a abandonado há tempos. A exaustão era nítida no rosto do rapaz, que soando frio tentava não se desesperar em respeito a Hermione. O bruxo tinha a consciência que aquilo deveria ser no mínimo traumatizante para ela, não havia motivo para agravar a situação.

E sem que Max soubesse, a melhor amiga sofria também por Malfoy e por não ter feito nada para ajudá-lo. “De mãos atadas” seria uma figura de linguagem pobre demais para traduzir o quão devastada e impotente Hermione se sentia.

Em um último esforço para salvar o lufano, levantou de chofre e apontou a varinha para ele. Sua voz saiu gutural quando pronunciou o feitiço de levitação, arrancando-o imediatamente do chão. Estavam mais longe da Ala Hospitalar do que seria seguro para chegarem lá a tempo, e Hermione sabia que aquela poderia não ser a melhor opção. “Foda-se a segurança”, ela pensou. Seu amigo estava morrendo em seus braços enquanto o garoto que ela tinha uma queda estúpida sucumbia junto a Harry, sabe-se lá aonde. Se aquela não era a hora de improvisar, então a garota ousaria dizer que não aprendeu nada com as enrascadas que se meteu ao longo dos anos em Hogwarts.

O problema do feitiço de levitação era o seguinte: ela teria que ter atenção redobrada com o caminho, e consequentemente em não bater o corpo de Max em alguma parede ou pilastra. A grifinória não podia dar-se ao luxo de deixá-lo ainda mais machucado. O cuidado adicional os atrasaria demais, e tudo o que eles não tinham agora era tempo. Estabilidade emocional, não dispunham disso também. Ainda assim, Hermione o guiou naquele caminho incerto que Max poderia estar fazendo pela última vez.

Às vezes um gemido sôfrego escapava da boca do garoto contra sua vontade. Em determinado momento Hermione não aguentou mais ouvir aquilo. Lamentou baixinho, o som logo se transformando em gritos de ajuda, pedidos desesperados por socorro. Talvez se o dia não estivesse tão bonito e não convidasse os alunos para um passeio agradável no lado de fora do castelo, Hermione conseguisse ajuda. Ou se a maldade humana não chegasse a picos tão alarmantes, ela e Max poderiam estar agora junto aos colegas que aproveitavam o sol e conversavam trivialidades despreocupadamente.

Aquele era um lindo e sangrento domingo, em que a maioria das pessoas estava nos vastos jardins da propriedade. Enquanto a felicidade reinava para algumas almas sob o céu naquela tarde ensolarada, uma tragédia era escrita com sangue em diferentes lugares da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts.

O professor Adams tinha sua parcela de problemas para lidar, é verdade, mas buscava não se focar neles enquanto andava pelos corredores de pedra. Aonde iria? Ele poderia ir para a  biblioteca, cozinha ou sua sala de aula. A vida não havia chegado até aí ainda. Para ele não fazia diferença o destino, só precisava se afastar um pouco do passado.

A tragédia pessoal de Vince Adams era tudo o que envolvesse Rosemary Palmer, ao menos até ouvir uma voz vagamente familiar que lhe quebrava o coração. Ele tentava dizer a si mesmo que aquela poderia ser mais uma entre as milhares de peças que Pirraça costumava pregar. Entretanto, o professor não acreditava para valer que o Poltergeist fosse tão longe em suas brincadeiras. Temendo que algo verdadeiramente grave tivesse acontecido foi que correu, sendo guiado pelo desespero da voz.

A aflição do bruxo que já era grande só fez aumentar ao ver Hermione Granger visivelmente abalada enquanto apontava a varinha para um garoto que Vince supôs ser da Lufa-Lufa e que estava flutuando.

— Granger. - Não havia o menor sinal do bom humor característico do senhor Adams na voz baixa e profunda que foi ouvida. Em seus lábios, o sobrenome de Hermione adquiriu um tom de alerta.

— Professor, ele foi envenenado. Preciso levá-lo a tempo até a enfermaria, mas a vassoura quebrou. Me ajude, eu não posso deixá-lo…

— Vassoura… - Vince a interrompeu. Se aproximou de Max e com um feitiço não verbal desejou que o objeto enfeitiçado chegasse até ele. Sabendo da capacidade intelectual da garota, fez a pergunta óbvia apenas por precaução. - Genial, Granger. Não conseguiu atrair bezoar, não é mesmo?  

Ela precisou de um segundo para processar a pergunta, tempo esse que Vince usou para fazer uma bela Nimbus 2001 voar magicamente até ele.

— Não.

Subitamente mais calma, ela libertou Max do feitiço de levitação que o havia submetido. O garoto foi pego imediatamente pelo professor, que ajeitou-se com o lufano na vassoura.

— Nos vemos lá.  

— Obrigada.

O bruxo não perdeu um segundo sequer a respondendo. Reparou que a respiração pesada de Max significava que se quisesse mantê-lo vivo, não dispunha de muito tempo.

Vince não precisou dizer onde ia, Hermione já corria em direção à Ala Hospitalar como se a própria vida dependesse disso. Estava cansada pela noite mal dormida e por não ter se alimentado bem quando acordou. Ninguém podia a culpar por isso, o grau de distração da garota era alto devido aos acontecimentos incomuns do fim de semana. Ter que salvar às pressas um amigo mais pesado que ela que normalmente já tinha dificuldade de locomoção não ajudava muito em ter uma disposição física decente.

Ainda assim, ela corria com todas as forças que tinha. Arfando e se esforçando o quanto podia para ao menos ter Vince e Max em seu campo de visão, a grifinória corria vários metros atrás deles.

Vince e Max chegaram na Ala Hospitalar com Madame Pomfrey exasperada, já que não paravam de aparecer alunos em péssimas condições. Apesar da situação caótica que se mostrava cada vez maior, a curandeira-chefe buscava tratar os enfermos com agilidade e eficiência, como costumava fazer dos incidentes mais simples aos mais críticos.

Os primeiros pacientes do dia chegaram com dor de cabeça, no que ela prontamente fez com que bebessem uma poção revigorante e os mandou embora após um curto período de observação. Talvez fosse só por causa do Memorial de Guerra que aconteceu no dia anterior, mas Madame Pomfrey não conseguia se sentir em paz naquela manhã. Atribuiu o fato a uma preocupação característica da profissão que exercia há tanto tempo e tratou de seguir sua rotina.

Então quando a bela tarde deu às caras, trouxe consigo o Sr. Zabini e a Srta. Lovegood com sintomas quase idênticos, mudando apenas a intensidade da aflição. Ela ainda fazia alguns testes no sonserino quando Harry Potter chegou gritando, anunciando a quem quisesse ouvir que o garoto com aparência doentia escorado nele, Draco Malfoy, havia sido envenenado. Daí em diante ela classificaria o fatídico dia simplesmente como desastroso.

Já Hermione, se solicitada, chamaria aquele domingo de sangrento, já que a vida de seus colegas corria o grave risco de chegar ao fim. Ela ainda não sabia que Luna Lovegood e Blásio Zabini também haviam sido envenenados, talvez apenas isso fosse capaz de aumentar seu choque naquele momento. A grifinória só soube depois, mas eles estavam dormindo por causa de uma poção que a responsável pela Ala Hospitalar os fez beber, e agora aparentavam a mais simples e bela serenidade. O completo oposto de Harry e Hermione.

A garota chegou até a Ala Hospitalar a tempo de ver o professor erguer Max nos braços e depositá-lo em uma maca indicada por Madame Pomfrey. Finalmente pôde respirar aliviada, mesmo com a dificuldade que o ar enfrentava para chegar aos seus pulmões. A respiração foi novamente suspensa quando o senhor Adams mudou de posição, revelando na maca ao lado um garoto loiro debilitado sendo amparado por Harry.

Ao entrar no local e ver o mais novo dos Malfoy sentado em uma maca, com Harry segurando-o para que não caísse, Hermione pôde notar que o rosto do garoto que amava exibia uma estranha mistura de branco e roxo. Harry, coberto pela mesma matéria pegajosa que Hermione, Max e Draco, pedia ao loiro para ficar calmo e garantia que tudo ficaria bem. O tom assustado não passava tranquilidade ao sonserino, só evidenciava a gravidade da situação.

Um violento ataque de tosse levou Draco a engasgar, o que fez Harry gritar por ajuda. Isso tirou a grifinória de seu transe, fazendo-a correr para auxiliar os dois. Empurrou o amigo para o lado gentilmente, podendo finalmente olhar nos olhos no loiro. Não era assim que imaginava reencontrá-lo após a noite maravilhosa que passaram juntos, mas nem tudo era perfeito. E droga, aquilo sequer passava perto de “aceitável”. Quando Draco conseguiu respirar novamente, ela segurou seu rosto com as duas mãos.

— Por Godric, Harry, o que houve com ele?

Ela estava ao lado do moreno, e antes de ouvir uma resposta pegou um pedaço de pano que Harry havia largado ao tentar manter Draco quieto na cama. Hermione passou o pano úmido na testa do sonserino, que estremeceu com o toque. A bruxa dita como a mais inteligente da geração engoliu em seco diante da aparência extremamente doentia do rapaz.

A pele naturalmente alva de Draco assumia um tom pálido preocupante, o cabelo sempre tão bem arrumado não passava de uma confusão de fios loiros em sua cabeça. As olheiras embaixo dos olhos cinzentos e sem brilho apenas reforçavam o completo caos em que Draco Malfoy se encontrava. O garoto que até nos fins de semana se vestia impecavelmente agora estava trajado com roupas amassadas e sujas. A camisa branca tinha marcas muito nítidas de gosma.

Aparentemente, o feitiço “cara de lesma” marcou a Harry também, pois parecia que tinham recorrido ao mesmo método para expelir o veneno do organismo dos rapazes. Falando em rapazes, Hermione não teve chance de levar o olhar adiante e ver como Max estava, já que a voz do melhor amigo capturou o resto de atenção que não era dirigida a Draco.

— Estava te procurando e esbarrei com o Malfoy. Nós começamos a brigar e ele passou mal, disse que foi envenenado. Te avisei e o socorri, depois segui seus conselhos. - Harry fez um resumo simples dos acontecimentos, mas Hermione se indignou com um trecho em particular.

— O garoto estava morrendo e você brigou com ele?

— Olha só quem fala, você faria pior! E em minha defesa, ele começou a morrer depois. - Entre tantas coisas difíceis de acreditar que se provavam possíveis e ocorriam repetidamente no domingo atípico, Harry se deu alguns segundos para revoltar-se com a indignação de Hermione. Tanto ele quanto ela estavam estressados e fizeram o melhor que puderam, sabia disso. Perdoando imediatamente a irmã de consideração, o garoto suspirou, derrotado. - Vamos brigar depois, está certo? Eles precisam de cuidados.  

Sentindo-se péssima, Hermione finalmente se lembrou de Max e o olhou adiante, encontrando-o na maca seguinte. Se o lufano estava vivo agora, Vince Adams merecia boa parte dos créditos. O professor não apenas levou o garoto até a Ala Hospitalar com rapidez, como cuidava pessoalmente dele. Sob as orientações precisas de Madame Pomfrey, Vince se esforçava na missão de ajudar aquele aluno a ficar bem. Ele evitou diversas vezes que o lufano se engasgasse, fez com que ele tomasse as poções, e com palavras brandas transmitiu uma tranquilidade que não sentia.

Sua dedicação foi recompensada quando a respiração de Max voltou a se acalmar aos poucos. Com olhos fechados e um lamento sôfrego, o garoto chamou por sua tia. Mary não era sua parente biológica, era apenas a melhor amiga que seus pais tiveram. Logo, quando o fruto daquela linda paixão entre Guido e Cecilia Owens nasceu, a “senhora bruxa”, como o lufano carinhosamente a chamava, ganhou um afilhado. Ela era sua madrinha, mas era tão amada quanto uma mãe. Max gostaria de dizer isso a ela, se tivesse oportunidade…

A atenção de Hermione foi novamente requisitada contra sua vontade, pois Draco tentava em vão controlar a respiração, resultando em outro ataque de tosse. Quando a situação do garoto estava consideravelmente mais estável, ela enfim mandou o resto de autocontrole para o inferno.

— Malfoy, me escute. Por favor, Draco. Só… Tente respirar, sim? Só respire. Eu imploro, se acalme.  

A garota nem soube em que momento daquele dia louco começou a chorar, mas Draco fechou sofregamente os olhos e encostou a testa na dela. Ainda sem ver o que fazia, secou as lágrimas de Hermione e se afastou quando a vontade de tossir veio com força. Deitado de lado na cama, ele não tinha mais forças para buscar as mãos dela. Entretanto, tamanho era o desespero de Hermione que ela não se importou com o que pensariam, cuidou de seu amado com todo o zelo. Abaixou-se para ficar na altura dele, falou palavras reconfortantes, mesmo chorando, e claro, o ameaçou.

— Hey, tenha calma. Eu sei que não estou, mas não vamos transformar isso aqui em uma disputa. Você vai ficar bem, tem que ficar… - Mais um violento ataque de tosse fez com que o coração de Hermione se apertasse em agonia. - Draco… Por favor, não faça isso comigo. Ainda vamos brigar muito, vamos sim. Mas para isso você precisa estar vivo, inferno!

— Senhorita Granger! - Madame Pomfrey a repreendeu.

— A senhora não entende, ele não pode fazer isso. Eu odeio tanto o que você me faz sentir que quase chego a te odiar, Draco. Eu não posso mais fazer isso.

— Há quatro alunos que foram envenenados nessa enfermaria, não preciso de mais estresse. Se essas pessoas realmente são importantes para você, tente se acalmar. - A curandeira-chefe tentou com mais gentileza dessa vez. Uma voz diferente das demais se sobressaiu para desmenti-la.

— Cinco. Aparentemente, hoje não é o dia de sorte do Longbottom também. - Com seu uniforme do time de quadribol da Sonserina, Pansy Parkinson chegou em grande estilo. Todavia, o fato de Neville Longbottom apoiar todo o peso de seu corpo na garota era insuperável. - Ah, e antes que me acusem…  Por mais que não pareça, eu sou inocente.

Isso foi o bastante para apavorar novamente aqueles que já estavam mais calmos. Não era o caso de Hermione ao olhar alarmada para Draco.

— Her… - Um murmúrio foi ouvido. - Her…

— Malfoy. - Ela disse ignorando tudo ao seu redor que não fosse Draco.

— Her… Mi.  

Ele não conseguiu completar. Sofregamente, colocou a mão no bolso da calça e de lá tirou uma espécie de origami, que começou a bater as asas. Como estava amassado, apenas ensaiou o movimento. Draco havia feito um pássaro azul! Um pássaro azul que assim como o do poema, estava preso. O pássaro feito de papel estava preso nas mãos de Hermione sem poder voar devido às asas amassadas, mas o coração de Draco estava nas mãos daquela garota.

Seu maior medo agora era morrer sem que ela soubesse. Ato egoísta, caso perecesse, mas ainda assim, sua última vontade. Ela olhou para aquilo com choque e admiração. Parte de sua sanidade voltou naquele momento, pois precisava ser forte por ele. Com um sorriso mínimo, respondeu enquanto alternava o olhar de Draco para o pedaço de papel dobrado.

— Essa é a prova que Draco Malfoy tem um coração. Se não tivesse, onde mais guardaria um pássaro azul? No bolso da calça não é um lugar adequado, pode machucá-lo.

Com olheiras, a pele com uma palidez doentia e banhado de suor devido ao esforço, Draco fechou os olhos tentou sorrir. Sim, ele tinha um coração. O autor trouxa era muito bom, tinha que admitir. Se seus sentidos rebeldes fossem controlados e ele não morresse, Draco pensou que gostaria de ler mais coisas do tal Charles. De olhos fechados, estendeu como pôde a mão na direção de Hermione. A garota achou que o loiro quisesse seu pássaro azul de volta, por isso o ofereceu. Quando ela o pôs ao lado do corpo do rapaz com um “tome” sussurrado, ele abriu minimamente os olhos e segurou a mão dela.

As ditas correntes elétricas tão comuns em histórias de pessoas apaixonadas não puderam ser detectadas pela garota, que já tinha o corpo todo em alerta máximo. Surpresa, ela o obedeceu quando achou ter ouvido um “fique", enquanto Harry que foi para perto de Luna sem Hermione perceber lhe trouxe uma cadeira.

— Sempre… - Ela não foi ouvida pelo sonserino que já dormia, efeito da poção que tomou. Todavia, a calma que sentiu não era resultado unicamente da mistura administrada para fazê-lo descansar. Hermione era como uma força da natureza, e tinha efeitos sobre ele até no estado de inconsciência. Sem se preocupar se acabaria o dia vivo ou morto, Draco Malfoy adormeceu naquela enfermaria, sem saber o que o aguardava no futuro.


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