Yellow - Dramione escrita por LeslieBlack


Capítulo 19
Sunday...


Notas iniciais do capítulo

Olá, bbs. Boa leitura!



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Blásio Zabini era o que as pessoas costumavam chamar de "um autêntico sonserino". Mais do que somente inteligente, ele era astuto. Também tinha um alto nível de cuidado com sua integridade, colocando-se sempre em primeiro lugar. Alguns classificariam esse comportamento como vaidade, já outros, egoísmo... Mas ele só queria se preservar. Física e emocionalmente, em todo e qualquer aspecto.

Blásio não era do tipo de pessoa que fala dos sentimentos ou que admite os possuir, não era aberto sequer com a própria mãe. Também pudera, casando sete vezes ela não era o melhor exemplo de estabilidade que o rapaz conhecera na vida. Ele não se importava com quantos homens sua mãe se envolvesse, mas acreditar nela quando falava que cada novo amor era o maior de sua vida já era exagero. O bruxo não podia e nem queria acreditar nesse tipo de coisa.

Então transferiu seu ceticismo para o amor. Aquele sentimento que todos diziam ser arrebatador não existia para ele, ao menos não da mesma forma que se apresentava aos demais. É claro que Blás já sentiu amor, inclusive ainda sentia. Sua mãe mesmo era um exemplo vivo. O garoto amava seus amigos, mesmo eles sendo tão parecidos consigo, até mesmo na parte da inexpressividade. Ou talvez justamente por isso. Os seres humanos não funcionam todos da mesma forma.

Sob protestos, ele amava à sua maneira Theo, Pansy e Draco. O loiro era seu melhor amigo, e por mais que Blásio entendesse perfeitamente o modo de agir do rapaz, ainda assim queria ajudá-lo. Estava claro como uma manhã ensolarada que Draco não estava bem. O grande mistério era o que de fato o perturbava, mas não era como se o amigo fosse responder abertamente ao ser questionado. Todavia, Blás tinha um palpite. Ele achava que o estado do garoto tinha alguma coisa a ver com Hermione Granger, pois desde o passeio ao orfanato Destiny Child ele voltou estranho. O palpite de Blásio era graças a melhor coisa que aconteceu para ele aquele ano, que no caso era um alguém. Como se o ocorrido fosse somente há alguns dias, o bruxo lembrou-se.

Estava na Floreios e Borrões comprando materiais e alguns itens de papelaria que colecionava, quando um livro sobre criaturas mágicas lhe chamou a atenção. Aquela não costumava ser sua matéria preferida na escola, tampouco um assunto que ele anteriormente tenha achado relevante. Entretanto, Blásio Zabini era observador. Um de seus passatempos preferidos era aprender tudo o que pudesse a respeito de uma pessoa, quando ela o deixava intrigado. Isso acontecia com uma frequência cada vez menor.

O moreno não seguia a pessoa, usava maneiras duvidosas ou qualquer coisa parecida. Ele apenas observava quando o objeto de estudo entrava em seu campo de visão. Aos olhos dos outros poderia parecer estranho uma pessoa encarando a outra, e com razão. Todavia, o sonserino fazia isso como um pintor que observa uma paisagem antes de reproduzi-la em um quadro.

O que houve foi simples, em algum momento dentro daquele castelo, um olhar azul como o céu lhe chamou a atenção. Não um céu tempestuoso ou de fim de tarde, mas da cor que aos poucos foi se tornando a preferida do moreno. O azul como uma tarde ensolarada e sem nuvens vez ou outra olhava para ele também. A dona de tão belos olhos não parecia notar sua inquietação, tampouco se lembrar dele. De toda maneira, Blás parou de chamá-la pelo apelido que usavam para fazer chacota com a garota.

Parou de achar graça no apelido “Di Lua”, que para ele passou a ser um termo proibido. Pouco antes da guerra estourar, o moreno descrito como mais um entre tantos “autênticos sonserinos” ameaçou alguns garotos que zombavam dela, a maioria companheiros de casa do rapaz. Como boa serpente, agiu rápido e sem chamar a atenção, com uma eficiência mortal. Acuados, os outros não zombavam mais de Luna e ninguém jamais soube que Zabini lhe auxiliou de alguma forma.

O motivo que o levou a defendê-la não foi amor, tampouco alguma inclinação do gênero. Blás viu uma coragem maior do que a dos leões ali, pois ela não tinha medo de ser quem realmente era, assim como não se importava com os julgamentos dos outros. Ele mesmo não tinha tamanha valentia, mas a reconhecia e respeitava. Ele valorizava isso.  

Sendo assim, por que decidiu protegê-la, de alguma forma? Nem mesmo ele tinha certeza. O que sabia era que haviam questões mais importantes no mundo do que implicar com alguém que não se importa com o que pensam, que a guerra já se desenhava, e ser infantil daquele jeito não era bom para os sonserinos. Foi o que admitiu para si.

Depois percebeu que a garota com a inteligência incomum não merecia ser incomodada por alguns idiotas da escola, que seu jeito sereno de ser merecia aparecer mais vezes. Que a beleza dela enquanto lia um livro qualquer sobre criaturas mágicas superava as garotas que faziam de tudo para serem notadas e beijar algumas bocas. A garota com os olhos de tarde ensolarada era diferente, não se importava com esse tipo de coisa.

Nessa época, Blásio Zabini não a via com nada além de admiração. A mesma que um apaixonado por criaturas olharia caso se visse diante de uma encantadora espécie nova. O detalhe é que o garoto desprezava as criaturas em geral até então. Coisa que mudou gradativamente, do mesmo modo que os sentimentos por ela mudavam também. Passou a ver tais livros de outra forma, foi do desprezo ao apreço. Acabaria se tornando um especialista no assunto. Continuou sendo reservado, mas dessa vez com uma calma maior após a guerra.

Zabini se lembrava que quando Lord Voldemort e Harry Potter estavam prestes a duelar, sem que ninguém soubesse, ele teve que se controlar para não ir até Luna e abraçá-la, tamanha sua felicidade por a loira estar viva. Uma de suas maiores preocupações tinha sido com a segurança dela, e sabia não ser capaz de feri-la se estivessem frente a frente. Por um lado, agradecia a Merlin por não ter que duelar com Luna e botar a vida dos dois em risco no caso muito provável de traição. Por outro lado, não vê-la durante tanto tempo o deixou em um péssimo estado de humor, que não melhorou devido às circunstâncias.

Tentou pôr em sua cabeça que aquilo era só porque acostumou-se a pensar na estudante como um espírito livre, como a personificação da esperança. Foi naquele momento que começou a se descobrir apaixonado. Algumas fichas demoram uma eternidade para alcançar o solo, mas quando caem fazem um verdadeiro estardalhaço. A dele atingiu o chão com força, abriria uma cratera a seus pés se não fosse uma figura de linguagem. Abstrata como é, a percepção age de forma mais sutil. Ele julgou tal sentimento como um pensamento tresloucado, causado pelo calor do momento. Tentou inclusive ignorar os sinais, mas não conseguia se livrar de algo que o conectava a garota.

Livros sobre criaturas mágicas eram sua nova obsessão, pois seriam a única conexão que o moreno permitiria existir entre os dois. Luna jamais poderia saber o que houve na cabeça daquele sonserino, um sujeito típico. Orgulho? Um pouco. Talvez ele admitisse, se perguntado. Afinal, era verdade, por mais que aquela não fosse a verdadeira razão. Luna Lovegood era esperança, tal qual uma tarde em que o sol reina e não há nuvens no céu. Assim como aqueles olhos. Ela era toda bondade, ingenuidade, liberdade de sentir e de sonhar, tudo que Blásio não tinha ou merecia. Simples assim, Luna Lovegood não era para ele.

Por isso foi uma surpresa para o bruxo, quando estendeu a mão para pegar o último livro sobre uma espécie rara encontrada no Brasil e ao tirá-lo da prateleira, bater com o braço em alguém. Surpresa maior foi ver quem acertou acidentalmente.

— Lun… - Tentou se corrigir a tempo, torcendo para ela não perceber o deslize. - Lovegood. Desculpe, machuquei você?

Seu plano era ser evasivo e não sofrer criando falsas esperanças. Luna e ele não iriam se aproximar, de toda forma. Esse era o motivo de mais uma vez estar se preservando. Mas não seria mal educado no processo, somente frio.

— Zabini! - Ela o saudou e sorriu, sem saber que aquele sorriso desestabilizava o moreno em sua frente, e aos poucos a tristeza o consumia. Ele tinha seus próprios objetivos muito bem traçados, faria o que tivesse que fazer. - Estou bem, obrigada. Não sabia que tínhamos gostos em comum.

— Receio que não tenhamos mesmo. - Ele olhou para o livro como se segurasse um bicho morto há dias, um animal extremamente mal cheiroso. - Peguei o livro errado, queria o de Quadribol.

Para sua sorte, havia um exemplar sobre algumas características do esporte ao lado do local onde ele tirou o anterior.

— Desculpe a confusão, sua cabeça está cheia de zonzóbulos. Também tem martímias da Ásia em alguns lugares da loja, talvez tenham interferido em alguma coisa.

— Martímias da Ásia? Elas só resistem em clima árido, sem contar que costumam se esconder nas patas dos camelos que atravessam o deserto. Não vejo co… - Blás parou de falar, percebendo o que fez. Deixou claro para ela que era um conhecedor de criaturas mágicas exóticas. - Boa, Lovegood.

— Eu posso ter mentido por uma boa causa. - Ela admitiu. - Será que pode me emprestar o livro quando acabar de ler? Claro, se o exemplar que eu encomendar não chegar antes. Na loja só tem esse.

— Por que eu faria isso, se é você quem vai levar?

— Nada disso, Zabini. Você viu e o pegou primeiro, não é justo.

— Eu não costumo ser um cara legal, só aproveite. - O moreno torcia internamente para ela aceitar e acabar logo com aquele suplício. Luna fez metade daquilo.

— Aceito com uma condição… - Ela disse, já se dirigindo para o lugar em que pagaria pelo livro.

— Sou todo ouvidos.

— Tomaremos sorvetes juntos enquanto conversamos. Meu pai costuma dizer que não há nada que não possa ser curado com a quantidade certa de coisa gostosa e gelo. O que me diz?

— Que adoro chocolate com menta.

Uma lembrança, era tudo o que queria. Não podia se negar isso. Que mal faria? Até agora, nenhum. Blásio Zabini não conseguiu mais se separar de Luna, tampouco reprimir seus sentimentos por muito tempo. Tinha medo não só da reação dela se soubesse, como dos amigos da garota.

Seu temor permanecia, mas a vontade de lutar pela garota dos seus sonhos era cada vez maior. Se fosse rejeitado por Luna, nunca mais a incomodaria com alguma bobagem do gênero. Mas precisava tentar, até por que se via cada vez mais envolvido. Foram dias em que só se encontravam para conversar, até que voltaram para Hogwarts. Até mesmo o silêncio parecia os unir, palavras não eram mais necessárias entre eles dois. Mas por Merlin, como eram prazerosas! Como se sentia feliz ao trocar algumas palavras com ela, descobrir e compartilhar as coisas. Novas, antigas… Simplesmente não importava.

O beijo que aconteceu em uma tarde - assim como os olhos dela - azul e ensolarada, marcou o início de algo que Zabini nunca acreditou de fato que se concretizaria. E como aconteceu, então? Afinal, ele sofria como um mártir somente por achar que ela não merecia alguém tão falho. Acabou que o rapaz não teve escolha, pois Luna se encantou por ele também.

Por mais que seu ar sereno fosse muitas vezes confundido com alienação, a garota não era burra. No fim das contas, foi a inteligência que a colocou na casa das gravatas azuis. Perdido em pensamentos, Zabini a encarava ostensivamente. Perceber foi questão de tempo. E quando confirmou suas desconfianças, ela passou a perguntar-se sobre os motivos do garoto. Zabini definitivamente não parecia querer troçar dela, como os outros faziam.

A curiosidade se transformou em interesse com o passar do tempo. Todavia, o moreno que passava tanto tempo apenas a olhando, parecia não se importar o suficiente para se aproximar e puxar assunto. A loira queria tanto saber como seria uma conversa com ele que passou a enxergá-lo como um amigo, embora nunca tenham de fato conversado.

Por isso a garota com ar sonhador não resistiu a tentação de se aproximar quando o avistou sozinho na Floreios e Borrões, aproveitando assim a rara oportunidade. Blás era especial, ela só confirmou o que já sabia. Tinha um jeito um tanto diferente das demais pessoas que convivia, algo tão dele que daria para reconhecer até de olhos fechados. Aquele moreno que aparentava austeridade era na verdade um amigo dedicado, uma excelente companhia.

O encanto transformou-se em paixão tão gradativamente que Luna só percebeu quando seu estado já era irremediável. Não que visse algo de errado em gostar de Zabini. A não ser, é claro, se não fosse correspondida. Mas o que sentia por ele era tão lindo que a garota não teve como evitar o sorriso instantâneo quando o via, as borboletas no estômago, o interesse por qualquer coisa que o sonserino dissesse… A felicidade que sentia simplesmente por se descobrir apaixonada não dependia da aprovação dela para existir, e Luna gostava da beleza extra que o mundo pareceu adquirir depois da chegada de Blásio em sua vida.

Em uma tarde em que conversavam nos jardins, em meio a confissões, risadas e companheirismo, o primeiro beijo aconteceu. Um beijo calmo de descoberta, que depois virou um segundo de reconhecimento… No terceiro já era vício. Blásio tentou se desculpar, mas o sorriso de Luna era tão genuíno que ele enfim entendeu que era correspondido.

Todos os sinônimos para felicidade poderiam ser usados. Perda de tempo, pois falar de amor jamais chegará aos pés de o sentir. Ainda assim, palavras são necessárias para contar histórias… Basta saber que aquele momento para ambos foi mais que especial, e que o sentimento crescia a cada dia.

O receio de Zabini em expor o relacionamento era por temer que Luna mudasse de opinião quanto a ele. Por isso se encontravam escondidos, até que o acaso decidiu jogar contra ele. No dia em que pediu Luna em namoro e decidiram contar a novidade aos amigos, Gina Weasley apareceu e fez um verdadeiro escândalo. Ela esperou que Luna se afastasse no horário do almoço para tirar satisfações com Blás. A discussão foi vista pelo professor Vince Adams, resultando em detenção para ambos. Ele sequer teve tempo de se explicar para a maldita ruiva, pois no castigo Draco e Potter começaram a brigar, e Granger a tocar piano… Uma verdadeira loucura!

Gina aceitou guardar o segredo, mas não seria necessário por muito tempo. Blásio faria como Luna e tentaria não se importar com a opinião dos outros. O memorial foi o estopim para perceber que a vida passa muito rápido por nossos olhos, e que o tempo era precioso demais para ser desperdiçado com covardia. Os apaixonados de casas diferentes estavam agora no jardim para quem quisesse ver. Afinal, amar não era vergonhoso.

De fato a vida surpreende de várias formas, não tinham dúvidas. Especialmente naquele domingo em que o sol dividiu seu esplendor com todos ali, o destino interferiu na vida de outras pessoas naquele castelo. Em meio a um romântico piquenique nos lindos jardins de Hogwarts, Blásio Zabini e Luna Lovegood não tinham como saber disso ainda. O que sabiam era que o mundo era um lugar agradável enquanto estavam nos braços um do outro, a garota recebendo bombons na boca e alguns beijos. Compartilhavam uma caixa de chocolate, o sentimento puro e momentos memoráveis... No fim das contas, a  vida podia ser bela e feliz.

Agradavelmente presos na névoa de felicidade que os envolvia, eles não faziam ideia dos eventos que se sucederiam dali para frente. Tampouco o que já havia acontecido naquele domingo ainda não nomeado com o adjetivo apropriado. O dia cheio de acontecimentos merecia ser relatado com detalhes, por isso é preciso voltar um pouco no tempo. Mais especificamente para a Torre de Astronomia, uma boa quantidade de minutos antes.

Hermione sonhava que estava caindo e por isso acordou sobressaltada. No sonho, despencou de um céu nublado e o solo era algo tão distante que ela até se permitiu gostar da sensação que o vento frio causava em sua pele. Isso até perceber que estava a poucos metros de seu destino e a aflição tomar conta. Ao fechar os olhos no sonho a última coisa que viu foi o céu cinza, e quando os abriu, já acordada, encontrou o olhar castanho claro de Gina voltado em sua direção.

— Que susto! - Ela disse ofegante pela adrenalina. - O que foi?

— O que foi? - A ruiva a imitou. - É sério isso?

— Eu não quero brincar com ninguém a essa hora da manhã, Gina. Não sei do que está falando.

— Manhã? Por Merlin, já é quase meio dia. Você dormiu na Torre de Astronomia, Mione! Acha isso normal?

— Como é? - Ainda bêbada de sono, a garota se levantou bruscamente e sentiu uma forte tontura. Ao se apoiar no colchão para recuperar o equilíbrio, se deu conta que não lembrava como ele foi parar ali. Nem o que estava fazendo fora de seu dormitório, para falar a verdade. A angústia em seu peito passava enquanto flashes da noite anterior voltavam aos poucos. Antes que pudesse se lembrar todos os detalhes do que houve em sua vida para no presente estar ali, Gina começou a falar.

— Eu vou mesmo ter que falar o óbvio? Você sumiu depois do Memorial e nós ficamos preocupados, mas te demos tempo para ficar sozinha e pensar. Afinal, essa era a sua vontade. O que houve afetou a todos, desculpe por brigar com você agora. Eu fiquei tão aflita ao não te ver quando acordei.

— Sinto muito por isso. Eu precisava respirar um pouco.

— Todos nós. O que George falou foi tão lindo e tocante que não consegui mais manter a pose inabalável, aquilo acabou comigo. Foi como ter Fred novamente conosco, Mione. E droga, eu não aguento mais sentir tanta saudade do meu irmão. Acontece que aguentando ou não, eu não vou parar de sentir isso, já que ele não vai voltar.

Hermione abraçou a amiga. Gina Weasley era forte, e não demonstrava suas fraquezas assim. Se é que se pode considerar sentir falta de alguém como fraqueza. Mas Hermione ficou feliz que ela finalmente tenha feito isso. A morte de Fred afetou a todos, não seria diferente com a irmã que ele tanto amava.

— Fred ficaria orgulhoso de você, sabe... Não só por ter se mantido forte para toda a família, mas pela pessoa que a irmã favorita dele se tornou. Saudade é inevitável, Gina, mas você sempre terá a nós. E me perdoe por sumir quando você mais precisava, eu sinto muito. Prometo que não vai se repetir, está bem?

— Oh, cale a boca. Você tem todo o direito de sumir de vez em quando... - Ela disse tentando se recompor.

— Acho que concordamos em discordar quanto a isso. Me conte mais do seu dia. - A morena pediu.

— Eu não estava bem, Harry também não, e nós ficamos conversando até tarde na Casa dos Gritos. Eu estava tão exausta que nem reparei ser a única no dormitório, só caí na cama e dormi. Quando levantei pensei que você já tivesse saído, então imagine minha surpresa ao saber que ninguém tinha te visto desde a tarde de ontem. Te procurei em vários lugares até encontrá-la aqui. Mal cheguei e você acordou.

— Céus, Gina. Isso é tão…

— Confuso. Sentimentos são, Mione. Por isso a sabe-tudo estava aqui?

— Eu não sou só um cérebro, sabe?

— É claro que sei. Mas você poderia ter ido para um lugar mais confortável, já que não queria ver a minha cara. - Sorrindo, Gina enfim expôs sua curiosidade. - Por que ficou aqui?

A compreensão de Hermione sobre o que aconteceu no dia anterior foi voltando enquanto a amiga falava, mas ainda estava com uma sensação estranha por causa das recordações que voltavam aos poucos. Seria assim estar de ressaca? Sabia que não se sentia bem com tanta saudade das pessoas que morreram e coisas pelas quais todos foram submetidos. Luna foi sequestrada, Gina correu muito risco duelando com Bellatrix Lestrange, ela própria foi torturada pela bruxa… Passaria a tarde toda relembrando os horrores da guerra, se fosse listar todos os acontecimentos. A reunião em Hogwarts em lembrança aos que se foram só evidenciou a dor e pesar que ela sentia diariamente e que alguns obtinham mais êxito em tentar esconder.

Hermione olhou para a ruiva, pela primeira vez cogitando contar seu maior segredo a alguém de livre e espontânea vontade. Harry era o único que sabia sobre seus sentimentos por Draco Malfoy, e ainda assim, descobriu por acidente. Mas ela não aguentava mais guardar o segredo e o próprio sentimento.

Lembrava-se bem, Draco esteve lá com ela a noite toda, sua companhia era consoladora. Em meio a pequenas provocações e confissões, acabaram se entendendo, de certa forma. Quando foi sozinha para a Torre de Astronomia, Hermione não sabia que ficaria lá por tanto tempo. Não que tivesse uma ideia de quanto tempo passaria até se sentir bem o suficiente para encontrar os outros, longe disso.

Ela só se despediu dos pais, um abraço forte em cada um e palavras de carinho entre os três. Vagou pelo castelo sem perceber para onde ia, os pés a levando para os lugares sem que seus sentidos registrassem as pessoas que cruzavam seu caminho ou os corredores por onde passava. Talvez por instinto tenha ido parar ali, um lugar reservado em que podia observar o céu. E então, como um sonho bom, sua constelação apareceu. Gina a olhava esperando uma resposta, que acabou sendo um singelo sorriso de Hermione acompanhado de uma simples frase.

— Eu queria ver o céu.

— Eu deveria ter imaginado.

Elas arrumaram o lugar, e após tomar um banho e comer, Hermione foi para seu refúgio. Mesmo com a biblioteca deserta, sentou-se na mesa mais afastada e tentou se concentrar. O livro aberto em sua frente não a prendia, já que seus pensamentos estavam em Draco. Lembrando de quando o garoto esteve em sua casa ao fugirem do orfanato, no jogo misto de Quadribol e até na noite anterior, a grifinória não podia acreditar como aquele podia ser o mesmo garoto que sempre implicou com ela.

O carinho que seu inimigo de infância demonstrou em uma noite ia contra o que ele fez em todos os anos em que se conheciam, sequer parecia a mesma pessoa. Hermione tinha certeza, sempre guardaria aqueles momentos como seu tesouro particular. O fato de terem virado a noite falando sobre qualquer coisa, o cheiro dele que tomou seu corpo e alma, o beijo no final… O beijo que ela tinha certeza, só aconteceria em sua imaginação. Hermione nunca ficou tão feliz em estar errada.

Conter o sorriso foi impossível quando a bruxa lembrou de Draco lhe dando “boa noite” no amanhecer, acompanhado de um beijo na testa. Agora mais do que nunca, ela via isso como um sinal de carinho e proteção. Draco Malfoy havia modificado para sempre a forma como ela interpretaria um beijo na testa dali para frente, conferindo um significado especial para o simples gesto. Depois se enfureceria com ele, a felicidade exigia cada vez mais espaço dentro da garota mais inteligente da geração.

E essa mesma garota não tinha a noção do tempo que ficou perdida em pensamentos. Lembrava de Draco, do sorriso dele, dos olhos tempestuosos… Em sua imaginação, revivia repetidamente o tão sonhado beijo. Isso até lembrar do memorial que ocorreu um dia antes. “Céus… As pessoas devem estar arrasadas. E eu aqui, feliz por ter beijado alguém!”, ela repreendeu-se em pensamento. Sim, Hermione Granger se sentia culpada por estar feliz depois de tudo o que houve. Horrorizou-se por esquecer tão facilmente a dor dos outros, tudo o que precisou para isso foi de Draco.

Enquanto isso, seus amigos deveriam estar sofrendo e precisando dela, enquanto a garota simplesmente havia sumido. Se a própria Gina não estava bem, quem dirá os outros? O sorriso que exibia outrora desapareceu, sendo substituído por uma expressão mortificada. Com o cenho franzido e sem prestar a menor atenção no livro, sentimentos contraditórios a consumiam.

Por isso mesmo só notou o garoto que entrou na biblioteca quando ele já estava perto demais, tamborilando os dedos na mesa e com cara de quem iria aprontar. Antes que pudesse perguntar a Max o que ele estava fazendo, o lufano começou a rodeá-la e cantar.

A dor ligou pro riso pra

ver quem valia um pouco mais

e a dor zombou do riso por

nunca fazer ninguém chorar

E o riso gargalhou

da dor que se esqueceu

dá pra chorar de rir

quaquaraquaquaquá

Não tinha como resistir aos sorrisos contagiantes do garoto da casa amarela, Hermione sabia disso. Não foi diferente aquela vez, em que ele a alegrou instantaneamente. O bruxo tinha o dom de levar a felicidade consigo aonde fosse, espalhando da forma mais natural.

— Gosto do jeito que você fala dos sentimentos, Max. - Sorrindo, ela fechou o livro e o pôs de lado. O lufano sentou na cadeira oposta e a encarou.

— Que jeito é esse? - Perguntou, passando a mão por entre os cabelos.

— Como se eles fossem reais, sabe? - Diante da sobrancelha arqueada do garoto, ela se explicou. - Quero dizer, como se eles fossem pessoas de verdade.

— Quem sabe não são? Afinal, tudo tem um nome. A sua cara quando eu cheguei se chamava “tristeza”. O que aconteceu?

— Nada demais, não precisa se preocupar.

— Sabe, eu nunca tive um amigo de verdade. Aquilo de contar os segredos, responder sinceramente quando alguém pergunta se estou bem, coisas do tipo… Essas costumavam ser só histórias para mim, não era algo que acontecia comigo. Até recentemente. O que estou dizendo é que te considero minha melhor amiga agora, portanto não me preocupar está fora de questão.  

Com um sorriso grato no rosto, a morena segurou ternamente a mão do rapaz antes de acariciá-la.

— Eu gosto muito de você, Max, e não pode imaginar o quanto sua amizade significa para mim… Mas dizer que nunca teve amigos me parece uma das suas histórias malucas. Não é possível que ninguém tenha visto antes o quão incrível você é.

— O que posso dizer? Tive vários colegas ao longo da vida, mas não passou disso. Já esteve cercada de pessoas e ainda assim se sentiu sozinha? - A bruxa confirmou com a cabeça. - Esse fui eu por muito tempo. Minha tia foi a última pessoa que me restou, e eu já havia aceitado que as coisas não mudariam... Mas esqueça, meu papel deveria ser te animar. O que estou tentando dizer é que sou grato. Tanto pela sua amizade quanto por ter me apresentado aos seus amigos. Luna, principalmente.

A última frase foi dita em um sussurro, enquanto Max olhava ao redor para conferir se estavam sozinhos. Hermione riu, era sua reação natural perto dele. Max ficava ainda mais meigo quando falava de Luna, era nítido que a garota mexia com ele. E a grifinória tentou ajudá-lo nesse assunto.

— Não precisa agradecer, você nos faz bem. Mas quanto a Luna, o que fará?

— Isso só o tempo dirá.

Hermione aceitou aquela resposta por ora. Apesar do apelido merecido de “sabe-tudo”, tinha a consciência que assuntos do coração podiam demorar para ser compreendidos. Finalmente aceitou que não precisava ter todas as respostas, e mais importante que elas, era a sensação arrebatadora de felicidade daqueles que amam. Decidida a facilitar o objetivo do amigo, que consistia em animá-la, Hermione mudou de assunto.

— Max, quando chegou aqui você disse que minha expressão era de tristeza. Ainda é?

— Deixe-me ver. - Ele ajeitou os óculos no rosto para dar mais ênfase às palavras. - Sua expressão agora se chama “Estou bem e ficarei melhor, mas para isso preciso da luz solar e de um ótimo amigo para me fazer companhia”.

— Jura? - A morena perguntou, entrando na brincadeira.

— Eu juro. - Ele levou a mão teatralmente até o peito e tentou não rir muito abertamente.

— Não posso resistir a tanta sinceridade, senhor Maximilian. Vamos.

Hermione foi até a prateleira em que pegou o livro e o devolveu ao lugar em que estava antes. Riu mais uma vez quando o amigo se afastou resmungando.

— Você não me suporta de forma alguma, é impressionante. - Max fingia estar indignado por ela não chamá-lo pelo apelido.

— O quê? Eu disse Maximilian, e não Owens. Os dois nomes são bonitos. O senhor não me chama de Mione, não sei do que está reclamando. - Teve que aumentar sua voz para ser ouvida, pois o lufano se distanciava cada vez mais. - E não adianta ir na frente, Maximilian, daqui dá para ver que você está sorrindo!

— Eu? - Ele se virou, a careta entregava seu esforço em tentar manter-se sério. - Jamais!

Continuou a andar com uma certa vantagem de Hermione, como se a guiasse. Devido ao problema que tinha na perna, Max mancava um pouco e seu ritmo não estava tão cadenciado como de costume. Talvez por isso ela tenha demorado para perceber que algo estava errado. O lufano parou de chofre, tentou se segurar na parede atrás dele e abaixou a cabeça. Prestes a cair no chão, chamou o nome de Hermione como uma prece.

— MAX! - Ela correu até ele, que caído no chão se contorcia de dor. - O que aconteceu?

— Me ajude.

— O que está sentindo? - Ele só fechou os olhos e se encolheu. - Max, você está me assustando! Se isso for uma brincadeira… Eu não vou arriscar, vamos para a Ala Hospitalar agora mesmo.

Em seu desespero, ela não sabia o que fazer além de segurar a cabeça dele e tentar impedi-lo de se engasgar com a saliva em excesso. Entretanto, a resposta veio em forma de cervo. Mais especificamente o Patrono de Harry, que dizia com apreensão palpável na voz.

Mione, socorro. Malfoy foi envenenado!

 


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam? Até a próxima semana, meus lindos!