O resgate do tigre escrita por Anaruaa


Capítulo 12
Capangas - Kishan




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No dia seguinte, fui até a casa de Kelsey para o café da manhã. Aparentemente, Ren passava todo o tempo por lá.

No meio de uma conversa, Ren anunciou que treinaríamos Wushu. Fiquei muito animado com a ideia. Nós alugamos um estúdio, onde passamos a treinar. Ren e eu éramos bem treinados e poderíamos nos defender caso necessário, mas achávamos importante que Kelsey aprendesse a lutar. 

Começamos a instruí-la, a partir das técnicas de incapacitação de oponente e movimentos de defesa. Ren começou a demonstrar as técnicas em mim. 

— Lição número um. Se seu atacante estiver correndo em sua direção, flexione os joelhos e espere até ele se aproximar. Então agarre-o pelo braço, gire ao redor dele e trave os braços em seu pescoço. Se o sujeito for grande, atinja-o no pescoço, sob a mandíbula.

Após demonstrarmos, foi a vez dela repetir o movimento. Ela derrubou Ren e o beijou no rosto. Aquilo me incomodou um pouco.

— Ótimo. Lição número dois. Se o atacante tem mais habilidade nas artes marciais que você, não lute com ele. Tente apenas incapacitá-lo. Mire o estômago ou a virilha e soque ou chute o mais forte que puder.

Começamos a demonstração simulando uma luta real. Eu atacava Ren, que recuava para sair do meu alcance. Então ele encontrou uma abertura e me socou com força no estômago, me derrubando. Eu me levantei rapidamente e voltei a atacar, desta vez com mais empenho, derrubando Ren no chão. Ele desferiu um soco para o alto, parando a poucos centímetros do meu rosto.

— Se tiver que escolher um ou outro, escolha a virilha. É muito mais eficaz. Lição número três. Procure os pontos principais: olhos, pomo de adão, ouvidos, têmporas e nariz. No caso dos olhos, ataque com dois dedos, assim. Nas orelhas, use ambas as mãos e dê um telefone, isto é, acerte ambos os ouvidos ao mesmo tempo, o mais forte que puder. Nos outros pontos, aplique um golpe forte, com a mão espalmada — Ren explicava enquanto demonstrava cada golpe em mim.

Ren começou a treinar com Kelsey, mas tanto ela quanto ele temiam usar a força. Daquela forma, o treino seria inútil. Empurrei Ren para o lado e tomei seu lugar.

— Desse jeito, ela nunca vai aprender. Ela precisa de um ataque de verdade.

— Não, você é bruto demais. Vai machucá-la.

— O que você acha que eles vão fazer com ela?

Kelsey tocou o braço de Ren, dizendo:

— Ele tem razão. Está tudo bem. Deixe Kishan tentar.

Ren concordou relutante e ficou encostado à parede. Kelsey ficou de costas para mim e eu a ataquei, agarrando seu braço e girando-a para que ela ficasse de frente para mim, então agarrei seu pescoço, estrangulando-a. Ela não conseguia reagir. Ouvi o rugido de Ren e senti o meu corpo se deslocar em seguida. Ren me lançou contra a parede.

— Eu falei! — ele gritou — Você é bruto demais! Ela vai ficar com hematomas no pescoço!

— É necessário ser bruto para ser realista. Ela precisa estar pronta.

— Ren, eu estou bem. Deixe-o tentar outra vez. Tenho que me preparar para que possa pensar com clareza durante um ataque. Você pode precisar de mim para salvá-lo um dia.

Ele ficou lá, acariciando seu pescoço, até que concordou. Eu corri até o fundo da sala e avisei:

— Não pense. Apenas reaja.

Eu me aproximei em silêncio. Kelsey não conseguiu perceber minha aproximação, até que eu agarrei seu pescoço e a arrastei. Ela tentou se debater, pisou no meu pé, mas não me atacou de forma eficaz, não conseguindo cessar meu ataque.

De repente, Kelsey bateu a cabeça no meu queixo. Doeu o suficiente para que eu a segurasse com menos força. Ela se aproveitou e se soltou do meu braço abaixando-se. Sem que eu esperasse, ela acertou minha virilha com o ombro e me socou com força no estômago. Eu caí no chão enquanto Ren ria alto.

— Você pediu! Não pense. Apenas reaja. Pena que eu não tinha uma câmera!

Ren foi até Kelsey, que estava trêmula e cansada.

— Kishan vai ficar bem?

— Ele vai se recuperar. Só precisa de um minuto.

Eu me levantei e a elogiei pelo ataque. Ela estava muito cansada e nos pediu para terminamos o treino.

Ren a examinou, depois a carregou até o carro.

Durante a viagem para casa, percebi que Kelsey não estava se sentindo bem e quase me arrependi por tê-la atacado, mas ela precisava aprender. Eu sabia o quanto Lokesh podia ser cruel, e se ele encontrasse Kelsey, era importante que ela soubesse se defender.

Chegamos em casa e Ren colocou Kelsey sobre o sofá. Eu olhei para ela preocupado. Ren se levantou e me deu um soco no estômago. Depois saiu para a cozinha sem dizer nada. Pedi desculpas a Kelsey e fui para casa.

Nas semanas seguintes nós continuamos com os treinamentos e intensificamos nossa vigília, alternando as rondas entre Ren e eu. Por precaução, deixamos a minha caminhonete pronta para uma fuga de emergência. Colocamos mochilas com roupas e outros objetos pessoais, além de dinheiro e estacionamos a caminhonete mais distante de casa, camuflada com galhos. Kelsey e Ren enviaram alguns itens mais importantes em uma caixa para a Índia.

Nós estávamos vigilantes. Ren passava quase o tempo todo na casa de Kelsey, e eu também passei a ficar lá na maior parte do tempo. Kelsey cozinhava, nós assistíamos a filmes e enquanto os dois ficavam agarrados um ao outro no sofá, eu me contentava a comer baldes de pipoca. Ren sempre brigava comigo por ter comido tudo, mas eu ficaria feliz em trocar de lugar com ele.

Eu estava me acostumando com o namoro de Ren e Kelsey. Ainda sentia um pouco de ciúmes e ainda desejava tê-la, mas estava conformado de que Kelsey pertencia a Ren.

Um sábado, Kelsey propôs um passeio à Tillamook e à praia. Ela disse que a previsão era de que aquele seria um dia quente e ensolarado. Eu duvidei muito, porque o Oregon era sempre frio, comparando com a Índia. Ren também não se animou, mas Kelsey lhe ofereceu sorvete de chocolate com manteiga de amendoim e então ele aceitou na hora.

Separamos biscoitos, chocolate e marshmallows para o lanche e colocamos uma muda de roupa na traseira do Hummer. Nos transformamos em tigre e pulamos para o banco de trás. No caminho, Kelsey abriu as janelas do carro para que sentíssemos o cheiro do mar.

Entramos em uma loja onde vendiam queijos e sorvetes. Ren segurou a mão de Kelsey e fomos até o balcão. Eu pedi um sorvete de casquinha e três bolas com os sabores cheesecake de mirtilo, laranja com chocolate e root beer.

— Uma combinação interessante, Kishan— comentou Kelsey

Eu sorri e fui me sentar para saborear o sorvete, enquanto Ren e Kelsey escolhiam os deles.Terminamos de tomá-los e voltamos à estrada. 

Quando chegamos, a praia estava deserta. Nós três éramos os únicos no local. Ren estendeu uma manta no chão e acendeu uma fogueira. Nós  nos sentamos, observando a paisagem que era realmente bela.

Nós comemos e conversamos despreocupadamente por um bom tempo. A tarde estava muito agradável. pesar de ainda sentir um pouco de ciúmes do relacionamento de Ren e Kelsey, eu estava feliz. Fazia muitos anos que Ren e eu havíamos rompido nossas relações, mas antes de Yesubai, nós éramos amigos. Eu sentia que, apesar das implicâncias de Ren, nós estávamos recuperando nossa relação. Além disso, ele e Kelsey combinavam e se faziam felizes, então estava tudo certo.

Nós ficamos em silêncio por um tempo, contemplando o mar. Ren levantou-se e puxou Kelsey pelas mãos. Os dois foram caminhar pela areia enquanto eu fiquei sozinho. Eles caminhavam de mãos dadas, pisando na água. Então Kelsey sorrindo soltou a mão de Ren e começou a correr. Ren correu atrás dela e quando a pegou, a jogou sobre os ombros e caminhou de volta com ela. Por alguns instantes eu imaginei aquela mesma cena comigo no lugar de Ren.

Ren estava muito animado e me propôs uma corrida.

— Vamos lá, Kishan. O primeiro a voltar ganha.

— Ganha o quê?

— Que tal um sanduíche de biscoito com marshmallow e chocolate?— Kelsey propôs.

Eu sacudi a cabeça, propondo um prêmio que me parecia bem mais interessante:

— Que tal um beijo de Kelsey?

O rosto de Ren tornou-se sombrio. Kelsey interferiu imediatamente:

— Ah, Kishan. Acho que essa não é uma ideia muito boa.

— É sim, Kelsey. Vai servir como motivação para ele se esforçar. A menos que ele ache que vai perder.

— No seu melhor dia você nem sequer veria minha cauda.

— Muito bem. Vamos lá.

— Rapazes, eu não acho...

Começamos a correr. Eu estive à frente de Ren, até chegarmos às pedras, mas Ren fez uma virada melhor que a minha e passou à frente. Eu estava muito motivado. Talvez aquela fosse a minha única oportunidade de beijar Kelsey. Eu faria qualquer coisa para ganhar. Por isso, agarrei o capuz da blusa de Ren, puxando-o para trás. Ren girou e caiu, porém  levantou-se rapidamente e avançou, correndo com fúria.

Eu ganhei dele, que ficou furioso. Eu ri cutucando-o para que saísse da frente e fui reivindicar meu prêmio. Parei à frente de Kelsey, que ficou nas pontas dos pés e me beijou no rosto. Ren se acalmou e pegou uma pedra, dizendo enquanto a lançava no mar:

— Você só ganhou porque roubou — resmungou.

— Ganhei porque sei como ganhar. Roubar é irrelevante. Você precisa aprender a fazer o que for necessário para ganhar. Por falar nisso, esse não era o prêmio que eu tinha em mente.

Eu segurei Kelsey pelo cotovelo e a girei de frente para mim. Segurei suas costas e a inclinei para um beijo teatral. Eu queria muito um beijo dela, mas me controlei para não passar dos limites. Ren ficou muito irritado, e falou ameaçador:

— Solte-a. Agora.

Eu sabia que meu irmão ficaria agressivo. Soltei Kelsey e Ren partiu para a briga. Eu quase não revidei, apenas me defendendo. Nós lutamos até que Ren se acalmasse, então voltamos para a manta e comemos biscoitos com marshmallow e chocolate.

Eu tentei me concentrar na comida, a fim de não prestar atenção na troca de carinhos entre meu irmão e Kelsey, mas era difícil não reparar.

Então, o celular de Kelsey tocou e ela não demorou a atender. Ren e eu ficamos ouvindo a conversa.

— Oi, Jason. Tudo bom?

— Achei que você ia gostar de saber que uns caras estranhos apareceram o campus ontem perguntando por você. Disseram que representam um escritório de advocacia e que têm novidades sobre o testamento dos seus pais.

— Ah. E como eram eles?

— Eram altos e vestiam uns ternos caros. Pareciam falar a verdade, mas eu não disse nada a eles. Achei melhor consultar você primeiro.

— Muito obrigada por me avisar, Jason. Você fez bem em não dizer nada a eles.

— Você está com algum problema, Kelsey? Está tudo bem?

— Tudo bem. Não se preocupe.

— Beleza. Até mais.

Nós ficamos apreensivos. Aqueles provavelmente eram homens de Lokesh e eles tinham chegado à Kelsey.

Liguei para Kadam que nos orientou a voltarmos imediatamente para a Índia. Começamos a juntar as coisas e fomos logo para a casa.

Ren e eu dissemos à Kelsey que se Jason não tinha dito nada aos homens, era improvável que eles já houvessem encontrado nossa casa. Resolvemos ir até lá, acertar umas últimas coisas antes de deixar o Oregon. Kelsey ligou para os pais para avisá-los que deixaríamos o País.

— O Sr. Kadam fez uma descoberta importante e precisa da minha ajuda. Ren irá comigo. Ligo assim que o avião pousar.

Kadam havia providenciado uma viagem para a família de Kelsey, a fim de que eles ficassem seguros, e Ren garantiu a ela que eles ficariam bem. Estávamos tensos.

Nós paramos o carro na garagem de casa e pedimos para que Kelsey ficasse ali enquanto inspecionávamos a casa. Percebemos que alguém tinha estado lá.

Nos vestimos com botas e roupas escuras. Ren desceu para buscar Kelsey enquanto eu vigiava a porta. ela se trocou e seguimos pela estrada em direção à minha picape. Ren e eu havíamos nos munido de armas da caixa de Wushu. O bastão tripartido tinha sido dobrado e estava preso no meu cinto nas costas e Ren havia enfiado um par de facas no passador do cinto. Eu seguia a frente, farejando o ar e examinando o solo, seguido por Ren e Kelsey.

Após alguns minutos caminhando pela mata, percebi que havia alguém em meio às árvores, movendo-se em silêncio, seguindo nosso rastro. Acenei para os outros indicando-os que se abaixassem.

— Precisamos sair daqui — murmurei. — Quando eu disser — Alguns segundos de tensão transcorreram. — Agora — sussurrei.

Começamos a correr floresta adentro, até que chegamos a uma clareira.

— Emboscada!

Demos meia-volta, O homem que nos seguia nos alcançou e bloqueou nossa passagem. Corri em sua direção, diminuindo rapidamente a distância. Quando estava a poucos metros, puxei o bastão e o brandi acima da cabeça, para ganhar impulso, acertando as pernas do homem e derrubando-o, e então, dando um salto girei a arma e a acertei nas costas e na cabeça do homem caído. Com um movimento rápido do pulso, a arma dobrou-se, acomodando-se em minha palma.

Nós continuamos correndo pelo bosque, mas havia outros homens nos emboscando. Muitos homens. Nós precisávamos proteger Kelsey, mas por mais que os derrubássemos, os homens de Lokesh não paravam de surgir.

Nós lutávamos e corríamos. Ren passou a carregar Kelsey nos ombros, pois ela não conseguia mais nos acompanhar. Os homens começaram a lançar algo que estava acertando as árvores.

— Eles estão atirando na gente?— Perguntou Kelsey.

— Não. Pelo menos não com armas de fogo. O ruído é diferente.

Ficamos ali em silêncio. Esperando.  Ren e eu nos comunicávamos com gestos. Eu passei o bastão para Ren e me transformei em tigre, entrando na mata para atrair os homens. Alguns me seguiram, mas eu percebi que havia mais deles, então voltei para avisar aos outros.

— Eles estão por toda parte. Levei-os o mais longe que pude, mas parece que todo um regimento foi mandado em nosso encalço.

Nós continuávamos a ser atacados e alguns homens pegaram Kelsey. Eu estava na forma de tigre e rugi com agressividade. Fui atacado com uma arma de choque, mas estava com tanto ódio que mal senti. Derrubei a arma e a quebrei ao meio com minha pata. Ataquei o homem caído no chão e o matei.

Ren também atacava os homens com ferocidade. Eu podia ouvir seus rugidos. Mas os ataques não cessavam. Eles eram muitos.

Outros homens chegaram. Aparentemente tinham chamado reforços e os recém-chegados portavam mais armas. Um deles sacou uma delas e disparou contra Ren. Um dardo atingiu-o no pescoço e ele cambaleou.

Kelsey conseguiu dar uma cabeçada no nariz do homem que a segurava e se soltou, correndo até Ren, que tinha sido atingido por outro dado. Eu tentava chegar até eles, mas não conseguia me livrar dos meus agressores. Eu senti uma fincada na perna e percebi que tinha sido atingido por um dardo.

Eu sabia que Ren estava sendo atingido por dardos tranquilizantes e logo não conseguiria mais lutar. Kelsey estava com ele e eu tinha que protegê-los. Olhei rapidamente e vi que Ren estava de joelhos na forma humana, sendo amparado por Kelsey. Então algo inexplicável e surpreendente aconteceu. 

Kelsey se colocou à frente de Ren, encarando os homens que se aproximavam. Sua mão começou a reluzir, e de repente, uma raio saiu dela e atingiu o homem, elevando-o no ar e lançando-o contra uma árvore com força suficiente para sacudi-la. O homem caiu curvado em sua base.

Ela continuou atingindo os agressores, um após o outro, até que foi atingida por um dos dardos. Ela caiu no chão. Os homens foram em sua direção, mas Ren ainda conseguiu derrubá-los, usando suas últimas forças.

Eu consegui me aproximar de meu irmão para tentar ajudá-los, mas muitos homens ainda vinham em nossa direção.

— Kishan! Pegue-a!

Eu peguei Kelsey em meus braços e Ren me pediu para levá-la. 

— Vá! Agora! — gritou Ren.

Eu não queria deixar meu irmão, mas eu precisava salvar Kelsey. Era o que Ren queria. Era o que eu queria.

— Ren! Não! —Implorou Kelsey antes de desmaiar.


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