Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 11
Capítulo 10 – Quando Menos se Espera


Notas iniciais do capítulo

Oi, gente! Estou de volta com mais um capítulo. Espero muito que gostem ;)
E, não posso deixar de agradecer a Kitai Malfoy, por ter recomendado essa história e também uma outra já finalizada. A Leilinha e Vi Reed pela recomendação aqui em Um Caminho Para o Coração. Obrigada meninas, vocês foram mais que demais.



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Mais uma vez, Emmett jantou sozinho. Olívia já estava na cama quando chegou, apesar de ainda ser cedo. A Sra. Smith nunca ficava muito tempo depois que ele chegava do trabalho, e ele nunca se queixou, gostava de ficar sozinho. Era em momentos assim que sentia Sarah de volta em sua vida. Ainda que gostasse de viver no passado, precisava entender que não lhe fazia bem.

Estava se preparando para sentar no sofá, tomar uma cerveja e fumar um cigarro, enquanto assistia à tevê, quando a campainha tocou.

Achou estranho que alguém estivesse a sua porta, porque não costumava receber visitavas, a não ser a senhora que ficava com Olívia depois da escola, e essa havia saído não tinha muito tempo.

Deixou a lata de cerveja na mesinha de centro, e foi até lá abrir a porta.

Para sua surpresa, não era ninguém de quem se lembrasse. A mulher a sua porta se vestia bem e era dona de uma beleza marcante. Havia uma pinta logo acima de seus lábios, sexy como armadilha do diabo, difícil de ser ignorada. Os cabelos louros, brilhando feito fio de ouro sob a luz da varanda.

— Quem é você? — ele exigiu. A postura séria, o olhar sombrio. Ele não a conhecia e também não a queria ali, não importava quanto bonita fosse. Seja lá o que tenha em mente, achou que estava perdendo tempo batendo em sua porta.

Rosalie estava estendendo a mão para cumprimentá-lo, quando lembrou que ele ignorou seu gesto na primeira vez que se viram. Decidida não repetir a cena, abaixou a mão.

— Me chamo Rosalie Hale. Estou temporariamente trabalhando na escola em que sua filha estuda. Nos conhecemos...

— Ninguém na escola me avisou que receberia uma visita, ainda mais há essa hora. O que Olívia aprontou dessa vez?

Rosalie ficou incomodada com o modo como se referiu a própria filha. Imaginou como conseguia.

— Ninguém na escola me enviou aqui. E Olívia não aprontou nada. Ela foi vítima de uma situação desagradável que ocorreu no outro dia. Nada, além disso.

— Sendo assim, você não tem nada o que fazer aqui. — Ele estava fechando a porta quando ouviu Rosalie levantar o tom de voz, acusando.

— Eu sei que você a machucou. Vi as marcas que deixou nela. Sua sorte é não ter sido outro funcionário da escola a ter visto, porque há essa hora já teriam entrado em contato com os órgãos de proteção a criança.

Emmett mal pôde acreditar no que acabou de ouvir. A porta foi puxada para trás num ato de fúria. O olhar que lançou a ela, fez com que recuasse alguns passos na varanda.

— Você é louca? — bradou. — Percebe o que está dizendo?

Mesmo acuada, ela o enfrentou.

— Não adianta negar. Vi as marcas nos braços dela. Você nem mesmo cuida dela como deveria.

— Você não sabe o que está falando.

— Eu sou a pessoa que cuidou de sua filha ontem, depois do ocorrido em sala de aula. Vi quando chegou à escola para buscá-la. O modo como a tratou.

— Como eu a tratei? — Ele desafiou, dando um passo na direção dela. Rosalie recusou novamente.

— Frio e distante — acusou. — Olívia não queria vir com você, ela se agarrou a mim, implorando em meu ouvido que não a deixasse. Aí hoje, o que aconteceu, ela apareceu na escola com os braços encobertos de marcas escuras. Novamente, lhe digo que teve sorte, o agasalho impediu que outras pessoas vissem.

— Eu já disse que não a machuquei.

— Se voltar bater nela...

Emmett saiu completamente para a varanda.

— Vai fazer o quê? — questionou, o olhar firme, sustentando o dela.

— Irei denunciá-lo. É isso que irei fazer.

— Você acha mesmo que um lar temporário, com pessoas que ela nunca viu na vida a fará menos infeliz?

— Você percebe como fala? — Rosalie mal conseguia acreditar no que estava ouvindo. — Ela é sua filha. É uma criança. Uma criança adorável.

— E você percebe que está se metendo onde não foi chamada? Nem mesmo nos conhecesse.

— Tem razão, eu não o conheço. Mas vejo sua filha triste e solitária cada vez que nos encontramos fora ou dentro do prédio da escola. Desculpe-me se não consigo ser indiferente.

— A mãe dela morreu.

— E o que você tem feito para tornar isso menos doloroso para ela?

Emmett ergueu o braço na direção do jardim.

— Vá embora! E não volte mais aqui. — Ele voltou para dentro de casa. Estava prestes a fechar a porta quando a ouviu perguntar.

— Há quanto tempo?

— Seis anos.

A resposta trouxe a verdade dolorosa. Não, pensou Rosalie. Seis anos era a idade de Olívia, então... Ela moveu a cabeça, não querendo deixar entrar a informação. Era triste demais.

— Olívia perdeu a mãe ao nascer? Ela jamais pôde conhecer o amor e os cuidado de uma mãe. — Rosalie desejou como nunca poder entrar naquela casa, pegar Olívia no colo e enchê-la de carinho e cuidados. E, de alguma forma, provar para ela que, sim, podia ser feliz. No fundo, sabia que Olívia não sofria somente com a ausência materna, mas também com a indiferença do pai.

— Vá embora! — ele voltou exigir. Em seguida, fechou a porta na cara dela.

— Por que faz isso com ela? — Rosalie gritou, do outro lado da porta.

O tom acalorado da conversa tirou Olívia da cama. Quando Emmett notou, a menina descia a escada correndo, vindo em sua direção.

— Papai? — parecia assustada, mas também curiosa. — Quem está aí? — Ela olhou do pai para a porta, que agora estava fechada, imaginando quem poderia ser.

— Não é ninguém.

— Eu sou alguém. E meu nome e Rosalie.

Os olhos de Olívia se arregalaram e a pergunta lhe escapou da boca num instante.

— Rose? Rose! É você mesma?

— Sim, sou eu, querida. Você está bem?

Olívia olhou para o pai.

— Por que não a deixa entrar? Ela é minha amiga, papai.

Emmett passou a mão de forma impaciente nos cabelos e então na barba crescida.

— Você foi dizer a ela que te machuquei?

— Não — Olívia negou. O medo estava de volta em seus olhos. — Não disse nada. Eu não disse nada, papai. Não.

— Para quem mais você disse isso, Olívia? — a voz dele soou alta demais.

— Para ninguém — ela soluçou.

— E por que essa mulher está me acusando de fazer isso?

Sentindo-se culpada, Olívia evitou olhar nos olhos do pai quando respondeu.

— Ela viu nos meus braços. Eu não disse nada, eu juro... Eu juro que não disse.

Emmett avançou em direção a ela. Segurou seus braços, puxando as mangas do pijama para cima, assustando-se com o que viu. O choque o obrigou recuar. Olívia parecia apavorada com o gesto dele.

O reconhecimento chegou aos pensamentos de Emmett; o momento que a puxou da cadeirinha na tentativa de tirá-la do carro o mais rápido possível. A raiva não o permitiu perceber que pusera força demais nos punhos. Ele poderia ter quebrado os braços dela com a mesma facilidade com que se quebra uma vareta.

Ele passou as mãos na cabeça de forma agitada, quase como castigasse a si mesmo com o peso da culpa. Perturbado. Agitado. Então, olhou para a menina. Os olhos dele não pareciam mais tão selvagens quanto antes.

— Sinto muito, Olívia. Eu não queria te machucar assim. Eu não queria Olívia. Eu não queria.

Rosalie bateu na porta e sua voz se elevou novamente.

— Eu vou chamar a polícia.

Emmett não se surpreendeu que ainda estivesse na varanda. Decidido, abriu a porta outra vez.

Rosalie reconheceu a dor nos olhos dele e também nos de Olívia.

— Faça isso — ele pediu, e dessa vez, não de maneira desafiadora. Era verdadeiro, queria ser punido pelo que fez. — Eu realmente não sou a pessoa adequada para cuidar dela. Na verdade, nem mesmo sou adequado para qualquer coisa.

Apesar de não ser um pai afetuoso, Rosalie reconheceu o arrependimento por tê-la machucado. Que ele realmente não tinha noção, antes de ela mencionar, que tinha machucado Olívia daquela maneira. Infelizmente, parecia se importar menos com os ferimentos da alma. Esse também era motivo para um provável afastamento dos dois.

Rosalie passou as mãos sobre os bolsos do agasalho, lembrando-se tarde demais que não usava o celular desde que chegou a cidade.

Olívia correu para o lado de fora, agarrando-se a ela, implorando:

— Não, Rose, por favor... — Um soluço lhe escapou, e não demorou o rosto estava encoberto de lágrimas. — Não chame a polícia. Eles vão me levar para longe. Para um lugar diferente. Eu quero não ir.

Rosalie tentou acalmar a menina, passando os braços em volta dela, oferecendo um pouco de carinho.

— Ele não... — Olívia tornou a soluçar. — Ele não queria fazer os dodóis. Ele não bate em mim.

— Mas ele não cuida de você direito, minha princesa.

— Eu não quero ir... Não quero...

— Está tudo bem, querida — Rosalie murmurou, acariciando as costas dela. Olhou para Emmett, que permanecia junto à porta. — Só não vou seguir com isso, nesse momento, por causa dela. Porque, apesar de tudo, Olívia te ama. Separá-los, não vai fazê-la feliz. Assim como não fará você feliz também. Você alguma vez pensou em buscar ajuda? Faça isso por ela, e por você mesmo. Vou correr o risco de dar a você a chance de cuidar e amar essa criança cada dia um pouco mais. Mas, se você não começar a mudar, não demora a escola irá perceber. E eu já não poderei ajudá-los.

— Você realmente deveria fazer isso agora...

Rosalie olhou no fundo dos olhos dele, era de um azul aquoso. Ao mesmo tempo, sombrio em sua dor, em seu desespero infundado. E, ainda que parecesse não se importar com a aparência, era um homem absurdamente atraente. Por um instante imaginou a barba espessa roçando sua pele, o corpo quase arrepiou com a ideia. Mas isso era uma coisa tola. Não estava ali para pensar esse tipo de coisa. Ela era muito mais que isso.

— Meu interesse é em fazer vocês se entenderem, não afastá-los. Você realmente não queria machucá-la, não é? No fundo, você sabe que precisa dela para não se perder totalmente.

Emmett não pôde responder. Uma parte dele não queria fazer mal a Olívia, jamais quis. Outra parte era indiferente. Estava tudo sempre tão misturado em sua mente; amor, raiva e desesperança. Ele a queria e não a queria.

Rosalie ficou olhando ele se afastar; os movimentos dos músculos, os ombros largos, curvados pelo peso dos sentimentos que o atormentava.

A menina ainda estava agarrada a ela. Rosalie a ergueu no colo. Olívia envolveu os braços e pernas em torno dela facilmente. Rosalie percebeu que sentia frio. Beijou suas bochechas molhadas de lágrimas, mencionando em seguida.

— É melhor você entrar, meu bem. Está tremendo.

— Você não vai chamar a polícia? — Ela não poderia, apesar de tudo. Olívia amava e precisava do pai. E ela não podia ficar indiferente ao fato de ele realmente não quer machucá-la como machucou. Os dois estavam sofrendo. E ela estava disposta a ajudá-los.

Pai e filha precisavam encontrar o caminho da felicidade de mãos dadas. Emmett precisava deixar Olívia entrar em seu coração. A separação não era solução nesse caso. Precisava deixar as pessoas se aproximarem novamente. Deixar livre o caminho para seu coração.

— Só porque vocês precisam um do outro — lembrou a menina. — E é mesmo verdade que essa foi a primeira vez que aconteceu?

Olívia balançou a cabeça, afirmando.

— Eu gosto muito do papai — confidenciou —, mesmo que ele não goste muito de mim.

— Por que diz isso, meu anjo? Ele gosta de você. É seu papai. — Rosalie lançou um breve olhar em direção à porta. — Seu papai está sofrendo por algo, e não consegue lidar com a força que isso tem. Mas eu tenho certeza que ele te ama muito. E que vai superar tudo isso. Por você, somente por você.

— É por causa da mamãe... — nesse momento, Rosalie notou os olhos de Olívia se encher de lágrimas, mais uma vez. — Eu a matei.

Rosalie não poderia ter ficado mais chocada com a informação.

— Meu Deus, não. — murmurou. — É claro que não, Ollie.

— Ela teve de morrer para eu nascer. Então, eu a matei. Eu sou malvada.

— Não. Definitivamente, não. Não foi culpa sua o que aconteceu. Foi uma fatalidade. Você não matou sua mamãe. Não pode pôr isso na cabeça, meu anjo, nem por um segundo. Não, Ollie.

— A Sra. Smith disse que sim. Que sou a culpada dela ter morrido e por isso o papai não gosta de mim. Porque sou malvada.

— Isso não é verdade. — Rosalie ficou imaginando que tipo de pessoa fazia uma malvadeza dessas com uma criança. Era cruel. — Essa senhora não sabe o que diz. — Numa tentativa de animá-la, começou fazer cocegas na barriga de Olívia. — Essa Sra. Smith é uma rabugenta. E uma bobona — conseguindo finalmente que Olívia desse uma risadinha. Rosalie adorou o som e o brilho que esse momento trouxe aos olhinhos dela.

A vizinha malvada era outro assunto a se esclarecido, pensou.

Como a menina estava mesmo com frio, Rosalie resolveu que ela teria de voltar para dentro da casa.

— Eu preciso ir, meu anjo. E você precisa entrar, está frio aqui fora. Aposto que estava indo para a cama quando cheguei causando toda essa confusão. — Cutucou o pijama dela, bem em cima da barriga.

— Eu já estava na cama há bastante tempo. A Sra. Smith quase nunca me deixa esperar o papai na sala. Ela sempre diz que ele não gosta de me ver.

— Essa Sra. Smith é mesmo uma bruxa má. Tem certeza que não viu a verruga dela?

Olívia sorriu de novo, Rosalie não poderia ter ficado mais satisfeita.

— Ah, Ollie, seu sorriso é tão bonito. E o som de sua risadinha é motivador. Deveria fazer isso mais vezes. — Rosalie a abraçou mais uma vez antes de finalmente colocá-la no chão. — Agora vá. Entre. Não quero que fique doente. — sussurrando completou: — Eu vou voltar.

Olívia já estava chegando ao hall, quando virou para olhar para Rosalie, fazendo uma pergunta.

— Onde você mora?

— Na verdade, minha casa é um pouco longe daqui. Estou passando uma temporada com meu avozinho.

— Ele gosta de você, o seu avozinho?

— Ele gosta.

— Os meus não gostam de mim.

— Por que diz isso?

— Eu só conheço a mamãe do meu papai. Ela não gosta da gente, por isso foi embora. A mamãe e o papai de minha mamãe, eu nunca os vi, nem mesmo por fotografia. Será que eles existem, Rose?

— Sinto muito, Ollie. E quer saber, eles são todos uns bobos. Não sabem a garotinha incrível que você é.

Olívia presenteou Rosalie com seu sorriso pela terceira vez naquela noite, fazendo-a acreditar que nem tudo estava perdido. Se havia uma chance de fazer aquela garotinha feliz, sem ter de afastá-la da única família que lhe restava, iria arriscar. E que Deus a proteja de um possível arrependimento.

— Tchau! — Ela acenou a mãozinha em despedida.

— Tchau, Ollie! Vejo você amanhã na biblioteca da escola. — ela aguardou a menina fechar a porta para poder então ir embora. Com as mãos dentro do bolso do agasalho, cruzou de volta aquilo que deveria ser um jardim. Imaginou como teria sido bonito nos seus dias de glória. Já estava dentro do carro, quando deu uma última olhada na casa, pensando, há quanto tempo Emmett ignorava a vida. E concluiu que desde a morte da esposa.

— Olívia? — Emmett chamou quando a menina passou a caminho da escada. Ela parou e olhou para ele. — Eu sinto muito. Não percebi que tinha machucado você.

Olívia moveu o pé na direção dele, esperançosa. Ele fez um sinal com a mão indicando que ficasse onde estava.

— Por favor, vá para o quarto. Eu preciso ficar sozinho agora.

A menina abaixou a cabeça, retomando seu caminho até a escada. Mantendo a mão na lateral de madeira que servia de proteção ao pisar no primeiro degrau.

— Eu não queria que tivesse sido desse jeito — Emmett murmurou à medida que Olívia se afastava. Ela olhou na direção dele, mas não parou. Não queria correr o risco de ele ficar bravo.

[…]

Rosalie encontrou o avô dormindo no sofá da sala quando chegou. A televisão estava ligada num documentário sobre pescaria. Ela desligou a tevê, antes de pôr a mão no peito dele e chamá-lo.

— Vovô, por que não vai para a cama?

Norman abriu os olhos devagar, mantendo fixos na imagem da neta, antes de olhar na direção da televisão desligada.

— Eu estava assistindo aquilo. Por que desligou, mocinha?

— Estava mesmo? Então me diz o que estava passando na tevê quando entrei na sala?

— Ah, eu não me lembro! — Ele se zangou, batendo a mão na perna, e Rosalie deu risada. Então lembrou o que a neta tinha ido fazer na rua. — Você conseguiu falar com o pai da garotinha? Ele admitiu ter batido nela? Ele não machucou você também, machucou?

— Não, eu estou bem. Sabe que é incrível. Ele parecia nem mesmo ter se dado conta do que tinha feito. Eu não sei se fico aliviada dele não ter feito de propósito ou se fico preocupada com o fato de ele perder o controle e fazer coisas da qual não lembra. Em todo caso, para não cometer um erro, decidi dar uma chance a convivência dos dois.

— Que história é essa? — Norman questionou ainda enquanto corrigia a postura no sofá.

— Sabe o que mais descobri? A mãe de Olívia morreu no parto dela, e pelo que entendi o pai nunca superou essa perda.

— Conheço uma história assim — Norman lembrou com facilidade.

— O pai se chama Emmett e a filha Olívia — Rosalie comentou aguardando o conhecimento do avô da história.

— Pobre rapaz, nunca se recuperou da morte da esposa. Vive o luto até hoje.

— Ele devia amá-la muito.

— Ah, sim, eles eram muito apaixonados. Estavam sempre juntos e felizes. Preparavam-se para a chegada daquela criança com ansiedade — Norman silenciou por um instante e então voltou a falar: — Pobre menininha que perdeu a mãe ao nascer. A mãe dele precisou ficar na cidade para ajudar com a menina por muito tempo.

— Olívia me contou agora a pouco que a avó os abandonou. Não entendo, por que, mesmo sabendo que eles precisavam dela, os abandonou?

— Ele se isolou de tudo, dia após dias, perdendo a vontade de viver. Viveu em função da dor do luto por muito tempo, nem ao trabalho ia mais. Ela achou que estava na hora de ele sair do estado em que se encontrava. Achou que essa seria uma boa maneira de fazer isso, voltou para a cidade dela, deixando para ele a responsabilidade de cuidar da menina.

— Mas Olívia precisava dela. Ela não pensou em como essa criança ficaria.

— Bom, ao menos a ausência dela o obrigou voltar a trabalhar. Ele saiu da toca. E, até você mencionar, eu não imaginava que pudesse ser ele um pai que não cuida da criança como deve ser.

— Mas e quanto aos avós maternos? Por que não os ajudaram?

— Esses aí não vieram nem mesmo ao funeral da filha. Parece-me que eles não tinham uma relação muito boa. Se não me engano, a última vez que ouviram falar deles estavam a caminho da Itália, país de origem dos pais do avô de Olívia.

Um som parecido com indignação escapou dos lábios de Rosalie.

Norman se levantou.

— Há coisas que somente ele saberá responder — murmurou. — Boa noite, querida. — Ele beijou no rosto de Rosalie, e seguiu em direção à escada. — Não fique muito tempo aí pensando nisso. Vá dormir.

— Não vou ficar — ela respondeu, em seguida, levantou e foi até a cozinha.

[…]

No dia seguinte, Rosalie esperou por Olívia no estacionamento da escola, próximo ao local onde ela costumava pegar e saltar do ônibus.

Não levou muito tempo o ônibus chegou com as crianças. Ela avistou Olívia sentada sozinha, no banco ao lado da janela. Acenou com a mão para ela. Assim que notou sua presença, Olívia ficou de pé dentro do ônibus, olhando para ela através do vidro da janela.

Rosalie sinalizou que descesse e fosse até ela. Olívia quis correr, ainda dentro do ônibus, e acabou esbarrando num garoto, que a empurrou. Para não cair segurou-se num dos assentos.

Ainda enquanto saía do ônibus, Olívia percebeu Rosalie se aproximar do garoto, que não devia ter mais de dez anos de idade. Ela parou no primeiro degrau, ouvindo Rosalie mencionar:

— Aquilo não foi legal, mocinho. Ela é bem menor que você. Não deveria fazer isso com uma garotinha.

O garoto abaixou a cabeça, envergonhado, e saiu marchando para dentro do prédio.

Rosalie viu Olívia na porta do ônibus e sorriu para ela. O rosto da menina se iluminou com a sombra de um sorriso. Rosalie ofereceu a mão e ela aceitou, antes de saltar o último degrau.

— Como você está querida? Dormiu bem? — As duas caminharam em direção à porta principal do prédio.

— Bem — A menina respondeu, chutando uma folha seca no chão.

— O seu papai não brigou com você depois que fui embora ontem, brigou? Ele voltou a machucar você? Ou disse coisas feias?

Rosalie parou de caminhar para que a menina olhasse em seus olhos. As mãos unidas o tempo todo. Olívia ergueu a vista, prestando atenção nela.

— Ele só me mandou ir para o quarto. Queria ficar sozinho.

Rosalie passou a mão nos cabelos desalinhados dela, desejando poder arrumá-los melhor. Querendo muito poder cuidar daquela criança.

— Você já tinha jantado?

Olívia concordou com um movimento de cabeça.

— Tomou café da manhã, também?

— Cereal.

— Hummm... — Ao menos não estava de estômago vazio, pensou. — Eu trouxe o nosso almoço — contou. — Você pode passar na biblioteca quando for liberada para o almoço.

Olívia concordou, satisfeita. As duas retomaram a caminhada, seguindo outras crianças que faziam o mesmo trajeto. Algumas cumprimentavam Rosalie com energia revigorante e sorrisos estampado em seus rostos.

A garotinha que estava de mãos dadas com ela se sentia especial porque, pela primeira vez, alguém segurava sua mão ao entrar na escola. E essa pessoa era Rosalie Hale, a pessoa mais legal que já passou por sua vida.

— Posso levá-la até a sala de aula?

Finalmente, Rosalie viu os lábios de Olívia se abrir com um largo sorriso aquela manhã.

— Você quer mesmo fazer isso?

— Sim. Eu quero muito. Além do mais, tenho mais alguns minutos até abrir a biblioteca.

Emmett não gostava de fazer isso. E sempre que precisava, nunca segurava sua mão.

Quando alcançaram à sala de aula, a professora estava na porta recebendo os alunos. Todos, alegremente, falavam com ela. Quando chegou a vez de Olívia, não foi diferente. Assim como os colegas de Olívia haviam sido punidos pela brincadeira de mau gosto do outro dia, Hannah também recebera uma advertência por ter perdido o controle e levantado à voz.

Rosalie beijou na mãozinha da menina antes de soltá-la. Hannah a cumprimentou da mesma forma que fez com os demais. Rosalie olhou sobre os ombros da professora, Olívia ocupar seu lugar ao lado dos colegas.

Hannah virou-se para Rosalie com um sorriso no rosto.

— Eu nunca tinha visto Olívia tão tranquila ao lado de alguém como fica quando está ao seu lado.

Rosalie deu tchau a Olívia, em seguida, recusou um passo.

— Ela é uma garotinha especial — lembrou.

Quando a menina acenou de volta, Hannah acrescentou.

— Parece que você se torou especial para ela também.

As palavras de Hannah trouxeram a Rosalie a sensação de bem-estar, de estar fazendo o que era correto. E, mais importante ainda, o que seu coração pedia.

— Vocês se conheciam antes de vir trabalhar aqui?

Rosalie balançou a cabeça.

— Nos conhecemos aqui. Mas eu já tinha visto ela fora da escola antes.

— Olívia é uma criança doce, e muito quietinha.

Outra vez Rosalie concordou.

— Eu não sou da família, mas quero que saiba que se acontecer qualquer coisa com ela, como aconteceu no outro dia, pode me procurar na biblioteca. Ficarei feliz em ajudar.

— Com certeza farei isso. Ela gosta muito de você.

— E eu dela.

— Tenho curiosidade em saber como são as coisas na casa dela.

— Parece que o pai dela não tem lidado muito bem com o luto.

— Pelo que foi dito na direção da escola, já faz seis anos — Hannah acusou. — Ele já deveria ter superado isso. Penso que enquanto ele estiver triste, ela também vai estar.

Rosalie pensou em dizer que talvez ele nunca tivesse se recuperado, mas achou melhor não fazer isso.

Hannah continuou.

— Ela encontrou em você uma grande amiga. E é uma amizade muito bonita. Mas o que vai acontecer quando Rachel voltar a cuidar da biblioteca e você não precisar mais vir à escola?

Rosalie não tinha pensando nisso, mas Hannah tinha razão. O que iria acontecer quando não estivesse mais por perto? Aquele foi o momento que começou a ficar preocupada.

As duas se despediram. Hannah entrou na sala de aula e fechou a porta. Rosalie seguiu caminho rumo à biblioteca. Se tudo ocorresse bem com a recuperação de Rachel, ela só teria mais alguns dias como substituta na biblioteca da escola primária.

Ao fim do horário letivo, recolheu suas coisas e foi encontrar Olívia na saída. A menina caminhava como sempre, sozinha, com a cabeça baixa.

— Olívia?

Bastou olhar para ela para seu rosto se tornar menos tristonho. As duas se encontraram no estacionamento.

— Quer uma carona para casa? — ofereceu.

Olívia pareceu pensar um instante a respeito. Então olhou de Rosalie para o ônibus escolar estacionado a poucos metros de onde estavam. Algumas crianças ocupando seus lugares. A mulher ao volante atenta as crianças que chegavam.

— Eu posso falar com ela — Rosalie sugeriu —, se me disser que aceita.

— Sim. Eu quero.

Rosalie segurou sua mão pequena e foi com ela falar com a motorista do ônibus. Não foi difícil convencê-la, uma vez que trabalhava na escola. Depois disso, levou Olívia até onde estava estacionado seu carro.

Olívia olhou com espanto o land rover.

— Esse é o seu carro? — Os olhos indo do veículo branco para Rosalie. Aquele, sem dúvida, era um carro mais bonito e bem mais novo que o do papai.

— Você gostou?

— Sim. Ele é muito bonito.

Rosalie desligou o alarme, em seguida, abriu a porta traseira para ela entrar. Olívia entrou no carro após Rosalie retirar a mochila de suas costas e colocá-la no banco.

— Eu não tenho uma cadeirinha. Mas vou prendê-la com o cinto e vou dirigir com cuidado.

A menina não conseguia deixar de olhar ao redor. Era tudo bonito, limpo e cheiroso no carro dela, como nunca viu antes.

— Aqui cheira bem — comentou.

Rosalie estava pondo o próprio cinto, quando virou o rosto, com um sorriso nos lábios, para falar com ela.

— Obrigada.

— O carro do papai não cheira assim. Ele...

— O quê? — Rosalie insistiu.

— Cheira a cigarro. E também tem muita bagunça e sujeira.

— Ele fuma?

— Um bocado.

— Isso não é bom.

— Eu vi na televisão outro dia que o cigarro causa câncer. Câncer é uma coisa ruim, não é?

Rosalie se sentiu péssima por ter de confirmar seus medos.

— Sim, Ollie. Câncer é uma coisa muito ruim.

— Será que o papai sabe disso?

— Eu tenho certeza que sim. Mas, posso tentar falar com ele depois — Então, com um sorriso no rosto, perguntou: — Podemos ir querida?

Olívia moveu a cabeça, concordando. Os pés agitados, demonstrando ansiedade.

Antes de sair com o carro do estacionamento, Rosalie ligou o rádio numa música animada para distrair Olívia. Durante o trajeto a música foi substituída por uma que a fez lembrar-se da traição de Royce e Irina. Ela não percebeu que tinha ficado em silêncio, nem esquecido da menina no banco de trás. A lembrança lhe trouxe lágrimas aos olhos.

— Rose? — Olívia chamou, mas ela não ouviu. Ela retirou o cinto de segurança e se pôs de pé entre os bancos, com as mãos em ambos os encostos da frente. — Rose? — chamou de novo, e Rosalie se assustou, apertando imediatamente o pé no freio, por sorte dirigia devagar.

— Não faça isso, meu anjo. — Rosalie soltou as mãos do volante e olhou para ela. — Você se machucou? — Ela analisou os braços e o rosto da menina, preocupada que tivesse se machucado.

— Eu estou bem.

— Você não pode fazer isso, Ollie. Não pode tirar o cinto e ficar de pé enquanto dirijo — Rosalie retirou o próprio cinto e se virou para colocá-la de volta no assento. — Por favor, não volte a fazer isso. Eu fico apavorada em pensar que possa se machucar.

— Você parecia triste.

— Me desculpe, não queria te deixar preocupada. Eu só me distraí com a música.

— Aquela música faz você chorar?

— Não.

— Ah... — Olívia murmurou, permanecendo em silêncio pelo tempo que Rosalie punha de volta o cinto. — O papai chora escondido às vezes — revelou então.

Rosalie ficou surpresa com a revelação. Isso deixava tudo mais claro para ela. Emmett nunca deixou a esposa partir de verdade. O coração dele ainda batia por ela. Mas ele não podia se esquecer de viver como vinha fazendo há anos. E se esquecer de que tinha uma criança que precisava e dependia dele. Do seu amor e afeto.

 


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Notas finais do capítulo

Obrigada a todos que comentaram no capítulo anterior.