Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 21
Capítulo 20 — Apresentando a Mamãe




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Não fazia muito tempo, Emmett havia saído da cama, passado no quarto de Olívia, constatando que ainda dormia. Ela parecia bem, à primeira vista.

Agora, tomava uma xícara de café, sentado na banqueta diante a ilha da cozinha. Passou a mão na barda crescida, pensando no que tinha decidido à noite, enquanto aguardava o sono chegar. Iria mostrar a Olívia, pela primeira vez, os vídeos caseiros cuja mãe dela aparecia. Estava apenas esperando que acordasse.

Seus pensamentos mudaram de rumo ao som da campainha, alertando para a chegada de alguém na porta da frente.

Ele levantou, deixando a caneca em cima da ilha. Nem imagina quem poderia estar à porta de sua casa àquela hora, numa manhã de domingo. Certamente não se travava da senhora Smith. Duvidava que tivesse coragem de voltar a pisar o pé ali algum dia depois do que havia feito.

— Então é você?! — murmurou ao abrir a porta. Deu um passo atrás, afastando a mão da maçaneta.

— Bom dia — cumprimentou Rosalie, passando pela porta.

— Bom dia — ele respondeu, sem de fato olhar no rosto dela.

— Eu sinto muito — Rosalie começou. — Por ter acusado e batido em você daquela maneira. Não que meus socos e tapas sejam fortes o bastante para machucar você. Por outro lado, compreendo que minha atitude, sim, pode tê-lo machucado. Talvez minhas unhas... Eu realmente sinto muito.

Sim, ele estava com alguns aranhões nos braços e pescoço adquiridos no momento que o atacou para defender Olívia.

— Eu mereci, por não acreditar em todas às vezes que diziam que a Sra. Smith era má.

— Disso não posso discordar. — Ela retirou o agasalho e pendurou no gancho ao lado da porta.

Emmett deu alguns passos na direção da sala de jantar, com intenção de voltar à cozinha.

— Não precisar voltar aqui todos os dias. Hoje, por exemplo, estarei em casa o dia inteiro. Tecnicamente, não precisamos de você aqui.

— Estou preocupada com a Ollie. Não dormi bem essa noite, pensando em tudo o que aconteceu. Você deve considerar...

Ollie, ele pensou. Ela chamava sua filha pelo apelido carinhoso, da mesma forma que Sarah costumava chamar mesmo antes de Olívia nascer. Já tinha a ouvido chamar Olívia assim em outras ocasiões, mas essa foi a primeira vez que não esteve perto de sentir raiva por usar algo que era de Sarah.

— Ela ainda está dormindo — foi apenas o que disse.

— Eu posso subir? — Rosalie olhou em direção a escada. — Gostaria de vê-la. O que aconteceu ontem deve ter deixado ela exausta. Pobrezinha.

Emmett assentiu.

Rosalie subiu os primeiros degraus da escada, parando para falar com ele mais uma vez.

— O que planejou para hoje? Quero dizer, você e a Ollie?

— Acho que isso não é de sua conta.

Rosalie abriu a boca e fechou sem dizer nada. Subiu mais alguns degraus, e foi surpreendida pela voz grave dele dizendo:

— Quero mostrar a ela alguns vídeos onde Sarah aparece.

Os olhos de Rosalie estavam radiantes, quando virou para olhar para ele do alto da escada. O programa perfeito para os dois, pai e filha, depois da atitude horrível da senhora Smith. E dos anos de descaso, praticados por ele. Era mais que Rosalie imaginou fosse fazer. Olívia precisava e merecia isso. Quase desceu os degraus que havia subido só para abraçar ele, mas o olhar duro a fez perceber que não era o que queria.

— Ollie vai ficar muito feliz — se limitou a dizer.

Emmett desapareceu pela porta da cozinha, sem mais explicações. Ela terminou o trajeto até o quarto de Olívia sem se deixar afetar pelo humor dele. A pequena era sua maior preocupação.

A porta estava entreaberta. Empurrou com cautela até ter espaço suficiente para passar.

Os cabelos ruivos estavam espalhados no travesseiro, o corpo pequeno oculto sob o peso da grossa coberta de inverno. Coitadinha, pensou Rosalie. Como podiam ser tão cruéis com ela, um amorzinho de criança. Sentiu o carinho que tinha por Olívia a envolvê-la ao se aproximar da cama. Sentou na beirada do colchão. Reparou, só agora, na fotografia de Sarah em cima da mesinha de cabeceira. A mesma fotografia que, dias atrás, Olívia lhe mostrou com intenção que reproduzisse o penteado.

Sentia afeição por Sarah, mesmo sem nunca tê-la conhecido. Talvez por ter sido ela a dar a vida a Olívia, a garotinha por quem tinha tanto amor e carinho. Mesmo na fotografia, reconheceu bondade no rosto da jovem mulher. Uma pena ter partido tão cedo.

Quando olhou para o lado, Olívia estava com olhos abertos, preguiçosos e sonolentos, fixos em sua figura.

— Bom dia, meu amor — cumprimentou com a voz suave, estendendo a mão para acariciar o rosto da menina. Olívia piscou os olhos lentamente, levando-a pensar se ainda sentia sono. — Tudo bem se quiser dormir mais um pouco — disse, usando o mesmo tom de voz suave.

Olívia esfregou o cobertorzinho no rosto.

Rosalie passou a mão em sua testa fazendo um carinho enquanto afastava alguns fios de cabelos do rosto. Sentiu a quentura na pele. Parou, deixando a mão sentir a temperatura mais alguns instantes. A menina esboçou um gemido enfraquecido.

— Está com febre, meu amor. É melhor chamar o seu pai.

Olívia sentou na cama, passando os braços em volta de Rosalie, o rosto escondido no peito dela.

Estava só de calcinha, assim como quando a puseram na cama à noite, depois do que a Sra. Smith aprontou. Rosalie puxou o cobertor para aquecê-la novamente.

— Está tudo bem, não irei embora.

— Papai vai ficar bravo — Olívia murmurou. Sua voz estava rouca por conta dos gritos na noite anterior.

— Não vai, meu anjo. Você não tem culpa de estar com febre. — Rosalie não entendeu o que disse a seguir, a voz da menina soou muito baixa e a rouquidão atrapalhava um pouco. — Não consegui te ouvir, Ollie.  Pode falar mais uma vez, meu amor?

Olívia aproximou a boca do ouvido dela, sussurrando:

— Fiz xixi na cama.

Rosalie afagou o rostinho, que era só preocupação.

— Está tudo bem, Ollie. Foi um acidente. Eu vou cuidar de tudo, fique tranquila. E eu tenho certeza que o seu papai não vai ficar bravo.

Olívia assentiu, confiando na palavra dela.

Rosalie beijou seu rosto.

— Eu não demoro. Vou falar com seu papai e então volto para cuidar de você. Se quiser voltar a dormir, ainda estarei aqui quando acordar.

Ela encontrou Emmett na cozinha fritando bacon com ovos. O cheiro de fritura alcançou seu olfato antes mesmo de entrar no cômodo onde estava.

— A Ollie está febril outra vez.

Emmett ergueu a vista do que estava fazendo para prestar atenção nela.

— O que disse?

— Ollie está febril.

Ele então desligou o fogo.

Rosalie continuou falando:

— Desconfio que seja de cunho emocional outra vez. Depois de ontem, não me surpreenderia. Ela é uma garotinha muito sensível.

Emmett anuiu.

— Vou dar a ela o medicamento prescrito na última consulta. Se a febre não ceder, teremos de levá-la ao pediatra novamente. — Rosalie foi pegar o remédio no armário da cozinha onde havia deixado.  — Ah — parou para falar —, ela fez xixi na cama. Por favor, não diga nada que possa magoá-la. Ela já passou por muitas coisas num curto intervalo de tempo. E tudo culpa daquela infeliz que você deixava entrar em sua casa.

Emmett parou, olhou para ela, mas não disse nada.

— Melhor preparar algo mais saudável para o café da manhã dela. — Ele a ouviu dizer atrás de suas costas. — Esta é uma refeição pesada para uma garotinha que acordou com febre.

[…]

— Olívia? — ele chamou da porta do quarto da menina. Ela olhou para ele. — Rosalie disse que você está com febre. — Se aproximou da cama, estendendo a mão para sentir a temperatura na testa dela. — Sim, está febril. Sente alguma dor ou desconforto?

— Não, papai. — Da mesma forma que Rosalie, ele notou a rouquidão em sua voz. E também aliou aos gritos da noite anterior.

— Está bem — falou meio sem jeito. — Ela está trazendo seu remédio. Logo estará sem febre alguma.

Olívia assentiu.

Emmett fingiu não saber do xixi na cama. Rosalie tinha razão, a menina já tinha passado por muita coisa em pouco tempo.

Olívia sentou na cama quando Rosalie entrou no quarto trazendo o remédio para baixar a febre.

— Vai ver que depois dessas gotinhas, estará se sentindo bem melhor — disse para a menina enquanto lhe dava o remédio na boca.

Emmett observou, afastado, ao lado da porta, sem nada dizer.

— Vou dar banho nela, depois vesti-la com uma roupa quente. Então ela desse para comer alguma coisa, está bem?!

Rosalie estava com Olívia no colo quando passou por Emmett. Ele balançou a cabeça sutilmente dando entender estar tudo bem.

Quando Rosalie e Olívia desceram a escada, minutos depois, a menina estava usando o pijama que ela lhe deu há alguns dias. Não pôde recusar o pedido da criança no estado emocional em que estava. Os cabelos ruivos escovados, presos numa trança folgada, jogados sobre o ombro miúdo.

Rosalie entrou de mãos dadas com ela na cozinha. Não demorou em notar a tigelinha vermelha sobre a mesa. Ao se aproximar, viu que era mingau de aveia. Também havia panquecas e torradas com geleia de uva. Ela ajudou Olívia sentar-se a mesa.

Emmett se aproximou trazendo uma colher.

— Obrigada — murmurou Rosalie, atrás das costas da menina. Como ele não disse nada, apenas afagou as costas de Olívia. — Come tudinho, assim ficará forte mais rápido.

— Foi você quem fez? — pediu Olívia.

Rosalie percebeu Emmett olhar em sua direção.

— Não — confessou, sustentando o olhar dele. — Foi o seu papai quem fez. Porque ele te ama e se preocupa com você. Ele quer que fique bem logo.

O olhar de Olívia buscou a presença do pai, um sorriso ameaçando surgir em seu rosto de traços delicados. Emmett manteve o olhar sereno ao encontrar com o dela.

O café da manhã seguiu sem contratempos; Olívia comeu toda comida que lhe foi oferecida. E Emmett, os ovos com bacon que havia preparado antes.

[…]

Rosalie estava sentada no sofá da sala, com Olívia ao seu lado, no momento que Emmett entrou carregando uma linda caixinha de madeira, que ela logo imaginou ter pertencido a Sarah. Ele a deixou na mesinha de centro e foi mexer na televisão. Voltou para junto da caixinha, de onde retirou um pendrive.

— Ah — murmurou Rosalie um instante depois, notando que aguardava um posicionamento seu. — Ollie, meu amor — ela se dirigiu então a menina —, eu vou ter de ir embora agora. — Olívia a olhou com ar preocupado. Rosalie acariciou seu rosto, adorando cada pequenina sarda. — O seu papai tem uma coisa muito legal para te mostrar. É algo muito bonito. E você ira se lembrar desse momento para sempre.

Olívia ainda parecia insegura.

— Você vai ver meu anjo, o quanto sua chegada foi desejada. — Rosalie lhe beijou a bochecha. — Estou indo, mas depois eu volto. Se precisar de mim, é só usar aquele número de telefone que deixei na sua mochila, e então virei correndo. Não importa o horário.

Olívia finalmente aceitou. O cobertorzinho encostado ao queixo, movimentando a cabeça em sinal positivo.

— Eu te amo — Rosalie sussurrou. Beijou outra vez o rosto da menina e se levantou. — Depois você coloca a roupa de cama do quarto dela na secadora — lembrou a Emmett. — Deixei batendo na maquina de lavar.  — Ela se encaminhou até a porta da frente, vestiu o agasalho e virou-se para falar: — Ollie tem meu número de celular, caso precise me localizar. — Não esperou que respondesse, apenas abriu a porta e saiu.

Assim que ficaram sozinhos, Emmett plugou o pendrive na entrada USB do aparelho de DVD, em seguida, mexeu no controle remoto sem pressa alguma.

— É desenho, papai? — Olívia pediu nos segundos iniciais.

— É ainda melhor que desenho. — Ele sentou ao lado dela no sofá. — São vídeos onde a mamãe aparece. — A expressão de surpresa e alegria estamparam o rosto de Olívia. Não demorou, a primeira imagem de Sarah surgiu na tela. Pai e filha se olharam, se preparando emocionalmente para as cenas a seguir. Emmett então sussurrou: — Essa é a sua mamãe, Olívia.

Uma lágrima escapou do olho da menina quando, surpreendendo o pai, disse:

— Olá, mamãe.

[…]

Norman havia chegado do mercado, minutos antes de Rosalie retornar da casa de Emmett. Guardava as compras no armário quando ela entrou na cozinha.

— Adivinhe o que comprei para nossa Abobrinha? — contou ele, ostentando a expressão animada.

— Não faço ideia.

Ele parecia tão feliz em ter comprado o presente para Olívia, que Rosalie sorriu de sua empolgação.

— O que o senhor comprou? — lançou o olhar curioso para as sacolas na ilha da cozinha, percebendo então o joguinho de chá cor-de-rosa ainda na caixa. — O senhor comprou um jogo de chá para ela?! Que lindo, vovô.

— Acha que ela vai gostar?

— Tenho certeza que sim. Ela vai gostar muito.

— Hoje ela virá aqui?

— Acho que não. Hoje é um dia muito importante para pai e filha. Ele está mostrando a Olívia todos os vídeos onde a mãe dela aparece. E é a primeira vez que faz isso. Mal consigo acreditar em tamanha delicadeza. Isso vai marcá-la positivamente para o resto da vida. Estou feliz que tenha tomado essa decisão.

Norman balançou a cabeça, compreendendo.

— Mais tarde, antes do horário de ela dormir, talvez eu dê um pulinho lá para ver como estão as coisas.

— Você leva o presentinho dela?

— Eu tenho uma ideia melhor. Por que o senhor não me acompanha e entrega o presente pessoalmente?

— Será? — ele pediu.

— Por que não?

[…]

Emmett e Olívia passaram toda a manhã assistindo aos vídeos onde Sarah aparecia. Alguns da época que ainda namoravam, passando pelo noivado e casamento. Passeios, apresentações, momentos importantes do período de gestação. Trabalhando no jardim, na construção do caramanchão e da casinha de madeira, hoje no quintal sofrendo com o abandono.

Durante a exibição das cenas, Olívia foi se aconchegando ao pai aos poucos. Os dois choraram em alguns momentos. A tarde chegou, sem que sentissem vontade de almoçar. Quando o último vídeo chegou ao fim, pai e filha adormeceram no sofá, abraçados. Olívia sentindo o conforto e segurança dos braços dele. Com a certeza de que foi amada e desejada por sua mamãe.

— Ollie — ela sorriu durante o sono, acreditando ter ouvido Sarah sussurrar seu nome, igualzinho no vídeo. Igualzinho Rosalie a chamava.

Passavam das seis da tarde. Essa época do ano as ruas escureciam muito cedo, por isso, quando Emmett despertou do sono tomado de memórias, a casa estava inteira às sombras. A televisão ligada exibindo uma tela azul, o pendrive ainda plugado.

Esticou o braço até alcançar o abajur ao lado do sofá. Com um pouco mais de claridade, conseguiu ver o rosto de Olívia. Mais uma vez reconheceu nos traços infantis a herança genética da mulher a quem tanto amou. A semelhança entre as duas não lhe trouxe raiva como acontecia anteriormente. Sentiu como se o caminho que a levava ao seu coração estivesse sendo moldado.

Pensou em lhe beijar a testa, então Olívia abriu os olhos e ficou a encarar seu rosto. Levou um instante para que um dos dois começasse a falar.

— Papai... — sussurrou Olívia, quebrando o silêncio doloroso que separava pai e filha de genuíno afeto.

— Sim?

— Fui eu quem matou a mamãe?

Emmett sentiu a força da pergunta apunhalar o peito. Viu o medo da resposta estampado no rosto da filha. Viu ansiedade e também esperança. A cena do parto de Olívia tomou sua mente, o momento exato em que veio ao mundo. Ele havia amado aquela criança naquele precioso momento e bem antes de ela nascer. Respirou fundo, consciente do que tinha a dizer.

— Não — murmurou. Com convicção voltou falar: — Você não matou a mamãe. É claro que não. — Viu o medo deixar aqueles olhos inocentes e não pôde controlar a avalanche de sentimentos que o atingiu: culpa, remorso, angustia, medo, insegurança, saudade e amor.

Abraçou Olívia, apertado, o corpo grande e pesado tremendo com soluços de choro que não pôde segurar. Olívia ficou presa ao abraço poderoso sem compreender o tamanho da culpa que o pai carregava. Tinha tantos pedidos de desculpas a fazer. Tanto a dizer, mas as palavras ficaram presas no caminho até a boca. Embaralhadas ao forte sentimento. Levou dois minutos inteiros para conseguir controlar os soluços.

A campainha tocou duas vezes seguida, então uma terceira vez, até conseguir soltar Olívia sem estar entregue às lágrimas.

Olívia olhou para ele com ar preocupado. Levou a mão ao seu rosto fazendo um afago em cima da barba.

— Não chore papai — pediu. — Não precisa ficar triste, a mamãe amava você também. Ela deixou a gente junto, para cuidar um do outro.

Emmett se sentiu miserável. Como uma garotinha sabia mais de amor do que ele?! Amaldiçoou-se por nunca ter cuidado dela como devia.

A campainha insistente, não permitiu que pedisse perdão por todos os anos que não pôde amá-la como merecia.

— Eu vou abrir a porta — Olívia avisou, saindo do colo dele.

— Não. — Ele a colocou no sofá. — Eu abro, já está escuro lá fora. — Ele levantou, secou o rosto na própria camisa, respirou fundo e se pôs acender as luzes na sala, finalmente indo abrir a porta.

Olívia segurava o cobertorzinho, ajoelhada no sofá, atenta a porta para ver quem era.

Rosalie e o avô estavam do outro lado, quando Emmett abriu a porta, aguardando seu convite para entrar. Ela logo notou o rosto abatido. Ficou preocupada que algo tivesse acontecido a eles durante o dia. Norman também notou o semblante abatido no rosto dele, e seu olhar automaticamente buscou por Olívia na sala.

— Está tudo bem? — Rosalie pediu. — Onde está a Ollie?

Ao ouvir chamar seu nome, Olívia saltou do sofá carregando o cobertorzinho, correndo ao encontro dela.

— Rose, Rose.

Emmett saiu do caminho permitindo a menina se aproximar dos visitantes. Rosalie a pegou no colo se deixando abraçar por braços e pernas. Beijou seu rosto pintado de sardas e lhe sorriu, cheia de afeto.

Norman ainda olhava para Emmett, que parecia miserável em seu tormento pessoal.

Entraram finalmente na casa. Emmett fechou a porta atrás das costas deles. Rosalie caminhou com Olívia nos braços até o sofá onde sentou com ela no colo.

— O que aconteceu, Ollie? — perguntou para a menina. Seu olhar buscou o de Emmett. Ele evitava olhar em seu rosto como estivesse envergonhado de si mesmo. Olhando para Olívia insistiu: — Você está bem? — De canto de olho tornou olhar para o homem grande, que naquele momento em nada lembrava o homem grosseiro que costumava recebê-la.

Olívia olhou no rosto dela, fazendo que sim com a cabeça. Naquele momento, a menina se deu conta da presença de Norman, saltando do colo de Rosalie para abraçá-lo. Norman tinha acabado de sentar no sofá quando ela se lançou em seus braços. Ele segurava uma vasilha com tampa e a sacola da loja de departamentos.

— Como está a minha Abobrinha hoje?

Abobrinha, pensou Emmett. Aquelas pessoas eram mais carinhosas com sua filha do que jamais foi. Nunca foi tão difícil olhar no rosto deles como estava sendo agora.

— Eu vi a mamãe — Olívia contou a Norman, que trocou um olhar com Rosalie. — Ali! — Ela mostrou a televisão agora desligada. — O papai tem um monte de vídeos com a mamãe. Ele a apresentou pra mim. Parecia até que ela estava bem pertinho do meu coração.

— Isso foi muito legal, não foi? — Norman mencionou.

A cabeça ruiva sacudiu com animação.

— Foi sim — ela respondeu, e correu de volta para o colo de Rosalie.

Rosalie beijou seu rosto por várias vezes, antes de finalmente perguntar:

— Vocês já jantaram?

Olívia negou com um movimentar de cabeça. Emmett lembrou que nem mesmo tinham almoçado fazendo a culpa crescer novamente dentro dele. Mas, ao ouvir Olívia falar, percebeu que estava feliz. Fato que a tornava ainda mais parecida com a mãe.

— Que bom — ouviu Rosalie dizer —, porque trouxemos o jantar.

A menina olhou para Norman. Ele lhe mostrou a vasilha que segurava fazendo um gesto com a mão.

— O papai também pode comer? — pediu, preocupada que o pai não tivesse o que jantar. Emmett não imaginou que pudesse se sentir mais miserável do que já se sentia. Mesmo com todas as merdas que havia feito nos últimos anos, Olívia ainda se preocupava com ele.

Rosalie segurou sua mão pequena.

— Claro que sim. Quer me ajudar pôr a mesa? — Olívia aceitou, se mostrando animada.

O olhar de Rosalie buscou o de Emmett, pedindo permissão para pôr a mesa. Já que a última vez que fez isso, ele não reagiu muito bem. Emmett somente meneou a cabeça, aceitando.

— Vamos, papai? — Olívia chamou, com a mão na de Rosalie.

— Depois eu vou. — Ele sorriu de forma envergonhada para ela.

Norman entregou a neta à vasilha com o jantar deles. Lembrando-se finalmente de dizer a Olívia que tinha um presente para ela.

— Olha, Abobrinha, tenho aqui um presente para você.

 Olívia abriu um sorriso, surpresa com a notícia.

— O que é vovô, Nor?

— Abre — ele insistiu. — Vê se você gosta.

Olívia olhou para Rosalie como pedisse ajuda para descobrir qual era o presente. Depois, olhou dentro da sacola.

— Oh! — murmurou. — Que lindo! — Ela retirou a caixa da sacola. E, com ajuda de Norman, retirou as pecinhas do jogo de chá de dentro da caixa. Olhou, uma a uma, com alegria e voltou abraçar Norman.

— Obrigada vovô, Nor. É lindo.

— Vamos levar para a cozinha? — sugeriu Rosalie. — Assim você pode brincar enquanto ponho a mesa.

Norman ajudou guardar todas as peças de volta na sacola. As duas deixaram a sala logo em seguida.

Quando estavam somente os dois, Norman arriscou:

— Como se sente?

Levou um segundo inteiro para Emmett se dar conta que era com ele que Norman falava. Olhando finalmente no rosto dele, admitiu.

— Sinto que não a mereço.

Norman meneou a cabeça, compreendendo.

— Você só tem de deixar o passado para trás, e olhar para frente. O arrependimento, quando verdadeiro, se torna aprendizado.

Emmett abaixou a cabeça.

Norman então prosseguiu:

— Estamos do seu lado, porque acreditamos que é possível. Minha neta, mais que qualquer pessoa. Eu o vi algumas vezes ainda enquanto Sarah estava conosco, então posso dizer que sei o quanto eram apaixonados. Sei que sofreu e ainda sofre com a ausência dela. Eu só não fazia ideia que não conseguia ver a filha de vocês com olhos de amor. Que a culpava pelo que aconteceu. Você podia ter buscado ajuda em vez de se isolar.

— Eu sei que fui miserável. Foi só há pouco tempo que consegui enxergar que precisava de ajuda, para mim e por minha filha. Então fui a minha primeira consulta. Não contei a ninguém. Você é a primeira pessoa para quem estou revelando isso. — Ele fez uma pausa. — Ontem, quando cheguei e encontrei a Sra. Smith sendo cruel com ela, tinha acabado de sair de mais uma consulta.

— Você demonstrou amor a Olívia ao defendê-la. A forma como a amparou. E até mesmo a forma como expulsou a senhora que praticava o abuso emocional. Minha neta me contou tudo. Eu realmente fico feliz que esteja permitindo a si mesmo voltar a ser o que era. Desejo que todo amor e cuidado dedicado à mãe de Olívia hoje seja passado a ela. Porque essa garotinha merece todo o amor do mundo. Acha que consegue fazer isso? Ou devemos buscar ajuda do serviço social?

— Estou disposto a fazer isso.

Norman sorriu com afirmação dele.

— Quero ser o pai que ela merece. Quero ser o pai que Sarah esperava que eu fosse.

— Então estaremos do seu lado. — Fez-se uma pausa, e Norman voltou a falar: — E quanto a Sra. Smith?

— Eu ainda não sei. Não tive tempo de pensar nisso. Mas uma coisa eu tenho certeza, ela não voltará a pôr os pés nessa casa novamente.

A conversa foi interrompida com a chegada de Rosalie e Olívia à sala de estar. Rosalie ouviu a última frase, olhou para os dois com curiosidade tentando adivinhar o que estavam falando.

— A mesa está pronta — avisou, atenta a expressão no rosto de cada um — Você e Ollie já podem jantar.

Emmett tomou coragem para olhar no rosto dela.

— Não vão nos acompanhar? — pediu.

— O vovô e eu jantamos antes de sair. O jantar é apenas para vocês dois.

— Não sei se me sinto confortável com isso.

— Bobagem. Sente e jante na companhia de sua filha, ela está ansiosa por isso. Não está, Ollie?

Olívia sacudiu a mão dela na sua.

— Uhumm — murmurou. Depois perguntou, na esperança de ouvir um sim: — Rose, você vai ficar para me pôr pra dormir?

— Vou sim, meu amor.

Emmett finalmente levantou do sofá. E ao se aproximar das duas, a caminho da cozinha, Olívia segurou sua mão. Ele olhou a mão pequena na sua, segurando-a com vontade.

Rosalie ficou para trás observando, ao lado do avô, pai e filha entrarem na cozinha de mãos dadas.

 


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