Culpa e Perdão: O pior de uma mente apaixonada escrita por NightlyPanda


Capítulo 9
Capítulo 9 - Caminhos e Mentes Feridos




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Acordei com o barulho do despertador. O desliguei e percebi que já estava na hora de ir para a empresa. Liguei a Tv e deixei o noticiário passando enquanto me levantava e ia me arrumar para sair. Fui até o closet e abri o armário onde estavam meus ternos, pensei em usar o azul naval, parecia uma boa escolha para o dia. Enquanto ajeitava minha gravata borboleta, prestei um pouco de atenção no som que vinha da televisão do quarto.

— Uma nova pista parece levar as investigações policiais mais a fundo no caso do assassino carmesim. Depois do mandato de busca e apreensão na mansão de Lars Dorsey, a polícia encontrou em um dos computadores apreendidos uma pasta com arquivos referentes aos executivos assassinatos das empreiteiras concorrentes da ACS. A polícia relatou que eram espécies de portfólios sobre os executivos, dados como formação acadêmica, quando ingressaram nos respectivos cargos, atuação frente a empresa, estavam todos listados nesses documentos. Essa nova pista agrava ainda mais a situação de Dorsey. Ele continua a negar todos os fatos e a se dizer inocente. O governador do estado soltou uma nota na qual afirma estar profundamente indignado com o ocorrido e espera e confia que a justiça será feita e os fatos esclarecidos. A ACS é uma das empresas que estão inscritas no edital aberto pelo governo do estado para a licitação da construção da hidrelétrica. O presidente da ACS, Travis Hagemman, afirmou em telefonema estar atento aos acontecimentos e que confia na atuação judicial para que a verdade seja exposta e que esses fatos não maculam em nada a imagem e os valores da ACS. Todavia, o mercado parece não concordar muito, e as ações da empresa estão tendo a maior queda na bolsa de valores em décadas.

“Humpf... pelo visto tudo está caminhando por conta própria, e tudo que eu precisei fazer foi mover alguns peões, vamos ver como eles reagem ao movimento do cavalo.” Acabei de me vestir e fui para a garagem, não iria nem tomar meu café da manhã, pelo visto teria muito o que fazer na empresa hoje.

Dirigindo pela cidade, a caminho do trabalho, percebi que passava ao lado do parque que estive com Hugo no domingo. Passava por ali sempre que ia à empresa e jamais tinha reparado nesse lugar. Era um parque agradável. Por um momento, relembrei das palavras dele e me senti desconexo de tudo. Alinhar aquela galáxia de emoções no meu universo seria uma tarefa extremamente difícil, mas eu não sou do tipo de fugir dos problemas, eu faria com que tudo se harmonizasse. Porque no fim, aquele garoto despertava em mim uma ideia ridícula de alguma chance de redenção e recomeço. Mas agora não era momento de me ater a tais pensamentos.

O painel do carro notificou que recebia uma ligação. O número era bloqueado, mas eu tinha certeza de quem era aquela ligação.

— Se não é o grande patriarca russo.

— Suas habilidades são realmente fascinantes meu filho. Mas você sabe que não é por causa sua que esse número está bloqueado. Bem, eu liguei para parabenizá-lo. O efeito dominó do sucesso da sua missão está sendo impressionante. Eu recebi uma mensagem do nosso “investidor”. Ele está realmente feliz com o serviço. Estamos perto de concluir esse trabalho Nolan, continue com os bons resultados e você será extremamente bem recompensado, como usual.

— Você não precisa usar esses termos enigmáticos comigo Górki, por que esse nosso investidor não pode ter a identidade revelada? Afinal de contas, sou eu que executo os serviços que ele contratou.

— Meu garoto, você sabe bem dos protocolos, e sabe bem também que eu jamais os segui com você. Mas dessa vez eu preciso, além do fato de que esse investidor não negociou diretamente comigo, mas sim por um intermediário. De todo modo, eu vou ficar fora do país por mais algumas semanas, acho que quando eu retornar já vai estar tudo finalizado. Preciso desligar agora porque estou para fazer desembarcar. Espero por notícias suas, até mais Nolan.

Não saber bem que me contratava me deixava um pouco irritado. Mas de todo modo, se o dinheiro foi pago, o serviço seria executado, nada de novo sob o sol. Já no prédio da HG+, Rowney esperava por mim para que discutíssemos alguns detalhes do novo projeto.

— E então, depois do capital ser formalizado, precisamos decidir o processo de marketing para que o valor dessa nova empresa seja extremamente rentável para nós e... Nolan!... Nolan!... Nolan, você tá na escuta?

— Ãnh? Ah sim, sim. Concordo, está tudo certo então com as ações a entrarem no mercado?

— Essa foi a primeira coisa que eu disse quando entrei na sua sala, estava falando da campanha publicitária do setor de marketing, mas pelo visto você não ouvi nada do que eu disse né?

— Me desculpe, eu estava com a cabeça em outra coisa.

— Se você fosse um ser humano normal diria que seria em outra pessoa. Mas só de pensar em você tendo um affair meu cérebro entra em pane. – Olhando pela janela, o vidro que me refletia parecia expor tudo que eu pensava. Realmente, Rowney não me conhecia, mas talvez esse era o seu dia de bons palpites. – E é por esse olhar de lobo seu que gela o âmago da minha alma que eu não disse nada.  

— Você acha que esse projeto precisa de mais alguma avaliação interna da direção ou já podemos mandá-lo pro setor especializado?

— Olha, se você não tiver mais nada para verificar nas plantas, nos documentos e nos portfólios, acho que está tudo certo. Só preciso da sua autorização Nolan, e desço com tudo para dar seguimento.

— Se é só uma autorização que você precisa... considere-se autorizado. Eu vou ficar aqui na minha sala olhando algumas coisas, se você precisar de mim, só dar um toque.

— Sim senhor!

Assim que Rowney saiu da sala, sentei-me e liguei o computador em minha mesa. Abri o compartimento no fundo da mesa e retirei o cabo, que ficava escondido por ela, da rede interna de dados da empresa. Troquei-o com o da internet normal para que não corresse qualquer risco. Era uma espécie de intranet com identificação maquiada. Conectado, comecei a pesquisar por algumas informações. Primeiro, reuni as notícias sobre a prisão de Dorsey e o andamento do inquérito. Precisava ter certeza dos fatores determinantes que o relacionavam com os assassinatos dos executivos. Dorsey era uma figura exibida, adorava estar na mídia, algumas fontes inclusive cotavam por debaixo dos panos seu interesse de concorrer ao governo estadual. Ele tinha um bom relacionamento com os empresários do estado e do país. No ramo da construção civil, tinha contatos que se misturavam entre a profissão e a família, as fofocas locais diziam que a diretora adjunta administrativa da DAZus era sua filha fora do casamento que ele jamais reconhecera formalmente, mas que nos bastidores ele gostava mais dela que de seus filhos dentro do casamento, por ela ter seguido na área do pai. Alguns insinuavam que foi ele que a inseriu no mercado.

Apesar do plano estar andando de acordo com o pensado, eu precisava me certificar de todas as incógnitas, e ainda havia algumas me incomodando. Não conseguia tirar da cabeça o fato de quem seria esse “investidor” que havia clamada ao Górki por meus serviços. Eu não devia me preocupar com isso, mas no fundo, me pinicava a dúvida sobre a sua identidade.

Minhas pesquisas não estavam sendo muito proveitosas, já estava a horas lendo notícias sobre Dorsey e sua trajetória no mercado da construção civil, mas nada de extremamente importante. Eu precisava ter acesso aos dados do inquérito que a polícia mantinha em sigilo. Já havia algum tempo que eu havia invadido um sistema policial, mas eu não estava tão enferrujado assim.

Peguei meu notebook na minha bolsa e o liguei ao lado do computador. Coloquei meu configurador de sinal no notebook para conectar ao sinal de dados do computador e parear os dois. No site da delegacia, fui até a página de inquéritos. Tinha como acessar com login e senha em uma página específica para ver os inquéritos. Seria tão mais fácil com o sinal de dentro da delegacia. Mas eu não estava com a menor disposição de ir até lá, e não podia ser assimilado com Dorsey de maneira alguma. Então o jeito seria modificar o sinal da minha conexão para que se passasse pelo da delegacia. Fui fazendo isso no notebook enquanto, no computador, rastreava os policias e delegados em exercício para hackear seus usuários do sistema e conectar como se fosse um deles. Quando consegui descobrir o acesso de um dos delegados, fui finalizar a camuflagem da conexão para entrar como se fosse o sinal interno da delegacia. “O governo podia pagar por um sistema mais seguro para o departamento de justiça, não me espanta os presos o invadirem constantemente”.

Assim que consegui, associei o sinal camuflado ao IP do meu computador e fiz o login com as credenciais do delegado no portal. Procurei pelo inquérito de Dorsey. “Operação Rosa Carmesim”, realmente, a criatividade dos policiais era muito maior que sua efetividade prática para a ação de combate ao crime. Fui abrindo e examinando todos os documentos anexados no inquérito da operação, já havia inclusive prova pericial que comprovava que as balas nos corpos encontrados no posto haviam sido disparadas da arma com a qual Dorsey foi autuado. Pobre homem, a definição exata de estar no lugar errado no momento errado. Fotos do crime, histórico das vítimas, documento anexados, analisei tudo que estava lá. O relatório do inquérito era imenso, e igualmente impreciso.

— É possível incriminar qualquer um com isso. – Acabei soltando em voz alta.

Não que me espantava a incapacidade de precisar os fatos, mas era incrível como uma resposta rápida ao pulsar social podia vir com a derrota total da presunção de inocência do primeiro acusado. Para mim, isso era uma carta na manga, meu trabalho em plantar provas para conseguir confirmar a culpa de Dorsey estava extremamente reduzido. No relatório, não constava, entretanto, detalhes significativos acerca do depoimento das testemunhas. Não constava também, no inquérito, qualquer gravação da cena, porque o posto não tinha sistema de câmeras de segurança em funcionamento. Nem a caixista nem a garçonete afirmaram a presença de mais ninguém além das pessoas presentes quando a polícia encontrou. Ou seja, a minha presença sequer foi mencionada. Procurava ansioso pelo depoimento da secretária Suzanna, mas não parecia encontrar de modo algum. Ansioso por encontrá-lo, desci a página e lá estava.

A Secretária de Desenvolvimento Energético do Governo Estadual, Suzanna Monte Cruz, não deu depoimento junto com as demais testemunhas, por ter sido internada em hospital devido aos danos que a mesma sofreu no atentado ocorrido no local do posto. Após sua alta, compareceu a esta Delegacia e nos informou, em resumo, o mesmo narrado pelas demais testemunhas. Em descrição:

Disse que havia parado no posto com os demais membros do governo para abastecer e se alimentarem. Disse que estavam vindo de uma viagem de negócios do governo e estavam em função. Disse que não se lembra muito dos detalhes devido a seu desmaio. Disse que igualmente não se lembra do motivo pelo qual desmaiou. Disse que também não se recorda de quem estava no posto, além dos demais membros do governo e da caixista e da garçonete.

O relatório continuava, nas análises citava os resultados das perícias. Procurei na página do inquérito do arquivo com os dados da perícia. Tinha no mesmo os resultados das necropsias dos corpos encontrados. Dois deles foram identificados sendo os seguranças que acompanhavam a secretária. Os restantes foram identificados como sendo: os dois secretários de assuntos estratégicos da Vernach Co., empresa com sede no estado e atuação no ramo da construção civil; e os três restantes, identificados por familiares, exerciam a função de seguranças particulares. No relatório, a referência aos resultados das necropsias apontava os três seguranças como prováveis seguranças particulares dos membros da Vernach, todavia, não encontraram em seus documentos vínculos empregatícios formais que confirmassem tal apontamento, e os parentes, igualmente não sabiam, nos três casos, o real empregador dos mesmos. O relatório novamente citava trecho do depoimento da secretária Suzanna no qual ela foi indagada sobre a presença dos membros da Vernach no mesmo local que os membros do governo, no mesmo horário.

Disse a Secretária que a presença das demais vítimas, apontadas como membros da empresa Vernach Co., não tinha qualquer relação com os agentes do governo que a acompanhavam, nem com a própria. Disse ainda que acredita ser apenas força do acaso eles terem igualmente parado para lancharem e abastecerem naquele posto.

De certo eu sabia desse encontro entre a secretária Suzanna e os membros da Vernach pelas mensagens que ela andou trocando com Augusto, pelo celular dele que eu havia grampeado. E pelo visto não é da vontade nem do governo, nem da Vernach tornar pública essas negociações, visto que a própria empresa não soltou nota alguma. Apesar de toda a incompetência que pode se esperar da atuação investigava dos policiais, ao fim do relatório tinha a propositura de se investigar o que os membros da Vernach faziam no posto, caso fosse de conhecimento da empresa, pedindo que os responsáveis por tais empregados fossem ouvidos. Pelo visto, esse pequeno incidente interferiria nos planos do governo e da Vernach. Eu precisava ficar atento nos próximos passos de Augusto e de Suzanna.

Analisado todo aquele material, encerrei tudo e desliguei o computador e notebook. Tinha ficado por horas a fio em minha sala estudando tudo aquilo. Já era quase onze da noite, todos deviam ter ido embora e eu devia ser o único ainda ali. Acho que pela imagem que tinham de mim, ninguém foi me avisar em minha sala, preocupados em incomodar. Ou talvez só não deram conta de que eu estava ali, afinal, eu não vou para empresa todos os dias e mantenho a discrição em serviço, quase ninguém percebe quando eu estou ou não. Inclusive Rowney, se bem que ele deve ter ficado receoso de me incomodar. Juntei todas minhas coisas e fui até o elevador.

Organizava tantas informações em minha mente que nem me dei conta de que, quando o elevador tinha aberto, ainda não era o estacionamento. Ao tentar sair do elevador, fui barrado por uma figura meio fantasmagórica que apontou na minha frente.

— AAAAAHHH!!! – Gritou aquela pessoa parada na entrada do elevador.

Eu me assustei com ela e com seu grito, se não pensasse rápido, teria a acertado com um golpe bem no meio do pescoço.

— Me desculpe! Eu não sabia que ainda tinha alguém aqui. Eu fiquei até mais tarde trabalhando e acabei me perdendo por aqui. – Saía mil palavras por segundo da boca daquele ser esbaforido e agitado, juntando todos aqueles papéis que deixara cair ao gritar. Segurei a porta do elevador para que ela entrasse e as palavras continuaram sendo lançadas como tiros de uma metralhadora automática.

— Está tudo bem. – Disse para ela enquanto segurava a porta do elevador. – Quem é você à final de contas?

— Ãnh? Nossa, me desculpe. Eu sou Helga, sou a nova estagiária da empresa no departamento de RH. Eu comecei nessa semana. Apesar de não ser muito dentro da área de jornalismo, que eu estou quase formando, eu achei uma ótima oportunidade. Quis mostrar que sou capaz de me encaixar no perfil da empresa e fui dar conta de todos os formulários que precisavam ser organizados e enviados e fiquei por conta de deixar tudo pronto, mas era muito serviço, não que eu me importe em ficar até mais tarde no trabalho, longe de mim, para mim isso é uma honra. Mas eu completamente me esqueci que o ônibus para minha casa para de circular as onze e meia da noite e eu...

— Você quer uma carona para casa? – Foi a primeira coisa que pensei em dizer para fazer com que aquele ser não morresse por falta de ar de tanto falar.

— Nossa. Eu adoraria! Seria de muito bom uso essa carona, mas eu não quero te incomodar de jeito algum. E também talvez fique fora da sua rota e...

— Sem problemas, vamos, o carro está logo ali. – Disse e saí andando assim que a porta do elevador abriu no estacionamento. Entramos no carro e eu nem precisei perguntar onde ela morava para que ela me desse todas as direções e caminhos possíveis de chegar até sua casa, na verdade, eu não precisava perguntar nada para que ela falasse. Ela simplesmente falava.

— E assim eu consegui essa vaga de estágio. Tenho que falar que o processo seletivo é extremamente concorrido, mas igualmente bem elaborado pela comissão do RH, eu elogiei bastante eles quando nos pediram esse feedback. Você não é do RH, é? Eu nem te perguntei quem você é? Eu já me apresentei e comecei a falar, esqueci completamente de perguntar seu nome e...

— Nolan. Me chamo Nolan. Sou o chefe executivo da empresa.

— Nossa, que bacana! Eu ouvi dizer que o departamento de vocês está com um novo projeto que é imenso, todo mundo no RH comenta. Não que eles fofoquem de vocês, nada disso, não quis delatar ninguém, eles apenas falaram que vocês estão encarregados de um grande projeto, na verdade apenas elogiaram muito o trabalho de...

— Você está com fome? Deve estar né, o dia inteiro trabalhando lá. Vou parar nesse drive thru e comprar algo para nós. – Meu Deus, espero que se ela comesse algo não tenha tempo de falar, eu não conseguia acompanhar a velocidade dos assuntos que ela falava, eu precisaria de um treinamento intensificado de uns dez anos para isso.

— O que você quer comer?

— Ah eu acho que vou querer só a promoção do dia, não trouxe muito dinheiro. Minha mãe bem que me disse que eu devia andar com dinheiro, porque eu ainda não recebi e não podia estar despreparada para qualquer imprevisto. Inclusive eu perdi meu ônibus hoje e já tive que pegar um táxi e...

— Não se preocupe, eu vou pagar. Vou pegar o mesmo do meu para você também, ok?

Saindo do drive thru, olhei para o cruzamento e esperei o sinal abrir. Reparei que ela não estava comendo e aquilo me aterrorizou.

— Você não vai comer?

— Ah, eu não quero sujar seu carro, ele está tão limpo. É muito chato quando você mantém algo limpinho e depois alguém suja tudo, sem falar...

— Não tem problema algum. – Acho que respondi na mesma velocidade que ela, mas o medo de ter que ficar ouvindo aquelas palavras atiradas na velocidade da luz até o fim do caminho me fizeram agir impulsivamente. – Pode comer, não liga de sujar. Isso não é nada.

Ela abriu o lanche e enquanto desembrulhava foi falando de tudo que estava ali e explicando o quanto era nutritivo aquele lanche, mas que ao mesmo tempo a cultura de fast food era perigosa e estava deixando as pessoas relaxadas e despreocupadas com suas saúdes. Quando ela deu a primeira mordida no hambúrguer, o alívio em minha alma foi avassalador.

— Está delicioso. – Disse ela. Mas dessa vez, ela disse apenas isso, e continuou comendo. Durou cerca de cinquenta segundos o silêncio até a próxima investida de palavras.

Seguia dirigindo, mesmo com aquela pessoa dividindo seu tempo entre comer e narrar histórias helênicas sobre qualquer trivialidade, aquilo um pouco que me tirava a cabeça do tanto de informação que eu tinha visto durante o dia. Quando virei na próxima esquina fiquei atento pelo retrovisor, tinha percebido desde a saída do drive thru, mas precisava confirmar. Estava sendo seguido.

Acelerei e comecei a entrar por entre algumas ruas e cortar alguns carros, vi que o carro que me seguia fez o mesmo. Assim que percebeu que eu havia notado, não fez qualquer questão de disfarçar.

— Eu acho que você errou a entrada. Mas talvez você saiba um outro caminho, é só que aquele é o caminho que eu tinha te avisado que era o com melhor custo benefício analisando o tempo pelo gasto de gasolina e também tendo em conta o menor número de casas noturnas tendo shows agora e ...

— Eu talvez precise pegar um outro caminho se você não se importar, parece que o que você falou não vai rolar.

— Ah, tranquilo, sem problemas. Eu só tinha dito porque... – Ela continuou declamando todas suas explicações, não notou de modo algum o que estava acontecendo. Era bom que ela ficasse entretida falando para que não desse alguma margem para perceber que estávamos no meio de uma perseguição. Fiz uma expressão de que estava atento ao que ela falava, abaixei o volume do rádio e comecei a dizer “uhum” e “sério?” após de cada frase dela, e parece ter funcionado, ela se empolgou e não parou mesmo de falar.

O carro que nos seguia não dava margem para despistá-lo, estava extremamente bem em não nos perder de vista. Eu mantinha acelerando e desviando por qualquer esquina ou cruzamento que se abria em minha frente, cortei ilegalmente pela direita uma série de carros, e ele parecia não se preocupar em igualmente infringir as leis de trânsito. Pelo jeito, ele não estava mais apenas me seguindo. Aquilo já havia virado uma caça.

Estávamos nos aproximando de uma enorme intersecção de ruas no centro da cidade, vi de longe que faltavam trinta segundo para o semáforo da minha faixa fechar, as ruas estavam vazias, acelerei com toda força e vi que ele me seguiu. Chegando perto do semáforo, mudei para a faixa da direita, faltavam dez segundos, mudei bruscamente para a marcha ré, virei o carro cento e oitenta graus e segui na saída à esquerda da via que vinha, peguei a primeira entrada pela esquerda e segui dirigindo.

— Meu Jesus!!! – Soltou ela segurando no apoiador do carro. – Isso sim é uma manobra bem executada. Como chamam isso mesmo, cavalo de pau... autogiro...

— Acho que o despistamos.

— Despistamos? Quem? Algum daqueles trenzinhos alegóricos que correm a cidade à noite com pessoas fantasiadas e gente alcoolizada? Foi por isso que virou tão radicalmente não foi? Isso super justifica, eles são a pior invenção legalizada nessa cidade.

— Ãnh? – Aquela menina tomava alguma coisa pesada. – Não, nada disso. Na verdade, nada não, só pensei alto, esquece. – Acabei sorrindo após dizer isso, não acredito no que tinha acabado de acontecer e com o que ela tinha dito ainda por cima, era de jogar qualquer tensão para os ares.

— A psicologia enquadra isso como um ato falho. Bom, eu não sou psicóloga, mas sou muito a favor da interdisciplinaridade, por isso fiz e faço algumas cadeiras de outros cursos na faculdade. Segundo a associação de .... – Ela continuou como se nada tivesse acontecido, não deu a menor preocupação ao fato de que eu simplesmente fiz uma manobra super ilegal no centro da cidade em cima da faixa de pedestre para escapar de alguém que estava nos perseguindo com intenções nada pacíficas. Essa era uma das quartas mais foras do comum, e olha que quartas-feiras são dias extremamente tendentes a coisas fora da rotina, mas isso era demais.

— Chegamos. – Disse para ela, que estava falando alguma coisa sobre qualquer coisa. – Desculpa ter atrasado e mudado a rota. Mas está em casa, sã e salva.

— Ah, sem problemas, eu que agradeço. Sem você estaria perdida ainda naquele prédio e sem como voltar pra casa. Ainda me comprou um lanche delicioso. Tivemos uma ótima conversa, espero que nos vejamos mais na empresa para conversarmos mais. Foi um prazer. Ah, a conversa está boa, mas é bom eu ir porque minha mãe deve estar preocupada, eu não avisei nada e ela fica bravíssima com isso. Boa noite.

Ela saiu do carro e eu nem consegui dizer boa noite. Afinal de contas, o monólogo dela com ela no carro parece que a agradou. Confesso que foi divertido. Mas tudo que eu precisava agora era ir para casa, tomar um bom banho e dormir.

Fiz a conversão ali mesmo e retornei. No caminho até o meu apartamento, observei para ver se não estava sendo seguido. Aquilo não me agradou nem um pouco. Normalmente eu teria ido até algum lugar onde desse para desmascarar quem era, mas eu não estava sozinho, não podia por ela em risco, nem a minha identidade. Eu tinha que ficar mais atento pelas ruas dessa cidade.

Quando cheguei na garagem do meu prédio, só conseguia andar pensando em cair na banheira e tomar um banho relaxante. E foi exatamente o que fiz.

— Essa quarta foi a quarta! Que dia enorme. Estou até falando comigo mesmo hahaha.

Depois de tomar meu banho, me arrumei para dormir. O resto de forças que tinha me guiaram até minha cama. Deitei e abracei o travesseiro do lado esquerdo. Senti o perfume de Hugo e o abracei forte, aquilo me fez adormecer de uma forma extremamente pacífica e harmoniosa.

Acordei extremamente derrotado de cansaço, parecia que tinha saído de uma tumba depois de milhares anos jogado lá. Ainda estava abraçado ao travesseiro, voltei a fechar os olhos e imaginar que Hugo estava ali. Uma notificação apitou no meu celular. A ignorei e continuei abraçado no travesseiro. Não passou nem um minuto e outra notificação chegou. E mais uma. E outra. E seguiram uma meia dúzia. Peguei o celular e fui ver quem estava a me incomodar logo cedo numa quinta-feira. Eu nem ia para a empresa hoje, não queria saber de nada de lá. Meu mal humor logo mudou para uma atenção exclusiva a tela do celular quando vi que eram mensagens de Hugo.

Hey Nolan ^_~

Bom dia!

Como você tá? Teve uma boa noite de sono? Espero que tenha tido sonhos legais >_

Queria saber o que você vai fazer hoje à tarde...

A minha turma vai assistir uma palestra de uma construtora, tá tendo um workshop de inovação da construção civil e é uma empresa que tá patrocinando e organizando, aí eles vão fazer um evento para os alunos do curso de Arquitetura e o pessoal da Engenharia Civil. Vai ser uma palestraagora pela manhã, e deve acabar na hora do almoço... Pensei que talvez, se você não tiver ocupado, e tiver afim, poderia te ver depois, de tarde...

Mas talvez você esteja cheio de coisas para fazer, então se você não puder está tranquilo.

@_@

Estava pensando em você, então foi isso.

É isso.

Beijos... Yobo

“Ele realmente disse Beijos e me chamou de querido em coreano? Esse garoto não existe...”, como podia ser mais adorável alguma criatura nesse mundo? Hugo, Hugo, não era sensato o que você buscava em mim, e era mais irracional ainda eu deixar e instigar esse sentimento.

Bom dia Hugo (o⌒.⌒o)♥

Agora que eu acordei e a primeira coisa do meu dia foi receber algumas mensagens suas, meu dia está ótimo 。◕‿◕。 Dormi bem sim, mas o melhor sonho eu tô tendo acordado!

Se você quer saber o que eu vou fazer essa tarde, bom, essa tarde eu tô com minha agenda toda ocupada. Vou passar minha tarde com o senhor hahaha
(⌒.−)=★

Onde vai ser esse evento? Já que vai acabar no horário do almoço, vou te pegar lá e nós vamos almoçar juntos!

Que bom que você estava pensando em mim... você nunca escapa dos meus pensamentos

(ღ˘⌣˘ღ)

Levantei da cama e fui me arrumar, saber que eu ia passar a tarde com ele me motivava a ficar mais esperto e nem parecia que já estive cansado algum momento da minha vida. Aquele garoto estava tendo um impacto em mim que não dava para mensurar.

Enquanto eu me arrumava, vi que ele me mandou uma mensagem. Ele compartilhou a imagem do evento que ele recebeu na faculdade dele, lá estava escrito que era um evento da DAZus para os estudantes de Arquitetura e Engenharia Civil, só um puro interesse de se destacar frente as outras empresas. De todo jeito, ia acabar de me arrumar e tomar um café, ele só ia sair na hora do almoço, então tinha algum tempo.

O telefone tocou e quando vi que era Rowney, percebi que talvez não teria esse tempo livre mais.

— Nolan, eu sei que você não vem para a empresa hoje, mas teria como dar um pulinho aqui agora pela manhã, coisa rápida.

— Aconteceu alguma coisa?

— Tinha um negócio no relatório que eu deixei passar em branco e o setor especial só vai encaminhar a papelada para o banco se você assinar também.

— Está bem, daqui a pouco eu chego aí.

Esse pessoal da empresa parecia ter um oráculo para avisá-los sempre que eu tinha algum tempo livre deles. Tomei meu café e terminei de organizar tudo para sair, de lá já iria encontrar Hugo.

O trânsito estava realmente pesado naquela manhã, e o caminho pelo centro estava um caos, resolvi passar por um caminho alternativo, ia demorar mais, mas provavelmente estaria mais tranquilo por lá. Enquanto dirigia pelas ruas daquele bairro, senti uma sensação desagradável em mim. Parado no semáforo, estava olhando pela janela do carro, o sinal abriu e eu segui, mas pouco mais na frente o outro semáforo estava a segundos de fechar, mudei para a faixa da direita, ia pegar aquela saída, e fiquei esperando o sinal ficar verde. Faltava mais de um minuto para o semáforo abrir, estava um silêncio inquietante naquele lugar. A calmaria foi rompida por uma van preta que passou arrebentando o retrovisor de todos os carros que estavam na faixa da esquerda, estava em uma velocidade muito acima da permitida naquele lugar, atravessou pelo sinal fechado e quase atropelou alguns pedestres que estavam na faixa. Os motoristas da faixa da esquerda saíram todos de seus carros e ficaram perplexos com o que tinha acontecido, xingaram o motorista da van, mas ele já estava bem na frente, dirigindo a toda velocidade, até fazer uma conversão e sair de vista. Ver aquela van se distanciando até me sumir, despejou sobre mim uma sensação horrível, um aperto em meu peito que eu não sabia explicar de onde vinha. Se acreditasse nesse tipo de coisa, diria até que sentira algum presságio. Por um segundo pensei em segui-la, para ver quem era aquela pessoa, mas olhei para o relógio, não tinha tempo, senão ia me atrasar para encontrar Hugo, já não estava tão cedo assim. O sinal abriu, fiquei aliviado por ter mudado de faixa, caso contrário, uma hora dessas, estaria sem meu retrovisor direito.

“Deve ser algum idiota sem carteira que se acha o cara por dirigir assim”, pensei enquanto arrancava o carro e virava para a direita e segui para o prédio da HG+.

Rowney estava me esperando no estacionamento, parei o carro na minha vaga e ele entrou.

— É tão urgente assim que você veio me esperar aqui no estacionamento?

— Eu sei que você odeia vir aqui mais do que uma vez na semana, e como é só uma assinatura que eu preciso, pensei em te esperar aqui que você já assina no seu carro e pode ir embora. Se bem que uma das estagiárias perguntou por você hoje.

— Nossa, me dá esse papel aqui e deixa eu assinar e ir embora antes dela materializar aqui. Se for quem eu tô pensando, foi a nova estagiária, dei carona para ela ontem, mas ela não para de falar por um milissegundo, e ela fala numa velocidade que eu não sei como as cordas vocais dela não estouraram ainda.

— Então é essa mesmo, eu fiquei aterrorizado com vi hoje, ela tem um superpoder, isso sim.

— Aqui, se for só isso que você precisa, eu já vou indo.

— É só isso mesmo, obrigado Nolan. Agora pode voltar para seu antro de atoice.

— Humpf... ninguém nesse lugar trabalha mais que eu, depois desse projeto, eu vou é pedir minha aposentadoria.

— Ai ai... Ah, antes que eu me esqueça, você viu? Parece que a situação do Dorsey tá ficando cada vez pior, acharam alguns arquivos no computador pessoal dele, liga ele diretamente ao crime. Algumas coisas que ele andou pesquisando sobre a agenda oficial da secretária e esse tipo de material. Além do mais, acharam um cofre na casa dele, estava semicerrado, as impressões digitais da última pessoa que abriu eram dele e lá dentro estava cheio de munição, da mesma que foi usada no ataque no posto.

Olhei para Rowney e apenas fiz uma cara de ouvinte atento.

— Eu não ando acompanhando os noticiários com tanta frequência.

— Pois é... Nossa, que esquisito, você ouviu esse barulho, parece algo grande, que estranho...

— Eu não ouvi nada, você tá é ficando perturbado Rowney.

— Não duvidaria hahaha. Deixa eu ir então, até mais Nolan.

Ele saiu do carro e eu dirigi para fora do estacionamento. Fiquei repassando o que ele me disse sobre Dorsey, mas algo não se encaixava. As armas que eu usei, são extremamente controladas na Rússia, não são tão fáceis de saírem de lá, o Górki, ele mesmo, as trouxe para mim. E o Dorsey não parecia o tipo de homem que guardaria munições de arma, ainda mais dessas, em um cofre. Isso parecia muito ter sido plantado, mas não foi eu que fiz isso, eu nem sequer fui na casa dele. Alguém estaria plantando provas nesse caso para incriminar o Dorsey? Mas quem? E para quê?

Tudo isso ficou martelando na minha cabeça e eu acabei esquecendo por um tempo que ia me encontrar com Hugo. Peguei meu celular e vi que ele não estava online desde cedo, provavelmente pelo evento que ele estava participando. Mandei uma mensagem para ele falando que ia esperá-lo do lado de fora do prédio da DAZus.

Segui dirigindo até lá e lembrei de Rowney falando que tinha ouvido um barulho estranho. Aquilo imediatamente me trouxe uma sensação horrível, a mesma que senti quando vi aquela van preta passando. Um aperto tomou conta do meu coração, fechei o olho e pus a mão no peito. Os abri com o carro atrás de mim buzinando para que eu andasse, tinha parado o carro do nada e ele quase batera em mim.

Um pouco mais a frente, quase chegando no prédio da DAZus, um congestionamento enorme. Por uns cinco minutos fiquei parado e nada do trânsito andar. Algumas ambulâncias e carros de bombeiros passaram correndo pela contramão. Aquilo era muito estranho, era pouco mais de meio dia, mesmo assim não era motivo para ter um trânsito assim. Talvez algum acidente tivesse ocorrido, mas pelo número de ambulâncias e bombeiros, não parecia ser algo simples. Desliguei o carro e saí para olhar, alguns motoristas estavam do lado de fora. Tinha uma fila enorme de carros e uma multidão de pessoas faziam um bloqueio no fim da rua.

Fui me aproximando, o aperto em meu coração estava maior ainda. Um helicóptero passou reto cortando os céus. Vi um motoqueiro na fila de carros e parei para perguntá-lo o motivo daquele engarrafamento todo.

— Parece que acabou de acontecer uma bagunça ali na frente. Uma van invadiu para dentro do prédio de uma empresa que fica mais na frente nessa rua e estava carregada de explosivos, a explosão foi enorme, você não ouviu? Eles estão evacuando todos do local, parece que a estrutura do prédio ficou danificada e tem chances do prédio desabar.

— Uma van? Mas que prédio, de que empresa?

— Parece que é daquela que é construtora... DAZus, algo assim.

Ouvir o nome da DAZus ressoou em todos meus sentidos, saí correndo dali e me enfiei no meio daquele monte de gente. Aquelas pessoas todas, ocupavam toda a rua, mal dava para ver o que estava à frente. Aquele homem falando DAZus ficou repetindo na minha cabeça e eu senti que tudo estava passando acelerado pelo meu cérebro, mas como se ao meu redor, tudo estivesse fora de sintonia, eu sentia que eu mesmo iria explodir. Todas aquelas pessoas na minha frente, estavam espalhadas por uns cem metros, mas pareciam quilômetros. Uma corrente policial marcava o fim daquela multidão. Não liguei para aquilo e atravessei o bloqueio.

— Senhor! Senhor! Retorne imediatamente! Essa área está em risco, o senhor não pode ficar aqui! – Gritou um policial em minha direção. Eu não dei a menor atenção e continuei andando. Senti um puxão em meu braço me arrastar para trás.

— O senhor está me ouvindo! O prédio está com risco de desabar, estamos evacuando todo o local, o senhor não pode ficar aqui, por favor volte!

Eu não conseguia nem prestar atenção no que aquele policial dizia, tentei continuar andando, mas ele forçou meu braço para me impedir. Retornei minha razão para aquilo, para mim mesmo, o encarei e vi que ele não soltaria meu braço.

— Eu preciso passar, eu não posso perder tempo aqui.

— O senhor não pode! Estamos evacuando aqui, isso está em zona de risco.

Olhei para frente e a uns duzentos metros estava o prédio da DAZus, uma enorme fumaça saía dos primeiros andares, junto de um fogaréu imenso. Minha alma parecia ter abandonado meu corpo e o deixado congelar. Não conseguia raciocinar bem para discutir com aquele policial. Ele estava segurando meu pulso direito, me virei de novo para o prédio em chamas.

— Eu preciso. Eu tenho alguém lá que precisa de mim...

— Senhor, nós estamos evacuando todos, o senhor pode deixar que a polícia vai... – Apliquei um golpe no braço daquele policial e, assim que ele me soltou, saí correndo em direção ao prédio.

— HEY!!! Atenção, todos os policiais, parem aquele home! AGORA!

Uns três ou cinco policias correram atrás de mim, mas não parei, continuei acelerando minha corrida em direção ao prédio em chamas.

— PARE! O SENHOR PARE AÍ AGORA! RESPEITE A POLÍCIA E...

Foi só o que deu para ouvir antes daquela explosão. Foi tão forte que uma enorme quantidade de fumaça e vento veio em alta velocidade em minha direção. O barulho foi enorme. Uma escuridão tomou as ruas por alguns segundos, pela fumaça que se espalhou. As cinzas estavam quentes, mas não me impediram de continuar seguindo em direção ao prédio. Continuei correndo e um segundo após, um enorme o estrondo irrompeu os ares. O prédio começou a ruir.

Vi os primeiros andares cederem e os de cima começarem a cair. Aqueles enormes blocos de concreto, placas de vidro e cabos de aço, tudo despencavam dos ares e se arremessavam ao solo como meteoros cadentes. Um dos policiais me alcançou e me puxou pelo pulso, mas um tremor balançou sob nós e ele me largou. Continuei correndo, mas um outro abalo agitou toda aquela rua. O tremor foi enorme. Me fez cair de joelhos no chão. Vi aquele prédio todo ruindo e desabando ao chão. Todo aquele instante, os segundos pareceram terem sido congelados pelas eras. Aos meus olhos, tudo se passou como se estendesse por séculos. Tudo que eu presenciava parecia desligar todos meus nervos em meu corpo. Vi. por lentas câmeras, andar se chocar contra andar daquele prédio, em direção ao solo, atraídos pela gravidade. A enorme explosão de fumaça e cinzas que subia pelos ares parecia escalar os céus em direção a ao espaço, para depois retornar como um impiedoso titã de volta à Terra.

Meus olhos não estavam fechados, mas tudo que eu comecei a ver foi o rosto de Hugo. Lembrei da primeira vez que o vi, na lanchonete quando ele deixou cair o chiclete. Lembrei de quando ele estava encharcado em meu carro me encarando em nosso primeiro encontro. Lembrei da sensação que meus dedos sentiram ao tocar seu rosto, aquela pele macia, o pulsar de seu coração quando o beijei pela primeira vez no banheiro do meu quarto. Os beijos que trocamos, o compartilhar de emoções que se passava por nossos lábios e a sensação de nunca ter me permitido tamanha vulnerabilidade, mas aquilo era o que fazia meu coração bater de uma forma à qual jamais havia batido antes. A imagem de quando patinamos juntos, seu corpo abraçado ao meu, seus passos medrosos no salão e ele sentindo confiante em meus braços. A sensação de o ter comigo, lembrei do momento em que o tive completamente em meus braços em meu quarto, naquele dia à noite, ele achou que estava sendo inseguro e se mostrando completamente vulnerável, mal sabia ele que a insegurança que corria em mim era enorme, mas estar ali com ele me fazia ser capaz de enfrentar tudo e todos.

Enfrentar todos, eu enfrentaria qualquer um e qualquer coisa para salvar ele. Tudo voltou a acontecer em tempo real, vi o prédio ruindo ao chão e eu precisava o resgatar dali. Minhas pernas fraquejaram quando tentei levantar, pensar que ele estava ali me desnorteou, mas ao mesmo tempo, saber que eu precisava salvá-lo me deu forças. Apoiei-me para levantar e correr em direção aquela tumultuosa fumaça que se abria em minha direção. Foi quando senti várias mãos me segurando e me carregando pelos ombros e por debaixo dos braços.

— HUGO! HUGO! POR FAVOR NÃO! ME DEIXEM IR SALVÁ-LO! HUUUGGGOOOOO!!!!!!!!!


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