Culpa e Perdão: O pior de uma mente apaixonada escrita por NightlyPanda


Capítulo 15
Capítulo 15 - Caminhos e Mentes Apostados




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            Era impossível parar de admirar aquele doce olhar. Ele estava de volta para mim e eu queria o envolver em meus braços e nunca mais soltá-lo. Chegava a me desconcertar a forma como eu estava dependente dessa sensação, eu jamais dependi de nada na minha vida, mas sem ele, era como se eu hibernasse, como se não tivesse propósito em continuar acordado. De repente, foi mesmo ele que me fez ter razão para querer estar acordado.

Deitados naquele sofá, ele encostava seu corpo sobre o meu e eu cobri seu torso com minhas mãos. Tinha nos servido uma garrafa de vinho, queria que desfrutássemos aquele momento da forma mais boêmia possível. Eu não pensava em nada, não conseguia dizer nada, apenas estar ali abraçado com ele, sentindo a ternura que seu corpo trazia sobre o meu, me deixava contente.

— E como foi a semana para você, Nolan?

Dedilhava meus dedos sobre seus braços, estava tão concentrado em tê-lo comigo que não me dei conta de que estava sendo chamado. Ele me encarou, repetiu meu nome e perguntou se eu estava acordado. Ter seus olhos conectados aos meus me fez ficar ainda mais perdido.

— Ãnh? Ah, minha semana foi, bem, atarefada... – Lembrei então do meu contato com o governador, lembrei também da sexta naquele galpão à beira do rio. Aquelas duas. Pensar nelas me fez relembrar do machucado no meu ombro esquerdo. Ainda bem que estava de suéter, não queria Hugo vendo aquilo. – A empresa está tendo alguns compromissos delicados, eu tô tendo que resolver bastante coisa esses dias, então tive muito trabalho.

— Eu não sabia que você estava tão ocupado assim. Você deve ter muita coisa para fazer, além de que hoje é domingo, deve estar cansado, não precisava ir me buscar no aeroporto, eu não queria ter te dado trabalho.

— E onde nesse universo que eu não estava morrendo de saudades de você? – Apertei meu abraço sobre ele e aproximei ainda mais meu rosto de seu pescoço. – Eu trabalhei bastante mesmo essa semana, mas em nenhum segundo você me saía da mente. Eu não teria como descansar de outra forma se não te vesse hoje.

O sorriso envergonhado em seu rosto era uma obra de arte.

— Mas eu quero saber de você, me diga da sua viagem, você voltou até acompanhado. – Aquela filhote de Husky siberiano deitada no colo dele, adormecida, era realmente uma fofura, mas confesso que ao ver que ele estava com uma bolsa de viagem para cães no aeroporto, eu me espantei.

— Naíma foi a melhor coisa dessa viagem, com certeza. – Disse ele a acariciando. O leve grunhido que ela soltou, parecia estar afundada em um delicado sonho. – Foi uma semana bacana. Eu sinto como se tivesse ido ao encontro de muitas memórias do meu passado que eu sequer sabia que existiam. Descobri muita coisa também sobre o que aconteceu... – Ele puxou um cordão para fora da sua blusa, parecia um amuleto. O ficou encarando, sua respiração começou a ficar pesada. – Bom, tem muita coisa passando na minha cabeça, eu preciso por tudo em ordem e tomar algumas atitudes. Mas nesse momento, eu não quero pensar em nada que não seja no quão confortável é estar deitado sobre você.

Coloquei uma mão sobre seus cabelos e os baguncei. Ele estava um pouco diferente de como estava antes de viajar, seja lá o que aconteceu nessa semana, ele parecia um pouco mais seguro e determinado. Ouvi-lo dizendo que precisava colocar seus pensamentos em ordem e tomar algumas atitudes me fez lembrar que era exatamente isso que eu tinha que fazer, em relação a essa história do governador e das construtoras, e agora, essa Martha...

Só que eu ia seguir o que ele disse e me preocupar apenas com nós dois nesse momento. Virei sua face para mim e passei meu rosto pelo seu pescoço. Naíma percebeu que ali não seria o lugar mais adequado para ela ficar e desceu para o chão, saiu andando em direção aos fundos. Sentindo o aroma de sua pela, captava cada poro de seus braços que se arrepiava, os acalmava com minhas mãos, o conduzindo a se deixar ser tomado pelo meu corpo que o cobria. Atraí todo seu corpo a se virar para mim. Fui subindo meu rosto por sua garganta, molhando o caminho com meus lábios até seu queixo, onde me deixei naufragar por completo. Minha mão esquerda já o contornava por trás e o segurava de encontro ao meu ser, mesmo o dominando pouco a pouco, eu sentia como se ele me conduzisse para o domar. Seus braços se dependuravam sobre meu rosto, apossando de minha nuca, aqueles gélidos dedos encostavam ao centro das minhas costas, se alinhavam pelo encontro dos meus ombros e me impulsionavam para me debruçar sobre ele.

Seus dedos então me deram o comando, se forçaram contra minhas costas, me fazendo o derrubar de costas sobre o sofá e me apoderar daquele corpo deitado sobre o meu, senti sua perna direita acorrentar o inferior do meu dorso e, logo, seguida pela esquerda, algemá-lo por completo. Os dedos que seguravam minhas costas, subiam por minha nuca até o topo da minha cabeça, passaram como rastejando por meu rosto, descendo pelo meu pescoço o colonizando naquela sensação que acalmava o ardor que se instaurava em mim. Caminharam sobre meu corpo até minha cintura. Como duas serpentes que se rastejam fazendo seu o solo que percorrem, ele me tomou naquele toque enquanto eu conectava nossas essências por nossos lábios. A mão direita se cobriu por dentro do meu suéter e se posicionou ali, sobre meu abdômen, em sutis e cronometrados movimentos circulares. Enquanto isso, os dedos de sua mão esquerda se viravam para a pele da minha virilha, como quem atiça e chama para ser perseguido, me fez ir ao seu encontro, mas antes de tocá-lo, os levou para a lateral do meu quadril, e brincando de se esconder, ficou me chamando a achá-los.

Em cada movimento que fazia com seu corpo, ele incendiava ainda mais a vontade que queimava em mim. Fiquei sentado sobre ele e o encarei profundamente, nossos olhares nos despiam. Preferi não deixar apenas assim, e retirei meu suéter, que caiu sobre seu rosto. Ele retomou suas mãos para o suéter e o aprofundo contra a maçã de sua face, inalando profundamente o tecido que o cobria. Não me contive, o arranquei de cima dele e o puxei em minha direção, sentado sob mim, ele me chamava a acertar seus lábios com os meus. Ele era um ou dois centímetros mais alto que eu, mas naquela posição, estava um pouco maior que ele, o que me fez ainda mais dominador da situação. E assim o fiz.

— Bom dia, Nolan. – Abri lentamente meus olhos, estavam tão cansados que parecia estarem sendo puxados para baixo. O sol entrava pelas grandes janelas de vidro que estampavam a sala. Estava deitado no sofá, me sentindo extremamente confortável, como se estivesse sido esquentado e acalmado. Quando retomei minha noção por completo, olhei direito para minha frente e percebi Hugo repousando sua cabeça sobre meu tórax despido. Passei minha mão sobre sua cabeça e a medida que fui a levando por suas costas, percebi que ele também não estava vestido.

— Sabia que estava me sentindo bem demais para ter sido apenas um sonho. – Ele sorriu e virou o rosto para mim, o trouxe sobre o meu e me beijou. Fui me assentando sobre o estofado do sofá e o trazendo para mais perto de mim enquanto o deixava me cobrir com seus beijos. – Podíamos aproveitar que já estamos “prontos” e repetirmos. – Disse sorrindo em seus lábios.

— Eu tenho que ir para biblioteca hoje, Nolan. Não me faça ser demitido, porque se você pedir de novo, eu vou apenas continuar te beijando e deixar você fazer o que quiser sem me opor. – Ele disse isso ainda brincando com meus lábios. Eu não disse nada, mas não precisei. Sobre ele, trouxe todo seu corpo de encontro aos meus lábios. Hidratava sua pele com a saliva que saía da minha boca, como se preparasse o solo para ser fertilizado. Com a cabeça em cima de sua barriga, me levantei e o dei um rápido e profundo beijo.

— Eu vou preparar o nosso café da manhã, depois te levo até a biblioteca.

Peguei minha roupa no chão e a dele também, saí andando e ele ficou me encarando com o puro olhar de tentação.

— Vou deixar sua roupa sobre a minha cama, pode ir tomar um banho primeiro se quiser, enquanto eu preparo o café.

Fui até o banheiro lavar meu rosto e escovar meus dentes, vesti meu calção e coloquei um robe por cima, passando pela sala, vi ele deitado no sofá me acompanhando com o olhar. O riso atrevido estampado no seu rosto me fazia delirar, passei o beijando com os olhos e fui para a cozinha preparar o nosso café. Lá, me deparo com aquele floco de neve no meio do chão.  Olhava para mim como se quisesse algo, pensei que talvez estivesse com fome, mas não tinha a menor possibilidade de ter ração para ela aqui em casa. Peguei um potinho de plástico no armário e o enchi de água, coloquei no chão para ela, fui na geladeira e peguei um pacote de frango em cubinhos no congelador, coloquei numa vasilha e deixei descongelando no micro-ondas. Não era o certo para se dar para um filhote como ela, mas teria que servir até que comprássemos a ração.

Deixei a carne esquentando e me coloquei para arrumar o café. Liguei a cafeteira e deixei ela preparando os expressos. Dei uma passadinha na despensa e peguei algumas coisas para preparar uns sanduíches naturais. Tinha atum, o pão de forma, peguei a muçarela, a azeitona e alface na geladeira e fui montá-los. No processo, o apito do micro-ondas informando que tinha aquecido a carne. Olhei para atrás de mim e ela estava sentada ali como se soubesse que eu tinha algo para ela. Coloquei aqueles cubinhos de frango em um outro potinho, soprei um pouco e a dei para comer.

— Aqui, bom apetite. – Ela cheirou por um bom tempo aquele pote e o que estava dentro, pegou um cubinho, tirou para fora e ficou o arredando para um lado e para o outro, até começar a querer mastigá-lo, foram uns três minutos. Mas depois que pôs para dentro o primeiro, comeu o resto que estava no pote em questão de segundos. Ela latiu para mim e veio em minha direção, ficou parada em frente aos meus pés olhando em meus olhos e latindo. Eu não sabia o que ela queria com aquilo. A peguei no colo e a levei até um dos bancos da mesa de jantar, como ele era acolchoado, a coloquei sobre ele e ela se ajeitou por ali, deitou e ficou me vendo preparar o café.

Depois de preparar os sanduíches, arrumei a mesa e coloquei alguns potes com biscoitos, torradas, peguei uma geleia de pimenta na geladeira, trouxe os expressos e finalizei o que ia servir.

— Esse chef não decepciona mesmo, não é? – Hugo estava encostado na porta me observando. Com os cabelos bagunçados, ainda molhados do banho, parecia a mais bela estátua esculpida em finos traços sobre o gélido branco de um bloco de mármore. Veio se aproximando até mim, parou por detrás e me circundou com o braço esquerdo. Viu então Naíma repousada sobre o banco e se ajoelhou para a observar direito. Com ela no colo, ele se assentou e perguntou se já estava pronto nosso café.

— Só faltava chegar você, agora está pronto.

Por entre goles e mastigadas, fomos passando aquele momento. Ele estava terno e manso, mas parecia intrigado. O fato de estar em silêncio não era o problema, mas sim seu olhar distanciado para o sanduíche que comia, era como se olhasse através dele e visse uma dimensão se abrindo por trás daquele pão.

— Por que você está tão distante?

— Oi? – Ele me olhou desentendido, ainda distraído em seus pensamentos.

— Você parece não estar dentro do seu corpo nesse momento, sua mente tá viajando longe Hugo.

— Ah, me desculpe Nolan. Eu só tava lembrando de umas coisas da viagem, pensando em algumas coisas que acontecerem enquanto eu estava lá.

— E aconteceu algo tão profundo assim?

— Hahaha – Aquele riso foi uma mistura de uma expressão desanimada com o semblante reflexivo que ele carregava. – Não foi nada demais, é só que eu me aproximei mais dos meus tios nesses dias, acabei sabendo sobre algumas coisas que aconteceram no passado e que antes não se conectavam a mim. Mas agora, é como se tivesse uma multiplicidade de fatos que me chamam a tentar entendê-los.

— Como esse colar que você está usando depois que veio de lá?

Ele o segurou forte e ficou o encarando por todo o tempo enquanto falava.

— Sim. Eu não fazia ideia, mas minha mãe trazia isso para mim no dia... bem, no dia que eles morreram. Era um presente para o meu aniversário de nove anos.

— Então você ficou sabendo informações sobre os seus pais?

— Não só deles, mas do que eu posso chamar de família.

O amuleto no colar era hipnotizante para Hugo, ele o encarava completamente vidrado, esperando que ele se abrisse e revela-se ser a resposta para todas suas dúvidas. Eu não o culpava, em algum momento, nós queremos mesmo saber tudo sobre nossa história, o que foi o passado.

— Meu tio me entregou esse colar em uma caixa que minha mãe trazia para mim naquele dia, dentro, tinha uma carta e uma foto que eles haviam tirado, era o meu presente de aniversário daquele ano. De alguma forma, eu sinto como se algumas peças dessa história estivessem desconexas. E é difícil tentar assimilar qualquer coisa, eu não tenho muitas recordações dessa época, mas essa semana que eu fiquei lá, foi como se eu tivesse recebido uma intuição de que eu preciso descobrir mais sobre isso tudo. Eu até bisbilhotei um sótão largado na casa dos meus tios para ver se encontrava algo...

— Ora, ora. Mas você está mesmo intrigado com isso. E descobriu algo?

— A minha tia chegou lá enquanto eu estava olhando tudo, fiquei paralisado na hora, haha. Mas ela mesmo fez questão de me contar algumas coisas, fiquei sabendo bastante sobre o meu primo que morreu. E depois que ela falou sobre ele, eu percebo como se ele fosse mais presente na minha vida do que eu podia imaginar, eu só não sei como direito. Eu até achei umas fotos, estão na minha mala, depois eu te mostro.

— Eu fico feliz que você está se sentindo bem em entrar mais em contato com seu passado e sua família Hugo, eu só quero que você saiba que, caso você precise de qualquer ajuda, eu vou estar sempre do seu lado para te ajudar, seja no que for.

— Obrigado Nolan! Eu me sinto um pouco mais confiante hoje em relação a isso tudo, e é bem graças a você. – Ele disse isso em um tom tão baixo, quase um sussurro, seu rosto corava um pouco enquanto olhava para dentro de sua xícara de café. Eu o respondi com um profundo olhar de aconchego e ternura, o convidando a fazer permanência em mim sempre que precisasse.

— Bom, mas agora eu preciso me apressar para ir pra biblioteca, ainda tenho que passar em casa antes, para deixar a mala e Naíma. Obrigado por ter me buscado no Aeroporto ontem Nolan, e... bem, obrigado por ontem.

— Você não precisa agradecer isso, Hugo. Hahahahaha. Eu vou te levar para casa, vou só trocar de roupa, enquanto você organiza suas coisas, e a gente vai.

Passei no meu quarto e fui para o banheiro, tomei um rápido banho, vesti uma jaqueta jeans por cima de uma blusa de manga branca, estava esfriando bem rápido e ainda nem era inverno ainda. Por fim, coloquei uma calça de sarja escura e calcei minha botina azul, estava pronto para sair.

— Vamos?

— Você se arrumou todo bonito assim para me levar até em casa? – Ele disse isso me analisando com uma expressão que me fazia quase tirar toda a roupa e ir para cima dele. Eu tinha que aprender a me controlar, mas ele dificultava isso demais.

— Ora, eu tô andando com você, preciso estar à altura.

Naíma veio então para perto de mim e a peguei no colo, tomei a mala da mão de Hugo e fui andando para a saída do apartamento.

— Tudo certo?

— Sim senhor! – Disse ele se aproximando de mim para acariciar Naíma, fui traído e ela pulou para o colo de Hugo.

— Hugo?

— Oi?

— Eu não te perguntei, mas, de ontem, você tá bem?

— NOLAN! – Ele me repreendeu sério e, num instante, começou a corar e a esconder o rosto em direção ao chão. – Não precisa perguntar esse tipo de coisa.

— É só que eu me preocupo com você, não queria parecer egoísta.

— Não pareceu, mas agora eu não sei nem onde enfiar a cara... E... eu tô bem, tá tudo... tranquilo.

Eu me aproximei de sua bochecha esquerda e dei um beijo em sua orelha, ele ainda estava constrangido e não me olhava. Eu fiz isso mais para não perder a oportunidade de colocar a frase de impacto.

— Então vamos?

Seguimos para a garagem, colocamos a mala no carro e saímos para a cidade. No caminho parei com ele em um supermercado para comprar algumas coisas para Naíma, até ele ir em um petshop de verdade. Na porta do prédio dele, me despedi e o ajudei a descer com a mala, mas logo o porteiro veio cuidar dela.

— Você quer que eu te ajude a arrumar a mala?

— Não precisa Nolan. Eu nem vou mexer com ela agora, vou só me trocar e ir para a biblioteca, quando chegar vou ir para a faculdade, só depois eu vou me preocupar com isso.

— Uhm. Então tá. Eu ia falar para você ir lá para casa depois da sua aula, mas você deve tá só querendo ficar quieto e descansar, então, dessa vez, eu vou deixar você sem ser sequestrado para lá.

— Olha, eu não acharia nem um pouco ruim. Mas eu preciso arrumar a mala e dar uma organizada nas coisas em casa, e não vou mentir para você, eu preciso hibernar um pouco. Mas eu te mando mensagem quando chegar em casa.

— Okey dokey senhor. – Para mim, ele ainda não estava muito acostumado em demonstrar afeto em público, e toda essa situação de passar por isso o deixava um pouco fora de sintonia, então eu não o forçava muito. Mas me surpreendi com aquele abraço que veio dele, mas ainda com o beijo que se seguiu. Nem consegui dizer nada, apenas o fiquei observando subir aquela escadaria.

“Hugo, Hugo...”

Entrei no carro e saí sem rumo dali. Enquanto dirigia a silhueta daquela mulher no galpão me veio a mente. Eu precisava descobrir algumas informações a respeito dela. Lembrei então de alguém que podia me ajudar com isso, fiz a conversão no meio da rua mesmo, o cara que vinha de caminhão atrás de mim me xingou com todas as ofensas registradas e as que ainda não foram patenteadas.

Pensava em como eu ia explicar porque estava precisando dessas informações, esse meu contato, digamos, era um pouco invasivo nos detalhes. Mas era a única pessoa que podia me ajudar a conseguir alguma coisa, e eu não podia ficar por aí bisbilhotando com minha cara sobre elas, afinal de contas, eu já estava saindo completamente da missão que me foi dada por pura curiosidade. Eu não fazia isso, não é a forma como eu atuo em serviço, só que nesse caso, tinha algo me atiçando para entender o fundo dessa história, como se tivesse se conectando a pontos não tão superficiais assim, eu só precisava entender o que eram e o motivo. Estava completamente disposto a assumir os riscos para sanar minha curiosidade. Algo me dizia que eu precisava fazer isso, que ia valer a pena.

Já na zona nordeste da cidade, eu tinha que passar por uma verdadeira fortaleza para chegar até esse contato. Na esquina da rua que transversa um parque no meio do bairro, um muro enorme percorria todo o quarteirão. Era a única parte daquele bairro que não estava pinchada, para mim, o motivo era bem óbvio. Por pura questão de segurança, resolvi estacionar meu carro a uns quatro blocos dali e ir até a entrada a pé. Quando o muro terminava, fazia um beco com uma loja de tabacaria que devia estar ali a uns três séculos. Era nessa ruela que eu tinha que entrar.

Ao meio desse beco, ainda do lado do muro, uma escada descia para um porão, no fim dela, uma porta de ferro toda enferrujada era a figura impositiva do que aquele local representava. Sobre a porta, uma placa em formato de corda pendurada, formando um laço, com os escritos Dama da Corda. Aos mais poéticos, era melhor não procurar entender o significado dessa corda.

Empurrei a porta e entrei no salão, era um bar escuro, as paredes eram todas negras, como se fossem feitas de graxa e asfalto. Algumas lâmpadas fluorescentes roxas nas paredes davam o ar de submundo que aquele lugar tinha. Um único candelabro se despendia ao centro do telhado, era um objeto tribal, os suportes para as lâmpadas eram todos de caveiras, as lâmpadas ficavam por dentro, eram vermelhas, brilhavam pelo interior clareando os olhos e as partes quebradas daqueles pequenos crânios. Todas as mesas eram de pedra, nelas vários entalhes feitos de canivete. Um sofá ao canto, parecia ser feito de penas de alguma ave exótica, cobria a parte de baixo da punica parede que tinha algum detalhe nela, era toda pintada em um motivo tribal macabro. Ao fundo esquerdo, uma parede se alocava em seu eixo, formando um corredor. À primeira vista, parecia ser o banheiro, mas aquele ser de quase dois metros de altura e circunferência incomensurável, todo coberto de preto e com as mãos cruzadas, guardando a entrada, dava o sinal de que não o era.

Um balcão ao canto direito tomava a parte mais clara do ambiente, se bem que era difícil chamar aquilo de “claro”. Atrás do balcão, prateleiras de vidro guardavam garrafas de bebidas, velas negras queimando, decorações que iam de réplicas de morcegos a alguns ossos. O barman que o atendia estava vestido socialmente, um terno de três peças bem cortado, a calça preta, a camisa branca e o colete preto. Os dois últimos botões da camisa estavam abertos, por isso ele não usava gravata. Olhando rápido para o seu rosto, parecia que ele estava de máscara. Com mais atenção, dava para ver que eram tatuagens, seu rosto era completamente coberto, como uma tela, só que o que seria a parte do tecido, já era uma tatuagem, como se tivesse sido feita a imagem óssea do crânio e, depois, coberta por algumas tatuagens diversas, escritos, imagens de animais distorcidos, figuras surrealistas. Analisando melhor, aquela tatuagem descia para seu pescoço e provavelmente por todo o corpo, suas mangas estavam dobradas nos cotovelos, a arte exposta do braço também era completamente tatuada, igualmente as mãos e os dedos, esses, repletos de anéis, alguns se ligavam em correntes até as pulseiras em seu pulso.

Tinham algumas pessoas bebendo ali dentro, dois rapazes sentados em uma mesa, um senhor que parecia estar morto no sofá ao canto, e uma mulher sentada em um banco no balcão do bar. Fui até lá, me assentei e o barman veio perguntar o que eu queria.

— Um vinho exótico. – Ele olhou para mim e encarou o gigante ao fundo do salão, se virou de costas e foi por uma entrada atrás da parede com as prateleiras, voltou com uma garrafa em sua mão. Tinha tanto tempo que eu não tinha que provar aquilo, não sabia nem mais o gosto. Um vidro transparente com uma cobra em conserva dentro. Era uma espécie de bebida de arroz fermentado, virava o vinho de arroz e a cobra era colocada em conserva dentro e guardado. Podia ser um escorpião também. Não era algo fácil de se descer pela garganta, fazia um certo estrago.

Ele abriu a garrafa e me serviu uma taça, a mulher sentada ao meu lado segurou firme seu copo e sorriu quando me viu colocando aquilo para dentro. Soltou uma risada maníaca, diminui o volume, e voltou à sua bebida, sem sequer se virar para mim.

Tomava aquilo e de repente uma mão se posiciona no meu ombro esquerdo e o segura firme.

— Você, vem comigo.

Aquela muralha de homem estava parado atrás de mim, um olhar frio e petrificante saía de sua face. Seu sério rosto, o rosto esquerdo tinha uma cicatriz de algum corte profundo. O acompanhei até o corredor onde ele estava parado quando entrei, assim que virei para dentro dele, vi uma porta ao final da parede à minha esquerda. De repente, tudo escureceu, percebi então que meu rosto estava coberto por um tecido negro e que tinha sido encapuçado. Não resisti, eu sabia que aquilo me levaria a quem eu precisava falar. Apenas senti uma mão em minhas costas me empurrando para andar. Segui meus passos, já preparava para me virar à esquerda no momento em que meus braços foram segurados por trás das minhas costas, por trás, me conduzia o caminhar. Senti então que me segurava com mais força quando dei o próximo passo, percebi que nada se dispunha sob meu pé direito, fui o pousando lentamente até encontrar algum apoio. Nesse momento, senti que estava descendo uma escadaria.

Não tinha virado à esquerda como imaginei, do caminho reto, desci todos aqueles quinze degraus e continuei em linha reta. Ao fim de alguns pares de passos, fui conduzido a virar para a direita e seguir em linha reta. Percebi então que algo barrava meu andar, desbravei a minha frente com alguns leves chutes, foi quando senti que tinham mais alguns degraus. Dessa vez em ascendência. Depois do quarto degrau, fui compelido a parar. Alguém parou atrás de mim e começou a me tocar, senti minhas mãos sendo atadas juntas atrás de meu corpo.

O capuz que cobria meu rosto foi retirado com tamanha agressividade que me senti sendo puxado para baixo junto. A luz que incendiava o ambiente me deixou sem visão por alguns segundos, um pouco mais de um minuto. Retornando a dilatação normal das pupilas, consegui observar o cenário em que estava, senti como se fosse melhor continuar sem enxergar. O cômodo estava completamente pintado de verde, do chão ao teto. Nas paredes, entalhes de animais, jaguares, serpentes, águias, e alguns motivos, tudo em um estilo maia, como se fossem riscadas com pedra sobre a própria parede. Focos de luz saíam do chão, no encontro da parede com o piso, e se inclinavam em quarenta e cinco graus, para a diagonal em relação ao teto. Uma luz alaranjada, completamente ofuscante. No teto, uma trilha de ossos saía de cada vértice, subindo pelas esquinas das paredes e se conectando ao centro do teto, no desenho de um mosaico. Do topo do teto, marionetes despencavam enforcadas. Algumas estátuas decoravam o cômodo, todas de pessoas vendadas com cordas em seus pescoços. Foi o momento em que senti algo me tomando abaixo do rosto. Abaixei meus olhos e passei minha mão sobre minha garganta, percebi então que eu estava sobre um pedestal, literalmente, com a corda no pescoço.

— Eu não me mexeria muito daí de cima com essa corda, um passo em falso e... – Aquela voz crua e seca foi se levantando, estava sentada em uma da poltrona atrás de uma mesa, à minha frente, mas estava virada de costas para mim. De pé, mas ainda sem se virar, consegui observar melhor a figura que me tinha em seu jogo. Uma mulher alta, de cabelos pretos lisos tão compridos que chegavam a quase encostar no chão. Quando se virou, era surpreendente a palidez de sua pele, chegava a ser acinzentada. O rosto completamente tomado no destaque daquele batom preto em seus lábios e os olhos contornados pelo lápis branco. Era limpo, mas a partir da linha do queixo, o pescoço era todo tatuado, igual ao barman. Os braços também tinhas suas marcas tribais tatuadas. Toda vestida de couro, sua roupa apresentava vários desenhos e marcas em vermelho, laranja e ver, com alguns acessórios de metal sobre o corpo, o braço esquerdo coberto de argolas, igualmente as orelhas. Em seu pescoço, uma corda em laço se jogava até o chão, se embaralhando entre suas pernas.

— Devo admitir que a sensação continua não sendo boa da segunda vez, Ix’Tab. – Eu tinha noção do risco que corria a cada palavra dita, sabia bem o território que estava, por isso tinha que ter ciência de dizer apenas o necessário para agradá-la.

— Esse nome é música para os meus ouvidos. Agora, o seu, meu caro Nolan, é um nome que eu jamais pensei que repetiria.

— Parece que o destino está nos amarrando mais uma vez.

— E a que eu devo julgar sua vida?

— Informação. É o que eu preciso. Informações sobre uma pessoa.

— E por qual motivo eu as daria a você?

— Ora, eu não vim de modo algum barganhar a dívida que você tem comigo. – Nesse momento, senti a corda apertar um pouco, percebi que tinha sido levemente levantada, me subindo um pouco sobre o solado, a ponto de inclinar meus pés e não conseguir ficar com a pisada firme e reta, mas sim um pouco sustentado pela frente do meu pisar. Olhei para ela e estava a passar a mão sobre uma estátua, com um controle em suas mãos. – Apenas lhe pedir por um favor, dama da corda.

Continuei com a corda apertada e levantado, ainda não estava suspenso, mas não queria chegar ao ponto de ficar. Ela não se virou para me olhar e continuou a acariciar sua estátua.

— E para que você quer essas informações?

— Para ofertar oferendas a você. – E a corda subiu novamente, estava completamente sobre a pontinha de meus pés. – Estou apenas tentando um sóbrio humor para vossa graça. Achei que gostasse de rir um pouco, afinal de contas, essas cordas... não são para conter os risos? – A gota d’água, foi quase possível ver fumaça saindo da cabeça dela, sua mão apertou a cabeça da estátua com tanta força que a esfarelou. Ela se virou para mim e em todo seu ímpeto de raiva apertou o botão naquele controle, eu estava completamente suspenso no ar, debatendo contra o nada, comecei a perder a respiração. Meu pescoço estava totalmente tomado, comprimido naquele laço. – Eu... preciso... saber...

— Porque condenei... aquelas almas todas... – Já estava perdendo os sentidos quando despenquei do teto para o chão, caí sobre aquele elevado onde estava parado com a corda no pescoço, dali, ricocheteei direto para o piso. Ajoelhado, comecei a retomar o fôlego.

— Você já teve um senso de humor melhor. Envelhecer não lhe faz bem.

— Talvez você não devesse brincar tanto com a sorte Nolan, ela nunca está do seu lado.

— E você diz isso para mim? Hey, eu vivo contra a maré há quase vinte e oito anos.

— Então, direto ao ponto, o que você quer?

— Um minuto. – Fui me levantando do chão, ainda ofegante. Passando a mão pela minha garganta, deixava o ar entrar em meus pulmões com todo vigor. – Eu preciso da sua ajuda Ix’Tab. Tem uma mulher, eu preciso de informações da vida dela. Tudo que eu tenho é um nome. E eu sei que você pode me ajudar.

— Posso?

— Ix’Tab, você tem os seus contatos, estão espalhados por todos os cantos desse país, até mesmo nas redes, não existe nada que passa pela Internet que você não tenha acesso.

Ela gostava de ser aclamada pelo poder que tinha. Sua expressão de autoridade demonstrava claramente.

— E isso tem a ver com algum dos seus trabalhos?

— Sim, mas não. É por causa de um trabalho, mas estou por pura curiosidade nisso. É meu interesse próprio saber da vida dessa mulher.

— Você não me parecia ser do tipo que seria amarrado no amor, Nolan.

— Não é isso. – Ouvir aquilo me fez lembrar de Hugo, mas não queria manchar as doces memórias que tinha dele visualizando seu rosto em um lugar desses. – Saber dela vai me esclarecer algumas coisas desse trabalho, o porque ele foi encomendado.

— Eu achei que você era do tipo profissional, que não se intrometia nos assuntos dos clientes.

— É, eu também achava.

— Afinal de contas, quem é essa mulher.

— O nome dela é Martha Nasser.

Ela cerrou os punhos sobre a mesa e expandiu seu olhar sobre mim de uma forma terrivelmente assustadora, vindo dela, era quase uma aparição demoníaca.

— Você a conhece Ix’Tab?

— Não! Mas esse sobrenome... não carrega boas energias. Você tem certeza que vai querer se meter com isso?

— Eu preciso.

— Então eu farei, mas por você. Agora, precisa saber, para não dizer que não foi avisado, o mal o atingirá se for até ele, Nolan.

— Bom, eu sei me defender bem.

Ela se virou na poltrona contrária a mim, de costas, analisando a parede a sua frente, respirou profundamente e fez um breve silêncio antes de se dirigir novamente a mim.

— Quando estiver pronto eu te avisarei.

— Obrigado, Ix’Tab.

Apenas a mão levantada fazendo sinal de saída para mim. Ela não tinha mudado tanto assim.

O capataz dela me escoltou para de volta ao salão no andar de cima. Fui até o balcão e pedi um gin para o barman. Ele me serviu e continuou limpando seus copos.

— Então para você é por conta da casa? – A mesma mulher ainda estava assentada bebendo ali. – Só não esquece que não existe ação sem reação nesse mundo.

Ela se levantou e saiu para os fundos do salão.

Terminei meu drink e saí dali. De volta ao meu carro, eu tinha agora que esperar pelas informações que Ix’Tab conseguiria. Não dava para não pensar no que tinha acabado de acontecer. Comecei a rir. Eu tinha ido pedir ajudar a uma maníaca que acreditava ser a forma humana da deusa maia do suicídio, a ponto de usar o mesmo nome dela. Essa era minha grande cartada para conseguir alguma informação sobre quem é Martha Nasser. E ainda tinha todos esses momentos frases de impacto que me aconteceram. Não me aterrorizaram, mas fazem um homem refletir, ainda mais com uma corda em seu pescoço. Enfim, eu tinha feito o que precisava. Agora, era esperar.

Já estava perto do horário do almoço, resolvi ir até algum restaurante por perto para comer algo. Não achava nenhum por ali e, quando finalmente achei algo parecido com um lugar onde teria comida, não tinha a menor chance de conseguir estacionar por perto. Tive então que rodar uns três quarteirões procurando uma vaga. Depois de achar, ainda tive que a disputar com um sem noção que não me viu sinalizando que ia entrar ali.

— Finalmente. – Repousei minha cabeça no encosto do banco, fechei os olhos por alguns segundos e deixei que o tempo corresse. Eu estava começando a ficar envolvido nessa missão em um nível criticamente irremediável. Tudo isso estava me estressando muito, eu queria apenas largar tudo, pegar Hugo e ir para alguma cidade no Japão, ou quem sabe na Coréia do Sul, poderia ser até na Tailândia. Vivermos só nós dois, só para nós dois, sem preocupar com mais nada, nem com ninguém. Começava a pensar seriamente nessa hipótese, mas para isso, eu não tinha como não terminar essa missão. A questão é que, algo nessa história me atraía feito um imã. Eu já nem estava mais ligando para o que eu realmente tinha que fazer. E para quebrar de vez meu leve descanso, meu celular começou a vibrar.

Antes mesmo que eu pudesse ficar um pouco animado com a possibilidade de ser Hugo, vi que era uma mensagem interceptada do celular de Augusto. E pelo tom da mensagem, era do governador e eles estavam prestes a se encontrar. Não daria tempo de ir até aquele lugar perdido no meio do nada onde eles se encontravam. Abri o porta-luvas e peguei um fone de ouvido, abri a interface de comando no celular e a configurei para ampliar o sinal, para tentar ouvi-los claramente, eu estava bem longe para conseguir um sinal claro com as configurações padrões. Precisei refazer alguns códigos, parecia que iria funcionar. Coloquei o fone de ouvido e o conectei no meu celular, fui adaptando o sinal e fazendo a conexão com o celular de Augusto. Pelos ruídos que ouvia, ele ainda devia estar na estrada, o que me daria mais algum tempo para estabilizar o sinal. Rastreei seu celular e no GPS, quando ele parou de se movimentar, mostrava que era exatamente no mesmo local que eles se encontrariam. Fiquei esperando a conversa deles começar. Tinha um pressentimento de que essa conversa me traria algum proveito pessoal.

— O senhor me chamou aqui tão de repente. Aconteceu alguma coisa?

— Augusto, Augusto... Você sabe que eu ando mexendo uns peões aqui, uns peões ali, pondo alguns cavalos em ataque, e até agora, anda tudo indo de acordo com o plano. Mas dessa vez... Dessa vez eu darei xeque mate sem nem mexer com minhas grandes peças.

— Como assim?

— Hahahahaha, o plano funcionou maravilhosamente Augusto. Semana passada, Suzanna foi se encontrar com um dirigente da DAZus no Corinthia, como eu tinha te dito, para oferecê-los uma “ajuda” do governo do Estado. Aquele pessoal é muito fechado, eu já estava começando a ficar incomodado em não saber como eles se movimentam nesse tabuleiro. Mas agora... Agora, eles estão no meu domínio.

— Então eles aceitaram?

— Melhor que isso. Eles não só aceitaram a proposta que Suzanna foi levar para eles, como contaram para ela quem será o novo CEO da empresa.

— Eles disseram? E quem será?

— Pelo visto será o vice-diretor executivo, Marco Alexandre. Ele não só quer a ajuda do governo, como pretende marcar uma reunião comigo.

— Mas foi ele quem se reuniu com Suzanna?

— Não, não. Eles ainda não o anunciaram, ele não pode ser exposto assim por enquanto. E isso me deu a oportunidade perfeita de dar uma cartada sobre aqueles desgraçados que planejaram me tirar da frente do governo. Agora que eu sei quem será o novo CEO da DAZus, posso usar disso para os trazer mais para dentro do meu controle.

— O que o senhor planeja?

— Ora Augusto, eles ainda não anunciaram o nome de quem será o novo CEO para a mídia. Agora que eles aceitarão a ajuda do governo e nos disseram o nome de quem assumirá a direção executiva da empresa, eu posso dispor dessa informação para mostrar que estamos alinhados.

— Então o senhor vai...

— Exatamente. Eu convoquei a imprensa para uma comitiva hoje à noite no palácio do governo, vou dar essa notícia em primeira mão para eles. Falarei para todos os canais de televisão, jornais, rádios e quem mais tiver lá que a DAZus nos informou que seu novo CEO, Marco Alexandre, aceitará a ajuda de recuperação empresarial do governo e que nós trabalharemos juntos para reestruturar a DAZus e a construção civil em nosso grande Estado.

— O senhor tem certeza que isso é uma boa ideia? Ficar se expondo desse jeito.

— Ah Augusto, esse pessimismo seu chega a ser deselegante. Claro que é uma boa ideia. Imagine bem o Travis, a Nina e o Mike, me assistindo anunciar quem será o novo CEO da DAZus, antes mesmo da própria empresa se pronunciar, e ainda afirmando que trabalharemos juntos no plano de recuperação judicial que o governo do estado vai oferecer. Eles vão quebrar o que quer que estiver na frente de cada um deles no inferno onde quer que estejam. Por mim, seria uns aos outros. Vai ser um golpe crítico neles.

— Nisso o senhor tem razão. Mas não dá para desconsiderar que eles também tentarão se voltar contra o senhor com tudo.

— Com tudo o que? Eles não têm mais nada, Augusto. Estão acabados, todos em crise, morrendo de medo de serem a próxima vítima do assassino carmesim.

— Para mim o senhor estava certo que era o Dorsey o assassino...

— E estou... É só que... bem... eu.... você sabe, ele negou ser ele. Não que a palavra dele valha algo... E que se foda esse assassino, só estava dizendo que a situação deles está precária, eles não têm como me ameaçar.

— Bom... o senhor disse que teria algo que me interessaria diretamente, por isso me chamou aqui. Sobre o que exatamente queria falar que me agradaria tanto assim?

— Eu tinha te prometido que quando tudo terminasse, eu passaria essa empresa, que a HG+ está construindo para abalar os meus adversários, pra você. Ontem saiu um balanço do valor de mercado e das expectativas das ações para o fim de ano, todas elas estão despencando...

— Inclusive a Vernach...

— Ora Augusto, mas você sabe que a empresa da HG+ está super bem avaliada, no Estado, no País e até mesmo fora. Eu mandei Suzanna para fazer algumas reuniões com empresários internacionais e todos eles mencionaram o interesse de investir nas operações da construção civil no nosso Estado quando essa nova empresa estivesse operando. Ela já vai começar na bolsa com um valor de mercado enorme. E será toda sua, pela sua lealdade e serviço prestado, em todos esses anos. O chamei aqui porque já vamos começar a passar ela para o seu nome sutilmente.

— O senhor sabe que eu sempre fui fiel ao senhor por todos esses anos. Espero que o senhor não ache que é apenas por interesse que eu o ajudei.

— Não veja isso como o preço da sua fidelidade Augusto, mas sim uma recompensa, na verdade, um presente, por nossa amizade.

— Apenas para que fique claro governador.

— Absolutamente. Bom, agora eu tenho que ir, tenho uma comitiva com a imprensa hoje à noite e preciso me preparar, se eu ficar muito tempo fora também, vão começar a procurar por mim.

— A que horas o senhor fará sua declaração aos jornalistas?

— Eu estarei no saguão do palácio às dezenove em ponto.

— Boa sorte governador.

— Eu não preciso de sorte Augusto, está tudo matematicamente calculado.

Ouvi os passos do governador saindo daquela espelunca. Augusto disse algo, mas ficou tão baixo que não sei se foi problema na conexão, ou se ele realmente sussurrou. Algo sobre “os melhores matemáticos já falharam”. Augusto não parecia que sairia daquele lugar, fiquei no carro o ouvindo no grampo, o esperando sair. Por uns quinze minutos mantive a conexão ligada, apenas escutando o barulho do ambiente e do que quer que ele estivesse bebendo descer por sua garganta. Não parecia que estava esperando alguém, apenas que estava matando seu tempo inutilmente. Resolvi então que não ficaria fazendo a mesma coisa e saí do carro para ir almoçar.

Tinha que planejar minha ida ao palácio do governo hoje à noite, eu precisava estar lá, sentia que seria o momento em que os planos do governador iriam pelo ralo. Comi um prato de peixe e batatas fritas, voltei para o meu carro e fui para casa. O pronunciamento do governador seria com uma comitiva de imprensa, eu precisava dar um jeito de me passar por um jornalista. Liguei meu computador e abri na internet a página do governo, na secção de informações e transparência, vi quais jornais, canais de tv e rádios tinham as credenciais autorizadas para entrarem nessas comitivas. O plano era ver quais eram autorizadas, imprimir uma credencial e falsificar um cartão de repórter credenciado. O Paladino Diário estava na lista, era um jornal de certa circulação, mas não tão grande assim, deveria ser fácil me passar por jornalista deles. Imprimi então a credencial deles, falsifiquei um cartão e inventei um nome. Nessa noite seria Bradley Hotto. Até que ficou bem convincente meu cartão falsificado de repórter.

Dei um pulo no meu closet para ver se tinha alguma roupa que exclamasse repórter de furos e manchetes. Achei um colete de pesca preto, parecia muito com o que os repórteres usavam, iria o vestir por cima de uma blusa social cinza azulada, com um jeans escuro e um sapatênis, estaria bem parecido com um jornalista de verdade. Ainda tinha um óculos completamente redondo e transparente que eu poderia colocar para ser o detalhe efetivo do meu figurino. Deixei a minha roupa pendurada em um cabide e fui para o meu quarto. Eram quase quatro da tarde, eu já ia começar a me arrumar para não chegar atrasado no palácio, tinha que ficar olhando onde as vans da mídia estacionariam, para sair de lá depois de todos, e passar por um deles.

Tomei um longuíssimo banho de banheira, a ponto de quase trocar de pele naquela água morna. Como essa banheira ficava enorme quando estava apenas eu dentro dela. Levantei e fui me trocar. Vesti meu “uniforme”, penteei meus cabelos, passei um pouco de gel neles, escovei os dentes e ajeitei os óculos no rosto.  Faltavam uns dez minutos para às seis. Já ia sair para achar um local despistado para estacionar meu carro e ficar observando a movimentação dos jornalistas e repórteres.

Consegui uma vaga ao fim da praça do palácio, vi aquele monte de vans e uma multidão de pessoas descendo delas em direção à entrada do prédio. Esperei o movimento diminuir para sair do carro. Quando vi que todos já estavam entrando, saí e fui até a van do Paladino Diário, não tinha mais ninguém lá, na porta dos fundos da van, tinha um adesivo do logotipo deles, tentei o arrancar sem o rasgar e o colei no meu colete. Estava quase soltando, sem cola alguma, mas seria um bom acréscimo ao meu disfarce.

Andei para a entrada do palácio, tinha alguns seguranças no começo da escadaria principal olhando as credenciais. Caminhei suavemente até um deles, ele se aproximou e me pediu meu cartão. Tirei do bolso do meu colete, o adesivo quase caiu, entreguei para ele e fiquei o vendo olhar com uma cara séria meu cartão.

— Pode entrar, a comitiva vai ser no saguão principal do térreo, é só seguir reto.

— Okay, obrigado. – Assim que passei por ele e subi os dois primeiros degraus, o adesivo descolou de vez e saiu voando pelo ar. Nem me importei com ele, seria até bom para caso o pessoal do Paladino Diário me visse, não ficasse me encarando.

Do lado de dentro, dava para ver os bancos onde nos assentaríamos e o palanque à frente, onde o governador e sua equipe ficariam para dar a notícia tão importante que ele tinha. Procurei um assento mais ao canto e ao fundo, olhei ao meu redor, estava lotado. Assentei e fiquei esperando a comitiva começar. Faltavam cinco minutos para às dezenove. Pontualmente às dezenove o governador e sua equipe entraram. Ele cumprimentou alguns repórteres que estavam na primeira fileira e subiu no palanque. Aquele homem não perdia o populismo em seu caráter nem por uma fração de segundo.

— Boa noite a todos aqui presente hoje. Agradeço imensamente por terem vindo para essa comitiva de imprensa. Hoje trataremos de um assunto muito importante e delicado para o nosso Estado. Como todos bem sabem, diversos fatos têm atrapalhado a tranquilidade de algumas empresas do ramo da construção civil no nosso Estado e no nosso país, não é um problema que nos afeta tão somente. Mas hoje, as notícias serão boas. – Assim que ele disse essa frase, a secretária Suzanna entrou pelos fundos do palanque e se sentou em uma das cadeiras atrás do governador. Ele se virou e a viu, sorriu em sua direção e a saudou. Ela repetiu o cumprimento, mas seu sorriso sádico quando ele virou de costas chegava quase a denunciá-la em suas intenções.

— Bom, como dizia, hoje, as notícias são boas. Há algumas semanas atrás, um terrível atentado assolou a sede da DAZus, renomada empresa de construção civil que se fundou no nosso glorioso Estado há alguns anos. A DAZus vem ganhando reconhecimento por seu excelente trabalho e dedicação a uma missão ética e profissional honrosa. Bem, nesse infeliz dia, muitas vidas foram perdidas. Não estamos aqui para valorar vidas, são todas igualmente importante. Fato é que, uma dessas vítimas, foi o Diretor Executivo da empresa, assim sendo, a DAZus, além de toda sua perda, ficou sem um farol. Mas nós estamos aqui hoje para reacendê-lo. É com grande prazer que eu, depois de uma proveitosa reunião com os dirigentes da empresa, anuncio que o atual vice-diretor executivo, Marco Alexandre, assumirá o cargo de CEO da DAZus. Mais feliz ainda fico em anunciar que, o governo do Estado em sua missão de manter nossa economia ativa, dinâmica e estável, elaborou um plano de recuperação econômica e que a DAZus concordou em assiná-lo...

O governador continuou falando, mas meu olhar estava em Suzanna. Ela estava tão sorridente, ela estava encarando seu celular e se virou para o governador, parecia que estava prestes a ter uma crise de riso insana a qualquer momento. O meu celular vibrou, uma mensagem de Rowney tinha chegado.

Não sei aonde você está, mas olha esses dois links.

Um era da transmissão ao vivo do discurso do governador para os repórteres. O outro era uma outra transmissão, um plantão urgente na televisão. Peguei meu fone no bolso, o coloquei discretamente e fui assistir esse plantão. Olhei para o governador, ele ainda estava falando, logo mais abriria para as perguntas. Percebi que alguns jornalistas ali também estavam fazendo a mesma coisa que eu, assistindo algo em seus celulares com seus fones.

“- Boa noite, entramos ao vivo agora nesse plantão para noticiar que os dirigentes da DAZus acabaram de convocar uma comitiva de imprensa no Sofitel Hotel. Vamos ao vivo para lá agora com a repórter Mayara Thorn.

— Boa noite, Michelle. Boa noite telespectadores. Estamos aqui direto da sala de reuniões do Sofitel Hotel para a comitiva convocada à meia hora atrás pelos dirigentes da DAZus. Entra agora na sala o vice-diretor executivo, Marco Alexandre, e sua equipe. Importante ressaltar que o governador também está fazendo uma comitiva de imprensa no palácio do governo nesse exato momento e acabou de informar que o novo CEO da DAZus é o Marco Alexandre, e que a empresa aceitou a ajudar de recuperação empresarial do governo. Ele vai falar agora, vamos ouvir.

— Boa noite a todos os presentes aqui. Essa noite falo em nome da DAZus através do nome do nosso presidente, George Keinz, que por motivos de estar em uma viagem internacional, não pode comparecer aqui. Bom, serei breve e objetivo. Estou aqui para dizer aos senhores e senhoras que, apesar de muitos boatos que andam correndo por aí, alguns nesse exato momento em outra parte da cidade, a DAZus escolheu seu novo Diretor Executivo. Com o aval e anuência máximos da presidência da empresa, é com grande prazer que eu anuncio Martha Nasser como a nova CEO da DAZus. Ela conduzirá nosso trabalho com grande determinação e prestígio, mantendo o mesmo nível de excelência e comprometimento que a DAZus tem entregue a sociedade por todos esses anos. Anuncio também a decisão do conselho gerencial de decretarmos o encerramento provisório de nossas atividades, por prazo indeterminado. Essa escolha se dá em nossa obrigação de avaliarmos nossas perdas reais, reestruturarmos nossas ações e organizarmos nossa atuação após o lastimável atentado em nossa sede. Por esse motivo, afirmamos que todos os contratos que estavam em fase de negociação serão desistidos e cancelados por parte da DAZus, e que os que estão em andamento serão reavaliados junto às partes em relação aos prazos e às respectivas cláusulas. Por último, gostaria de enfatizar que a DAZus jamais se propôs a ser socorrida, razão pela qual não tem qualquer fundamento o boato que nós aceitamos a ajuda de recuperação empresarial do governo. Não aceitamos e não aceitaremos, por acreditarmos que impõe condições severamente onerosas, as quais não podemos compactuá-las, até mesmo por uma questão de transparência da gestão pública, mesmo que isso não parta dos gestores. A DAZus enfatiza que sempre estaremos comprometidos com nossa missão e em desenvolver um trabalho de excelência e respeito para a sociedade. A todos, o meu muito obrigado.

— Bom Michelle, acho que isso deixa tudo um pouco bagunçado em relação as declarações do governador. Diretamente do Sofitel Hotel, Mayara Thorn.

— Obrigada Mayara. E é isso telespectador que nos assiste, voltaremos agora para a transmissão ao vivo para o discurso do governador no palácio do governo.”

Então elas tinham executado mesmo o plano de colocar o governador me maus lençóis. Olhei para todos os lados, todos retiravam seus fones e se levantavam para indagar ao governador. Nunca ouvi tantas pessoas dizendo “governador” ao mesmo tempo. Ele pelo visto ainda não estava ciente das notícias. Um assessor se aproximou por trás, tampou a boca e o falou em seu ouvido direito. A cara que ele fez ao ouvir foi como se tivesse tido seu espírito arrancado para fora do corpo. Talvez tenha sido o que aconteceu.

Ele estava estático. Suzanna atrás ainda estava com o sádico sorriso no rosto. Múltiplos repórteres começaram a indagá-lo sobre as alegações da DAZus e se ele estava mentindo. Ele nem se mexeu. Suzanna então se levantou, foi até ele e o chamou, eles começaram a andar para fora do palanque sem responder ninguém. Todos os ali presente se amontoaram para ir atrás deles, mas os seguranças, como se tivessem aparatado ali, fizeram um bloqueio e os impediram de irem até o governador, que saiu pelos fundos do saguão. Aproveitei da confusão e me retirei dali.

Enquanto andava para fora do palácio até o carro, fiquei pensando em como estaria a sala de reuniões do governo nesse momento. O governador devia estar xingando Marco até sua primeira geração, mas principalmente deveria estar enfurecido com Suzanna, por o ter feito de otário. Isso era algo que eu queria ver, não fazia ideia do que ela iria dizer ou fazer para se eximir de qualquer responsabilidade. Talvez alegar que eles também mentiram para ela, seria o mais lógico.

No carro, estava pronto para dar a partida quando ouvi um barulho e olhei para o céu pela janela. Um helicóptero saía do heliponto do palácio em direção ao norte, provavelmente com o governador em fuga dentro dele. Antes que eu pudesse ligar o carro, meu celular vibrou. Mais uma mensagem recebida no celular de Augusto.

Preciso te encontrar ainda hoje. Urgente!

Acelerei o carro e saí em direção ao norte, tentaria seguir aquele helicóptero por terra. Não fazia a menor ideia de onde o governador poderia estar indo, não me parecia viável que ele fosse de volta para aquela espelunca no meio da estrada, menos ainda para sua mansão, uma vez que toda a imprensa estaria o esperando por lá, ele não levaria Augusto nessas condições.

O helicóptero continuava seguindo ao norte, e pela estrada eu continuava o seguindo. Nenhuma notificação chegava no celular, como queria que Augusto o respondesse, me dando alguma dica de onde estariam indo. Saindo da região central da cidade, vi no horizonte que eles se aproximavam de um edifício todo espelhado. Perdendo altitude, imaginei que fossem pousar ali, acelerei mais ainda o carro para me aproximar do prédio. Quando pousaram, eu me aproximava daquele quarteirão, fiquei atento então para qualquer carro que se aproximasse. Fiquei surpreso de nenhum repórter ter seguido o helicóptero. Não chegava ninguém nos arredores do prédio, continuei dando voltas no quarteirão, mas nada de um sinal de Augusto.

Para minha surpresa, o helicóptero levantou voo novamente e segui em sentido oeste. Eu não entendi nada, mas continuei o seguindo. Olhei no celular e nada. Depois de alguns segundos, minha ficha caiu.

— Ele entrou no helicóptero no heliponto do prédio, Nolan seu idiota. – Dei um tapa tão forte em minha testa que as marcas de meus dedos ficaram perfeitamente estampadas. Continuei com os pés sobre os pedais do carro, peguei o celular e comecei a sincronizar a conexão com o celular de Augusto. Pelo visto eles estavam tendo a reuniãozinha deles naquele exato momento, enquanto o helicóptero seguia para fora da cidade ao oeste. Ia precisar manter dirigindo, então aparelhei o celular com o painel multimídia do carro e transmiti a conexão para ele, para escutar em maior volume enquanto dirigia. Assim que a conexão estabeleceu, aquela saraivada de gritos do governador era suficiente para jogar o helicóptero no chão.

— Eu tenho uma chance! Uma chance de me promover na mídia e tudo vai por água abaixo.

— Mas governador...

— Todos aqueles olhares rindo de mim, me condenando ao escárnio. Eu vou me certificar de os punir. Todos eles. TODOS ELES VÃO ME PAGAR.

— Como isso foi acontecer governador?

— E EU SEI AUGUSTO? Se eu soubesse não tinha passado esse vexame na frente de todos os repórteres.

— Mas eu pensei que o senhor tinha todas as informações em mãos. Para mim o senhor estava certo da nomeação do Marco.

— Eu estava Augusto, eu estava. Mas pelo visto essa informação não era verídica. A Suzanna tinha me garantido... e eles me fizeram de trouxa.

— Então o senhor acha que a secretária Suzanna o enganou?

— Não, não a Suzanna. Jamais. Ela não teria coragem, ela é fiel a mim, me daria a vida se fosse preciso. Eles se certificaram de a enganar, porque sabiam que ela é minha pessoa de confiança no governo. Desgraçados. Eu vou os fazer se arrependerem de bancarem os espertos para cima de mim. E essa desgraçada...

— A Nasser...

— O maldito do Dorsey. Esse desgraçado até preso está movendo suas peças. Mas eu vou dar o troco nesse filho da puta, ele me paga. Não sei o que ele espera mexendo os pauzinhos para colocar a filha dele de CEO da DAZus, mas se depender de mim, ela não terá a vida fácil. Eu consegui afundar os outros, ela vai cair também.

— E o que o senhor pretende, governador?

— Eu tenho que dar o troco neles. Mas por enquanto, a mídia vai ficar de cima de mim, então tenho que ser cauteloso. Vamos ter que adiar a abertura do capital da empresa que a HG+ está criando. Enquanto isso, vou pensar em algo para enterrar essazinha de vez. Vou convocar uma reunião com o núcleo forte do governo amanhã. De todo jeito, vou precisar que você me mantenha informado, se conseguir alguma informação dessa mulher e da DAZus, me avise imediatamente.

— Eu vou tenta governador, mas eu lhe disse, a DAZus joga sozinha, eles ocultam todos seus rastros. Não sei se vou conseguir algo.

— VOCÊ TEM QUE CONSEGUIR AUGUSTO! Você tem que conseguir. Meu mandato e minha reeleição dependem disso, eu preciso os destruir, eles todos, e isso inclui a DAZus. Quem não estiver comigo, não sobreviverá para estar contra mim. Meu caminho estará limpo e nada vai me impedir.

O helicóptero direcionou a noventa graus leste e seguiu em frente, uma tempestade começou a rachar os céus e fez com que o sinal da conexão ficasse extremamente fraco. Começou a chover e eu não ouvi mais nada. Mas tinha conseguido algo.

— Martha Nasser... filha do Dorsey. Esse mundo é mesmo pequeno.

Retornei para casa, estava me sentindo exausto, não apenas meu corpo, mas como se por dentro, tudo o que corresse em mim se cansara, até meu espírito. Uma sensação de frio desesperador me subiu pelas costas, percorrendo minha espinha até o topo da minha cabeça. Senti que não iria aguentar subir as escadas até o quarto e me deixei cair sobre a poltrona da sala. Meus olhos fecharam e eu não era capaz de os abrir novamente.

Retomei minha consciência e me vi nocauteado naquele estofado, suava mais que os ladrilhos brancos de uma sauna coreana. Obriguei minhas pernas a se firmarem e me lancei, passo a passo, em uma conquista do território que levava ao quarto. De frente para a cama, caí de joelhos no chão e apoiei meu rosto na parede do colchão que se punha a minha frente. Não entendia direito o que se passava com meu corpo. Tentei me livrar de toda aquela roupa, já pingava todo o suor que absorvia do meu corpo, e então, lancei minhas mãos sobre o colchão e puxei meu corpo para cima da cama.

A escuridão profunda que tomava aquela noite sem luar, tomou por completo meu sono, invadiu todo espaço em minha mente e me perturbara por toda noite. Eu não recordo bem de ter sonhado com nada em específico, mas as imagens das sombras que se contorciam em um ambiente ainda mais escuro, eram extremamente claras em minha memória.   

Já era próximo do meio dia quando acordei. Eu não reconhecera de modo algum o que havia me ocorrido na noite passada. Mas não sentia reflexo nenhum ao acordar pela manhã. E tinha muito o que fazer. Peguei meu celular, uma dezena de notificações. Algumas mensagens de Hugo perguntando se eu estava bem, creio que ele se preocupou com a minha falta de sinal de vida. Como era atencioso esse ser. Uma outra mensagem, entretanto, me roubou completamente a atenção e me fez esquecer de responder a mensagem de Hugo.

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Ix’Tab

— Em apenas um dia ?!... - Pelo visto, a rede de contatos de Ix’Tab não era de se menosprezar.

O tabuleiro começara a tomar forma nessa partida, eu estava colocando minhas peças em pontos estratégicos, mas estava na hora de fazer uma bela jogada, e é exatamente o que eu vou fazer agora.

 


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