9 anos antes, algum lugar do reino do Sudeste

                A casa era feita de pedra, não havia iluminação interna então estava um pouco escuro, com alguns raios de sol passando pelo telhado que não era feito do material de melhor qualidade, o único cômodo iluminado lá dentro era a cozinha, onde um homem de meia idade estava sentado esperando pacientemente que seu chá fique pronto naquela tarde, ele quase não possuía mais cabelo, tinha um corpo forte, sua pele era parda, tinha uma cicatriz na bochecha de um corte horizontal, vestia uma camisa de tecido fino, branca e uma calça preta de algodão, com chinelos nos pés.

Mais alguns minutos se passaram e finalmente estava concluído, serviu-se, mas antes que pudesse saborear o primeiro gole escutou batidas vindo da porta de sua residência seguidas de uma voz que chamava pelo nome.

                “Marcelo!” Exclamou a voz masculina vinda de fora da casa, ainda batendo na porta.

                “Droga.” Resmungou consigo mesmo e se levantou para atender, caminhando até a porta, destrancando-a e em seguida a abrindo, na sua frente via um homem conhecido seu, aproximadamente da mesma idade, seus cabelos eram negros e sua pele clara, as marcas da idade estavam presentes em seu rosto, seu corpo era forte, pois trabalhava carregando coisas pesadas. Ao lado dele havia uma criança que tinha algumas marcas em seu rosto, ferimentos, marcas roxas de pancadas, nada muito sério. “Nossa, o que aconteceu?”

                “O coitado tava sendo perseguido por um grupo de garotos mais velhos... De novo. Manda ele ficar longe de confusão, em algum momento pode não ter ninguém pra ajudá-lo.”

                “Entra moleque.” Falou pra criança que obedeceu, entrando na casa, deixando os mais velhos a sós. “Obrigado João, desculpa por isso, te devo uma.”

                “Me deve várias, mas tudo bem, só toma mais cuidado com ele.” Falou antes de se despedir, e começar a seguir o caminho contrário pelo que veio.

                Marcelo então fechou a porta de casa, trancando-a em seguida, indo em direção ao quarto do garoto, parou na porta e viu ele sentado á beira da cama, com as mãos juntas e olhando para o chão, seu cabelo castanho cobria seus olhos, não estava chorando, apenas não queria ver a cara do pai naquele instante.

                “Eu posso explicar...” Falou o menino.

                “Então explique.”

                “Eles estavam mexendo com um cachorrinho, batendo nele... Aquilo não era legal, então eu consegui salvar ele.” Marcelo suspirou e se sentou ao lado dele.

                “Yuri, eu entendo que suas intenções eram boas, mas eles poderiam ter te machucado de verdade.” Ele colocou a mão nas costas do mais novo. “Essa é a terceira vez que algum adulto precisa te trazer em casa para alguém não te bater.”

                “Mas ele não podia se defender...” O garoto apertava os próprios joelhos com as mãos.

“E você pode?” O mais velho falou, se levantando, Yuri agora olhava para ele. “Você é valente filho, mas sua valentia será inútil se você não souber se defender, e por isso pode prejudicar tanto você mesmo tanto os que você tentar proteger”

                “Eu sei, mas eu não ia ficar sem fazer nada.”

                “Com certeza, por isso me siga” Marcelo começou a andar para fora do quarto, Yuri seguiu-o para lá, descendo as escadas indo para o porão que o garoto nunca havia entrado antes.

                Quando chegaram lá embaixo, o homem acendeu as lamparinas uma a uma, revelando o que tinha lá embaixo, nas paredes armas estavam penduradas, espadas, lanças, machados e havia uma armadura samurai pendurada , era uma sala relativamente grande, então Marcelo parou e olhou para o filho.

                “É aqui onde você vai passar boa parte de seus dias, eu treinarei você para aprender a se defender, e para defender os outros.”

                “Demais! Mas assim do nada?” Falou o garoto um pouco nervoso.

                “Eu vi você indo escondido assistir aos treinos do exército real, acho que está pronto.” O homem falou com um leve sorriso. “Vamos começar.”

...

Dias atuais, dojô de Belo Horizonte.

                Todos estavam ansiosos para assistir o duelo, Nicholas e Yuri se preparavam enquanto muitas pessoas se aglomeravam para acompanhar, a área onde o confronto iria acontecer era um tanto grande, o Imperador se mantinha apenas usando o seu Kimono de treino diferente de Yuri que usava sua armadura de samurai leve, um membro do dojo chegava ao local do combate e entregava uma espada ainda dentro da bainha para Nicholas.

                “Tem certeza que não vai usar uma proteção melhor, senhor?” Perguntou o membro do Dojô. “Pode acabar se machucando.”

                “Está tudo bem, não há o que se preocupar.” Ele sacou sua espada, que não era uma Katana, era uma espada reta e aparentemente mais pesada.

                “É como eles haviam me dito, ele é diferente dos demais” Yuri pensou enquanto pegava a sua arma, e para surpresa de muitos, era uma lança, algumas pessoas diziam “sai daí moleque” ao longe e zombavam dele, ele ignorou e ficou em posição de combate, Nicholas não se importou muito e fez o mesmo.

                “Vamos começar” Nicholas manuseava sua espada com apenas uma mão, botando essa à frente do corpo. “Me ataque”

                Yuri correu para cima de seu adversário desferindo um golpe no lado desarmado de seu oponente que foi facilmente defendido, faíscas voaram, com surpreendente agilidade ele tentou desferir outro no outro lado, mas também foi facilmente defendido, então o lanceiro se afastou. Os dois trocaram uma encarada rápida, nenhum dos dois estavam brincando em serviço, então foi a vez de Nicholas ir para cima, Yuri tentou aproveitar a vantagem do maior alcance de sua arma para tentar interceptá-lo tentando um ataque vertical, mas a velocidade de reação de seu oponente era muito maior do que esperava, ele desviou e antes que pudesse fazer qualquer coisa, estava com um dos braços imobilizados e com a lâmina da espada em frente ao seu pescoço.

                “Acabou.” Falou Nicholas, vendo seu oponente soltar a lança.

                “Você é incrível.” Yuri deu algumas risadas, as pessoas aplaudiram os dois. “Melhor do que dizem por aí, senhor.”

                “De onde você veio garoto?” Perguntou enquanto guardava a sua arma de volta na bainha.

                “Uma pequena vila ao norte daqui, é um pouco longe.”

                “Tem algum lugar para ficar?” O homem mantinha a expressão séria.

                “Sabe, senhor Nicholas, eu nem pensei nisso, cheguei ontem à noite e dormi na porta do dojô esperando o senhor, hahaha.” O garoto dava algumas risadas sem graça. “Nem comi nada ainda.”

                “Ta com fome? Pega” Nicholas jogou para ele o recipiente onde estava seu lanche para viagem.

                “Mas é do senhor, não vai querer?” Ele abriu a vasilha, olhou a comida e ficou totalmente tentado.

                “Não se preocupe, vai ter muito mais quando chegarmos ao palácio.” O imperador se virou e começou a andar em direção a saída.

                “V-Você disse o palácio, vai me levar á sua casa?”

                Nicholas parou e olhou para trás

                “Não vou chamar duas vezes.” E continuou a andar

                “Demais.” Falou consigo mesmo, seguindo o homem para fora.

                A carruagem já esperava pelos dois do lado de fora, alguns se perguntavam o que o Imperador viu no rapaz, aqueles que viram a batalha acreditam que as habilidades dele em combate chamaram a atenção de Nicholas, e outros até se arriscam a dizer que o homem finalmente conseguiu um amigo, mas de qualquer forma, algo importante deve estar acontecendo.