Capuz Vermelho - 2ª Temporada escrita por L R Rodrigues


Capítulo 26
Cerimônia do despertar (Parte 2.1)


Notas iniciais do capítulo

Capítulo 2x12.

(Season Finale).



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— Você sabe por que me chamo Mollock? - perguntara o rei ao homem enjaulado e decadentemente largado naquele chão de terra seca e sem vida. 

Ele o encarou com uma frieza que, àquela altura, já estava tornando-se exaustiva. A única expressão com a qual podia vê-lo, não havia outra. 

— Por que está perguntando à mim quando você é quem deveria responder? - retrucou ele, desinteressado. 

A besta de um aspecto demonicamente canino suspirou de olhos fechados parecendo forçar seu fraco mecanismo que bombeava a calma e a paciência necessárias. Ao abri-los, seu olhar converteu-se em uma austeridade ameaçadora. 

— Há poucos instantes, descobri minha origem. - dizia ele, deambulando pelo cubículo terroso de um lado para o outro. - Foi em um livro utilizado por seres humanos fêmeas que adotaram práticas de idolatria a um deus chamado Hades. Por seus ritos obscuros e por se entregarem as trevas, elas ficaram conhecidas como bruxas. Fiquei surpreso pelo meu nome estar estampado naquela página. - fez uma pausa, parando de andar. - Este deus em questão governa um mundo inferior chamado Tártaro. Meu antigo lar. 

O cientista o ouvia atentamente, sem descravar os olhos fuzilantes naquele monstro. 

— Embora eu questionasse a origem do nome do livro, eu me contentei pela citação. - disse ele, orgulhoso de si. - Agora, finalmente, sei de onde minha parte mais poderosa provém. É reconfortante, é libertador. - aproximou-se da jaula tranquilamente, fitando o homem seriamente. - Eis a diferença que existe entre nós a ser quebrada, meu pai: Eu sei quem eu sou. 

O encarcerado denotou feições de ojeriza profunda e sincera diante daqueles odiosos par de olhos amarelos o encarando. Sentira-se obrigado a falar. 

— Eu... jamais me tornarei algo como você. - afirmou, frio. - Se diz meu filho... acho que agora é a hora de cumprir meu dever como "pai". 

Repentinamente, Mollock descontraíra os músculos, rapidamente esboçando empolgação. "Ele vai admitir, finalmente!", pensou, com expectativa. 

— Se sair por aquela porta agora mesmo... faça o favor de não voltar mais. - disse Loub, sério e em tom de ordem. 

A animação de Mollock se esvaíra num instante. Não estava disposto a seguir aquela aparente ordem, mantendo sua soberania única e nada compartilhável. 

Loub prosseguira, agora se levantando. 

— Pode conseguir todo o conhecimento que quiser... pode devorar todas as palavras de um livro e toda a carne de um corpo em pouco tempo... mas vai precisar muito mais do que isso se quiser tornar-se um rei merecedor do poder que obtém. - agora estava chegando mais perto das grades dianteiras. - Não vou me render aos seus propósitos, já me encontro no meu limite. 

— Está tentando me induzir a rendição? - indagou Mollock, tornando a encara-lo com mais rebeldia. 

Loub sorrira forçadamente. Seu maxilar parecia atrofiado demais para expressar qualquer reação feliz ou pelo menos uma tentativa para tal coisa. 

— Se eu fosse capaz de algo assim, talvez ficar trancafiado nessa jaula não me seria tão ruim. - aproximou-se ainda mais. - Que tipo de pai é esse que não possui controle sobre seu filho imaturo? 

Mollock já estava praticamente espumando pela boca tamanha era sua revolta mediante àquelas palavras zombeteiras. Rugira selvagemente, segurando uma das grades com brutalidade. Loub se afastou um pouco, sem tirar o sorriso forçado. 

— Essa raiva... essa irritação toda é porque falei a verdade? - perguntou Loub, provocando-o. - Não tem controle sobre si mesmo. E, ainda assim, deseja se consagrar como rei? 

— O primeiro passo - dizia Mollock, esbravejado. - é expandir minha mente! 

— Ótimo, então deixe-me completar o processo... - disse Loub, retomando o tom de voz rude. - ... com uma bala bem no meio da sua cabeça. 

— Com que arma? - perguntou Mollock, desafiador. - Com que autoridade? 

— Duvida? - disse ele, os olhos faiscando de coragem. - Você não sabe nem a metade, sua besta do inferno. Se há uma diferença entre nós... É que eu possuo controle sobre mim mesmo! 

— Você quer impor uma autoridade sobre mim que não condiz com sua posição! - retrucou Mollock com rispidez. 

— Então porque me chama de pai? - questionou Loub. - Porque ainda insiste me usar para que um dia eu possa me unir a você para "dividir o poder". Mas que piada de péssimo gosto! Quer compartilhar o poder porque não consegue governar sozinho? 

— Agora chega! - vociferou Mollock, dando as costas abruptamente. - Talvez eu tenha de rever meus planos para o senhor. Devo estar cometendo um erro ao pôr você no mesmo patamar que o meu. - se dirigira à porta, confiante. - Os preceitos humanos estabelecidos não se aplicam a nós dois. Pode ser meu pai, o meu criador, mas não possui a mesma vocação para segurar um poder enorme nas mãos. E isto é algo que somente eu, seu filho, pode merecer dignamente. 

Enquanto Mollock abrira a porta já de saída, Loub sentira um dor lancinante percorrer-lhe os joelhos e canelas. Teve de aproveitar a chance para faze-lo refletir sobre o que significa controle. 

— Mollock... Talvez nada impeça de você conseguir o que quer... mas saiba que a prova viva está bem próxima de você. - fez uma pausa. - Uma ascensão sem controle é a garantia de uma queda ainda mais incontrolável. 

Aquela conversa fora a última que ambos tiveram dentro da cela subterrânea... E, sobretudo, a primeira em que Robert Loub tinha dado a última palavra. 

                                                                                  ***

"Sem controle", pensara Mollock, as palavras de seu "pai" ecoando na sua mente inúmeras vezes. "Eu possuo controle... Agora!". O mundo ao seu redor era somente um borrão azul escuro enquanto corria em alta velocidade na direção de Rosie Cambpell, as garras prontamente afiadas reluzindo. A jovem, por outro lado, avançava contra ele emanando uma calma talvez ensaiada, mas que fora muito efetiva. Com aquela lâmina enorme, grossa e falciforme, Rosie corria pelo solo pedregoso, na parte mais alta das Ruínas Cinzas, encarando o algoz com ferocidade. Segurava o cabo da arma firmemente, e sua respiração ficava mais intensa à medida que seus corpos velozes estavam prestes a gerar uma colisão visceral.

Um estridente e irregular barulho metálico de ferro se chocando ressoou no espaço vibrantemente, fazendo erguer uma nuvem fina de poeira fria. Mollock defendera-se cravando suas dez garras na lâmina de Rosie, impedindo que a mesma o derrubasse ou o atingisse.

A jovem empurrava com mais força, mas se deu conta do quão pesado era o corpo do monstro. Por outro lado, Mollock tentava contra-atacar, também empurrando a lâmina na direção oposta, seus olhos fumegando ódio. De repente, sentiu que o fio de corte da arma penetrar nas suas palmas deixando cair algumas gotas de sangue. "Pode me ferir, mas jamais me matar!". Aquilo serviu como pura distração e ele foi empurrado cada vez mais pela força persistente de Rosie. Os pés do rei pareciam querer afundar-se no chão. Foi então que, canalizando toda a sua energia para seus músculos braçais, Mollock, primeiramente, virara a lâmina na posição vertical, em seguida conseguiu fazer com que o cabo de ferro oxidado batesse contra o rosto de Rosie com um baque tremendo na bochecha do jovem.

Jogara a arma a uma certa distância. Rosie caíra rolando no chão, a boca sangrando. A lâmina da arma bateu contra uma pedra próxima. Mollock, andando como se quisesse aumentar de tamanho - ao mesmo tempo agradecendo por sua fisionomia robusta -, tornou a fitar Rosie furiosamente. A jovem se levantara sem esforço, cuspindo sangue. Virou a cabeça para Mollock, fulminando com o olhar.

— Está jogando sujo demais para alguém que quer ser visto como um rei justo. - provocou ela, limpando o sangue que escorria pelo seu queixo.

— Ouça-me, criança, não preferiria gastar minha energia com você - dizia Mollock, relanceando a arma jogada no chão à sua direita. - mas estando conivente com os atos para me interceptar... não vejo outra saída a não ser mata-la.

Rosie colocou-se em postura e tornou a sorrir.

— Ah é? Então chega um pouco mais perto se quer mesmo tentar. - disse ela, idealizando uma manobra.

Com um rugido, Mollock iniciara mais uma ofensiva, correndo na direção dela, mas afiando somente as garras da mão direita. Como um reflexo instintivo, Rosie dera um pulo pairando horizontalmente no ar por milissegundos até chutar o rosto de Mollock com extrema violência. Em seguida, rapidamente o golpeara com o cotovelo na lateral de seu corpo, depois apoiando uma mão no chão para dar-lhe mais um chute bem treinado no seu maxilar, fazendo-o inclinar a cabeça para trás com um urro.

Mollock, para sua sorte, não caíra. Muito pelo contrário: Inclinou velozmente o rosto machucado para frente, na direção de Rosie, os olhos insanamente esbugalhados.

— É tudo o que você tem!? - questionara ele, as presas rangendo brilhantes.

A jovem não se abatera diante daquela monstruosa imagem. Sem perder tempo, correu até a arma caída no chão, segurando o cabo enferrujado e investindo contra Mollock sem titubear, resistindo ao peso da lâmina. Contudo, só o que ouvira foi o baque agora inconfundível das garras do rei contra o metal da arma. Com apenas uma mão, Mollock segurava a lâmina tremulamente, mas já contentado pela evidente vantagem. Sorriu abertamente para Rosie. A mesma o fuzilou com os olhos enquanto pressionava a arma contra a mão direita dele.

Rosie, estranhamente, sentiu um inesperado calor descer gradativamente até o cabo da arma. Franziu o cenho, confusa. "De onde vem esse... ar quente?!", pensou ela, cerrando os dentes. Mollock manteve-se sorridente... ao passo em que a mão que segurava aquele objeto cortante e pesado entrava em brasas. Rosie arregalou os olhos, estupefata. "A mão dele está queimando!". Não exatamente. A combustão provinda da mão se originara de seu âmago, sua vontade interior mais profunda, o calor percorrendo a lâmina, esquentando-a até a mesma entrar igualmente em brasas, crepitando. O fio cortante fora derretido virando uma pasta quente que derramava no chão, tal como lava de vulcão. Rosie largou imediatamente o cabo assim que sentiu o calor queimar-lhe as mãos. Nem ao menos percebera o golpe dado por Mollock contra seu rosto. O rei a atacara com uma bofetada, jogando-a a alguns metros de distância.

— Isso é incrível. - disse ele, admirado com a descoberta examinando sua mão. - É a aproximação! Posso senti-la! Estou chegando perto de meu destino!. - cerrara a mão, virando-se para o chão de ladrilhos verdes que formava o piso do Templo de Mitra.

Rosie novamente se levantava, observando com desespero Mollock correr na direção da tampa.

— Não! - berrou ela, começando a correr atrás dele em disparada.

Embora a distância entre o ponto de onde estavam parecesse relativamente longe da tampa, nenhum dos dois estava disposto a perder um segundo se quisessem obter suas conquistas. Mollock, em uma rápida manobra, pulou por cima de uma alta pedra, seu corpo em câmera lenta flutuando no ar e reluzindo à lua, atravessando o obstáculo. Uma gradual torrente de nuvens tempestuosas se aproximava dali... deixando o local ainda mais sombrio.

Rosie também pulara a rocha... para cair por cima dele!

A jovem agarrara suas mandíbulas com extrema força, erguendo-as. Mollock tentou se desvencilhar, querendo tira-la de suas costas, movendo a cabeça de um lado para o outro em um ritmo louco e selvagem. "Sua inseta! Saia de cima de mim!". A confusão entre ambos os fez esbarrar fortemente em um pilar afundado numa poça de areia. A estrutura rachou por alguns centímetros, caindo fragmentos e pó sobre eles. Rosie sacara uma adaga - desembainhando-a com um som rascante - e a enfiara na veia carótida de Mollock.

Seu urro estridente quase estourara os tímpanos da jovem, que logo pulou para voltar ao chão assim que um poderoso jato de sangue se lançava no ar ininterruptamente. Rosie assistia, caída no chão, horrorizada à cena. Mollock gritava de dor tentando pressionar a ferida, mas o denso espirro de sangue que saía o impedia. A jovem sentia todo o mundo a sua volta vibrar intensamente. "Mas que loucura é essa!?", pensou ela chocada, tentando se afastar, engatinhado para trás.

                                                                                 ***

Do outro lado, um pouco mais distante, Charlie corria por entre os vários pilares caídos, se escondendo a cada minuto e assistindo o embate que se seguia. "Não posso acreditar que Rosie está lutando sozinha contra esse monstro!", pensou o rapaz, embasbacado com o que via. "Ao menos ela conseguiu feri-lo... Mas não por muito tempo. Mollock possui resistência máxima e não demorará para se recuperar. Pode estar apenas fingindo dor para convencer Rosie de que não é tão forte quanto pensavam.". O mago do tempo mordera os lábios, tentando barrar os mais pessimistas dos pensamentos. "Hector, Adam... onde estão todos vocês? Venham logo!". Era imprescindivelmente necessário que Charlie conseguisse uma distância mínima suficiente para que pudesse conjurar o selo de barreira enquanto os outros distraíam Mollock . "É nossa última chance.".

Viu Rosie caída no chão... aos poucos se afastando do monstro que não parava de gritar e sangrar.

"Não recue, Rosie! Ele pode estar tentando ganhar tempo para pega-la desprevenida, ele sabe que está com a guarda baixa!", pensava ele, querendo, mais do que tudo, um contato quase que telepático. Mas era pedir demais. Restava-lhe apenas assistir desesperado.

                                                                                    ***

O time da Legião atravessava aceleradamente pelo espaço coberto por colunas caídas e despedaçadas.  Lester estava detestando ter que correr por aquele monte de escombros largados pelo chão. "Caramba, levar um tropeço nesse lugar é mais fácil do que levar uma bala na cabeça num tiroteio!", reclamou ele, empunhando sua eficiente Ak-47. Êmina, Alexia e Adam vinham logo atrás dele, correndo quase que lado a lado, passando pelos inúmeros blocos de mármore cinza.

— Cuidado, Alexia! - alertou Adam, olhando por trás do ombro. - Olhe bem por onde pisa!

— Tudo bem! - respondeu ela, correndo e focando-se nos blocos, atentando-se para não tropeçar.

Hector ficara para trás, em luta corporal contra um Red Wolf remanescente. Prometera alcançar os quatro logo mais assim que os viu correrem, mas, ao que tudo indicava, não estava para cumprir sua palavra tão cedo.

Uma sequência de socos entre ambos quase se fez interminável. "Estamos decidindo quem vai cair primeiro?! Eu topo!", pensou o caçador, revidando violentamente com um soco. Levara mais outro de igual peso.

Ambos tiveram de cessar por um instante. Estavam ofegantes e sangrando bastante no rosto.

— Olha... - disse o assassino. - confesso que estou cansado dessa brincadeira. Pausa para respirar.

Hector dera uma risadinha escabrosa.

— E eu que deveria estar ao lado dos meus amigos agora... tenho que perder meu tempo com um reles assassino profissional que pensa que, mesmo ganhando a briga, irá receber a recompensa!

— Cala a boca, seu otário! - vociferou ele, irritado. - Meu mestre vai me recompensar o quádruplo do salário que nunca cheguei a ganhar pelos serviços sujos que eu fazia!

— Seu mestre vai acabar morto se continuar insistindo em meter mais o nariz onde não deve. - retrucou Hector, semi-cerrando os olhos e encarando-o. - Ele teve sorte de ter escapado de mim com vida!

O homem respirou fundo se reposicionando para voltar com a troca de socos.

— Bem, parece que a pausa acabou. - disse ele, assoando uma narina de onde saiu uma boa quantidade de sangue.

Hector rira dele em tom baixo, mas zombeteiro.

— Tem razão. Acabou mesmo. - disse ele, logo sacando uma pistola de dentro de seu sobretudo.

Disparara um único tiro sem dó. O projétil acertara o peito esquerdo do homem em cheio.

Vendo o assassino cair se debatendo de dor diante de si, Hector assoprara a fumaça que saía do cano da pistola. Contudo, o caçador, sem perceber, acabou sendo acometido por um transe a partir de uma visão que o induziu a uma luta consigo mesmo. Aquele sangue quente gorgolejando pela ferida aberta pela bala lhe era, de alguma forma, atraente. Piscara os olhos diversas vezes, sentindo-se paralisado. "O que está havendo comigo?". Um desejo nunca antes experimentado passara a lhe torturar, quase dominando-o. A poça de sangue crescia à medida que seus olhos se tornavam mais ávidos... o homem já jazia morto no chão de pedra.

O caçador balançava a cabeça negativamente em rápido ritmo, não aceitando aquela sensação estranha e viciante. "Por que? Por que me sinto assim?", se perguntou, curiosamente sentindo seus caninos cresceram devagar. "Preciso sair daqui!".

Após recuar alguns passos, o caçador hesitou, inclinando a cabeça para um lado e observando o crescer da poça sangrenta envolta do cadáver. Em um desvencilhamento súbito e de muito esforço, ele saíra correndo na direção em que seus amigos estavam indo. Enquanto corria, refletia sobre aquele lampejo animalesco.

"Já está acontecendo... E mais cedo do que eu pensava!".

CONTINUA... 


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