Capuz Vermelho - 2ª Temporada escrita por L R Rodrigues


Capítulo 25
Cerimônia do despertar (Parte 1.4)


Notas iniciais do capítulo

Enfim a última... desse capítulo (risos nervosos).



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Os grunhidos de dor proferidos por Adam deixavam Alexia apavorada a cada minuto que se passava. Estava calmamente envolvendo a cintura do caçador com ataduras. "Aguente firme, Adam. Vai passar.". Um círculo vermelho podia-se ver na lateral direita do corpo, região onde se encontravam os rins. "Quando removi a bala pude sentir que não afetou nenhum órgão, nem o rim ou o apêndice.".

— Alexia... - gaguejava ele, a voz embargada de dor. - Já pode parar. Agradeço o apoio e toda a preocupação, mas já estou bem. - garantiu ele, erguendo levemente a grossa mão.

— Não está não. - retrucou ela, discordante. - Preciso leva-lo a um lugar seguro...

— Não, Alexia. - recusou Adam, engrossando o tom. - Você mal aguentaria meu peso, iria cair no primeiro passo. - disse ele, com um pontada de riso.

Percebendo o tom cômico que o caçador atribuíra a resposta, a vidente tornou a sorrir, envergonhada e quase tornando a rir também.

— Tem mesmo certeza de que consegue ao menos andar?

— Absoluta, eu juro. - afirmou ele, fazendo que sim com a cabeça. - Mas seria bem-vinda uma ajudinha pra levantar. - disse, desatando a rir.

— Tudo bem... - aquiesceu ela, estendendo os braços para tira-lo do chão. - Vamos lá. No 3. Um... - agarrou os antebraços robustos do caçador com firmeza. - .... dois... três! - e, por fim, levantara-o com um arranco, quase fazendo-a cair para trás.

Vendo que Alexia perdera o equilíbrio, Adam a puxara de volta antes mesmo que caísse segurando-a pela cintura. Os corpos de ambos ficaram colados... e seus rostos logo se enrubesceram.

Com os pés firmes no chão, Adam a soltara de imediato, suspirando de alívio.

— Ahn... obrigada?! - disse Alexia, incerta sobre o agradecimento.

Adam sorrira.

— Tudo bem. Estamos quites.

Olharam para a esquerda, escutando os incessantes barulhos de transmutações, intercalados por tiros. Após alguns segundos de reflexão sobre se deveriam voltar ou não a seguir, entreolharam-se no mesmo momento.

— Precisamos chegar até Êmina e Lester. Ouça... os sons estão se distanciando... talvez tenham conseguido ultrapassar o topo do morro.

— Tem razão. - disse Alexia, apurando a audição. - Mas com você nessas condições, nunca vam...

— Não, fique tranquila. - disse, pondo uma mão no ombro dela. - Meu corpo é resistente, os pontos não vão romper. Além disso, eu tenho um sinalizador aqui comigo, posso usa-lo para chamar a atenção dos Red Wolfs ou para avisar Lester e Êmina de que estamos vivos. OK?

Alexia acenou com um "sim", a expressão séria e determinada.

— É isso aí, vamos. - disse Adam, tornando a correr sem dificuldades, para a surpresa da vidente.

                                                                                    ***

Sob os pilares decadentes, frios e rachados, um dos assassinos corria aflitivamente pelos arredores, sem decidir exatamente qual rumo tomar, olhando para trás a cada um minuto. Em um instante de pura distração e temor, esbarrara com força em uma fonte. Quase caíra dentro, segurando-se firme na borda, sentindo com as mãos o mármore gelado e uma lufada de ar frio bem no meio do rosto cheio de cicatrizes.

A fonte parecera tomar conta de boa parte do espaço a sua frente. Desesperado, olhou em volta e só enxergou pilares, alguns caídos e outros erguidos e ladeados estreitamente, onde nenhum corpo humano, por mais magro e esguio que fosse, não passaria. "Completamente sem saída! Puta merda!", praguejara mentalmente, com as mãos na cabeça.

Um ruído de arma de fogo sendo carregada ressoou bem próximo de seus ouvidos. Virou-se para trás lentamente... deparando-se com uma figura que ele julgara indesejável. "Só pode ser brincadeira!"

O cano de um fuzil AK-47 estava alvejando-o diretamente na cabeça.

O homem ficara paralisado, seu sangue havia gelado, o suor esfriado. "Só há uma saída.".

Os passos do atirador foram se aproximando... até que homem resolvera tomar uma atitude extrema. Olhava para a arma e para o rosto de seu proprietário.

Tirado de sua manga, um revólver calibre 38 se revelara inesperadamente.

O homem mal percebeu o que havia feito tamanha era a rapidez com a qual havia feito.Apontou o cano do revólver para sua cabeça... tomado pelo descontrole emocional. "Só há uma pessoa nesse mundo que é digna de me matar!"

Seu dedo apertando o gatilho foi um movimento quase automático. O estampido ecoou pelo espaço.

Uma cachoeira de sangue jorrou em abundância aliada ao impacto da bala na cabeça do homem, havia transpassado seu cérebro.

Caíra de lado, a cabeça baleada afundando em uma densa poça de sangue. Trevor Sincoln se suicidara. O mesmo homem que era forte candidato a braço direito de Michael.

A figura que se aproximava de seu corpo parecia demonstrar um semblante de tristeza.

Lester foi tomado por uma angústia terrível ao olhar o corpo do assassino jazido.

— Poxa... Você roubou minha cena, cara. - disse ele, franzindo os lábios.

Assim que se preparava para sair dali, o caçador estremecera ao vislumbrar um avermelhado ponto luminoso emergir no horizonte. Reconheceu a fumaça que saía por baixo e seu peito se inflou de esperança. "Com certeza não é Charlie, mas só há uma pessoa na Legião que consegue lançar um sinalizador melhor do que eu: Adam!", pensou ele, correndo na direção do sinal brilhante.

                                                                                  ***

Após uma corrida que durara 10 minutos, Lester, finalmente, conseguira alcançar Adam, Alexia e Êmina, se juntando á eles sem cessar a correria. Agora suas pernas se movimentavam a toda velocidade para a direita, atravessando obstáculos - escombros de pilares largados e alguns até empilhados -, enquanto Êmina carregava a bazuca sem reclamar do peso ao mesmo tempo em que corria na frente, enfrentando o vento frio que penetrava na sua pele branca, nas bochechas coradas e nos lábios carnudos. "Nada pode nos barrar agora! É tudo ou nada!"

Adam lhe contara no caminho sobre o acidente que sofrera e como Alexia lhe foi importante. A vidente ainda o fitava orgulhosa, embora o mesmo estivesse correndo na sua frente e ela atrás. "Adam, eu havia esquecido de te agradecer por ter me convencido de que fui útil nessa missão.", pensou ela, os olhos marejados de emoção. Seus cabelos ruivos esvoaçavam ao vento enquanto corria e passava pelos blocos de mármore.

Lester agora corria lado a lado à alquimista. Sua preocupação agora estava focada em Charlie.

— Algum sinal do Charlie? - perguntou ele, ao pular um pedaço de um pilar.

— Nada ainda, infelizmente. - respondeu Êmina, o tom de emergência. - Não podemos se esquecer de Rosie e Hector! Viu eles?

— Nadica. - disse Lester. - Tomaram chá de sumiço.

— Talvez podem estar do outro lado! - deduziu Adam, otimista. - Desde que o tiroteio começou, não vi mais eles!

— Ah, essa não. - disse Êmina, desalentada e preocupada com ambos.

— Provavelmente, Charlie ainda não decidiu uma distância precisa de onde possa lançar o selo ou sinalizador! - disse Lester, suas pernas já indicando cansaço.

— Mas ele tinha que lançar o sinalizador assim que alcançasse o topo do morro! - acrescentou Êmina.

— Foi exatamente isso que expliquei pra ele! - afirmou o caçador estrategista, inconformado. - Não pode ser, cacete! Disse tudo sobre o plano e agora parece que esqueceu!

— Charlie tem memória eidética, só pra constar! - informou Alexia para Lester. - Ele jamais se esqueceria de algo tão importante, eu juro!

— Vamos descobrir assim que chegarmos lá! - retrucou Lester, impaciente e ansioso.

— Êmina! - chamou Adam, correndo por trás dela. - Não vi explosão alguma. Por que não usou a bazuca para acabar com uma boa quantidade de Red Wolfs?

— Olha, eu pensei bem e decidi reservar o único tiro que trouxemos para quando estivermos frente à frente com Mollock! - disse ela, a fala rápida como um míssil.

— O quê!? - questionou Adam, em reprovação. - O que vocês tem na cabeça? Por que não pensaram sobre levar dois ou três projéteis? Um só tiro não acabaria com mais da metade deles, mas acabar com Mollock!? Sem chance!

— Não esperamos acabar com Mollock com um tiro só. - redarguiu Lester, convicto. - Êmina e eu planejamos usar isso como parte da distração enquanto o Charlie prepara o selo.

Adam parecera refletir sobre a questão, ficando alguns segundos em silêncio.

— Tudo bem, então. É bom que funcione. - aquiesceu ele.

                                                                                    ***

Rosie e Hector corriam por entre as colunas decrépitas, ziguezagueando para lados diferentes o tempo todo. Quando puderam chegar ao topo e descer a ladeira até as ruínas, tinham combinado um plano incerto e arriscado. A separação de ambos acarretaria a resultados imprevisíveis. Por um breve momento, Hector achava a ideia inaceitável por valorizar seu puro instinto protetor para com a parceira de caçada. Rosie, por outro lado, persistira sem relutância em avançar sozinha ao encontro de Mollock. Visando uma menor perda de tempo, Hector acabara cedendo à vontade. Discutir era a última coisa que ele queria naquela noite e, certamente, não era nada apropriado naquela hora.

Agora estavam como competidores em uma corrida de atletismo, sendo iluminados pelo luar intenso.

Sem aviso, Hector enveredara para outra direção, como se conhecesse um atalho, sendo que somente conhecia as Ruínas Cinzas nos livros e nenhum deles constava uma mapa detalhado para se memorizar. Rosie achou estranho, mas preferiu não diminuir o ritmo de suas pernas para parar e pensar a respeito. "Pelo menos volte vivo, por favor.", pensou, logo se dando do quanto se preocupava com o caçador, embora, se dissesse isso oralmente, não quisesse admitir.

Sua capa vermelha voava às correntes de vento gélido. Os olhos da jovem faiscavam de bravura.

                                                                                   ***

Minutos de corrida desenfreada passaram como segundos. Hector passara por uma casa de mármore semi-destruída, pulando as muretas, sem olhar para trás.

Entretanto, sua concentração em seguir em frente o mais rápido que podia foi abalada por um peso que desabou em cima de seu corpo. Tal peso tinha braços que insistiam em agarra-lo e mante-lo no chão. Os dois corpos rolaram pelo solo arejado, fazendo pequenas nuvens de poeira.

Hector havia pensado que um bloco de pedra de mármore tinha caído sobre ele de alguma coluna.

O homem que o assaltara baixou o capuz, revelando um homem de meia idade com mal penteados cabelos grisalhos e curtos. Tinha um olho cego e um sorriso amarelado.

Hector o encarou com raiva, preso por seus fortes braços.

— O que acha de brincarmos um pouco antes do espetáculo começar hein? - perguntou-lhe o homem, sorrindo ameaçadoramente.

                                                                                     ***

Aquela já poderia ser, sem nenhuma sombra de dúvida, a metade do caminho até o Templo de Mitra. Mollock continuava caminhando tranquilamente, cintilado pela Superlua estonteante no céu. "Paz ao meu lado... guerra no outro.". Percorria uma área mais espaçosa e com menos pilares.

Do outro lado, Charlie se metia em uma das pilhas de blocos maciços de mármore para se esconder, sentindo próximo o bastante para alvejar Mollock. Para sua felicidade, as palavras para se fazer o rito de selagem poderiam ser proferidas por qualquer idioma, sejam eles de origem humana ou extra-mundana. Olhou por uma brecha, com máxima discrição. "Aqui já está bom. É o limite mais preciso que consigo acreditar. É uma pena não terem chegado ainda, meus amigos.", pensou ele, lamentando pelo fato de algo crucial no plano ter dado errado. Inicialmente, a estratégia consistia em distrair Mollock no exato momento em que Charlie estaria preparando o selo de separação e pega-lo de surpresa. Ao que parecia, na realidade, teria de contar com uma sorte improvável. "O sucesso da prática nem sempre é o reflexo do sucesso da teoria.".

Queria dizer algo a si mesmo, mas se limitava apenas aos pensamentos em turbilhão... por enquanto.

"Chegou a hora."

Pôs-se de lado ao último bloco da fileira empilhada daquelas pedras, olhando com cautela para Mollock. Sacou do bolso o selo e o desdobrou... sem descravar o olhar apreensivo do monstro.

"E ele continua andando... sem desconfiar de nada. Está muito focado.".

Erguera o papel estreito e amarelado diante de si, segurando-o. Por fim, abriu a boca para recitar, em eficazes sussurros, o rito de selagem.

— Para a destruição de qualquer unificação indesejável, quebre, separe, rompa o elo vivente entre dois corpos que existem como um só. 

Os dois símbolos desenhados um abaixo do outro emitiram um brilho amarelado e tremeluzente. Charlie soltara o papel... que permaneceu flutuando em pelo ar.

O mago do tempo estendera a mão novamente, com máxima confiança. Deu um pequeno empurrão no selo.

O papel, literalmente, voou em linha reta na direção de Mollock com grande rapidez.

O rei sentira algo se aproximando como um animal selvagem prestes a abocanhar sua presa e virara-se abruptamente para ver o que era. Como que por instinto, abrira a boca para rugir... mas ao invés de um som gutural e animalesco, de sua boca saíram labaredas de fogo crescente, sendo cuspidas contra o selo que se pulverizava de cima à baixo, até não restar mais nenhum pedaço.

O selo se perdera. Aquele fogo fora tão poderoso que nem o transformara em pó... tinha-se a impressão de que fizera-o evaporar junto a fumaça.

Charlie esbugalhara os olhos e entrara em completo transe de estado de choque.

Seus pelos eriçaram-se. Se escondeu rapidamente, pondo-se de costas aos blocos. "Eu não posso acreditar! Mas... Não pode ser! Mollock simplesmente cuspiu fogo e destruiu o selo!? Como isso...?". Um oceano de dúvidas enchia sua mente. Sentia que o ar se perdeu. Ofegou baixinho, tomando fôlego, não se entregando ao nervosismo completo. "Respire, Charlie.".

Pensou ter sua vida por fio ao pensar que Mollock se aproximava para encontra-lo.

Foi quanto uma voz familiar soou como um verdadeiro sinal de esperança. Sua expressão se suavizou... e o rapaz passara a ver pela brecha quem era, por curiosidade. "Ah, finalmente".

Nem mesmo o próprio Mollock conseguia acreditar que fizera aquele movimento. Sua boca fumaçava de leve, e isto parecia não incomoda-lo. "Isso foi fogo? É! Isto é um sinal! Estou na direção correta!".

— Ei você, seu feioso! - gritou a autoritária voz feminina.

Virando-se lentamente a fim de ver quem o desafiara com aquele tom que lhe era inadmissível, Mollock mostrou paciência.

Seus amarelos e penetrantes olhos foram de encontro aos azuis fuzilantes de Rosie... que o encaravam a uma certa distância.

A jovem empunhava uma arma colossal de aspecto antigo. Uma espécie de "foice" com duas lâminas grossas e curvas dos dois lados, prendida em um cabo de ferro descascado. Encontrara-a perto dali e teorizou ser pertencente a algum povo da civilização que antes habitava as Ruínas Cinzas... muito antes do local ser denominado assim.

— Presumo que veio acompanhada daquele caçador medíocre. - disse Mollock, ficando totalmente frente à ela.

— Sim. - respondeu ela, fria. - Seus amigos humanos nos impediram de passar. Confesso que me sinto bem melhor pelo jogo ter virado. - sorrira com elegância. - Agora sou eu quem estabeleço o limite.

— Eu já esperava que algo assim acontecesse. - disse Mollock, relanceando os olhos para a direção de onde viera o selo. - Alguém armar uma emboscada contra mim... me por na palma da mão. Você sabe quem foi, não é? - tornou a andar alguns passos.

— Sei sim. - respondeu Rosie, examinando a lâmina da arma, parecendo esnobar a estatura de Mollock. - Mas, é claro, não espere que eu vá revelar quem seja.

— O que a torna tão confiante a ponto de nem sequer se surpreender com o que fiz ou o que sou?

— Hector me contou tudo sobre você. -  disse ela, voltando a encara-lo.

— Ele não sabe nada sobre mim. - retrucou o outro.

— Parte de você assassinou o pai dele. - disparou Rosie, sem aviso. - E eu entro nessa briga pela memória do meu pai, não só pela causa de Hector.

— Seu pai!? - Mollock demonstrou ceticismo. - O que seu pai tem a ver comigo? Aliás, quem é você, afinal?

— Meu pai era um Red Wolf. - disse Rosie, com um tom emotivo. - Ele morreu por causa de um ataque cardíaco. E estou disposta a fazer qualquer coisa para impedir que Abamanu e você triunfem juntos. - elevara a voz, intensificando-se.

— Agora vejo bem. Esse manto vermelho que veste lembra bastante os que aqueles humanos usavam... mas é diferente, apenas uma capa com um capuz. Que desagradável. - disse ele, com um olhar entendiado. - E quanto à Abamanu... Ele terá que deixar eu triunfar primeiro.

— Não se eu evitar. - ameaçou Rosie, dando passos à frente segurando firme a arma.

— Humana tola. Espera me atrasar com um simples lâmina? - indagou Mollock, também andando.

— Não, tenho uma ideia melhor. - disse Rosie, passando a caminhar a passos largos. - Que tal chutar o seu traseiro?

— Ótimo. - disse ele, sorrindo, mostrando as presas. - Façamos um teste!

Ambos passaram a correr, um na direção do outro, tal como dois mísseis prestes a colidirem e gerarem uma explosão arrasadora.

Era o prenúncio de um furioso embate entre o bem e o mal.


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