Iguais, porém opostos escrita por Cellis


Capítulo 2
Como superior e inferior


Notas iniciais do capítulo

Olhaaaa quem resolveu aparecer duas vezes em menos de uma semana? Eu mesma, a pessoa que ficou em casa o carnaval inteiro e resolveu preparar mais um capítulo para vocês!
Gostaria de agradecer a cada um dos comentários de vocês, de verdade ♥

Boa leitura.



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Bo Ra nunca acreditou naquela história de vidas passadas. Tinha nascido há exatos dezessete anos e poderia morrer a qualquer momento — após isso, sumiria em algum lugar escuro e úmido debaixo da terra, até se decompor por completo. Ela sabia que sua forma de pensar era um tanto sombria e desacreditada, porém, a garota sempre a teve como uma verdade simples e concreta e assim conseguia viver sua vida mais facilmente.

Contudo, a Kang estava questionando aquela sua verdade naquele exato momento.

Dedilhando sua própria mesa, batendo uma por uma as unhas compridas contra a madeira branca ao lado do caderno aberto, ela não conseguia evitar que sua atenção fosse constantemente desviada dos números no quadro para o centro da sala. Ele tinha se sentado propositalmente na única cadeira que ocupava exatamente o meio da sala. Kim Taehyung acreditava ser o centro do universo até mesmo naquele momento, no meio da aula de física quântica, e isso fazia Bo Ra querer bufar até esvaziar seus pulmões por completo. Mesmo assim, ela teve de se contentar em escolher um lugar no canto esquerdo mais ao fundo da sala, já que, não importava para onde fosse, o maldito sempre estaria lá.

Yah, pare com esse barulho irritante, espaguete. — a voz sonolenta de Jimin chamou a atenção dela. Sentado na cadeira de trás, ele precisou se esticar um pouco para frente para que ela ouvisse seu resmungo em forma de sussurro. — Física já é uma matéria difícil, mas fica duas vezes pior com o barulho dessas suas unhas de bruxa.

Bo Ra, lentamente, torceu o próprio pescoço para trás para encarar o amigo. Ao deparar-se com o olhar assustador dela, Jimin lhe direcionou um pequeno sorriso torto, na tentativa de salvar sua pele.

— Senhorita Kang? — o professor da respectiva matéria, um dos mais jovens de todo o corpo docente, acabou por salvar o adolescente. Bo Ra virou-se para frente, rapidamente encontrando todos os olhares sobre ela. — Está tudo bem aí atrás?

Kim Namjoon era um homem com seus vinte e poucos anos, dono de uma inteligência assustadora, um belo porte físico e covinhas cativantes. Fazia a grande maioria de suas alunas suspirarem sonhadoras, mas, naquele momento, fez com que Bo Ra quisesse enfiar a própria cabeça dentro de sua mochila.

Ye, professor Kim. — respondeu e, mesmo incomodada por ter toda a sala lhe encarando naquele momento, seu tom de voz saiu natural e inabalável. Já estava acostumada a fingir. — Desculpe.

Namjoon sorriu, exibindo suas covinhas e arrancando um par de suspiros apaixonados na fileira da frente. Ele era uma pessoa extremamente compreensível e simpática e, vez ou outra, Bo Ra se perguntava como ele havia ido parar naquele buraco obscuro que era o Kobe Suwon.

— Tudo bem. — disse e, em seguida, fitou seu relógio de pulso. — Vocês estão liberados, classe.

Era hora do almoço e, depois de quase cinco horas dentro da sala de aula, os alunos finalmente teriam um intervalo. Bo Ra agradeceu mentalmente aos céus por ter companheiros de classe tão fúteis, que já estavam mais preocupados com qual seria o cardápio do dia do que com a leve vergonha que ela havia acabado de passar — não que ela desse importância para a opinião deles, mas era bom não precisar ouvi-las.

Bem, todos eles eram assim, menos ele. Taehyung era extremamente perceptivo e observador e, ao passo que as panelinhas foram se formando e a sala esvaziando, ele se manteve sentado no mesmo lugar que estava. Bo Ra o flagrou a fitando por cima dos ombros largos, com seu habitual sorriso quadrado e irônico — o mesmo que ele usou quando a pegou surtando sobre estarem na mesma sala, fazendo aquela pergunta sem pé nem cabeça logo depois e, em seguida, que manteve em seu rosto conforme ignorava a falta de palavras de Bo Ra e adentrava na sala como se nada tivesse acontecido. Bo Ra detestava aquele sorriso superior que ele sempre exibia especialmente para ela, deixando claro como ele se sentia sublime.

— Espaguete, pare de fantasiar com seu ódio mortal contra o Taehyung e vamos comer. — disse Jimin ao pé do ouvido dela, cutucando-a.

Ela fitou o amigo com uma expressão séria, se levantando à contra gosto em seguida. Quando viu as costas de Taehyung finalmente atravessarem o vão da porta, deixando os dois amigos sozinhos na sala, Bo Ra se sentiu livre o suficiente para puxar a orelha de Jimin.

— Fantasiando? Yah, você sabe que a gente se detesta.

Jimin resmungou, finalmente conseguindo fugir do aperto de Bo Ra em sua orelha, que agora estava vermelha e queimava.

— E como sei. — retrucou, fazendo cara feia.

E Jimin estava certo, afinal. Só a história de como Taehyung adorava colar chiclete no cabelo de Bo Ra quando eles eram crianças, ele já tinha ouvido várias dezenas de vezes — e aquela parecia ser a mais leve da grande biblioteca que guardava as histórias sobre a relação conturbada daqueles dois. Mas isso não importava porque, naquele momento, eles estavam há poucos passos de um almoço que cheirava extremamente bem.

Aquilo sim era importante para Park Jimin.

Ele não precisava se esforçar para ser fofo, já nascera com o dom e sabia disso. Por isso, tudo que precisou fazer fora exibir seu belo sorriso para a funcionária da cozinha, e a mesma pois uma quantidade generosa de comida em sua bandeja. Ele sorriu satisfeito, fitando a pequena montanha de arroz quase transbordando da tigela, ao passo que Bo Ra sacudiu sua cabeça negativamente.

— Aproveitador. — ela sussurrou rindo apenas para alfinetá-lo, enquanto se sentavam sozinhos em uma mesa mais afastada do enorme refeitório.

— E qual é o problema em exibir meu sorriso cativante por aí? — retrucou, fingindo-se de inocente.

Bo Ra teria sustentado mais um pouco aquela discussão de amigos, apenas para se divertir, mas acabou sendo impedida por uma presença inesperada.

— Mas olhem só, se não é o casalzinho mais bonito do Kobe Suwon, mas que na verdade não é um casalzinho. — a voz masculina um tanto embargada chamou a atenção dos dois. — Yah, vocês ainda continuam com isso... eu já desisti de entender, sinceramente.

E lá estava Min Yoongi, com seu uniforme desleixado, os cabelos negros que contrastavam com a pele pálida e a postura despreocupada. Ele encarava o casal de amigos com certa malícia no olhar e, quem visse de longe, com certeza acharia que estava bêbado — mas esse era apenas o seu jeito habitual de ser. Mesmo sem ser convidado, sentou-se ao lado de Jimin.

Hyung, você voltou. — disse Jimin, amigavelmente. Ele podia fazê-lo, já que Yoongi era quase dois anos mais velho. — Como foi seu ano sabático?

Maldita mania que Jimin tinha de ser simpático com todos. Yoongi havia desaparecido no ano passado, dando uma pausa no colégio justamente ao iniciar o último ano e, mesmo que Bo Ra tivesse certeza de que aquela história de ano sabático fosse nada mais que uma desculpa esfarrapada, ela estava longe de querer ouvir as mentiras do mais velho.

— Refrescante, meu caro Jimin. Mas agora eu estou de volta e quero comemorar por isso. — respondeu, e lá estava a maldade em sua voz que fazia Bo Ra revirar os olhos.

— E o que tem de tão bom em voltar para a escola, quando já deveria ter terminado os estudos? — a garota murmurou o mais antipática possível, fitando a própria comida.

Ah, eu tinha me esquecido de como você é um doce de pessoa, Bo Ra. — Yoongi disse, rindo do comentário que ela fizera e sem levá-lo como o insulto que realmente era. — Espero ver toda essa doçura na festa que estarei dando hoje à noite, na minha casa.

Bo Ra o encarou, descrente, enquanto Jimin pareceu se animar.

— Festa? — indagou o mais novo, sorrindo.

Ye. Os dois estão convidados e, por isso, pretendo vê-los lá. — Yoongi o respondeu, dando um breve tapinha no ombro do outro antes de se levantar.

— Quem vai?

Yoongi sorriu maliciosamente com a pergunta de Jimin e, alternando entre o olhar animado do garoto e o completamente desinteressado de Bo Ra, respondeu um tanto orgulhoso:

Todo mundo.

Assim, Yoongi os deixou sozinhos e voltou caminhando despreocupadamente na direção do seu restrito grupo de amigos. Jimin imediatamente fitou a melhor amiga que, por antecipação, resolveu já se pronunciar.

— Nem pense nisso, dedinhos.

Ah, fala sério! É só uma festa, sua anti social. — Jimin rebateu, frustrado. — Nós podemos ir, ficamos um pouco e depois vamos embora. O que acha?

— Não, Jimin. — ela respondeu, firme. — Sem chance.

 

***

 

Park Jimin tinha, por fim, um maldito sorriso charmoso e convincente. Nem mesmo Bo Ra, que já o conhecia há anos e sabia de todos os seus pequenos podres, conseguia resistir; e, por isso, lá estava ela, fazendo cara feia na porta da casa de Yoongi.

— Você está arrumada demais para quem não queria vir. — brincou Jimin, passando a mão pelos cabelos enquanto atravessavam a rua.

A música eletrônica vindo do interior da casa era tão alta que, assim que colocaram os pés na calçada do mais velho, já conseguiam ouvir o vibrar das janelas de vidro. Com certeza, seus pais não estavam em casa e nem ao menos sabiam sobre aquela festa.

— Não é porque eu estou aqui contra a minha vontade que tenho que estar desarrumada, oras. — ela respondeu, dando de ombros.

Na verdade, Bo Ra gostava de se arrumar. Sentia-se bem quando se maquiava, escovava seu cabelo e escolhia a dedo as melhores roupas que tinha em seu guarda roupa. Claro, ela fazia isso com o único objetivo de agradar os próprios olhos quando se olhasse no espelho, porém, os olhares admirados que recebia quando o fazia eram um bônus extremamente bem vindo — ela era bonita e sabia disso. Por isso, naquela noite, ela usava um short preto cintura alta, um cropped de lã verde musgo com uma gola alta quentinha e botas de camurça que imitavam um coturno. O coque alto e bem preso, além dos brincos de argola prateados, completavam o que o melhor amigo fez questão de chamar de obra prima. Bo Ra riu e, em resposta, resmungou que Jimin também estava mais bonito do que o normal.

A música alta invadiu os ouvidos de ambos, e só não era mais incômoda do que a casa extremamente cheia. Para todos os lados que se olhasse (ou que conseguisse se olhar, já que a única iluminação presente eram luzes coloridas que piscavam sem seguir um padrão exato) via-se adolescentes rindo, conversando, dançando, bebendo e, principalmente, beijando. Por algum motivo que Bo Ra não conseguia entender, era quase que uma lei uma garota solteira beijar alguém em uma festa, sem compromissos — às vezes, até mesmo as que não eram solteiras. Não que ela fosse do tipo romântico de garota, que se preservaria apenas para seu príncipe encantado, mas também não possuía nenhum resquício daquele desespero hormonal que via nos outros adolescentes da sua idade.

Os dois tiveram que andar um bocado no meio da agitação inicial da festa, até encontrarem um lugar um pouco mais calmo. Nos fundos da mansão da família Min, havia uma grande área de lazer com duas piscinas e coberta por um telhado de madeira rústico. Havia um número considerável de pessoas ali, a maioria estudantes do Kobe Suwon, mas ainda assim era um ambiente mais tranquilo por conta de ser mais afastado da origem da música.

Yah, eu vou buscar alguma coisa para a gente beber. — Jimin disse para ela, um pouco mais alto e já se afastando. — Não arruma confusão, pode ser?

— Eu vou tentar! — respondeu, rindo.

E então, Bo Ra foi deixada sozinha no meio do que apelidou carinhosamente de ninho de najas. Mas, no fim das contas, ela já estava mais do que acostumada a simplesmente ignorar a existência daquelas pessoas; por isso, tudo o que fez foi dar de ombros e procurar um canto onde pudesse se sentir mais relaxada. Acabou por encontrar uma área próxima à piscina que parecia uma choupana, porém um pouco mais sofisticada, e decidiu que ali seria um ótimo lugar para criar raízes até Jimin retornar. Enquanto caminhava para debaixo do guarda-sol, seus olhos se desviaram do caminho durante uma fração de segundos — que fora o suficiente para que ela cruzasse olhares justamente com ele.

Kim Taehyung estava impecável, como de costume. O suéter preto sem um fio sequer fora do lugar, a calça jeans monocromática que, ao contrário da moda atual, não possuía rasgos, e o tênis que quase brilhava de tão branco. Além de, claro, uma de suas marcas registradas: o cabelo extremamente sedoso, atualmente cinza, perfeitamente penteado. Ele e Bo Ra estavam em lados opostos da área mas, mesmo assim, ela podia sentir seu cheiro amadeirado, o qual ela achava enjoativo num nível astronômico. O rapaz a fitou e moveu o canto direito da boca num sorriso dado de má vontade e, em troca, Bo Ra tratou de revirar os olhos e direcionar sua atenção para o ponto mais distante o possível dele. Ela não estava disposta a deixar que todo aquele ar superior de Taehyung arruinasse sua já escassa felicidade em estar naquele lugar, por isso, optou por ignorar completamente sua presença.

Foi quando, nos segundos que se seguiram, ela conseguiu identificar uma melodia conhecida vindo de dentro da casa. Estreitou os olhos, como se isso fosse lhe ajudar a ouvir melhor, e logo reconheceu a música que tanto gostava. Crazy, do já desmanchado grupo 4minute. Não que aquele fosse o seu estilo preferido de música, mas a batida trazia boas memórias da época em que Bo Ra ainda fazia suas tão amadas aulas de dança. Fechando os olhos, ela conseguia ver nitidamente sua professora lhe pedindo para não dançar músicas daquele tipo de uma forma tão sensual, ao passo que a adolescente sempre a ignorava. Amava dançar, especialmente dançar como queria — e agora, sem perceber, já movimentava seu corpo, entrando no ritmo da música. Sozinha em sua choupana, ela discretamente misturava passos da coreografia original com os movimentos aleatórios que surgiam em sua cabeça, acabando por gostar do resultado que estava tendo. Por fim, cerca de um minuto depois, ela já não dava a mínima se alguém estava a olhando ou não, apenas dançava confortavelmente como gostava.

Já pelo fim da música, ela foi bruscamente interrompida por uma presença a qual desconhecia.

— Você dança muito bem. — disse um rapaz de cabelos vermelho escuro, se aproximando por trás de Bo Ra.

A garota se virou para encarar o dono da voz, e acabou por encontrar um sorriso largo e simpático. Enquanto ela prudentemente notou as roupas despojadas do rapaz e a postura bem humorada do mesmo, ele descaradamente a olhou da cabeça aos pés.

— Obrigada. — ela respondeu, mais por educação do que por realmente se sentir assim.

—Meu nome é Hoseok, sou primo do dono da festa. — apresentou-se, ainda mais simpático do que antes. — É um prazer conhecê-la.

Ele era primo de Yoongi? Bo Ra estava internamente espantada com a notável diferença entre os dois, mesmo mal conhecesse o tal Hoseok. Este último parecia mais bem humorado e educado, ao passo que Yoongi conseguia ser um poço de ignorância e sorrisos maliciosos.

— Bo Ra. — ela se restringiu a dizer, ainda sem muita expressão.

A verdade era que, não importava quem ele fosse, nitidamente pertencia ao mesmo meio que os alunos do Kobe Suwon — ou seja, Bo Ra preconceituosamente já não confiava nele. 

— Você é aluna do colégio Kobe Suwon? — ele indagou, parecendo curioso. Citando o colégio mais caro da cidade, como ela já esperava. Concordou com um aceno positivo de cabeça. — Eu também. Entrei esse ano para fazer o último ano, por causa dos meus pais. — de repente, ele riu sem jeito e coçou a nuca. — Entrarei, no caso, já que faltei logo no primeiro dia de aula.

Talvez, o rapaz estivesse esperando que, com todas aquelas afirmativas, fosse instigar a curiosidade de Bo Ra e fazê-la perguntar mais sobre ele. Assim, manteriam uma conversa longa e saudável e, no fim da festa, suas bocas já estariam se atracando.

Mas ele havia escolhido o alvo errado.

— Boa sorte. — ela disse, com certa ironia na voz.

Ele pareceu surpreso e, para a infelicidade de Bo Ra, também determinado a manter a conversa.

— Você é a primeira pessoa que não rasga elogios sobre o colégio quando eu menciono o mesmo.

Bo Ra o encarou, não conseguindo conter a amargura em sua risada.

— Eu não sou como a maioria dos alunos. — afirmou e, em seguida, deu de ombros. — Talvez seja por isso.

— Isso é bom. — Hoseok rebateu, mantendo o sorriso amigável no rosto.

Bo Ra teve a impressão de que ele estava prestes a dizer mais alguma, porém acabou sendo interrompido antes que conseguisse. A passos furiosos, uma garota que parecia alguns anos mais nova do que os dois aproximou-se com a expressão completamente fechada. Ela vestia roupas de marca e parecia ser uma daquelas adolescente que acreditam que são princesas da vida real, para (mais uma vez naquela noite) a infelicidade de Bo Ra.

Yah, quem é você?! — ela indagou diretamente para Bo Ra, que foi obrigada a erguer uma sobrancelha por conta da audácia da garota. — O que pensa que está fazendo com o meu Hobi Oppa?

— Yoon Hee, pare com isso. — Hoseok ordenou à garota num tom que soava cansado. A outra, por sua vez, lhe fitou furiosa. — Nós já conversamos sobre isso.

Pela semelhança dos nomes e pela personalidade nitidamente difícil, a garota com certeza era a irmã mais nova de Yoongi. Na verdade, reparando melhor nela, Bo Ra teve a impressão de já tê-la visto pelos corredores do colégio.

Ótimo, mais um membro arrogante e impaciente da família Min.

Oppa, você não tem o direito de andar por aí com vadias bem na minha frente! — a mais nova exclamou, manhosa e magoada.

Naquele momento, todas as atenções já tinham se voltado para os três. Mesmo assim, Bo Ra deu um passo à frente (como era vários centímetros mais alta, acabou por intimidar Yoon Hee) quando Hoseok ameaçou abrir a boca. Ela poderia ter a paciência e a indiferença que fosse em relação àquela gente, mas isso não significava que se deixaria ser pisada por uma garotinha mimada que nem conhecia — ou por qualquer outra pessoa, na verdade.

— Yah, se ele é seu oppa, eu sou sua unnie. — Bo Ra se pronunciou. Seu tom de voz era baixo e pausado, ganhando um efeito ameaçador que nem ela mesma esperava ser tão eficiente. — Por isso, dobre sua língua quando falar comigo.

— Eu não tenho unnies inferiores como você. — a garota, agora com o rosto vermelho pela raiva, também havia baixado seu tom de voz. Mesmo assim, ela ainda não soava um terço da mulher que Bo Ra aparentava ser.

— E eu gostaria que não existissem dongsaengs tão inconvenientes e irritantes como você. Mas, como dizem, nem sempre nós podemos ter o que queremos.

Aquela havia sido a gota d'água para Yoon Hee, e Bo Ra podia ler isso nitidamente escrito na testa da mais nova. Exibiu seu melhor sorriso vitorioso, mas infelizmente não conseguiu mantê-lo por muito tempo. Num piscar de olhos, a mais baixa deu dois passos à frente e, reunindo todas as suas forças, empurrou Bo Ra para trás. Porém, tudo que havia atrás de Bo Ra era a piscina de águas cristalinas — e foi exatamente lá que ela foi parar.

Nem mesmo a música alta conseguiu disfarçar o estrondo que o corpo de Bo Ra fez ao chocar-se com a água. Como não esperava por aquela reação, ela nem ao menos conseguiu puxar a mais nova junto consigo. Suas costas bateram na água fria primeiro, fazendo todo o corpo dela gelar, e Bo Ra bebeu uma quantidade considerável de água e cloro. No segundo em que o choque inicial passou, seu primeiro pensamento fora de quantas formas poderia torturar aquela pirralha maldita assim que saísse da água, para apenas matá-la depois. Quando finalmente conseguiu retornar à superfície, buscando desesperadamente por algum ar, ela se deparou com todos os olhares (e risadas) direcionados diretamente para ela. Yoon Hee sorriu orgulhosa de si mesma e deu as costas para a cena, justamente no momento em que Bo Ra estava prestes a xingá-la das palavras mais baixas e inapropriadas possíveis.

Ah, ela teria o que merecia, cedo ou tarde.

— Espaguete! — a voz de Jimin soou desesperada ao encontrar a amiga dentro da piscina, especialmente por causa da expressão de assassina que ela tinha no rosto. — Meu Deus, o que aconteceu?!

Esticando o braço na direção de Bo Ra, Jimin preocupou-se primeiro em ajudá-la a sair de dentro da piscina. Assim que o fez, apoiou Bo Ra na mesinha de madeira da choupana e jogou sua jaqueta jeans sobre o corpo encharcado dela, que tremia por causa do frio e da raiva. As risadas já haviam se dissipado, porém, Bo Ra ainda sentia todos os olhares tortos sobre ela.

— Foi você que fez isso com ela? — Jimin indagou para um Hoseok completamente chocado, já avançando na direção do rapaz.

Aniyo! — exclamou, fazendo com que o loiro parasse onde estava. — Pelos céus, Bo Ra, me perdoe. Eu sabia que a Yoon Hee não tinha juízo, mas isso... — ainda sem saber o que dizer, ele encarou a situação em que a garota se encontrava. Molhada, batendo-se sob a jaqueta de Jimin, com a maquiagem borrada, o cabelo bagunçado e, de bônus, ainda havia perdido uma de suas argolas dentro da piscina. Hoseok pareceu realmente desesperado, coçando sua cabeça com fervor. — Aish... eu deveria ter ignorado o conselho dele e ter ficado apenas a observando, de longe. Isso nunca teria acontecido se eu não tivesse vindo perturbá-la.

—Conselho? — Jimin indagou por Bo Ra, que tinha a garganta vedada pela raiva naquele momento. — De quem?

— Eu não lembro o nome dele, mas ele era alto, tinha os cabelos cinzas e um suéter preto. — respondeu Hoseok, vagamente. — Ele disse que eu deveria vir falar com você. Aish... me perdoe, Bo Ra.

Naquele exato momento, toda a raiva de Bo Ra subiu para o patamar do ódio. Ela já não ouvia os pedidos de desculpa ou as explicações de Hoseok, pois todos os seus sentidos voltaram-se lentamente para o lado oposto ao que se encontrava. E lá estava ele, discretamente erguendo uma taça que continha um líquido rosa exatamente na direção de Bo Ra, como se estivesse brindando consigo mesmo. O sorriso quadrado e superior estava lá, praticamente gritando para Bo Ra como ele sempre a consideraria inferior e, como de algum modo que ela não sabia, havia planejado cada segundo daquela confusão.

Mas Bo Ra não era inferior, e já estava farta da falta de limites de Kim Taehyung.

Ela se levantou sem precisar de ajuda e começou a caminhar na direção dele, como se estivesse só os dois presentes em toda a face da Terra.

— Bo Ra. — Jimin a chamou e tentou segurá-la, já sabendo o que poderia vir a seguir, mas foi em vão.

Tranquilamente, Bo Ra aproximou-se de Taehyung. Todos os olhos estavam sobre os dois, quando ele sorriu de canto e abafou uma risada.

— Você deveria ir para casa, Kang. — disse. — Vai pegar um resfriado se continuar assim.

Mais falso do que a preocupação do rapaz, apenas o sorriso gengival que Bo Ra abriu em seguida. Com toda a calma que ainda possuía e em silêncio, ela pôs sua mão úmida sobre a mão de Taehyung que segurava a taça quase transbordando, assustando-o. Ocupado demais tentando entender o que ela estava fazendo, ele nem ao menos tentou impedi-la de tomar a taça de sua mão — e, ainda com o cenho franzido, ele viu todo o líquido gelado e colorido ser jogado diretamente em seu rosto. Todos ao redor deles se espantaram e não fizeram a menor questão de esconder isso. Taehyung enxugou os olhos e, quando finalmente os abriu, Bo Ra pôde ver transbordando pelos menos o mesmo ódio que pulsava dentro dela.  

Isso apenas a incentivou a continuar. Sem muito esforço, ela se aproximou o suficiente para alcançar o pé do ouvido dele, que não se moveu.

— Eu estou de saco cheio de você, Kim Taehyung. — sussurrou com a voz rouca, tomando o cuidado para que apenas ele lhe ouvisse. — Parabéns. De tanto fazer da minha vida um verdadeiro inferno, você está prestes a conhecer o diabo... porque você é ruim, Kim, mas eu posso ser duas vezes pior.

Dito isso, ela se afastou dele com a expressão completamente vazia, porém firme e com fogo transbordando pelos seus olhos, exatamente como a dele. Ajeitou a jaqueta de Jimin e, sem se importar com mais nada, deu as costas para Kim Taehyung em direção à saída da festa. Mesmo perplexo (assim como todo o restante dos presentes), Jimin tratou de apressar o passo para seguir a amiga, até que os dois simplesmente desapareceram.

Bo Ra não fazia ideia mas, pela primeira vez, ela conseguira produzir um arrepio caloroso na nuca de Taehyung. E, também pela primeira vez, ele não a viu como um ser inferior; mas sim como igual.

Mesmo antes de começar, ele já estava achando que aquela guerra seria um tanto divertida.


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam? Aguardo suas opiniões, elas são muuuuito importantes!

Até ♥