As crônicas de Animadria. "Guerras no Norte." escrita por Lord JH


Capítulo 14
Julgamento


Notas iniciais do capítulo

Muruk, Teresia, Kimerion e outros seres decidem o destinos dos prisoneiros e sobreviventes da batalha do Rochedo.



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A neve cobria todo o chão e as montanhas do rochedo. E próximo ao lago, inúmeros seres se reuniam para decidir o destino dos seres prisioneiros da batalha do rochedo.

Mamutes, brontotérios, rinocerontes, eslámotérios e outros seres formavam um enorme círculo em volta de vários humanos, prineves, trolls da neve, gigantes de gelo, hienas, lobos, felinos, raposas e ursos.

Cervos de várias espécies, cabras e carneiros e até anões aguardavam o início do julgamento, que cuja noticia aparentemente havia se espalhado rapidamente, pois vários seres de cidades próximas apareceram para assistir ao decisivo evento.

Brimir, o centauro, havia chegado acompanhado por seus amigos e alguns seres da cidade de Verunia e Baratund; E logo após explicar que era um dos poucos sobreviventes de Valokia para Kimerion, Muruk e Teresia, o rei dos anões e os dois mamutes anciões lhe deram o direito de participar do julgamento.

— E que comecemos agora o julgamento dos prisioneiros e sobreviventes do exército dos rochedos! Kimerion, você começa. — Falou Muruk ao iniciar o julgamento.

— Eu começo? Bom, todos vocês já sabem a minha opinião. Devíamos matá-los e jogar o corpo deles no lago! — Gritou Kimerion ao apontar o seu machado para o troll de gelo Beolgar, que estava bastante machucado, porém vivo.

— Apoiado! — Gritou Theodor antes de barrir e levantar um coro de grunhidos de rinocerontes e brontotérios aliados.

— E contaminar a nossa agua com o corpo imundo deles? Essa é uma péssima ideia! — Falou Pelbo, o carneiro, ao demonstrar insatisfação com a ideia do rei anão.

— Concordo com Pelbo. Não podemos condenar a nossa maior fonte de agua da região por causa de monstros como esses. — Falou Malukia, a cabra da montanha que liderou o primeiro ataque na batalha.

— Então tá, joguemos eles em outro lugar. O fato é que devemos mata-los. — Falou Kimerion em concordância plena.

— Não concordo! — Falou Tobias, o alce gigante que liderou o primeiro ataque ao lado de Malukia e Belunia.

— E com o que você não concorda, Tobias? — Perguntou Kimerion com um tom de voz desgostoso.

— Eu não concordo com a decisão de executá-los. Eles já se renderam! Não apresentam mais perigo para nós. Talvez seja bom dar uma segunda chance a eles. — Finalizou o alce gigante com a sua voz grave e bela.

— Segunda chance? Segunda chance!? — Indagou Brimir, o centauro de Valokia. — Eles não deram uma segunda chance para a minha cidade, deram? —

— Sim, é isso mesmo! Eles mataram quase todos, exceto aqueles que não estavam presentes no momento do ataque ou os que conseguiram fugir voando ou nadando! — Exclamou Berena, a centauro de belos pelos dourados e liso.

— Exato. Eles não merecem piedade, ou gentileza! Eles merecem a morte! — Gritou Kimerion ao levantar o seu machado mais uma vez.

— E eles merecem a morte pelo o que eles fizeram aos mamutes ou pelo o que aconteceu com a sua irmã? — Perguntou Tobias de maneira direta.

Um silencio monstruoso caiu por sobre a multidão de seres, e todos olhavam ansiosos para o rosto sério e furioso de Kimerion.

Foi então que em uma tentativa de mudar o clima de constrangimento, Teresia perguntou — E você Barabar? O que acha que deve ser feito? —

Barabar demorou alguns segundos até entender que a pergunta se dirigia a ele, e quando ele começou a falar “ Bem, é.... Eu acho que...” ;  Kimerion interrompeu e falou — Sim, a minha irmã, alce. Você lembrou bem mais um dos crimes que esses monstros cometeram! O assassinato da minha irmã. —

— Não sabemos se eles cometeram esse crime. Tudo o que temos sobre isso são boatos. — Falou Belunia ao dar apoio a Tobias na conversa.

— E o que você acha que aconteceu com a minha irmã, rena? Que ela tropeçou e caiu do penhasco e morreu? Ou talvez que a manada de Laina sofreu uma avalanche e congelou até morrer? Ou melhor, que a cidade daquele centauro ali pegou fogo porque uma vela de cera caiu em cima do palheiro e queimou tudo!? — Gritou Kimerion quase perdendo o controle.

— Nós não queimamos Valokia! — Gritou uma raposa vermelha do grupo dos prisioneiros. — Nós nem sequer saímos dos rochedos quando Ulrk abandonou esse lugar com o exército e os dragões. — Finalizou a raposa ao conseguir a atenção de todos.

— Então você está me dizendo que vocês são inocentes, raposa? — Perguntou Velkur, o prineve de Baratund, com uma cara de pouco amigo.

— Sim, nós somos! — Respondeu Maluk, a raposa vermelha macho e corajosa. — Nós nunca sitiamos Valokia, ou matamos irmã de rei anão nenhum. E muito de nós também não participaram do ataque aos mamutes. —

— Então quem participou!? — Perguntou Kimerion indignado com a resposta da raposa.

— Isso eu não sei, senhor anão. Quando cheguei aqui os mamutes já estavam mortos. — Respondeu Maluk sinceramente.

— Mas você comeu da carne deles, ou não comeu? — Perguntou Tereb, o rinoceronte, furioso.

— Comi! — Respondeu a raposa de imediato. — Assim como todos que estão aqui ao meu lado. Pois essa foi a decisão apropriada a dar ao corpo deles. Ou vocês quando pescam um peixe ficam observando ele até apodrecer?  — Perguntou Maluk com coragem e sinceridade.

— Está chamando nosso povo de peixe!? Seu... — Reclamou Theodor antes de ser seguido por Beorobor que disse — Mata eles logo! —

E então vários seres começaram a gritar e opinar decisões, cada uma mais sangrenta que a anterior.

— Silencio! — Gritou e barriu Muruk para fazer todos se calarem. — Estamos em um julgamento, não em um concurso de que grita mais alto! Prossiga...? —

— Maluk. Apenas Maluk, senhor. — Respondeu a raposa agora um pouco acanhada.

— Maluk. Você nasceu aqui nos rochedos, ou é de outra região? — Perguntou Muruk curioso.

— Não, senhor. Eu nasci na grande floresta entre os rochedos e a montanha de Dubaldor. — Respondeu a raposa sinceramente.

— E por que veio para cá, Maluk? — Perguntou Muruk enquanto estudava atentamente a raposa.

Maluk: — Abrigo e alimento, senhor. Essas são terras difíceis para todos. E apesar de sermos predadores, também sentimos frio e fome. —

— Então porque não pescam ou procuram outra coisa para comer ao invés de nosso povo? — Perguntou um coelho branco que se juntara a reunião sem ninguém perceber.

— Porque o peixe não grita, não é isso o que você quer dizer? — Falou Maluk ao olhar para o pequeno mamífero. A verdade é que peixe não dá na neve, e nem todos nós somos hábeis pescadores, como humanos, ursos ou elfos. Sendo que até eles também falham na arte. — Respondeu Maluk sinceramente.

— Então, Maluk, o que você sugere que façamos com vocês? Que sintamos pena de sua história, e deixemos todos vocês para viver e nos matar novamente? Ou que acabemos com isso aqui e agora e eu nunca mais terei que ver nenhuma dessas hienas e outras criaturas fedidas de sua laia? — Perguntou Sogor, o cavalo peludo e amigo de Brimir de Valokia.

Maluk: — Não, eu sugiro que façam como disse o alce ali e nos deem uma segunda chance. Olhem para nós, não são monstros o que vocês enxergam, são velhos, filhotes, fêmeas, e seres feridos por uma batalha já perdida! Kilbar está morto, e aqueles que queimaram a cidade de vocês já estão em outro continente nesse momento. Vocês vão mesmo nos culpar por um crime que não cometemos? —

 — É isso mesmo! Não temos culpa de nada! Vocês já mataram muitos dos nossos na batalha. Já não foi sangue o suficiente? — Perguntou Berunia, a leopardo das neves de assustadores olhos vermelhos.

— Bom, se depender de mim, não! — Respondeu Barabar, o brontotério branco e de personalidade impetuosa.

— De mim também! — Gritou Beorobor, o javali.

Logo, outros seres recomeçaram a opinar, mas antes que Muruk precisasse pedir silencio, uma voz velha e arrastada ecoou pela superfície do lago e acima da voz dos outros seres.

A voz pertencia a um velho humano, de roupas de couro surrada, e carregando um pequeno bebê nos braços.

— Com vossa licença, senhores. Me chamo Armuk, e eu sou o ancião da tribo Tafetau, esse pequeno bebê que trago nos braços é filho da minha filha que foi morta por uma flecha e uma lança de anão atravessadas no ombro e no peito. Tudo o que eu pude oferecer para a minha filha comer, foi carne e alguns cogumelos. Meu sonho sempre foi querer descobrir como os anões conseguiam cultivar cogumelos, raízes e outros fungos comestíveis nas cavernas deles. Tudo para que o meu neto um dia não precisasse matar outro ser pensante para ter que se alimentar. Mas os anões nunca pisariam em nossas terras, ou ao menos assim eu pensava. Mas agora vejo inúmeros anões, armados e prontos para me matar e não para me ensinar algo que poderia mudar a vida de todo o meu povo para todo o sempre. — Finalizou o velho com tristeza e um imenso pesar na voz.

Todos os seres ficaram em silencio e olharam diretamente para Kimerion que examinava o velho com um olhar frio e sério.

Passado algum tempo, Tobias se aproximou do rei anão e delicadamente perguntou — E então Kimerion, já se decidiu se vai matar alguns velhos e inocentes ou se vai fazer algo para mudar a realidade deles? —

Kimerion pensou mais um pouco, e após olhar para a neve em seus pés, falou — É, eu talvez possa ensinar algumas coisas ao povo dele.... Mas só se eles prometerem nunca mais caçarem e se alimentarem de um ser pensante outra vez. —

— Parece um trato justo para mim. — Falou Muruk em concordância.

— Obrigado senhor, obrigado. Eu prometo que a partir de hoje, a tribo Tafetau, nunca mais terá que derramar sangue inocente. — Falou o velho Armuk agradecido.

— E a tribo Palapara também! — Gritou uma mulher magra com grande parte do braço esquerdo faltando.

— E a tribo Teturu! — Gritou outro homem segurando uma criança nos braços.

— E também a tribo dos Urikibais! — Gritou uma velha de longos cabelos brancos.

— E nós também! Nós trolls de gelo, amamos cogumelos no jantar. — Falou Beolgar tremendo de medo e euforia.

— Então está decidido! Façam um juramento e prometam que nunca mais vão se alimentar de nenhum ser pensante novamente. — Falou Teresia decidida.

Foi então que um alto grito duplo ecoou dos dois lados do grupo.

 — Espere, não podemos fazer isso! — Falou Brimir, o centauro, e Morogor, o leão das cavernas branco, e agora cego do olho esquerdo.

— Como disse? — Perguntou Teresia se sentindo insultada e interrompida em seu momento de fala.

— Não podemos aceitar que eles façam isso! A minha cidade queimou e ninguém será punido? — Perguntou Brimir extremamente indignado.

— Bom, você pode tentar achar os dragões, Brimir. Ouvi dizer que eles foram para o Sul. — Falou Beorobor bastante sarcástico.

— Escute aqui, javali! Minha cidade queimou e eu não saio daqui sem justiça! — Gritou Brimir furioso.

— Então receio que terá que procurar pelos incendiadores de sua cidade em outro lugar, caro Brimir. Pois aqui não encontrará nada mais do que, segundo as próprias testemunhas que afirmam que foram dragões de gelo que queimaram a sua cidade, inocentes de sua acusação. — Falou Muruk com um tom de voz paciente, mas decidido.

— Mas eles mataram o seu povo! — Replicou Brimir inconformado.

— Então o crime deles, não recai sobre você. Ou estou errado, Brimir? — Perguntou Tobias calmamente.

— Mas isso é errado! — Gritou Brimir mais uma vez.

— Talvez seja, mas não tanto quanto o próprio acusado se negar a receber o seu perdão. Qual é o seu nome, leão? —Perguntou Muruk ao se virar e olhar para o leão da caverna branco.

— Meu nome, é Morogor, senhor. E a condição imposta pelo rei anão só pode ser mantida por alguns seres aqui. Pois um leão e outros felinos, precisam de carne para viver. — Explanou Morogor com sinceridade.

— É verdade, senhor Muruk, não tem como alguns desses seres manterem a promessa. — Falou Miguar, o elfo guerreiro de Verunia.

— Então o que vamos fazer com eles? — Perguntou Theodor ansioso por um pouco de sangue e morte.

— Não há o que fazer. — Respondeu Velkur, o prineve líder da guarda de Baratund. — Deixem eles partirem e digam para nunca mais voltarem ao rochedo. —

— Isso é loucura! — Gritou Sogor extremamente inconformado. — Como vamos saber se eles manterão a promessa, como vamos saber se podemos confiar neles? —

— Porque Morogor não mentiu sobre a sua condição com a proposta. — Respondeu Belunia, fazendo todos se calarem. — Sim, ele poderia muito bem ter mentido, ou ficado quieto diante da proposta e mesmo assim sairia livre e pronto para caçar e matar outro ser; mas ele assumiu a sua condição e se recusou a proferir um juramento impossível de se manter. E por esse ato, acho que ele merece o nosso respeito e talvez um pouco de nossa confiança. — Finalizou a rena ao bater com o casco direito no chão.

Então todos ficaram em silencio antes de surgirem os primeiros murmúrios de concordância.

Muruk então concordou com a sua tromba, e falou — Ninguém poderia estar mais certo do que Belunia nesse momento. A decisão foi tomada e se alguém for contra ou quiser falar algo, esse é o momento. — Falou Muruk ao olhar para os lados.

— Vocês são uns loucos! Bonzinhos demais para o meu gosto! — Falou Brimir ao bufar e olhar para os mamutes.

— Calma Brimir, vocês podem ficar na minha cidade. Minha guarda necessita de guerreiros habilidosos e fortes como vocês. — Falou Miguar ao colocar a mão na garupa do amigo centauro.

— Então, se mais ninguém vai falar nada.... Peço para aqueles que não são nativos do rochedo, e que realmente não possam proferir o juramento, que partam agora. — Falou Muruk decidido.

Foi então que Morogor, e vários outros felinos e predadores deixaram as margens do lago e atravessaram através da multidão em direção aos seus antigos lares.

Porém, antes de ir, Maluk se aproximou de Muruk, e em um tom de voz bajulador e admirado, falou — Muito obrigado, senhor mamute. Nunca vou esquecer a lição que aprendi com vocês aqui hoje.

Muruk então tocou a ponta da tromba na cabeça da raposa, e respondeu — Não precisa agradecer, senhor Maluk. Pois você também nos deu um aprendizado muito maior do que você pode imaginar. —

E então, após agradecer mais uma vez, Maluk partiu, enquanto Muruk esperava que o resto dos seres que ficaram proferissem o juramento.

 


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Notas finais do capítulo

Continua...



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