Um tal Cavaleiro escrita por Sabonete


Capítulo 2
A merda não tira folga


Notas iniciais do capítulo

Dancan tem mais um de seus dias revelados.
E se vocês se perguntam se todos tem a sorte dele, a resposta é simples: quem procura acha!

Espero que gostem!

E por favore, se leram e gostaram, comentem :3



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Pharvra estava do meu lado, como sempre, olhávamos as águas transparentes do rio que cortava a pequena Turd, uma vila distante de Estherburg, onde costumávamos ficar estacionados durante os treinamentos militares do meio do ano.

Ela falava de como a experiência militar era algo bem fora do que imaginava quando era mais nova, nada mais do que uma camponesa com medo da vida adulta.

Eu apenas a ouvia, sua voz era gostosa, e suas frases faziam todo o sentido. Acho que sua insegurança é a base para muitos que se alistam voluntariamente para as forças militares, como eu também fiz.

A tenente dizia que a ideia de ser uma camponesa a mercê de Senhores, burgomestres, nobres ou clero, não a agradava desde cedo. Essa ideia era municiada dos relatos constantes de visitas de "homens de berço" as vilas e dos estupros que aconteciam.

Eu só podia concordar com ela, as histórias eram comuns na minha cidade natal, inclusive, isso também acontecia com os homens, mas em menor número.

Esse não era um medo comum, a incerteza de poder ter uma vida com comida na mesa, ou um teto sobre a cabeça também era muito parecida. Algo que compartilhávamos com dois a cada três membros do exército.

Pharvra insistia em dizer que isso era um plano arquitetado pelo Rei Louco, Gurdus Tavollon XI, que instaurou a Lei do Alistamento Voluntário, as atuais taxas de impostos, e outras regras rígidas que hoje em dia são naturais para todo mundo em Dantália.

A voz dela era um pouco hesitante, ela me olhava de lado. Acredito que buscava algum sinal de julgamento da minha parte. Talvez pensasse que falar aquilo a faria parecer uma mulher fraca. Bom, eu pensava exatamente o contrário. Para mim, ela era a mulher mais forte que já conheci.

Nossa conversa foi interrompida pelos gritos de um homem de idade avançada. Naquele momento eu não sabia o que era, mas já me culpava por não estar com minha cota de malha. Esperta foi Pharvra, que mesmo nos dias de folga permanecia "montada" para a batalha. Como ela dizia, e acabava de se provar; "a merda não tira folga".

Fomos correndo, com nossas armas em mãos. Nós dois, e mais alguns guardas de Turd correram para o portão da palhiçada. O senhor respirava com dificuldade e apenas balbuciava algo sobre os homens rato.

Podiam ver nos olhos dos guardas o escárnio, mesmo que não rissem. Eles ficavam engraçados com aqueles capacetes cônicos, mas me fez sentir falta do meu.

Pensei em pedir-lhes que levassem a situação mais a sério, mas infelizmente um homem rato saltou por cima dos muros de madeira, e matou num único movimento um dos aldeões que acudiam o velho.

Homem Rato era um termo bem pejorativo para uma besta humanoide com feições animalescas, coberto de pelos e com uma calda longa e careca. Eram feras agressivas, territoriais e tinham um gosto problemático por carne de gente, como a do aldeão da ocasião.

Os guardas se assustaram bastante, acho que nunca tinham visto um homem rato. Bom, nem eu, mas já havia lido sobre eles.

Essa era uma vantagem de saber ler, a desvantagem era que eu perdia muito tempo enquanto muitos amigos festejavam nos bordeis.

Pharvra também sabia ler. E ela, ao contrário de mim, gritou para tomarem cuidado, pois eles andavam em bandos, e sempre um ia na frente, como um batedor.

Eu? Eu deveria realmente dar as ordens, afinal era o oficial de maior hierarquia ali. Mas não tinha tempo para falar algo, já que sem Pharvra perceber, outro homem rato saltou pelo muro de madeira, bem em cima de mim.

Eu lutava pela minha vida, e ele pela dele, ou para me comer.

O que os livros não diziam, era como esses serem tinham o hálito ruim. Misture carne podre de uma semana, com água da latrina de Estherburg e temperem com a sopa 'especial' do cozinheiro chefe da cantina do dormitório, que você teria ideia do que eu quero dizer. Os livros também não dizem o motivo esse cheiro faz seus olhos lacrimejarem e seu nariz arder.

Pharvra ainda não tinha notado minha interação não consensual com o homem rato. Ela estava ocupada organizando os guardas, que já avistavam um grupo maior das criaturas correndo por entre as árvores.

Meus braços doíam, eu não esperava que aquele animal fosse tão potente. Naquele momento não haviam muitas opções, tínhamos ido silenciosamente em nosso duelo, para um beco escuro. A maldita criatura não emitia nenhum som, e eu estava preocupado demais em respirar.

Talvez sua força, sua agilidade, sua capacidade muscular, ou seu instinto, seja lá o que foi, o fez ser capaz de me superar. Meus braços foram lentamente cedendo aos dele enquanto sua mandíbula fétida se aproximava de meu rosto. Maldito habito de criaturas nefastas de comerem a cara dos seus inimigos.

Minha vida passou pela minha cabeça. Meus irmãos me maltratando por eu ser o menor deles, meu pai me batendo, minha mãe me batendo, os instrutores me batendo, meus colegas me batendo. Em um inside momentâneo, comecei a me achar um pouco masoquista.

A gota de saliva tóxica caiu diretamente na minha boca. Eu tossi, e aquilo tirou de meu transe pré-morte. Sem pensar, enfiei meu punho fechado dentro da boca do animal, e não me contive até que todo ele, até chegar ao meu ombro estivesse imerso nas entranhas da fera.

Eu gritei "Você quer? Então toma".

Não foi coragem, ao contrário do que Pharvra especulou quando veio me procurar e me encontrou com a criatura caída em cima de mim. Ela havia liderado a guarda e controlado o ataque dos homens rato. Foi um ato desesperado movido a medo da morte e um nojo profundo daquela porcaria fedegosa que tinha tocado minha boca.

Com certeza eu morreria de alguma doença incurável, ou viraria um babaca feito o Comandante Lander. Torcia para que a morte viesse.

Dias depois, já em Estherburg, todos que passavam por mim me olhavam estranho, não poderia os culpar, meu braço direito estava com um odor tão ruim, que nem mesmo a lealdade de minha tenente era capaz de superar. Mesmo depois quatro banhos, dois deles com ervas perfumadas.

Capitão fedido era meu apelido, carinhosamente dado por Houser.


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Notas finais do capítulo

Espero que o protagonista comece a estar sendo moldado para vocês, porque até esse ponto na minha cabeça ele ainda estava nesse processo de criação.

Bom, volto aqui com a continuação para a semana (:



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