Quantas dúvidas escrita por DiHen Gomes
Chego chegando, o primeiro a entrar na sala para a prova final. O professor já está em sua mesa e nos recebe sorrindo. Meu sorrisão é maior que o dele, o que o faz diminuir um pouco o seu.
— E aí, professor, beleza? Vai arrebentar a prova hoje!
As meninas não tiram os olhos de mim. Sei que sou bonitão, fazer o quê, né? Mas já falei que não quero saber delas! Hoje só tenho que responder tudo certo e adeus, escola! Tchau, professor Igor! Falou, Caio!
— Está bem confiante, Bruno.
— Só parece! Tô brincando, vai arrebentar!
Vou para o meu lugar e aguardo. Venha logo, prova! Um silêncio precede o som dos papéis na mão do professor. Ele ainda tenta nos amedrontar, mas eu tenho certeza que nessa prova vou tirar nota máxima. Tá ligado!
Não sou o primeiro, mas termino cedo. Levanto com meu sorrisão de aparelho azul e deixo a prova ao mesmo tempo que dou tchau com a outra mão ao professor.
— Rápido, não? Como você colou sem eu perceber?
— Quer saber, professor? Minha cola foi Deus. Ele me ajudou a lembrar tudo. Mas se o senhor prefere não acreditar, beleza. Tchau.
Como se não tivesse aula depois. Mas esse tchau foi um alívio. Finalmente essa matéria acabou. Chega de estudar todo dia e toda noite. Agora posso voltar a evangelizar para minha tribo. Não aceito Zebulom perder o rally de novo. Tá amarrado!
Fico no pátio mandando mensagem para minhas amigas do FJ pelo celular até a próxima aula, principalmente as da minha tribo, para marcarmos uma evangelização bem top para encher o Cultura Day, que já está bem perto! Ergo os olhos um momento para flagrar Gabriel passando longe, cabisbaixo. Nem vi quando ele saiu da sala. Corro até ele.
— Zerei a prova, mano. Zerei com zero mesmo.
— Que isso, piá, seja positivo.
— Ah, tanto faz. Não volto mais pra esse lugar, mesmo se repetir de ano, que se foda.
Ele mira o corredor atrás da quadra. Do bolso tira um pacotinho e, sem ele perceber, deixa cair um pacotinho.
— Gabriel, isso aí que caiu, pra quê você carrega isso?
Ele não responde. Apenas me olha e volta a seguir até seu cantinho.
— Você não precisa disso. Sabe o que você precisa? Voltar pra Deus.
— Que deus, Bruno? O que deixou sua mãe morrer e não fez nada?
Gabriel pode até ter enfiado uma faca de gelo no meu coração, mas eu sei que aquilo foi para o melhor. Sim, a saudade é grande. A vida é tão corrida sem ela para ajudar; minha irmã não faz nada em casa, meu pai só trabalha, eu tenho que cuidar de tudo. Graças a Deus, isso está me fazendo bem. Não pensava que eu era capaz de conciliar tanta coisa, principalmente minha fé em público, o que não aconteceria se minha mãe estivesse comigo.
— A questão não é comigo, é com você. Para de ficar se menosprezando só por causa de um número num papel. Quer saber? Eu estou desempregado, não tenho nenhum dinheiro, e mesmo assim não fico me achando inferior. Já sei, você virá comigo sábado num encontro bem top. E domingo vamos no Cultura Day, vai ter muita música, dança, teatro... vai ser top do top!
— Tá louco, mano? Encontro com homem? Tô fora!
— Ô, piá, tá me achando com cara de quê? Não é só nós, vai ter um monte de jovens, vamos pular, dançar, vamos se divertir. Vem com a gente, Gabriel. Vou te buscar na sua casa!
Gabriel insiste algumas vezes, mas sou mais persistente e o convenço a ir comigo. Mais uma alma, e mais um jovem para minha tribo. Tá ligado!
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