Quantas dúvidas escrita por DiHen Gomes


Capítulo 37
37 - Valéria




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— Raiva, que raiva! Que desordem! Argh!

Bato a porta e logo à frente está Karla deitada no sofá de frente para a televisão.

— E você, não vai pra balada hoje? — grito com minha amiga.

— Acha que vou perder? E você, quando vem comigo de novo? Hoje a noite é nossa.

Vou com passos firmes até a cozinha, pego um pote de sorvete cheio e uma colher grande, e volto para a frente da televisão.

— Ih, Val, tá deprê? Qual é, foi o Elton?

— Nem fala o nome daquela desordem na minha frente.

— Hmm, ele não era seu príncipe?

— É, mas… Tá difícil dele mudar. Seu eu pudesse esquecê-lo…

— É quem, então? Eu sei que você tá assim por causa de alguém? Quem é o cara?

Ela é minha melhor amiga, não preciso esconder nada dela.

— Hoje vi uma pessoa que eu tinha uma quedinha quando ia na igreja. E adivinha? Ele tá ainda mais gato! Ele me chamou pra igreja amanhã. Agora não sei se vale a pena, já que o Elton não…

— Esquece isso, Val! Homem é tudo igual, só muda o endereço e o tamanho do documento. Quer saber? Vamos pra festa, é isso que você tá precisando.

Realmente só fui para a balada duas ou três vezes com ela, e nunca aconteceu nada demais. Até gosto de ouvir músicas agitadas, e eu posso muito bem ficar no meu cantinho apenas ouvindo.

— Se você quer sair dessa, lá você pode ficar com qualquer carinha, sem compromisso, só a parte boa!

Não tem problema. Vou apenas ouvir uma música legal para esquecer um pouco aqueles homens.

*

Não é tão interessante quanto parecia. Fico sentada na mesa do canto, mas nem a música está boa. O DJ não está com nada! Mas Karla está se divertindo muito na pista. Cercada de rapazes babando por ela. Ela pode até ser bonitona, como todas as brasileiras, mas não passa de uma piranhona. Lá está a mais chamativa da festa de rolo com quatro rapazes, trocando saliva com um de cada vez. Ela os faz de idiotas, e os tontos se deixam levar. O último deles continua agarrado à cinturinha da Karla enquanto ela vem para perto da minha mesa. Vejo seu rosto um pouco embaçado por alguns goles.

— Vem, Val, vem dançar comigo. Olha lá, aqueles meninos estão de olho em você faz tempo.

— Não sei, Karla. Tô bem aqui. Deixa eu curtir… — soluço — … sozinha.

— Não tá não!

Karla me puxa à força, derruba a taça no banco e me põe no meio da pista. E nem ligo muito, pois não estou vendo o que acontece ao redor. As luzes piscantes e escuras pioram mais a minha vista desfocada. Só sei que Karla está do meu lado pela mancha grande que dança do meu lado. Movimentos bastante ousados que ela tenta me forçar a fazer. E eu faço mesmo. Vou até o chão, e o grito dos homens em resposta me dá vontade de continuar. Estão gostando de mim, me admirando.

— Quer ver eles ficarem doidinhos, Val?

Karla me agarra com força, sinto seus braços mas não a vejo direito. Sinto sua respiração e, por fim, sua boca. Ela me beija na frente de todos. Na hora o efeito do álcool passa, arregalo os olhos, ainda desfocados, mas consciente. A resposta dos rapazes é três vezes maior, por isso demoro alguns instantes sendo o centro das atenções daqueles machos antes de empurrar Karla de mim. Minha vista, agora normal, percebe a malícia do seu sorriso.

Volto correndo para a mesa, passo as costas da mão na boca para tirar vestígios de Karla dela. Uma vontade de vomitar toma meu estômago mas consigo contê-la. Pego minha bolsa e saio do recinto sem Karla notar, pois continua entretida com os homens.

Aqui fora só chega o batidão do som. O vento frio junto a um turbilhão de pensamentos me dão arrepios. Afinal, o que foi aquilo? Sei muito bem. Já vi isso antes. Já fiz isso antes. Eu mostrei a outros como vir nesses lugares só dá problema. Lembro das peças de teatro que montei anos atrás.

— Val, Val, espera, aonde vai?

— Embora. Aqui não é meu lugar. Nem sei por que vim.

— Fica aí, a festa tá só começando. E, psiu, tem dois aqui querendo ficar com você.

— Não, não, sério, tô indo. Tchau.

Começo a andar, e Karla me segue.

— O que foi, Val? É o bebê? Você tá se sentindo mal?

— O Michael tá ótimo, mas eu preciso ir. Quero… ficar sozinha um pouco.

A piranhona deve se achar mesmo minha melhor amiga, pois deixa a balada e volta para casa comigo. Se pensa que eu vou ceder à sua vontade, está muito enganada. Finjo nem vê-la pelo caminho, e em casa me tranco no quarto.

Meu Deus, o que foi aquilo? Lá não é meu lugar. Agora estou toda envergonhada, nem para falar com o Senhor eu consigo erguer o rosto. Perdoa, eu não quis, não queria… Me ajuda!


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